O advogado Pedro Dallari, que trabalhou para a Bancoop no acordo de regularização entre a cooperativa de construção e o Ministério Público de São Paulo, falou nesta sexta-feira (10) como testemunha no processo que procuradores da Operação Lava Jato movem contra Luiz Inácio Lula da Silva, em Curitiba, acusando-o de ser o “proprietário oculto” de um apartamento triplex no Guarujá. O ex-presidente jamais foi dono do imóvel.
Concedido ao juiz de primeira instância Sérgio Moro, o depoimento de Dallari explicitou a mirabolante linha do tempo da acusação esboçada pelos procuradores de Curitiba. Para eles, o triplex seria fruto de alguma forma de propina em contratos da Petrobrás celebrados entre 2006 e 2008.
A defesa de Lula perguntou se seria possível Dona Marisa Letícia – que é uma das acusadas na denúncia aceita por Moro – já imaginar, ao adquirir a cota do apartamento 141 (que não é a tal cobertura, mas fica no mesmo prédio) em 2005, que haveria uma cobertura reservada para ela naquele imóvel, e que todo o empreendimento seria assumido pela OAS, o que só aconteceu em 2009. “Que eu saiba não, porque em 2005 era impossível prever que os empreendimentos seriam assumidos por construtoras.” Mas, pela tese da Lava Jato, isso teria que ter ocorrido. Só assim faria sentido a teoria de que a OAS estaria utilizando a cobertura (que teria sido dada ao ex-presidente e a dona Marisa) em troca da cota da unidade que tinham (141), sem acréscimo de qualquer valor, a título de pagamento indevido a Lula.
A linha do tempo apresentada pela acusação é mirabolante. Dona Marisa se juntou à cooperativa Bancoop para adquirir uma unidade simples – a 141 – em 2005. Quatro anos depois, o empreendimento veio a ser assumido pela OAS, que só concluiu a obra em 2013.
Mas o Ministério Público acusa Dona Marisa de, já em 2005, ter a intenção de obter, sem pagar, uma cobertura triplex no edifício do Guarujá. E de isso ser propina paga ao ex-presidente em Lula em troca de sua influência para que a empreiteira tenha fechado três contratos com a Petrobrás, celebrados entre 2006 e 2008, ou seja, depois da data em que dona Marisa se associou à Bancoop para adquirir a unidade 141!
Os tais contratos da Construtora OAS foram celebrados enquanto Dona Marisa pagava prestações mensais para a Bancoop, que na época construía o empreendimento.
A OAS Empreendimentos, outra empresa do grupo OAS, mas diferente da OAS Construtora, só assumiu o prédio no Guarujá, entre outros da Bancoop, em 2009. Ocorre que, em 2009, quando o empreendimento passou para a OAS, todos os cooperados que lá possuíam unidades tiveram a opção de aderir ou não ao novo contrato de incorporação com a OAS.
Dona Marisa não aderiu ao acordo, perdendo o direito à unidade específica do imóvel que possuíam, a 141. O apartamento, então, foi liberado para venda, e ele foi de fato vendido. Mas, no entendimento da família, e conforme falou proceder “em tese” (por não conhecer o caso específico), Pedro Dallari, Dona Marisa manteve, junto à Bancoop, e conforme presente nas declarações de imposto de renda de Dona Marisa e Lula, os créditos dos valores pagos entre 2005 e 2009, para abater do valor total caso adquirisse algum outro imóvel da construtora (já não mais o imóvel previsto originalmente, sob o qual perdeu direito de preferência e que foi vendido para outro proprietário).
A família de Lula considerou, apenas em 2014, meses após o prédio estar pronto, e mais de três anos depois de Lula deixar a presidência, adquirir uma unidade no imóvel, o tal triplex. Avaliaram o imóvel em duas visitas de Dona Marisa e uma do ex-presidente Lula. Não gostaram do apartamento, não quiseram comprar, não compraram. A partir disso, e apenas disso e de meros boatos de que Lula seria dono do apartamento, o Ministério Público denunciou Lula e Dona Marisa como proprietários do apartamento, embora Lula e sua família jamais tenham usado o apartamento, tido chave dele ou a escritura do imóvel.
Foi o advogado Pedro Dallari quem celebrou o acordo entre a Bancoop, a cooperativa de construção ligada ao Sindicato de Bancários de São Paulo, e o Ministério Público de São Paulo para a solução de atrasos que existiam na construção de imóveis residenciais pela cooperativa, que regulou a transferência de diversos empreendimentos de imóveis da Bancoop para várias empresas.
O acordo determinou as transferências dos projetos, que foram separados em CNPJs e contas individuais, e foram assumidos por várias empresas, entre elas, a OAS Empreendimentos.
Nessa transição, em 2009, Dona Marisa, que pagou entre 2005 e 2009 parcelas por uma unidade simples do imóvel, a 141, perdeu o direito a reserva do apartamento previsto para ela, ao não aderir o acordo, que foi posto a venda e efetivamente vendido pela OAS sob a nova numeração do prédio (apartamento 131). Entenda toda a verdadeira história do famoso “tríplex do Guarujá”, em nota publicada em janeiro de 2016 pelo Instituto Lula.