Em debate hoje (29) no Rio de Janeiro sobre a política de preços da Petrobras, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu que o lucro da companhia seja repartido com a sociedade brasileira, tanto por meio de investimentos em áreas de interesse, como saúde, educação e ciência e tecnologia, como por meio de medidas que impeçam grandes altas dos preços e permitam que todos tenham acesso aos combustíveis. “Uma empresa do porte da Petrobras, ela tem que ter lucro, mas é preciso repartir esse lucro com quem é responsável por ela, que é o povo brasileiro”, afirmou.
Lula voltou a ressaltar a importância da Petrobras para a soberania do Brasil e afirmou ser preciso fazer com que a sociedade brasileira entenda que a luta pela empresa é de todos, e que o fato de ter pessoas cozinhando com lenha, sem condições de pagar pelo gás, sem conseguir abastecer carros com gasolina ou caminhão com diesel é por causa da destruição em curso pelo atual governo.
“A Petrobras tem que se transformar numa briga nacional. É preciso construir o discurso para a pessoa que está cozinhando com lenha na calçada porque não tem gás perceba que essa luta é dela. Aquele cara que tem o carrinho que não pode mais encher o tanque, tira o carro da garagem só para limpar a calota e o para-choque, ele tem que saber que essa luta é dele. O caminhoneiro que não está podendo mais encher o tanque de óleo diesel, ele tem que saber que essa luta é dele”, declarou.
O ex-presidente disse que a Petrobras foi crucificada por ter sido tratada nos governos petistas não só como empresa de petróleo, mas como empresa fundamental para o desenvolvimento nacional e para a melhoria da qualidade de vida dos brasileiros, com a criação da Lei da Partilha e de um fundo nacional que destinaria recursos da companhia para educação, saúde e ciência e tecnologia. Ele lembrou que foi nos governos petistas que a estatal fez a maior capitalização da história, a maior descoberta de petróleo e a mais importante regulação para que a companhia fosse, efetivamente, do povo brasileiro.
“A Petrobras tinha que ser destruída, como eles estão destruindo, porque desde 1860, quando se descobriu o petróleo, o petróleo é a razão de quase todas as mazelas que acontecem em quase todos os países do mundo. Se a gente não contar essas histórias para o povo, o povo não sabe”. Lula disse que é preciso convencer a sociedade de que, quando o petróleo é nosso, a gasolina é mais barata, o óleo diesel é mais barato, o gás de cozinha é mais barato, o nafta é mais barato, tudo é mais barato.
Dolarização
No debate promovido pela Federação Única dos Petroleiros (FUP), com presença de técnicos do setor, do ex-presidente da estatal José Sérgio Gabrielli, do ex-diretor Guilherme Estrella, da presidenta nacional do PT, Gleisi Hoffmann, além de políticos como o pré-candidato ao governo do Rio, Marcelo Freixo, o pré-candidato ao senado André Ceciliano, dos pré-candidatos a deputado federal Lindberg Faria e José Maria Rangel e de lideranças petroleiras de todo o Brasil, o ponto central foi a atual política de preços da companhia.
Implementada pelo governo Temer e seguida pelo governo Bolsonaro, a chamada PPI (Política de Paridade de Importação), que nada mais é do que a dolarização dos combustíveis, levou a uma alta desenfreada dos preços, que penaliza os mais pobres em várias frentes. Desde a dificuldade direta para acessar insumos como gás de cozinha, diesel e gasolina, até a carestia generalizada de itens de alimentação e outros produtos, já que combustíveis caros resultam em alta dos preços e inflação descontrolada.
Cloviomar Cararini, do Dieese, alertou que, desde 2016, quando a nova política entrou em vigor, o gás de cozinha subiu 350%, enquanto o salário mínimo avançou 35% e a inflação teve alta de 31%. “Discutir política de preços é discutir soberania nacional”.
Eduardo Costa Pinto, da UFRJ e do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Combustíveis (Ineep), disse que o objetivo da PPI é maximizar o lucro da Petrobras, o que viabiliza importação por agentes privados e mais dinheiro ao acionista ao custo de aumento de preço na bomba.
Ele disse que ninguém questiona o lucro da empresa, mas que, na dimensão estatal, ela precisa ser utilizada na estratégia de política energética do Brasil, combinando segurança de abastecimento e acesso barato aos derivados. Ele disse ser possível reduzir os preços em curto prazo e defendeu que a companhia, além de autossuficiência na produção de petróleo, tenha autossuficiência também na produção de derivados.
Deyvid Bacelar, coordenador-geral da FUP, entregou ao ex-presidente Lula uma carta dos petroleiros elaborada em plenária no ano passado com propostas que eles gostariam de ver num plano de governo do PT. Os petroleiros defendem nova política de preço, retomada e ampliação do parque de refino, retomada das fábricas de fertilizantes e de toda a rede de distribuição “vendida a preço de banana”.
Bacelar afirmou que a PPI “sangra” a população brasileira e disse ser importante que a Petrobras volte a ocupar espaço no desenvolvimento nacional e regional.
Consumo de energia e qualidade de vida
O ex-diretor Estrella afirmou que a nação que não tem domínio sobre seu potencial energético não é soberana e que a soberania do Brasil foi perdida por causa de interesses no pré-sal. “O Brasil não é mais nosso, a Petrobras não é mais nossa. Esse é o desafio que nós temos que enfrentar, recuperar a soberania nacional”, afirmou.
Segundo ele, o que está acontecendo no Brasil é um projeto de país escravizado e submisso, com o povo sem direitos. “Já fomos a sexta economia do mundo e hoje somos a 13ª e estamos depois da 15ª posição em consumo de energia per capita. O consumo de energia por habitante é referência de qualidade de vida”.
O ex-presidente da estatal disse não há no mundo nenhuma nação grande que não tenha na segurança energética um elemento chave para o seu projeto de nação. Segundo ele, a segurança energética não significa apenas acesso às fontes de energia, mas a capacidade do povo ter acesso a elas, o que significa preço.
“Não é à toa que hoje, com os preços no mercado internacional altos, a maioria dos grandes países tem adotado, crescentemente, políticas para evitar o impacto disso sobre os seus consumidores e sobre a sua população. O mundo hoje está apontando claramente que petróleo, gás e energia elétrica não podem ser tratados como mercadorias quaisquer. O Estado é fundamental para viabilizar o acesso a essas fontes”, disse Gabrielli, lembrando que, nos tempos do PT, o Brasil tinha essa prática, formalmente, na política nacional de abastecimento, que foi modificada em 2017.
Gabrielli afirmou ainda que a interrupção dos investimentos em refinarias tornou o Brasil mais vulnerável aos preços internacionais e tirou soberania do país. Segundo ele, é possível reduzir os preços dos combustíveis no Brasil, fazendo o que o ex-presidente Lula chama de abrasileirar os preços dos combustíveis. “Esse abrasileirar acho que vai além do que simplesmente pensar no câmbio, significa pensar no aumento da capacidade da produção doméstica, significa aumentar nossa participação na distribuição. Significa, portanto, mudar a estratégia da Petrobras”, disse.
O ex-dirigente da estatal defendeu discussão clara e aberta, até com acionistas, para dizer que a Petrobras é parte do projeto e da soberania nacional e que o Brasil não abrirá mão de ter capacidade, como todas as potencias do mundo, de administrar o preço e a oferta dos derivados para o povo.
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