Cristiano Zanin*
O juiz Sergio Moro e alguns procuradores da Força Tarefa transformaram a Lava Jato numa operação que usa o sistema jurídico e a mídia para perseguição política. É o que se chama de lawfare.
Dentro do roteiro que estabeleceram, teriam que condenar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva mesmo que sem crime nem provas, como se disso dependesse o sucesso da operação.
As entrevistas de Moro e do procurador Carlos Fernando dos Santos Lima a esta Folha reforçam essa constatação: fazem referências impróprias ao ex-presidente Lula mesmo exercendo funções públicas em processos a ele relacionados. Jogam às favas a impessoalidade do agente público para fazer juízo político.
Desqualificando as instâncias revisoras, Lima afirmou que a reversão da sentença contra Lula seria consequência “daquelas bobagens que plantam durante o processo para virar nulidade num escalão superior”.
O que Lima chama de “bobagens” são grosseiras e inequívocas violações a garantias fundamentais que também embasam um comunicado que fizemos ao Comitê de Direitos Humanos da ONU, já com uma primeira fase de admissibilidade superada.
Ao apresentar suas alegações finais, Lima e os demais membros da Força Tarefa reconheceram não terem conseguido provar a acusação feita contra Lula em relação ao tríplex. Disseram que o caso era de “difícil prova”. Mas a despeito disso insistiram no pedido de condenação, pois esse sempre foi o resultado pré-anunciado.
Moro, por seu turno, tentou defender sua sentença, após críticas da comunidade jurídica nacional e internacional que se intensificam a cada dia. Disse ser possível condenar alguém com base na palavra de uma testemunha que “viu algo do qual (sic) se infere que a pessoa é culpada”.
A teoria, além de não ser compatível com a garantia constitucional da presunção da inocência, também se revela falha no caso de Lula: nenhuma das 73 testemunhas afirmou qualquer fato que pudesse confirmar a denúncia.
Além disso, a prova documental mostra que o tríplex não poderia ter sido transferido a Lula sem a prova do pagamento em uma conta específica da Caixa Econômica Federal, o que jamais ocorreu. O imóvel também estava hipotecado até 2013.
A verdade é que Moro condenou Lula após ele próprio formular uma nova acusação –diversa daquela que consta na denúncia, violando o princípio da correlação. Reconheceu que Lula não recebeu recursos desviados da Petrobras e que ele não é o proprietário do tríplex.
Mas condenou o ex-presidente com base em narrativa isolada apresentada por um corréu e delator informal, que reconheceu ter mudado de postura sobre o tema por orientação de seus advogados. O pedido de acesso às diligencias já documentadas dessa delação nos foi negado.
Moro, tal como fez na sentença, ainda defendeu sua decisão de divulgar o grampo ilegal da conversa entre Lula e a então ocupante do cargo máximo do país.
Mas o STF já decidiu que essa conduta foi incompatível com a Constituição e fez duras críticas ao juiz. Moro parece ter esquecido do pedido de “escusas” feito em 2016 ao ministro Teori Zavascki.
O voluntarismo de Lima e Moro permite identificar interesses pessoais, midiáticos e políticos no processo. Quando o interesse do homem se sobrepõe ao dever da função pública que ele exerce, o Estado de Direito é colocado em xeque. Espera-se que as instâncias superiores exerçam seus papéis com independência e imparcialidade. É o que basta para que seja reconhecida a inocência de Lula.
Cristiano Zanin Martins, advogado do ex-presidente Lula.
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