O juiz Sérgio Moro não tentou apenas forçar a defesa a desistir de testemunhas em processo que apura um apartamento que não é do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e um terreno que foi recusado pelo Instituto Lula e jamais recebido. Moro, com muita pressa de emitir a sentença e aparente pouco interesse em ouvir testemunhas, também tentou eliminar do processo 12 testemunhas da acusação, indicadas pelo Ministério Público Federal.
Como essas testemunhas já tinham feito depoimentos em outro processo que Moro conduz contra Lula, que trata de contratos da OAS e de um apartamento no Guarujá, processo onde as mais de 70 pessoas ouvidas não apresentaram nenhuma prova ou crime de Lula, ele determinou que os depoimentos de um processo fossem simplesmente transferidos para o outro, para que as testemunhas não fossem ouvidas de novo. Tal medida ignora o fato óbvio de que há diferenças entre o que se busca apurar em um processo e no outro. Reduzir a participação de uma testemunha a um depoimento já prévio e concedido em outro contexto prejudica o fazer processual, Não importa quais das partes tenham elencado o depoente.
O Ministério Público e também a Defesa protestaram contra a decisão de Moro e recorreram no processo .
Moro, então, resolveu ceder ao Direito e aceitou ouvir as testemunhas da acusação, e disse que decidiria depois se Lula teria que comparecer as audiências das testemunhas de defesa. Na última segunda-feira (17), o juiz proferiu a seguinte decisão:
“Já que este julgador terá que ouvir oitenta e sete testemunhas da Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva, além de dezenas de outras, embora em menor número arroladas pelos demais acusados, fica consignado que será exigida a presença do acusado Luiz Inácio Lula da Silva nas audiências nas quais serão ouvidas as testemunhas arroladas por sua própria Defesa, a fim prevenir a insistência na oitiva de testemunhas irrelevantes, impertinentes ou que poderiam ser substituídas, sem prejuízo, por provas emprestadas [de outros processos]”.
A decisão de Moro foi chamada de “birra” até pelo jornalista Merval Pereira, insuspeito de qualquer simpatia por Lula ou antipatia por Moro, muito pelo contrário. É que a decisão não tem qualquer previsão legal. O juiz é obrigado, por ser sua profissão e pela lei, a ouvir as testemunhas em audiência. O réu não é obrigado a acompanhar as audiências porque é representado pelos seus advogados. O juiz não pode condicionar ouvir testemunhas de defesa à presença do réu, ou obrigá-lo a ir nas audiências porque restou contrariado com o número de testemunhas arroladas em um caso onde aceitou a denúncia do Ministério Público.
O processo acusa Lula de ter “recebido” em troca de contratos na Petrobras um terreno que não é dele e que foi recusado pelo Instituto Lula, e um apartamento alugado pelo ex-presidente, supostamente propriedade oculta de Lula.
As delações da Odebrecht deixam claro que não foi Lula que solicitou o terreno e que o imóvel foi RECUSADO pelo ex-presidente. As delações também não falam nada a respeito do apartamento, ou de participação de Lula em desvios de contratos na Petrobras. Ou se já, fato é que a ação não devia sequer ter sido aceita e é totalmente improcedente. Mas, uma vez que o magistrado resolveu abrir o processo, agora é preciso pelo menos respeitar a lei.