Em seu discurso durante encontro com integrantes do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) no assentamento Eli Vive, em Londrina (PR), na tarde deste sábado (19), o ex-presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, reforçou que o combate à fome é uma de suas maiores preocupações. Para ele, ficar sem comer é um mal comparável a uma doença para os seres humanos.
“Paulo Freire dizia que toda criança que come fica inteligente, porque se a criança não come, ela não tem sequer a capacidade de desenvolver sua inteligência. E toda pessoa que come fica bonita, a pessoa que não come não pode ficar bonita porque a fome é feia e a gente não pode se acostumar com a fome. A fome é uma doença que não dói aos olhos de quem não a sente. Se você estiver conversando com uma pessoa e ela estiver com fome, você não sabe. Às vezes a fome parece invisível aos olhos de quem não sente. É uma das coisas mais bárbaras que a humanidade deixou acontecer com ela. E a fome é mais grave porque a gente tem capacidade de produzir alimento para todos os seres humanos e mesmo assim ainda tem 900 milhões de seres humanos que vão dormir todo dia sem comer”, lembrou o ex-presidente.
As frases do educador Paulo Freire, um dos fundadores do PT, completaram o discurso da ativista e apresentadora Bela Gil, que falou sobre o assunto no início do evento, defendendo a agricultura familiar livre de pesticidas e uma política mais abrangente de reforma agrária.
“A comida é uma ferramenta muito poderosa de transformação, de transformação política, econômica, social, ambiental, cultural, nutricional. Comer é um ato político, a gente faz política com a comida, pro bem ou pro mal. É importante que todos e todas tenham a oportunidade de escolher o que comer, a oportunidade de escolher não colocar veneno no prato, de escolher uma alimentação mais saudável. Acho fundamental a gente pensar no combate à fome e que todas as pessoas tenham acesso à alimentação saudável. Para isso temos que pensar na reforma agrária”, disse ela.
Para o ex-presidente Lula, as experiências que adquiriu nas diversas fases da vida, desde a infância no agreste pernambucano e após a mudança para São Paulo, onde viveu em bairros periféricos e sem estrutura, lhe dão uma visão mais aprofundada dos problemas do Brasil que a maioria dos outros possíveis candidatos à presidência.
“Tenho consciência que tem gente mais letrada do que eu, tem gente que já leu mais livros do que eu. Tem gente que aprende a falar inglês e francês com facilidade, eu mal e porcamente sei falar português. Agora não tem nenhum dos concorrentes que entenda 10% da alma do povo brasileiro como eu. Eu sei o que é o chão de fábrica, o que é ficar desempregado, o que é ficar sentado na mesa sem ter um bocado de feijão, um arroz pra comer. Eu sei o que é levantar de manhã e não ter café pra tomar, eu sei o que é não ter nem manteiga pra passar no pão, eu sei o que é morar em rua que entra um metro e meio de água dentro de casa e você levantar meia-noite pra espantar rato e barata que tão saindo pelo vaso sanitário, eu sei o que é perder tudo que você tem, até colchão de capim a gente perdia, sei o que é no dia seguinte tirar um palmo e meio de lama, com sanguessuga subindo nas suas canelas e você tendo que comprar pinga de péssima qualidade pra matar. Você tirar a lesma do seu pé e quando tava tudo limpinho dava outra chuva e enchia tudo outra vez. Não foi só uma vez, foram muitas vezes, eu lembro quando a gente mudou de casa porque a outra vila não enchia. No primeiro ano, um metro e meio de água entrou dentro da minha casa, eu sei o que é dormir na calçada só de short, batendo queixo. Nenhum deles sabe”, recordou.