Na última terça-feira, 31 de maio, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva concedeu uma entrevista para a rádio Bandeirantes FM de Porto Alegre (RS), no programa Jornal Gente. Confira abaixo, na íntegra, a conversa com os jornalistas Sérgio Stock, Guilherme Macalossi e Rodrigo Orengo.
Rodrigo Orengo:
Hoje o debate público claro que está em torno do preço dos combustíveis. O senhor já comunicou publicamente a chamada dolarização do preço dos combustíveis, mas eu gostaria de saber na prática, como que o senhor pretende enfrentar este assunto? Pergunto porque há impeditivos legais, a Lei das Estatais e também definições do Conselho da Petrobras, o senhor pretende mudar o Estatuto da Petrobras, mudar a lei justamente das estatais? E ainda, pensa em subsídios e fundo de estabilização? Como o senhor na prática pretende enfrentar esse problema? Bom dia.
Luiz Inácio Lula da Silva:
Rodrigo, deixa eu te dizer uma coisa. Primeiro, o presidente da Petrobras é subordinado às orientações políticas do Estado Brasileiro, que é o acionista majoritário da Petrobras. Ou seja, embora a gente já tenha a maioria das ações, é o governo que indica o Conselho, é o Conselho que indica o presidente, que é então indicado pelo Conselho da Petrobrás. Ora, quando você não sabe o que fazer, você tem dificuldade, você convoca o Conselho de Política Energética e você define o que fazer com o preço dos combustíveis.
Eu só queria te lembrar, Rodrigo, que em 2008 o preço do combustível chegou a 147 dólares o barril, e a gasolina era vendida no Brasil a R$ 2,60, e a Petrobras era lucrativa. Ora, o fato de você dolarizar o preço do combustível, e por conta disso você jogar nas costas do povo brasileiro a responsabilidade de pagar um custo de combustível que não é real, porque não é real o custo do combustível dolarizado, porque nós somos autossuficientes, porque nós temos capacidade de extrair petróleo, o que aconteceu é que pararam de construir as refinarias que estavam sendo construídas. E hoje o Brasil não tem capacidade de refinar todo o combustível que ele tem direito.
Ora, então o que é preciso fazer? Primeiro é preciso que uma parte do lucro da Petrobras seja revertido em investimentos na Petrobras. Segundo, não é correto você ter um lucro de 105 bilhões de reais e você dividir tudo isso em dividendos para os acionistas. Não é possível, não é admissível que você não leve em conta a necessidade de fazer reinvestimento. Então, o que vai acontecer? Primeiro nós temos que ganhar as eleições. Ganhando as eleições nós vamos ver como é que está o Congresso Nacional depois do resultado eleitoral. Depois você vai chamar o Conselho da Petrobras, o Conselho Nacional de Política Energética e nós vamos discutir um plano para que a gente possa recuar nos preços dos combustíveis ao ponto de você abrasileirar o preço do combustível.
Porque grande parte do custo é em real, então portanto não tem sentido você dolarizar o preço para atender o interesse de quem? O interesse apenas dos acionistas? E o interesse do investimento da Petrobras? Porque não está acontecendo. Ou seja, a Petrobras já tem a maior jazida de petróleo descoberta no século 21, e é preciso que a gente transforme isso num passaporte para o futuro. Por que eu queria fazer refinaria? Porque a gente precisaria ser exportador de derivado de petróleo e não importador de derivados de petróleo e exportador de óleo bruto. Então, nós vamos tratar isso com muito carinho. Agora, primeiro, eu não posso dizer na prática porque na prática eu preciso ganhar as eleições primeiro. Quando eu ganhar as eleições, Rodrigo, aí você vai conversar comigo e nós agora vamos tomar tais e tais decisões. Mas eu não posso porque eu não sou o presidente da República, eu sou só candidato. Eu só posso dizer para você Rodrigo, você viverá nesse país, a hora que a gente recuperar…
Sérgio Stock:
No cenário internacional complicado é uma desordem econômica do mundo inteiro. Mesmo que o senhor não queira dizer na prática o que vai fazer, em linhas gerais, o que que é necessário para o Brasil conseguir sobreviver e sair desse cenário de dificuldade de crescimento e inflação que é mundial e também afeta o país?
Luiz Inácio Lula da Silva:
Olha, deixa eu dizer uma coisa para vocês, é importante lembrar que quando eu ganhei as eleições em 2002 eu tomei posse dia 01 de janeiro com a seguinte situação, os economistas progressistas, os economistas da esquerda no Brasil diziam que o Brasil estava quebrado, que era praticamente impossível governar. Nós tínhamos uma dívida com o FMI de 30 bilhões de dólares, nós tínhamos uma pequena reserva que não dava sequer para pagar as nossas importações. Nós tínhamos uma dívida interna pública de 65% do PIB, nós tínhamos uma inflação de 12% e tínhamos 12% de desempregados. Eu dizia para os economistas: como é que eu posso, se vocês não acreditam que é possível recuperar o Brasil, por que vocês querem que eu seja eleito presidente?
O que aconteceu pouco tempo depois? Nós pagamos os 30 bilhões que devíamos ao FMI e ficamos, deixamos de ser devedores para sermos credores, porque emprestamos 15 bilhões para o FMI. Nós, que nós tínhamos o hábito de ter reservas internacionais, e por isso o Brasil era muito vulnerável ao aumento do dólar, às inflexões da política no mundo inteiro, fizemos uma reserva de 370 bilhões de dólares. Nós reduzimos a dívida pública de 65 para 32%, fazendo a maior política de inclusão social que esse país já conheceu, e colocamos a inflação durante quase todo o meu mandato dentro da meta de 4,5% para mais 1,5 e para menos 1,5. Ou seja, nós provamos que era possível equilibrar.
Eu acho que a mesma coisa tem que ser feita agora, é importante lembrar o significado da crise do Lehman Brothers em 2008, o que aconteceu na economia brasileira. E quando eu disse que a crise ia ser uma marolinha, é porque nós estávamos já fazendo uma política econômica anticíclica. Você está lembrado que nós tínhamos lançado o PAC em fevereiro de 2007, quando a crise chegou a gente estava com uma decisão de fazer investimento em infraestrutura extraordinária, ora dinheiro do orçamento, ora dinheiro financiado pelo BNDES, em todos os estados da federação. Se você pegar a história econômica do Rio Grande do Sul, você pode pegar em qualquer centro de estudos do Rio Grande do Sul, você vai perceber que poucas vezes na história o Rio Grande do Sul recebeu a quantidade de investimento que recebeu nos nossos governos. Porque a gente tinha uma política anticíclica de investimento, e é por isso que nós vencemos a crise muito rápido, e é por isso que nós entregamos o governo com a economia crescendo 7,5%.
Ora, é possível fazer isso agora, é possível fazer isso agora. O Brasil é um país sui generis, porque nós ainda, diferente de um país acabado como a Alemanha, um país acabado como a França, que está tudo certinho, todas as ruas estão asfaltadas, tudo com saneamento básico, aqui no Brasil nós temos uma quantidade enorme de infraestrutura a ser realizada para a gente garantir o direito de cidadania do povo brasileiro. Ainda é preciso levar água potável para milhões de brasileiros, é preciso fazer saneamento básico para milhões de brasileiros, é preciso levar luz elétrica ainda para as pessoas, é preciso cuidar da Saúde cuidar, da Educação, cuidar de tantas coisas que nós poderemos ter um alto programa de investimento em obras de infraestrutura que podem passar pela Educação, pela Saúde. E você pode fazer com que essa obra de infraestrutura seja o financiamento de um ativo produtivo que aumente o valor do nosso país.
O que não dá é para você ficar chorando o leite derramado. Ah, eu estou desempregado, ah, eu não tenho mais jeito na minha vida, ah o Brasil está com uma dívida pública. Sabe qual é o melhor jeito de diminuir a dívida pública em relação ao PIB? É aumentar o PIB, não é cortar mais investimento. Porque no Brasil se costuma dizer que vamos cortar investimento, quando fala cortar investimento a gente vê todo dia o que acontece, é na área da Ciência e Tecnologia, é na área da Educação, é na área da Saúde, é na área do transporte, é na área da agricultura, sobretudo a pequena e média propriedade brasileira.
Então, meu caro, é preciso que a gente comece a reverter e pensar que isso que é dito como gasto hoje se transforme em investimento, que possa trazer retorno para a sociedade brasileira. É isso que vai acontecer no Brasil. Eu não quero falar porque a gente não pode ficar citando coisa porque primeiro eu tenho que ganhar as eleições, a gente não pode sentar na cadeira antes. Eu quero te dizer uma coisa, eu quero te dizer uma coisa, nós vamos fazer, a primeira coisa que eu quero fazer como presidente, se for eleito presidente da República, é convocar uma reunião com os 27 governadores para que a gente possa estabelecer de verdade a situação de cada estado, o que o Governo Federal pode fazer para ajudar os estados, e o que os estados podem fazer pelas suas próprias mãos. A partir daí, começar a recuperar a relação entre os entes federados.
Um presidente da República tem que conversar com os governadores, tem que conversar com os prefeitos, tem que conversar com os sindicatos, tem que conversar com o Congresso, tem que conversar com os empresários, um presidente da República não fica trancado na sua biblioteca fazendo live e fazendo fake news. Eu estou dizendo isso todo santo dia. O meu compromisso com o povo brasileiro é provar que é possível esse país voltar a crescer e não dá para jogar a culpa em cima da Guerra da Ucrânia. Não dá. Esse país estava fazendo uma fábrica de ureia em Três Lagoas, acabaram com ela, estávamos fazendo uma fábrica de amônia em Uberaba, acabaram com ela, fecharam fábrica que a gente tinha de produzir fertilizante em Sergipe e no Paraná. Esse país não se respeitou, esse país achou que era importante vender tudo o que tinha, agora estão percebendo o quanto é importante fertilizante. E por isso o Brasil, que é um dos maiores produtores de alimentos do mundo, não pode ficar dependente de fertilizante. A gente precisa criar a nossa matriz de produção de fertilizante para que a gente possa dominar o mundo na produção agrícola.
Guilherme Macalossi:
Presidente, bom dia. Aqui Guilherme Macalossi. O senhor falou na entrevista para a Time, uma entrevista que repercutiu bastante aqui no país que “não se discute a política econômica antes de ganhar as eleições”. O senhor mesmo menciona isso agora dizendo que vai esperar o Congresso então ser eleito para discutir com o Congresso. Muitos críticos do senhor apontaram que é uma tentativa de buscar um cheque em branco junto à população. Mas o senhor é um homem experiente, o senhor é um homem que tem uma trajetória política muito grande, o senhor sabe mais do que ninguém que na política não existe cheque em branco, o senhor vai ter que necessariamente discutir muitas dessas propostas como, por exemplo, revogar a Lei do Teto de Gastos, que o senhor já se manifestou contrariamente, ou mesmo readequar, reformar a legislação trabalhista, que passou por uma mudança no governo Temer, com os parlamentares, tanto na Câmara dos Deputados quanto no Senado Federal. Portanto, o senhor vai ter que dialogar com o Congresso, que é feito por gente como Artur Lira e Renan Calheiros. No passado durante o seu governo nós tivemos o episódio do mensalão, mais recentemente nós tivemos o orçamento secreto. Como é que o senhor pretende trazer essa gente para administrar o país?
Luiz Inácio Lula da Silva:
Veja, primeiro eu espero que pessoas como você que são eleitores votem em pessoas diferentes para poder ser um legislador brasileiro. Eu acho que o Congresso Nacional tem que passar por uma renovação e a gente votar, e eu vou fazer campanha para presidente pedindo voto para deputado e senador. Eu quero dizer para o povo que é importante votar em deputados e senadores que assumam o compromisso com a sociedade de que não vai ter orçamento secreto no Congresso Nacional, de que não vão fazer mudanças na legislação trabalhista para prejudicar o povo trabalhador, que isso tem que ser feito no acordo entre empresário, trabalhadores e governo. Não precisa ser aprovado a toque de caixa a destruição daquilo que a gente tinha conquistado desde 1943. Eu quero dizer que você pode fazer uma reforma na Previdência negociada, e eu fiz ela para o setor público. Eu quero dizer que tem outro jeito de fazer as coisas. E por que eu disse que é importante a gente esperar o Congresso? Porque é preciso rever muitas coisas que foram feitas da forma mais democrática possível. Da forma mais democrática possível. E eu vou fazer isso porque sei fazer isso.
Sérgio Stock:
Qual é essa forma mais democrática possível, presidente?
Luiz Inácio Lula da Silva:
Eu não estou pedindo cheque em branco, porque eu tenho legado. Eu tenho legado. É só você pegar o que nós fizemos no Rio Grande do Sul, você vai perceber que eu não tenho que ficar fazendo discurso, promessa de coisa que eu não sei se eu vou conseguir fazer. Eu sou muito realista, e eu disse, quando eu tomei posse, eu disse em 2003: se quando eu terminar o meu mandato cada brasileiro tiver almoçando, jantando e tomando café, eu terei realizado a minha obra da minha vida. E nós conseguimos fazer isso.
E você sabe perfeitamente bem, em 1975 eu fiz a minha primeira viagem a Porto Alegre, e eu fui viajar para Porto Alegre orientado por um companheiro chamado Walter Barelli, do DIEESE, que eu ia conhecer o estado mais desenvolvido, o estado muito mais culto, um estado diferente do restante dos estados brasileiros. E era verdade. Era verdade. Lá tinha, o Brizola tinha investido em Educação antes dos outros governantes de outros estados, parecia efetivamente, quase que parecia um outro país. O que aconteceu com o Rio Grande do Sul? Retrocedeu economicamente. Hoje nós temos mais de 1,2 milhão de pessoas vivendo abaixo da linha da pobreza, hoje nós temos uma seca tremenda e não tem política do Governo Federal para ajudar a pequena e a média propriedade. 52% das pessoas que produziam leite pararam de produzir leite porque não tinha rentabilidade, porque não tinha condições de sobrevivência. Então, como é que esse estado pôde retroceder? Eu visitava o Rio Grande do sul quando o pessoal dizia, porque a metade sul do Rio Grande do Sul não tem saída, não tem não sei das quantas. O que aconteceu com a metade sul no nosso governo? Nós duplicamos a rodovia de Pelotas a Rio Grande, nós fizemos um grande estaleiro em Rio Grande, que produziu duas plataformas, que produziu navios, e que agora está fechado.
Guilherme Macalossi:
Presidente, o senhor está mencionando aí vários feitos do seu governo aqui no Rio Grande do Sul. Eu acho que é importante o senhor falar aqui para o público gaúcho, porque ao mesmo tempo que as pesquisas de opinião que lhe colocam na liderança em todos os cenários em nível nacional, elas também apontam que o senhor é rejeitado principalmente aqui no sul do Brasil e que perde a eleição aqui no Rio Grande do Sul, a última pesquisa do Instituto Paraná Pesquisas, aqui no estado especificamente, mostra o senhor atrás do presidente Bolsonaro. Eu pergunto: por que o senhor é tão rejeitado aqui no Rio Grande do Sul?
Luiz Inácio Lula da Silva:
Por que você escolheu o Instituto Paraná e não o Datafolha?
Guilherme Macalossi:
Eu escolhi o Instituto Paraná porque a pesquisa foi feita junto à Band.
Sérgio Stock:
É critério da Bandeirantes, presidente.
Luiz Inácio Lula da Silva:
Deixa eu lhe falar uma coisa, com todo o respeito que eu tenho pelo jornalista, eu primeiro tenho clareza que eu vou ganhar as eleições no estado do Rio Grande do Sul, porque eu conheço povo do Rio Grande do Sul, já ganhei muitas eleições aí. Depois nós tivemos reveses, o que é normal da democracia, e nós vamos ganhar porque nós vamos fazer com que o povo gaúcho se lembre do que foi o Lula e a Dilma no governo brasileiro para o Rio Grande do Sul, o que foi a quantidade de obras que nós fizemos nesse estado. Eu não vou ficar lendo aqui, mas eu poderia pedir para o Stuckert mandar para vocês para vocês se lembrarem o que nós fizemos nesse estado, a quantidade de obras que nós fizemos nesse estado, a quantidade de rodovias, a quantidade de pontes, o que nós fizemos para combater enchentes, o que nós fizemos na Educação, a Universidade dos Pampas, a Universidade Fronteira Sul, ou seja, a quantidade de investimentos que nós fizemos nesse estado nunca tinha acontecido no estado do Rio Grande do Sul.
Eu até queria pedir para vocês, peçam para a universidade mostrar para vocês em que período um presidente da República ou um partido político fez mais investimentos no Rio Grande do Sul do que nós fizemos. E isso, e mesmo quando o PT não governava o Rio Grande do Sul, eu fiz isso com o (Germano) Rigotto, eu fiz isso com a governadora (Yêda Crusius), porque para mim não interessava que partido pertencesse o governador, para mim interessava que ele era governador do estado e eu estava pensando em fazer as coisas para o povo pobre desse estado. É por isso que nós fizemos um milhão, criamos 1 milhão de empregos no Rio Grande do Sul, 212 mil moradias entregues do Minha Casa Minha Vida, 91 mil famílias beneficiadas com Luz para Todos, 405 mil famílias atendidas pelo Bolsa Família, a criação da Unipampa com campus em 10 cidades, a criação da Universidade Federal Sul, 536 mil alunos do Pronatec, 246 mil alunos do ProUni e do FIES, 2.197 ônibus escolares entregues pelo nosso governo.
Ou seja, eu tenho clareza da revolução que nós fizemos nos estados brasileiros. Eu poderia dizer para vocês com muita humildade, nunca antes na história do Brasil um presidente da República tratou governadores e prefeitos com o tratamento democrático e republicano que eu tratei. Aí vocês têm testemunha, o Rigotto, tem a governadora, vocês têm o Tarso Genro, Olívio Dutra, que vocês podem perguntar o que a gente fez nesse estado aí. E fizemos em todos os estados da federação. Porque o PAC foi o maior investimento de obra pública que nós fizemos na história desse país, começou em 2007, depois a Dilma continuou com o 2007. E eu até brincava com a Dilma, ela deve estar ouvindo o programa agora, a Dilma era chefe da Casa Civil, e toda vez que a gente ia discutir obra ela vinha colocando uma obra do Rio Grande do Sul. Eu falava: pô Dilma, é tudo para o Rio Grande do Sul, é tudo para o Rio Grande do Sul? Estava brincando com a Dilma. E eu tenho clareza do que nós fizemos nesse estado. Então veja, nós sabemos o que fazer.
Eu tenho claro que se voltar à presidência da República, eu tenho que fazer mais do que eu fiz, e fazer mais do que eu fiz significa trabalhar mais, significa fazer um trabalho concreto, harmonizado com o Congresso Nacional. É preciso que a gente harmonize as instituições, a Suprema Corte cuida da Constituição, o governo cuida de governar e o Congresso Nacional cuida de legislar, se cada um fizer a sua tarefa está tudo muito bem nesse país. A única coisa que eu posso dizer para vocês é que nós vamos voltar a cuidar do povo pobre desse país. As pessoas vão voltar a comer três vezes ao dia. Eu recebi um recado aqui que está difícil comer churrasco no Rio Grande do Sul, o povo vai voltar a comer uma costelinha assada, o povo vai voltar a comer uma picanha, porque não é possível que o Brasil sendo o maior produtor de proteína animal do mundo esse povo precise ficar na fila para pegar um osso, ou ficar pegando carcaça de frango no lixo. Não é possível. Eu vou fazer mais do que eu fiz.
Sérgio Stock:
Sim. Agora, o caminho, mesmo que o senhor insista em dizer que precisa primeiro se eleger para dizer o que vai fazer, o senhor na hipótese de ser eleito, em 2023 vai pegar um mundo completamente diferente daquele período de 2003 para frente, quando havia o boom das commodities. E agora nós estamos numa desordem econômica, e inclusive com uma inflação no mundo inteiro. O senhor também tem dito que para resolver o problema do ajuste fiscal, das contas públicas, as soluções para a pandemia, é imprimir dinheiro. E isso foi justamente o que os economistas do mundo inteiro têm apontado que foi o maior problema nesses dois anos da pandemia, a impressão de dinheiro, jogar dinheiro no mercado no mundo todo, e que gerou essa inflação, que está justamente impedindo muita gente de poder comprar a costelinha que o senhor acabou de citar aí. Como é que o senhor vai resolver esse mundo com um Brasil completamente diferente daqueles de 2003?
Luiz Inácio Lula da Silva:
Sérgio, deixa eu falar uma coisa para você, com o respeito que é peculiar na nossa relação. Veja, não diga que a gente vivia um boom de commodities porque boom de commodities nós vivemos hoje. O Brasil nunca exportou tanto como exportou a um dólar durante muito tempo a R$ 6,00. No meu tempo o dólar era R$ 2,60. Portanto, os empresários ganhavam muito menos. Não dá para ficar jogando a conta no nosso governo por causa do boom de commodities. Boom de commodities tem hoje. O que aconteceu no nosso governo é que nós colocamos o pobre no orçamento da União, é que nós criamos o Bolsa Família quando diziam que não podiam criar. É que nós resolvemos fazer universidade nesse Brasil quando dizia que não podia fazer, e eu proibi no meu governo discutir a Educação como se fosse gasto, Educação era investimento. E é por isso que eu passei para a história até hoje como o presidente que mais fez universidade, que mais fez escola técnica. Não apenas eu, o PT, porque a Dilma também fez muito. Então, o que nós fizemos foi fazer o Programa Luz para Todos que ninguém queria fazer, porque custou 20 bilhões de reais de investimento para levar energia na casa de 15 milhões de pessoas. Foram atendidos quase 4 milhões de famílias, de residências, e isso não será feito por uma empresa privatizada, nenhuma empresa privatizada vai ter dó que o pobre está cozinhando com fogão de lenha, ou que está trabalhando a luz de candeeiro não, somente uma empresa pública e o Estado é que tem coragem de tomar essa atitude. E nós fizemos, investimos 20 bilhões de reais para levar energia na casa de pessoas que viviam no século 18.
Nós fizemos coisas que não podíamos fazer. Ah, você não pode criar o Ministério da Pesca, você não pode criar o Ministério da Igualdade Racial, você não pode criticar o Ministério e vai abandonando Ministério e criando Agência Reguladora para dar o poder do Estado aos empresários. Ou seja, quando é que nós vamos ser uma nação independente de verdade e soberana? Quando é que a gente vai tomar conta do nosso nariz? Quando é que a gente vai poder garantir ao povo trabalhador desse país o direito de viver dignamente com o seu salário? Por que no meu governo o salário mínimo pode aumentar todo ano, e hoje o salário mínimo não pode aumentar? Por que a cesta básica no meu governo com o salário mínimo você podia comprar três cestas básicas e agora mal e porcamente dá para comprar uma?
A novidade não é o crescimento por causa do boom, a novidade é que nós colocamos o pobre no orçamento. E quando o pobre entrou no orçamento ele começou a consumir, mesmo que pouquinho, ele consumindo o comércio vendia, gerava emprego, o comércio vendendo encomendava da indústria que gerava mais emprego, que gerava mais um salário, nós colocamos a roda da economia para funcionar. Foi assim no Rio Grande do Sul. É por isso que nós criamos 1 milhão de empregos com carteira profissional assinada no Rio Grande do Sul. Não são apenas as commodities.
E depois é o seguinte, se tem uma coisa que eu aprendi a fazer foi fazer política externa. Nós passamos a ser protagonistas internacionais porque nós criamos a Unasul, porque nós criamos a CELAC aqui na América do Sul, porque nós mandamos a ALCA embora e fortalecemos o Mercosul. Eu vou dar um dado para você, quando eu cheguei na presidência a relação comercial entre Brasil e Argentina era de apenas 7 bilhões de dólares, quando eu deixei, era 39 bilhões de dólares. A relação com o Mercosul era pouco menos de 15, passou a ser 50. Ora, então nós tivemos uma relação com a China muito forte, com a Rússia, com a Índia, com os Estados Unidos, com a Europa, com a África, nós efetivamente acreditamos que o Brasil poderia ser protagonista internacional.
E foi o momento em que o Brasil ganhou mais respeitabilidade. É importante lembrar, Sérgio, que depois que eu cheguei na presidência nós fomos convidados para participar de todas as reuniões do G8, nós ajudamos a criar o G20, e nós tivemos então a participação de protagonismo internacional na política externa, nós criamos os BRICs, que era uma coisa extremamente importante. Nós não fizemos o acordo União Europeia e América do Sul porque a União Europeia não quer colocar a possibilidade do Brasil, Argentina e outros países exportar produtos manufaturados, produtos com mais valor agregados, ou seja, só quer que a gente exporte commodities, e a gente quer ter o direito de se reindustrializar. Você sabe que o Brasil já teve, 30% do PIB era industrial, hoje é apenas 11%. Como é que nós vamos aumentar a nossa capacidade social?
Guilherme Macalossi:
Só para a gente otimizar aqui os temas, presidente, são muitos assuntos, muitas perguntas e pouco tempo. Ainda sobre organização da economia, ontem à noite o senhor postou no Twitter que “o Brasil foi o único país do G20 que fez superávit primário durante todos os anos de governo do PT”. Só que entre 2014 e 2016, que foram os últimos três anos do PT no poder, o Brasil acumulou um déficit de quase 300 bilhões de reais, isso com a ex-presidente Dilma Rousseff pedindo ao Congresso Nacional, inclusive, a alteração na Lei Orçamentária para não incidir na Lei de Responsabilidade Fiscal. Por que a impressão que se passa é de que o PT parece querer que o Brasil esqueça três anos da sua administração, da administração do PT?
Luiz Inácio Lula da Silva:
Eu não quero que o Brasil esqueça, quem disse que eu quero que o Brasil esqueça? Eu quero que o Brasil lembre de que a Dilma foi vítima de um golpe, de uma armação. Porque é importante porque você lembrou o período que Eduardo Cunha virou presidente da Câmara. Em comparação do papel do Temer, presidente da Câmara no Fernando Henrique Cardoso, em 99, quando o Brasil tinha quebrado duas vezes, e o Temer entrou e passou a votar as coisas que o presidente da República Fernando Henrique Cardoso queria, e ajudou a recuperar um pouco a economia.
A Dilma, quando ela tentou fazer mudanças, inclusive na política de desoneração, ela mandava uma medida para desonerar um celular e Eduardo Cunha colocava não apenas a Telefônica, mas colocava 50 coisas a mais. Por isso é que nós chamávamos ele de ‘Homem Bomba’. Ou seja, na verdade nós tivemos um presidente da Câmara que trabalhava com o intuito de prejudicar o governo e não deixar. E aí quando o PMDB inventou a Ponte para o Futuro, nós estamos vendo qual é o futuro que nós fomos metidos. E aí era tudo para evitar que a Dilma governasse, era tudo para evitar que desse certo o governo.
Guilherme Macalossi:
Mas o senhor tem mantido conversas com o MDB, inclusive com lideranças como Renan Calheiros e Elnício Oliveira, que participaram disso.
Luiz Inácio Lula da Silva:
Olha, vocês precisam aprender a ter respeito pela presidenta Dilma, porque poucas vezes na história desse país a gente teve uma mulher da qualidade dela. A Dilma chegou em 1º de dezembro de 2014 com 4.3% de desemprego, o menor desemprego da história do Brasil, era padrão Finlândia, padrão Noruega, padrão Suécia. E ela tinha feito desoneração exatamente para não deixar de fazer políticas públicas e não deixar de garantir o crescimento do emprego. Quando ela tentou fazer a reversão ,o Congresso Nacional não apontou.
Ora, obviamente que eu não faço política parado no tempo e no espaço, eu faço política vivendo o momento que eu estou vivendo. Eu agora estou conversando com muita gente que participou do golpe com a Dilma, porque se eu não conversar não faz política, se eu não conversar você não avança na relação política com o Congresso Nacional, você com os partidos políticos. E eu estou fazendo uma campanha que não é do PT, é uma campanha que é do PT, que é do PCdoB, que é do PSOL, que é do PSB, que é do Solidariedade, que é da Rede, são sete partidos que fazem parte da campanha porque eu disse para a presidenta Gleisi: eu não quero ser presidente do PT, eu quero ser presidente de um movimento pelo restabelecimento da democracia nesse país e para que a gente possa colocar dentro do coração de cada um de nós uma coisa chamada indignação, com a miséria, com a pobreza, e com o desalento que está caindo hoje nesse país.
Então veja, eu aprendi com o doutor Ulisses Guimarães na campanha de 89, ele dizia: Lula, economia a gente não fala muito antes de chegar ao governo, se a gente falar a gente nem ganha e nem faz. Então, é o seguinte, eu tenho para o povo brasileiro um legado, o legado mais auspicioso de sucesso na economia, um legado mais auspicioso. Foi o período que o Brasil mais cresceu nos últimos 40 anos, a maior política da inclusão social da história do país, o maior número de estudantes nas universidades, o maior número de empregos. É importante lembrar que quando o mundo rico estava desempregando 100 milhões de pessoas por conta da crise de 2008, o Brasil estava empregando 20 milhões de pessoas com carteira profissional assinada.
É esse legado que eu quero defender na campanha. Eu não preciso ficar fazendo promessas, eu só tenho que mostrar o que nós já fizemos, e tenho que mostrar que quando eu ganhar as eleições eu vou restabelecer a relação respeitosa que o Brasil tinha com o mundo. E você sabe que é uma relação forte. A minha relação com o mundo é muito forte, é por isso que eu fui recebido na Alemanha pelo novo chanceler, é por isso que eu fui recebido pelo Macron, é por isso que eu fui recebido pelo López Obrador, é por isso que eu fui recebido pelo Aníbal Fernando, enquanto o nosso presidente não é recebido por ninguém porque ninguém quer conversar com ele, só o pessoal de extrema direita, os fascistas que estão pelo mundo.
Sérgio Stock:
Ex-presidente Lula, nós temos muitos problemas no Brasil e isso entra governo e sai governo, inclusive nos governos do PT não houve solução para problemas graves como favelas, criminalidade, problemas muito sérios que o país enfrenta, independente de quem esteja no governo. E ultimamente a gente tem presenciado fatos muito tristes, muito lamentáveis que ocorrem no Brasil infelizmente. E eu gostaria de saber a sua opinião, como o senhor viu a ação da polícia na operação da Vila Cruzeiro, no Rio de Janeiro, que enfrentou bandidos fortemente armados, inclusive com fuzis e granadas, qual é a sua opinião sobre esse fato?
Luiz Inácio Lula da Silva:
Olha, antes de falar da Vila Cruzeiro, deixa eu lhe falar uma coisa. É o seguinte, nós não fizemos tudo o que era possível fazer, mas nós fizemos o maior programa habitacional que esse país já conheceu. Foram 4 milhões de casas contratadas, inclusive casas para as pessoas que não podiam pagar, a gente subsidiava as casas. Foi feito o maior programa habitacional da história desse país, e com a construção, e com o anúncio do PAC, a gente acordava com as empresas que todos os trabalhadores a serem contratados deveriam ser do local que a obra estava sendo realizada. Eu não sei se você viu uma entrevista antiga na Revista Isto É, um líder de uma quadrilha no Rio de Janeiro, um tal de Nem, ele disse que quem mais acabou com a quadrilha dele foi o PAC, porque o PAC tirou muitos bandidos que estavam com ele para ir trabalhar.
É por isso que eu digo que o problema do Brasil é a ausência do Estado. A gente pensa que a polícia resolve o problema, a polícia quando ela vai ela já vai para atirar, ela não vai para resolver. O problema deveria ser resolvido antes, se não tivesse a ausência do Estado na Educação, na Saúde, na Cultura, no lazer, no saneamento básico, nas áreas de recreação, se o Estado estivesse presente nessas áreas a polícia seria apenas mais um componente para manter a tranquilidade. Acontece que as pessoas ficam ilhadas, ficam separadas, ficam abandonadas e o Estado só aparece quando é para matar alguém, através da polícia. Eu te confesso que não dá para a gente dizer que é a instituição, a gente tem que dizer que alguns policiais recebem orientação dos seus comandantes de forma equivocada.
Porque em nome de matar bandido se mata inocente. Você viu o que foi feito com o rapaz, o Genivaldo, em Sergipe. Ou seja, aquilo é comportamento da polícia? Três homens para enfrentar uma pessoa com problema de distúrbios mentais, fazer aquela violência? É falta de informação, é falta de atuação, é falta de inteligência, é falta de preparação. Então, o que eu acho é o seguinte, a violência policial ela só é justificada pela ausência do Estado. Se o Estado chegasse antes com política social, com emprego, com Educação, com Saúde, com saneamento, com cultura, com área de lazer, com asfalto, com iluminação, certamente a polícia seria mais um ingrediente de política social e não a única solução como se tenta estabelecer. Eu acho abominável esse genocídio que acontece no Brasil. Acho abominável. Nesse dia morreu mais gente pela polícia do Rio de Janeiro do que na Guerra da Ucrânia.
Sérgio Stock:
Agora, a polícia no morro ou na Vila Cruzeiro, no Rio de Janeiro, é o Estado chegando lá também só que de outra forma, não é. Como é que o senhor viu essa ação especificamente?
Luiz Inácio Lula da Silva:
O Estado já chega para praticar a violência, o Estado não chegou para recuperar aquele povo. O Estado deveria ter chegado antes com as coisas que eu te falei, com Educação, com Saúde, com Cultura, com lazer, com recreação, com saneamento básico, ou seja, com qualidade de vida e com oportunidade de emprego para as pessoas, aí seria menos necessária a polícia. A polícia só entra abruptamente porque não existe a figura do Estado social. E é esse Estado social que nós vamos fortalecer.
Guilherme Macalossi:
Presidente, o senhor falou aqui antes que dialogava com vários líderes políticos, inclusive mencionou aqueles que participaram do que o senhor chama de golpe contra a Dilma Rousseff. Um dos apoiadores do impeachment de Dilma Rousseff foi o seu vice Geraldo Alckmin. Como é que está a discussão dele em relação aquele momento histórico?
Luiz Inácio Lula da Silva:
Não, não fale isso que não é verdade.
Guilherme Macalossi:
Geraldo Alckmin era contra o impeachment de Dilma?
Luiz Inácio Lula da Silva:
O Geraldo Alckmin não só era contra como ele pediu um parecer de um advogado que deu um parecer contra o impeachment. Não, não, não, por favor, não fale isso porque o Alckmin é um homem de bem, e é um companheiro que vai me ajudar de forma extraordinária a consertar esse país. Aliás, ele vai estar comigo em Porto Alegre amanhã. Seria importante se você pudesse ir lá, até para poder conhecê-lo pessoalmente. Ele é uma pessoa altamente qualificada, e que eu tenho certeza que vai me ajudar muito, muito, muito a recuperar esse país para o povo brasileiro voltar a ser feliz, a ser alegre, para que o povo gaúcho volte a cantar, para que o povo gaúcho volte a falar, volte a festejar, volte a sorrir, volte a ter emprego.
Você não sabe a tristeza que eu tive quando eu fui a Rio Grande e vi aquele estaleiro sendo fechado, vendo o pessoal, milhares de metalúrgicos desempregados sem nenhuma expectativa de vida, o Brasil que poderia ser competitivo com a China, com a Coreia, com Cingapura na indústria naval. Nós saímos de 3 mil trabalhadores para 86 mil trabalhadores, ou seja, agora destruíram, nós estamos com 20 e poucos mil trabalhadores e a tendência é acabar. Então, eu quero com o Alckmin reconstruir esse país, voltar a investir em Educação, voltar a valorizar a Educação porque não existe país do mundo que dê um salto de qualidade se não houver Educação.
Sérgio Stock:
Presidente, não houve um erro estratégico na constituição, na formação, no conceito do estaleiro de Rio Grande ao ter apenas um cliente, que era a Petrobras, e aí com tudo o que a Petrobras viveu nos últimos anos, corte de investimentos, então acabou prejudicando justamente o estaleiro que hoje, como o senhor disse, está muito abaixo daquilo que se esperava?
Luiz Inácio Lula da Silva:
Não, não foi falta de dinheiro na Petrobras, foi falta de decência na direção da Petrobras. Porque só a Petrobras, na minha cabeça o Brasil deveria ser uma indústria naval para atender aos interesses da América Latina, porque o Brasil é o maior país, porque o Brasil tem a indústria mais forte, porque o Brasil tem mais população, porque o Brasil tem mais costa marítima, então a minha ideia era que a indústria naval brasileira pudesse ser uma indústria naval compartilhada com outros países. Lamentavelmente, na medida que a Petrobras deixa de fazer investimento, obviamente que deixa de haver os pedidos.
A Petrobras era a garantia de que a gente ia ter obra para fazer. Da mesma forma que quando nós fomos fazer os helicópteros na Helibrás a gente teve que assumir o compromisso de que eles iriam produzir uma certa quantidade e as Forças Armadas iriam comprar, porque senão não teria comprador. Então meu caro é o seguinte, você precisa se lembrar de uma coisa, dezembro de 2010, esse cidadão que vos fala fez a maior capitalização da história do capitalismo mundial em São Paulo na Bolsa de Valores. Quando nós colocamos 70 bilhões de reais para capitalizar a Petrobras, para que ela se transformasse na segunda empresa de energia do mundo. Do mundo.
Agora, desde que nós descobrimos o pré-sal que tem muita gente que não quer que a gente dê certo. Quando a gente fez a Lei da Partilha, tinha muita gente que não queria. Quando a gente criou dizendo que era o passaporte para o futuro, quando a gente criou o fundo social, quando a gente criou, fizemos a lei que 75% do royalties iriam para a Educação, Ciência e Tecnologia e Saúde, muita gente não queria, infernizaram a vida, até fazer o impeachment da Dilma, para poder destruir a Petrobras, para poder destruir a BR. Vocês estão vendo o discurso de que: não, vamos vender a BR porque vai ter mais empresa, vai ter mais competitividade, vai ser mais barato. Agora nós temos quase 400 empresas importando gasolina dos Estados Unidos. E pagamos o preço que estamos pagando.
Mas nós vamos melhorar isso. Eu tenho fé em Deus que depois que eu ganhar as eleições vocês me convidem para um debate ao vivo que eu vou aí em Porto Alegre. E depois nós vamos assumir compromissos econômicos para vocês me cobrarem no final do meu mandato, porque eu tenho quatro anos para fazer mais do que eu fiz em oito. Então se prepare que eu vou trabalhar muito mais, se prepare que vocês vão ver um vulcão governando esse país, em erupção, para fazer esse país dar certo. Nós não temos tempo a perder. Não vou ficar procurando briguinha com fulano de tal, não vou ficar vasculhando a vida de ninguém, eu quero abraçar esse povo e dizer vamos para frente, porque o Brasil efetivamente merece voltar a ser feliz.
Guilherme Macalossi:
Presidente, uma questão que eu acho que é importante, o senhor fala bastante sobre a economia. O senhor, digamos, centraliza a digamos a agenda econômica, apesar de não ser específico em relação ao que pretende fazer. A Gleisi Hoffmann, deputada que é uma liderança importante dentro do PT, recentemente disse que o PT mantinha conversas inclusive com o Pérsio Arida e outros nomes ligados ao Plano Real. Eles depois disseram que não tinham, não tinham falado com lideranças do PT, basicamente desmentiram Gleisi Hoffmann. Eu lhe pergunto, quem hoje é, digamos, o pensador econômico que dará composição ao seu plano de governo? Quem é o interlocutor econômico do PT hoje? Quem é a referência do partido na construção de propostas? Tem alguém com quem o mercado eventualmente possa dialogar? Eu falo mercado aqui não apenas os agentes da Bolsa de Valores, eu me refiro a toda a cidadania que participa do mercado.
Luiz Inácio Lula da Silva:
Não, mas o mercado precisa conversar com o candidato a presidente, e a hora que eu tiver interesse eu vou conversar com o mercado. Eu não vou ficar indicando economista, eu tenho 90 economistas participando do grupo de trabalho, tem gente do mercado. Eu não vou queimar um ou outro economista. Veja, o Pérsio Arida foi indicado pelo companheiro Alckmin para conversar com a Fundação Perseu Abramo sobre o programa de governo. E ele foi conversar, e eu acho que é razoável que se converse. É razoável que se converse, nós não somos donos da verdade e nós queremos conversar com todo mundo.
O programa de governo não pode ser do PT, o programa do governo tem que ser desses sete partidos que estão conosco e mais a sociedade. Eu estou pensando inclusive, presta atenção numa coisa que eu vou dizer para vocês, que eu não sei se eu vou conseguir colocar em prática, eu estou tentando encontrar um jeito de fazer um orçamento participativo para acabar com o orçamento secreto. Eu estou querendo ver como é que eu vou criar mecanismos para que o povo brasileiro possa, quem sabe agora através da internet, participar da execução do orçamento.
Quando a gente chegar no Congresso Nacional com a proposta do orçamento não será mais o orçamento do Ministério da Fazenda ou do Planejamento, será um projeto de orçamento com a participação da sociedade, para que os gaúchos participem como participaram quando nós governávamos o estado e a cidade, o povo dizer o que quer e como quer, e para que quer. Qual é a obra prioritária? Em que estado ela deve ser feita? Nós vamos ter que evoluir, porque não dá para o presidente ficar refém do Congresso Nacional como está o Bolsonaro. Hoje o Lira controla uma parte do orçamento, o Ciro Nogueira controla outro, e o que que faz o presidente? Fake news. Fake news, fake news, contando sete ou oito mentiras por dia.
Nós precisamos trabalhar. Então, essas coisas vão ser muito transparentes, e eu acho que nós vamos, nós vamos tratar disso com muito carinho. Por isso é o seguinte, eu não quero, eu lembro em 85 quando o Fernando Henrique Cardoso sentou na cadeira do Jânio Quadros e perdeu as eleições. Eu não quero sentar na cadeira de ninguém, eu quero primeiro tratar de ganhar as eleições, quero viajar muito o Brasil, quero conversar muito com o povo, depois se ganhar nós vamos começar a dizer o que é que vai acontecer nesse país. Tem duas coisas que eu acredito, primeiro, um governo tem que ter muita credibilidade quando ele abrir a boca, as pessoas têm que acreditar naquilo que ele falou, e tem que ter muita previsibilidade, ninguém será pego de calça curta no meu governo.
Os empresários sabem disso, os banqueiros sabem disso, o agronegócio sabe disso, todo mundo sabe disso, o pequeno produtor sabe disso, o pequeno e médio comerciante sabe disso. Ora, quem é que criou a lei, a lei para fortalecer a Lei Geral da Pequena e Média Empresa no Brasil? Quem criou o SIMPLES no Brasil? Quem é que legalizou mais de 6 milhões de pequenas empresas nesse país? Ora, então essas coisas vão ser ditas com todos. Eu queria que vocês até perguntassem, vocês devem ter amigos aí, perguntar para o agronegócio o que o Bolsonaro fez para o agronegócio? O que o Bolsonaro está ajudando o povo do Rio Grande do Sul que está por conta da seca, o que ele está fazendo?
E eu vou dizer uma coisa para vocês, a última grande medida feita pelo agronegócio foi a Medida Provisória 352/2008, quando eu discutia securitização de uma dívida de 89 bilhões de reais. Esses tratores modernos que você vê na propaganda do agro esses tratores eram vendidos no meu governo a 2% de juros ao ano, hoje eles pagam 14% ou até 18%. Então, o que o Bolsonaro fez? Prometeu arma. Arma para quê? Para matar quem? Para atirar em quem? Então, meu caro, é o seguinte, esse país vai voltar a ser civilizado, a paz vai ocupar o lugar do ódio, a verdade vai ocupar o lugar da mentira e a democracia vai ocupar o lugar do fascismo. É esse país que nós vamos recuperar, e é nesse país que eu acredito que a gente vai voltar a ser protagonista internacional.
Sérgio Stock:
Nessa agenda que o senhor cita para chegar às eleições e tentar ser eleito presidente inclui Porto Alegre amanhã. A sua vinda aqui para Porto Alegre amanhã para um ato político no Pepsi on Stage, que é um complexo cultural ao lado do aeroporto Salgado Filho, e também uma série de reuniões. Com quem o senhor vai se reunir amanhã e o que o senhor traz para essas pessoas, seus interlocutores aqui?
Luiz Inácio Lula da Silva:
Olha, primeiro obrigado pela pergunta, querido. Eu vou ter uma agenda, primeiro eu vou encontrar com o nosso companheiro Paulo Pimenta, presidente do partido, o Edegar Pretto, o nosso pré-candidato, vou encontrar com o meu companheiro Olívio Dutra, que ficou viúvo há dez dias atrás porque morreu a sua companheira Judite, vou encontrar com o Tarso Genro, vou encontrar com a bancada do PT estadual, com o senador Paim, com os deputados estaduais, com os deputados de outros partidos políticos, com os pré-candidatos.
Depois eu vou fazer uma reunião sobre cooperativa, vou fazer uma reunião sobre Educação, e vou fazer um ato público no ginásio sobre soberania. Algumas reuniões serão no hotel e o ato público final será no ginásio. Ou seja, para tentar discutir a questão da soberania nacional. Esse país é por demais grande, é por demais importante, a América do Sul depende do comportamento do Brasil. Então, o Brasil precisa ser um país soberano, o Brasil tem que manter boas relações com os Estados Unidos, boas relações com a China, para não ser subordinado.
Nós temos que discutir a questão climática aí amanhã, eu quero discutir esse assunto porque hoje você não discutirá novos investimentos e nova política de desenvolvimento se você não colocar a questão climática na hora do dia. A qualidade de vida, a qualidade da água, a qualidade do ar, o respeito a fauna, a floresta, ou seja, e aí entra a questão da Amazônia, que nós somos soberanos, donos da Amazônia, mas nós precisamos compartilhar as pesquisas na Amazônia, para que a gente possa fazer da riqueza da biodiversidade da Amazônia uma forma de gerar emprego para que milhões de brasileiros e milhões de seres humanos possam viver melhor. Então, eu quero dizer para vocês que é uma alegria imensa depois de algum tempo voltar à minha querida cidade de Porto Alegre.
Sérgio Stock:
Ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, pré-candidato do PT à presidência da República nas eleições de 2022. Muito obrigado pela sua entrevista. Aqui é o Jornal Gente, da Rádio Bandeirantes Porto Alegre. Eu e o Guilherme Macalossi agradecemos o seu tempo, a sua disponibilidade em responder às nossas perguntas, que certamente são perguntas da população também. Um bom dia, um bom trabalho ao senhor.
Luiz Inácio Lula da Silva:
Obrigado Sérgio, e até a próxima oportunidade se Deus quiser. E até amanhã. Se quiser participar do ato como cidadão comum é só ir lá e procurar o Stuckert que eu vou lhe dar um abraço.
Sérgio Stock:
Está certo, muito obrigado presidente, um bom dia ao senhor.
Guilherme Macalossi:
Obrigado presidente, um abraço.