Da ONU Brasil
A cubana Yamila Cuevas Machado chegou ao Brasil em 2013 para trabalhar no Programa Mais Médicos. Alocada no município de Alagoinha, a 225km de Recife, a doutora ficou um ano no posto de saúde da cidade.
Quando voltou de férias, pediu à Secretaria de Saúde do município para trabalhar na zona rural, atendendo a população três comunidades remanescentes de quilombos — Alverne, Laje do Carrapicho e Bom Sucesso.
“Isso aqui era uma fazenda de reprodução humana”, conta Maria Cristina da Silva, quilombola moradora de Alverne. “Eles faziam os escravos procriarem para vender. Minha tataravó chegou até aqui em um navio vindo da África, com um filho nos braços. Ela conseguiu fugir e veio andando, de Recife até aqui, e foi uma das fundadoras desse quilombo. Até hoje, Alverne é conhecida como ‘a Serra dos Negros’”, lembra.
Quilombolas são descendentes de africanos escravizados que mantiveram tradições culturais, religiosas e de subsistência ao longo dos séculos.
Há pouco mais de um ano, a Fundação Cultural Palmares, instituição pública do governo federal do Brasil que é voltada para promoção e preservação da arte e da cultura afro-brasileiras, reconheceu oficialmente os três povoados como comunidades quilombolas. Na região moram aproximadamente 400 famílias.
“Hoje, com a chegada dos nossos queridos cubanos, nós temos médicos todos os dias no nosso Programa de Saúde da Família, com atendimento bem humanizado e também com preocupação com a família. Esse reconhecimento traz mais possibilidades de que eles consigam apoios, programas e políticas públicas”, afirma a chefe da pasta municipal da Saúde de Alagoinha, Vera Neide Galindo.
“E a outra vitória importante que tivemos neste período foi a adesão ao Programa Mais Médicos, que aconteceu em 2013. Isso melhorou muito a vida das pessoas. Hoje, já podemos ver o resultado do programa: conseguimos desafogar muito a unidade de saúde e diminuiu bastante o número de casos de urgência e emergência no nosso município”, acrescenta o prefeito Maurílio de Almeida Silva.
“Nós tínhamos médicos no PSF (Programa de Saúde da Família) por apenas dois dias, nos quais atendiam, em média, 30 pessoas e demoravam, eu acredito, um minuto com cada paciente. E hoje, com a chegada dos nossos queridos cubanos, nós temos médicos todos os dias no nosso PSF, com atendimento bem humanizado e também com preocupação com a família”, conta o agente comunitário de saúde, Vagner Pontes de Jesus.
Aos 23 anos, Jadyson de Almeida trabalha na Secretaria de Saúde de Alagoinha e acompanha Yamila com frequência na rotina de trabalho. O jovem costumava jogar bola, mas sentia falta de ar e tinha a pressão sempre muito baixa. Ele falou sobre a sua situação com a cubana e pediu que ela o examinasse.
“Quando fiz a ausculta nele, na hora desconfiei que havia algo no coração e pedi que fosse encaminhado a um cardiologista. A mãe dele custou a acreditar em mim, mas eu insisti que era urgente”, lembra a médica. Poucos meses depois, Jadyson fazia uma cirurgia cardíaca de peito aberto para a substituição de uma válvula defeituosa. “Ela salvou a minha vida”, afirma o rapaz que, hoje, apesar de não jogar mais futebol, leva uma vida normal.
O vínculo que Yamila Cuevas construiu com a comunidade quilombola ultrapassou a conexão médico-paciente tradicional e se transformou numa relação de amizade e gratidão — sentimentos que ficam evidentes na forma como Maria Darci, de 65 anos, fala sobre a cubana.
“Eles acham que para eles foi bom, mas para mim foi muito melhor. Porque o que eu dou é o que eu aprendi: dar amor, dar atenção, dar saúde. Eu nunca tinha ido a um médico assim não, que acompanha você. Eu venho aqui e conto todos os meus problemas para ela, coisas que a minha família mesmo não sabe. Quando saio daqui, saio mais leve, mais feliz. Eu a chamo de mãe, apesar de ter idade para ser avó dela”, diz.
Já Maria José da Silva Barros, de 38 anos, conta que desde pequeno seu filho vivia doente, mas ela não sabia o que era. Em um dia em que a criança se sentia muito mal, ela foi até a unidade de Bom Sucesso, onde encontrou Yamila. A médica diagnosticou uma forte crise de asma, deu um remédio para o garoto e, como viu que o quadro se agravava, ligou do seu celular para o SAMU e ficou com o menino nos braços enquanto a ajuda não chegava.
“Eu acho que se não fosse ela aquele dia, o meu filho tinha morrido. Ela até hoje o chama de ‘o meu menino’. Ela é muito carinhosa. Eu nunca fui tão bem atendida por uma pessoa como fui por ela. Eu falo com ela até pelo WhastApp”, sorri, orgulhosa.
Yamila recebe diariamente o reconhecimento da comunidade. Mas acredita que recebe muito mais do que oferece. “Eles acham que para eles foi bom, mas para mim foi muito melhor. Porque o que eu dou é o que eu aprendi: dar amor, dar atenção, dar saúde. Mas eles estão me dando muito mais do que isso. Para mim, família é o que nasce do coração e isso foi o que eu encontrei neles.”
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