Juristas são categóricos ao afirmar: impedir a candidatura de Lula é inconstitucional. As análises convergem na afirmativa de que Lula pode ser, sim, candidato à presidência da República, sustentadas pelo que diz nossa Constituição e arcabouço de leis.
Entenda por que Lula é e pode ser candidato:
A Constituição Federal estabelece a filiação partidária como condição de elegibilidade. Como o PT é um partido político legalmente constituído, ele pode pleitear o registro da candidatura de Lula, seu filiado.
E, mais do que isso: de acordo com o princípio da igualdade de condições na disputa – regra basilar do Direito Eleitoral – se o PT pode concorrer, ele deve ter os mesmos direitos dos demais partidos, como a participação em atos de pré-campanha e campanha, inclusive debates e entrevistas.
A Lei Complementar 135/2010, conhecida como Lei da Ficha Limpa, não impede o registro da candidatura em casos como de Lula. Durante o período eleitoral, ele tem sua inelegibilidade suspensa.
Por que é assim? Porque, no decorrer da campanha, um candidato que tenha sido condenado em segunda instância ainda pode ter revista sua inelegibilidade por uma instância superior. Tanto é assim que a própria lei alterada pela Ficha Limpa dá as regras de como um candidato nestas condições deve agir para, ao longo da campanha, reverter a condição adversa. Está no Artigo 26-C da referida norma.
É certo que a Defesa de Lula recorrerá às instâncias superiores contra a condenação do ex-presidente por supostamente ser dono de um triplex do qual jamais teve as chaves, em um processo sem provas. Assim, não se pode permitir que a condenação em segunda instância possa inabilitá-lo automaticamente.
À luz da legislação, especialistas em direito eleitoral apontam que Lula, pode, sim, ser candidato a presidente. Caso alguém não concorde e peça sua impugnação na Justiça eleitoral, o pedido pode levar de 20 a 25 dias para ser analisado. “Enquanto isso está acontecendo, o candidato continua fazendo campanha”, afirma Lara Ferreira, professora de Direito Constitucional na faculdade Dom Helder Câmara e servidora do Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais, em entrevista à rede inglesa BBC de comunicação.
Já o ex-ministro da Justiça Eugênio Aragão destaca exatamente o Artigo 26-C da Lei de Inelegibilidade, citado acima. “A Lei deixa bem claro que alguém com condenação em segunda instância pode ser elegível se houver recurso desta decisão. Então tudo vai depender muito de como o recurso especial por parte da defesa ao Superior Tribunal de Justiça vai ser recebido”, explica o jurista, em entrevista ao jornalista Juca Kfouri.
Também o jurista Luiz Fernando Casagrande Pereira, aponta: “Para reverter uma decisão colegiada do TRF-4, bastará a concessão de uma liminar pelo STJ ou pelo STF (alternativas não excludentes), com fundamento no art. 26-C da Lei 64/90. Se esta liminar ficar vigente até a diplomação, é o que basta para Lula garantir diplomação e depois a posse, em caráter permanente.”
O especialista em Direito Eleitoral e sócio do Ulisses Sousa Advogados, Ulisses Sousa, responde a consulta sobre o tema feita pelo jornal O Estado de S.Paulo: “Caberá à Justiça Eleitoral, e não ao TRF-4, decidir pelo deferimento ou indeferimento do pedido de registro da candidatura. Ao interpor recurso contra a decisão do TRF-4, Lula postula ao Superior Tribunal de Justiça e ao Supremo que seja suspensa a inelegibilidade e, por consequência, assegurado o direito de concorrer nas próximas eleições.”
Finalmente, para Sílvio Salata, presidente da comissão de direito eleitoral da OAB-SP, mesmo preso Lula pode pedir o registro e organizar a campanha. “Ele tem a seu favor a cláusula pétrea da presunção de inocência, ainda a ser avaliada no STF”, explica.
Nas últimas eleições realizadas no Brasil, em 2016, nada menos do que 145 candidatos a prefeito não só concorreram como venceram a disputa estando na mesma condição de Lula, tendo contra si uma condenação de segunda instância. Nenhum deles foi impedido de concorrer, todos tiveram o direito de disputar e muitos foram empossados no cargo enquanto seguiam com seus processos judiciais nos tribunais superiores.
Neste contexto sobre a elegibilidade de Lula, ganha relevância a decisão do Comitê Internacional de Direitos Humanos da ONU que mencionou o artigo 25, “b”, do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, que estabelece “o direito a qualquer cidadão de votar e de ser eleito em eleições periódicas, autênticas, realizadas por sufrágio universal e igualitário e por voto secreto, que garantam a manifestação da vontade dos eleitores”.
Como lembram os especialistas em Direito Eleitoral Stella Bruna Santo e Gabriel Borges, essa decisão já foi comunicada ao Estado brasileiro, que por ser signatário está obrigado a assegurar tais garantias a Lula. “Trata-se, pois, de matéria passível de análise pelo TSE, eis que se refere ao exercício dos direitos políticos, requisitos e condições de elegibilidade, questão, pois, de conteúdo constitucional”, relatam em artigo publicado no site jurídico Conjur.
No último dia 18 de julho, a vice-presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministra Rosa Weber, rejeitou o pedido para que a Corte declarasse a inelegibilidade de Lula antes do registro da candidatura dele na Corte.
Na decisão, a ministra afirma que o ‘Direito tem seu tempo, institutos, ritos e formas’. “A possibilidade de arguição preventiva e apriorística de inelegibilidade do requerido [Lula], ainda sequer escolhido em convenção partidária, e cujo registro de candidatura presidencial nem mesmo constituiu objeto de pedido deduzido por agremiação partidária […] em absoluto encontra ampara no ordenamento jurídico pátrio”, escreveu Rosa. Reportagem do jornal Folha de S. Paulo, cita frase de Rosa Weber: “Não se pode impedir a candidatura sem seguir o rito da lei”.
Lula tem direito a ser candidato e, agora, tudo depende somente que a Justiça Eleitoral siga os preceitos constitucionais e sua vocação de imparcialidade, levando sempre em consideração a preservação tanto dos direitos políticos do candidato e quanto da soberania popular.
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