O advogado do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Cristiano Zanin Martins escreveu uma carta aberta ao jornalista Merval Pereira sobre a publicação “Preparando o terreno”, divulgada nesta quarta-feira (19), em O Globo.
Na carta, Cristiano afirma que a defesa do ex-presidente não atua para “desacreditar a Justiça” e todo o trabalho dos advogados é baseado em “fatos e técnica jurídica” e não “convicções”.
O advogado comenta ainda sobre intenção de Merval Pereira de ocultar os ilícitos praticados pela Lava Jato. “Só se fala em investigações contra Lula. E as investigações contra os agentes do Estado que violaram a Constituição e as leis, chegando a praticar condutas que a lei, em tese, define como crime? Por que nem uma palavra?”, escreveu Cristiano Martins.
Confira a carta na íntegra:
Carta aberta ao Jornalista Merval Pereira – Organizações Globo
Senhor Jornalista,
Ao contrário do afirmado (“Preparando o terreno”, O Globo, 19/10/2016), nem o ex-Presidente Lula e nem nós, seus advogados, atuamos para “desacreditar a Justiça”. Todo o trabalho de defesa está escorado em dois pilares: fatos e técnica jurídica. Não usamos “convicções” ou simulacros de legalidade.
O senhor citou, com desdém, o fato de termos arguido a suspeição do Desembargador João Pedro Gebran, do TRF4, para julgar os procedimentos que abrimos contra o juiz Sergio Moro perante aquela Corte. Ora, é a lei que nos permite fazer esse questionamento, pois o art. 254, I, do Código de Processo Penal estabelece que o magistrado (juiz, desembargador ou ministro) não pode julgar um “amigo íntimo” (essa expressão é da lei, caso desconheça). Apontamos, por meio de provas, a possibilidade de haver a relação entre o desembargador Gebran e o juiz Moro. Apresentamos à Corte, por exemplo, um livro em que o primeiro reconhece uma “crescente amizade” e afinidade com o segundo em um texto que indica tal proximidade. Tanto é que o próprio desembargador Gebran, de forma conscienciosa e correta, suspendeu o julgamento que seria realizado na data de hoje para melhor analisar o assunto.
Em relação ao juiz Moro, o senhor considerou “natural” ele não ter acolhido os fundamentos que apresentamos para mostrar a sua suspeição e consequente impedimento legal para julgar o ex-Presidente Lula. Mas o fez ao seu modo, sem debater os fatos e as provas. E no caso de Lula eles falam por si. Afinal, há uma vasta sequência de fatos – todos comprovados — que mostram que o citado agente público praticou violações claras às garantias fundamentais de Lula, como, por exemplo, ao privá-lo de sua liberdade por meio de uma condução coercitiva sem previsão legal, ao divulgar suas conversas interceptadas para alcançar fins estranhos ao processo, ao grampear 25 advogados do nosso escritório para monitorar a defesa do ex-Presidente, ao fazer 12 acusações contra nosso cliente em documento dirigido ao STF, ao participar de eventos com políticos e pré-candidatos do PSDB e de outros partidos que antagonizam Lula e, ainda, ao participar de eventos da própria Globo, que sabidamente não aprecia Lula.
Suas afirmações acabam confirmando a correção da nossa atuação. Quando o senhor reconhece que há outros juízes responsáveis por ações ou investigações envolvendo o ex-Presidente Lula sem que tenhamos apresentado questionamentos sobre a imparcialidade desses magistrados, como fizemos em relação aos magistrados citados acima, é porque somente usamos desse meio de defesa quando efetivamente temos provas para usá-lo. Não é uma receita válida para qualquer caso.
O senhor fala – mais uma vez sem razão – que nossa estratégia é de “politizar os processos” sem revelar o denso conteúdo jurídico das defesas apresentadas e que estão disponíveis a qualquer interessado no site www.abemdaverdade.com.br. Na realidade, sua intenção é a de esconder a defesa do Lula, pois ela é sólida, baseada em provas, e supera, à toda evidência, as “convicções” dos acusadores que elegeram o ex-Presidente como inimigo.
Também é clara a sua intenção de ocultar os ilícitos praticados pela Lava Jato. Só se fala em investigações contra Lula. E as investigações contra os agentes do Estado que violaram a Constituição e as leis, chegando a praticar condutas que a lei, em tese, define como crime? Por que nem uma palavra?
Usaremos, sim, de todos os recursos que a lei prevê para ver reconhecida a inocência de Lula, no Brasil e no exterior. Se o país aprovou, por meio de decretos legislativos, a competência de órgãos internacionais para apurar violações a garantias fundamentais, ela também deve servir a Lula. O comunicado feito à ONU em julho é um exemplo disso. Mas falar em asilo é algo despropositado e só poderia ter vindo de alguém como você, que atua para esconder que a defesa de Lula não deixa qualquer margem de possibilidade e, sobretudo, de legitimidade para qualquer condenação criminal.
Cristiano Zanin Martins