“Você encontrará nestas páginas alguns velhos amigos, intelectuais e artistas, parceiros de caminhada, lideranças e admiradores. Encontrará, também, se tudo der certo, mensagens enviadas por pessoas que não gostam do PT, que são ou já foram seus adversários, e que exatamente por isso teriam muito a contribuir para a construção do futuro, dialogando sobre temas relevantes com um interlocutor da sua estatura. O único requisito é escrever com civilidade. Sem perder a ternura.”
Assim se apresenta o site Cartas para Lula em sua página no Facebook. Criado em 7 de abril último, data que marcou um ano da prisão política do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, traz cartas de personalidades das mais diversas áreas, como a cantora e compositora Ana Cañas, a filósofa Marilena Chaui, o jornalista Ricardo Kotscho, a cineasta Anna Muylaert e o escritor Mia Couto.
Muitos podem ser considerados “petistas de carteirinha”, companheiros que dividiram com Lula dias de luta e o sucesso de um governo reconhecido mundialmente pela sua capacidade de transformar o Brasil de um país com 40 milhões de miseráveis, em uma nação que chegou a pleitar a posição de quinta economia do mundo.
Outros sequer conheceram o ex-presidente pessoalmente. A estilista Luciana Benetti relata em sua carta que conhece Lula pelos relatos dos que conviveram com ele e dividiram os momentos de plenitude e de dor. “E sabe o que é mais curioso, presidente? Os relatos são unânimes no que se refere à sua empatia, à sua capacidade de se colocar no lugar do outro e de compreender o que este está sentindo.”
Luciana escreveu ao ex-presidente no dia 9 de abril, mesmo dia em que a professora Zilda Iokoi manifestou em carta sua preocupação: “Estou muito aflita conosco, pois acho que ficamos muito cordeirinhos quando te prenderam e, agora, com esse lindo mas ineficaz ‘bom dia e boa noite Presidente Lula’. Está na hora de exigirmos sua libertação com um pouco mais de energia contra esse Supremo que perdeu a dignidade e hoje se comporta contra as leis e a verdade”.
Aflição também foi o que relatou o sociólogo Boaventura de Sousa Santos, professor da Universidade de Coimbra, em Portugal. Em sua carta, ele relata o dia em que foi visitar Lula, no prédio da Superintendência da Polícia Federal, em Curitiba. “Quando o visitei na prisão em 30 de agosto de 2018, vivi no pouco tempo que durou a visita um turbilhão de ideias e emoções que continuam hoje tão vivas quanto naquele dia.”
Boaventura lembra de ser acompanhado por um jovem policial federal que no caminho declara: ‘lemos muito os seus livros’. “Fico frio por dentro. Estarrecido. Se os meus livros fossem lidos e a mensagem entendida, nem Lula nem eu estaríamos ali.”
Conta ter balbuciado algo nesse sentido e ter recebido como resposta: ‘cumprimos ordens’. “O intelectual sumia dentro de mim. As minhas ideias e teorias reduzidas a desabafos de má consciência…”
Foi nesse estado de espírito que Boaventura chegou até Lula que “certamente nem suspeitou do turbilhão que ia dentro de mim”. E relata: “ao vê-lo, acalmei-me. Estava finalmente na frente da dignidade em pessoa, e senti que a humanidade ainda não tinha desistido de ser aquilo a que o comum dos mortais aspira”.
Esse Lula, que não troca sua dignidade nem pela sua liberdade, conforme já declarou o ex-presidente, faz falta para o amigo e ex-assessor de imprensa, Ricardo Kotscho.
“Em momentos difíceis, nas campanhas e no governo, era sempre você quem procurava animar a tropa, acalmar os afobados, apontar caminhos para superar as crises. Os nossos amigos comuns que conseguiram te visitar, todos eles, como o Frei Betto, me relatam que saem da tua cela mais fortalecidos, dispostos a lutar e vencer os obstáculos do que quando chegaram.”
As cartas para Lula já chegam a mais de 35 mil enviadas ao longo de um ano, desde a prisão do ex-presidente. O novo site é um espaço destinado à publicação dessas cartas ao ex-presidente. “Um território de afeto e memórias, mas também de críticas e diálogos”. Quer publicar? Mande sua carta para [email protected].