O jurista Celso Lafer, ex-ministro das Relações Exteriores de Fernando Collor e Fernando Henrique Cardoso, tem uma extensa obra sobre a efetivação dos Direitos Humanos no Brasil por meio de tratados internacionais. No entanto, em entrevista ao UOL (18/08) sobre o comunicado do Comitê de Direitos Humanos da ONU que exige o direito de Lula ser candidato, Lafer afirmou o contrário do que escreveu em sua produção científica sobre o tema:
“À luz do ordenamento jurídico internacional e nacional, cabe, com exclusividade, ao Judiciário brasileiro apreciar se os dispositivos legais que limitam a atuação política e a elegibilidade do ex-presidente Lula de alguma maneira estão em contradição com os dispositivos do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos”.
Mas o Comitê, como é sabido, é o órgão criado pelo Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos da ONU, do qual o Brasil é signatário desde 1985, para controlar a aplicação, pelos Estados-Parte, das disposições deste instrumento. O Brasil, em 1992, ratificou sua adesão ao Pacto, com a consequente promulgação do Decreto nº 592. E em 2009 o Congresso Nacional aprovou o Decreto Legislativo 311, que reconhece a autoridade judicial do Comitê sobre a aplicação do Pacto no Brasil.
A Constituição, por força da Emenda Constitucional nº 45, determina que os tratados e convenções internacionais aprovados com processo semelhante às emendas (três quintos dos votos em dois turnos) teriam equivalência a elas. Sobre esse tema, Celso Lafer escreveu em sua obra “A Internacionalização dos Direitos Humanos”:
“Considero que os tratados internacionais de direitos humanos recepcionados pelo ordenamento jurídico brasileiro a partir da vigência da Constituição de 1988 e a entrada em vigor da Emenda Constitucional n. 45 não são meras leis ordinárias, pois têm a hierarquia que advém de sua inserção no bloco de constitucionalidade. Faço estas considerações porque concebo, na linha de Flávia Piovesan, que o § 2º do art. 5º, na sistemática da Constituição de 1988, tem uma função clara: a de tecer ‘a interação entre a ordem jurídica interna e a ordem jurídica internacional’.”
Portanto, para o jurista, as normas dos tratados e convenções internacionais de direitos humanos têm caráter materialmente constitucional, ou seja, valem como leis. A doutrina de Lafer foi citada e aplicada pelo Supremo Tribunal Federal em decisão de habeas corpus. O entendimento do STF é de que as normas dos tratados internacionais estão acima da legislação.
E agora, Celso Lafer? Vale o escrito pelo jurista ou vale a opinião do tucano? Ou será que a doutrina só não vale para o Lula?