“Em meu país, metade do que dizem os grandes meios de comunicação é mentira. Da outra metade, é preciso desconfiar”, foi assim que encerrou sua apresentação o vice-ministro de Descolonização do Estado Plurinacional da Bolívia, Félix Cárdenas, no Seminário “ As corporações midiáticas e sua incidência nos processos democráticos Sul – Sul”, encerrado neste dia 21, em Buenos Aires.
Cárdenas foi um dos expositores mais aplaudidos pelos jornalistas, autoriades e técnicos que participaram do encontro, organizado pelo Ministério da Justiça e dos Direitos Humanos da Argentina, o Centro Internacional para a Promoção dos Direitos Humanos (CIPDH), a Unesco e o Instituto Lula.
Em sua exposição, o representante da Bolívia explicou a relevância da definição de “Estado Plurinacional” de seu país. Lembrou que a Bolívia é composta por 36 diferentes nações indígenas e isso passou a ser reconhecido e respeitado apenas a partir do governo de Evo Morales. O vice-ministro então contou que para combater o monopólio dos grandes grupos midiáticos que desenvolvem um combate diário ao “primeiro governo índio da história da Bolívia”, eles decidiram “ignorar o que diziam os grupos de mídia e ajudar a montar 300 rádios comunitárias em todo o país”. As emissoras, ele explicou, são gerenciadas pelos movimentos sociais e “fazem suas transmissões nas línguas dos povos de cada região, coisa que as elites não podem, nem conseguem fazer, pois apenas falam a língua dos colonizadores,”. Ele contou que “em nosso governo, todo funcionário público deve conhecer ao menos uma língua indígena, além do espanhol”.
Das três mesas de debates também participaram autoridades, especialistas em comunicação e jornalistas da Argentina, Brasil, Venezuela, Nigéria e República Democrática do Congo. O seminário fazia parte do “I Encontro América Latina – África”, que se desenvolve em múltiplas sessões com temas diferentes desde dezembro de 2014.
Nas exposições dos diversos especialistas e jornalistas da Argentina foi destacada a importância que teve no país a chamada “Lei de Medios”, implantada no governo de Cristina Kirchner e que colocou importantes limitações para a expansão dos monopólios de comunicação. Os argentinos deixaram claro que a lei determina limites para o exercício do poder econômico que influencia toda a sociedade, mas que jamais colocou qualquer obstáculo ao exercício pleno da liberdade de expressão.
Os argentinos também defenderam a importância que tem no país a existência de um canal público aberto de televisão e de uma emissora de rádio também pública. A TV Pública, canal 7, e a Rádio Nacional alcançam toda a Argentina, com programação de grande qualidade.
Os representantes dos dois países africanos descreveram as dificuldades que encontram para exercer suas profissões neste processo de implantação da democracia em boa parte do continente. O jornalista Emanuel Mayah, de Lagos, capital da Nigéria, que trabalha com o chamado jornalismo investigativo, descreveu as limitações que tem para ver publicadas reportagens de grande valor informativo, mas que são rejeitadas pelos editores dos jornais porque não tem apelo popular como as notícias de crimes e desastres.
O Brasil foi representado no seminário pelos jornalistas Franklin Martins, conselheiro para a África do Instituto Lula e ex-ministro da Comunicação Social do governo Lula, e Celso Marcondes, diretor. Marcondes falou na mesa de abertura e Martins na principal mesa do evento. Ambos deram grande ênfase em suas apresentações ao papel que as grandes redes de comunicação brasileiras jogam hoje no processo de desgaste do governo de Dilma Rousseff, atuando quase sempre como os verdadeiros partidos de oposição ao governo e “disfarçados sob o manto da independência”, como ressaltou Franklin Martins em sua exposição.
A programação do evento foi publicada no site do Instituto Lula .
Todos os vídeos do seminário estarão em breve disponíveis neste espaço.