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Leia a íntegra da entrevista de Lula para a rádio Educadora, de Piracicaba (SP)

Na última terça-feira, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva concedeu entrevista para a rádio Educadora, de Piracicaba (SP). Confira abaixo a íntegra da conversa com os apresentadores Jairinho Mattos e Paulo Eduardo Carlim.

Jairinho Mattos:
Alexa, quem é Luiz Inácio Lula da Silva?

Alexa:
Luiz Inácio Lula da Silva, mais conhecido como Lula, é um político e sindicalista e ex-metalúrgico brasileiro. Fundou o Partido dos Trabalhadores e foi o 35º presidente do Brasil. Nasceu em Caetés, Pernambuco, porém viveu a maior parte de sua vida em São Paulo. 

Jairinho Mattos:
Presidente Lula, eu não posso perguntar a Alexa quem é o Jairinho Mattos porque pode ser que ela me confunda com o vereador lá do Rio de Janeiro, que eu já estou sofrendo com isso. É um prazer nessa festa democrática, para muitas pessoas nesta tarde, recebê-lo e poder ouvir um pouquinho das suas propostas não só a região de Piracicaba, mas para todo o Brasil que nos assiste. Boa tarde, presidente, o atual candidato, ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, seja bem-vindo.

Luiz Inácio Lula da Silva:
Boa tarde, Jairinho, é um prazer estar conversando com você, um prazer estar conversando com os ouvintes da Rádio.

Jairinho Mattos:
Boa tarde, presidente, agora chegou, só estamos acertando o delay, cortar o delay, só para a gente ouvir o Lula, a gente não precisa se ouvir. Presidente, eu vou lhe lançar uma primeira pergunta que é enviada pelo nosso comentarista, o Ivan Galvão, representado aqui por mim e pelo Paulo Carlim. Quais as medidas que o senhor tomaria de imediato, presidente, para mitigar a fome de 33 milhões de brasileiros miseráveis que a gente já chama de nem-nem, nem estuda, nem trabalha, e eu agora até incorporaria e o terceiro nem, nem consegue um prato de comida e de janta todos os dias, Lula.

Luiz Inácio Lula da Silva:
Jairinho, outra vez boa tarde a você, boa tarde ao Paulo Carlim, boa tarde aos ouvintes da Rádio Educadora AM 1060 de Piracicaba. Olha, veja, o compromisso que nós temos na verdade, e é isso que me entusiasma de voltar a ser candidato a presidente da República, é para acabar com a fome outra vez e fazer com que esse país volte a crescer, a se desenvolver, a gerar oportunidade de trabalho para as pessoas. 

Não, porque o que nós queremos na verdade é provar que esse país não precisa ter fome. Nós já fizemos isso uma vez, você está lembrado que quando eu ganhei as eleições em 2003 o Brasil também tinha fome. Eu disse no meu comício de posse que, se ao terminar o meu mandato a gente tivesse cada brasileiro ou brasileira comendo três vezes ao dia, eu já teria cumprido a missão da minha vida. Porque a verdade é essa, não tem nenhuma explicação econômica, nenhuma explicação política do povo brasileiro ter fome. 33 milhões de pessoas passando fome e 105 milhões de pessoas com algum problema de insegurança alimentar. Ou seja, pessoas que não conseguem comer todas as calorias e as proteínas necessárias à sobrevivência humana. 

E isso só tem uma razão de ser, é desgovernança, é irresponsabilidade. Porque o Brasil é o terceiro produtor de alimentos do mundo, porque o Brasil é o primeiro produtor de proteína animal do planeta Terra, e, portanto, não tem sentido as pessoas não terem o que comer. Por que as pessoas não têm o que comer? Porque as pessoas não têm dinheiro. Se as pessoas não têm dinheiro não têm o que comer. E ninguém está dando comida de graça a não ser os movimentos de solidariedade que tem sido feitos nesse país. Eu estou convencido que nós podemos acabar com a fome no Brasil. Nós já fizemos isso e eu repito, nós já fizemos isso e nós vamos fazer outra vez. Porque cada brasileiro tem que ter o direito de tomar café, almoçar e jantar, nenhuma criança precisa ir dormir com fome, nenhuma criança nesse país, nós temos as condições de fazer isso. 

Então, o que nós temos que fazer? Nós vamos tomar uma medida não é no primeiro dia, porque não tem medida no primeiro dia, porque às vezes a medida leva meses para começar a entrar em vigor e começar a funcionar. O que nós vamos é fazer com que esse país volte a crescer, nós vamos ter um pacote de investimento em infraestrutura para começar gerar emprego. Nós vamos ter que ter muita credibilidade para convencer os empresários nacionais a investir, nós vamos ter que ter muita credibilidade para convencer os investimentos externos a vir para cá para a produção. E nós vamos ter que ter muita, mas muita credibilidade junto à sociedade brasileira para criar um outro Brasil. 

O país está desmontado, as instituições estão desacreditadas, as instituições estão brigando entre si e nós precisamos fazer esse país voltar à normalidade, ninguém precisa ter raiva de ninguém, ninguém precisa ter ódio de ninguém. Você sabe que eu perdi as eleições para o Collor, perdi eleições para o Fernando Henrique Cardoso e ninguém ficava com raiva, ninguém ficava com ódio, ninguém ficava querendo atirar, querendo brigar, querendo desaforar as pessoas. Esse país precisa voltar a ter paz, esse país precisa voltar, a sua sociedade, a voltar a ser humanista para que a gente se trate bem, se respeite, e isso vai acontecer com muito investimento para gerar emprego nesse país e para gerar esperança no nosso povo. Eu estou convencido que isso vai acontecer, foi por isso que o companheiro Alckmin veio ser o meu vice-presidente, porque quem já foi governador de São Paulo durante quatro anos, e eu já fui presidente do Brasil oito anos, nós vamos somar as nossas duas experiências para que a gente possa fazer o Brasil voltar a ser grande, respeitado e tratar o seu povo bem. 

Paulo Eduardo Carlim:
Lula, em síntese então, pelo que pudermos compreender, você propõe já para o primeiro ano de um eventual mandato próximo um pacote de obras de infraestrutura para ancorar essa credibilidade necessária que você menciona? 

Luiz Inácio Lula da Silva:
Nós vamos ter, Paulo, vários pacotes, veja, não é um pacote. Nós vamos ter vários pacotes porque a primeira coisa que eu quero fazer, se nós ganharmos as eleições, é juntar os 27 governadores desse país para que a gente recupere o pacto federativo e para que a gente assuma a responsabilidade junto com os governadores das obras mais importantes de cada estado que precisam ser feitas, porque é inadiável, porque além de gerar benefício para a sociedade vai facilitar o transporte, vai facilitar a produção, nós vamos fazer isso em combinação com os governadores para que a gente volte a estabelecer o diálogo nesse país. Depois nós vamos ter muita conversa com os prefeitos brasileiros, porque um país não pode ser rico se as prefeituras são pobres. E muitas vezes os prefeitos não têm como fazer os investimentos, cabe ao estado facilitar que a prefeitura receba alguma coisa. 

Eu estou sabendo, Paulo, o ano passado Piracicaba foi transformada aí numa região metropolitana que envolve várias cidades. Ora, criar região metropolitana é muito bonito, agora, é preciso que o estado assuma junto com as prefeituras o que vai fazer para ajudar a desenvolver essa região metropolitana. Como é que nós vamos cuidar do transporte, como é que nós vamos cuidar da habitação, como é que nós vamos cuidar do modelo de desenvolvimento, incentivo para o desenvolvimento, tudo isso tem que estar num jogo muito combinado entre o governo federal, o governo estadual e prefeitos, porque senão a coisa não funciona. 

Então nós vamos restabelecer a democracia no Brasil, vamos restabelecer a civilidade, e vamos fazer com que muita coisa aconteça. É preciso reduzir a política de juros, é preciso resolver o problema da dívida de 70 milhões de famílias brasileiras que estão endividadas nos cartões, algumas porque estão utilizando o cartão para comprar comida. Nós vamos ter que resolver esse problema negociando com os credores para que eles facilitem a dívida dessas pessoas. Tem muito penduricalho nessa dívida. Então é preciso a gente afastar esses penduricalhos para que a pessoa fique apenas com o principal, ou seja, tem muita coisa para fazer. E tem muita conversa para fazer, conversa com os empresários, conversa com os trabalhadores, conversa com os professores, conversa com os alunos. 

Porque o Brasil foi tirado da sua normalidade, o Brasil hoje está uma loucura, as pessoas não se entendem, o Congresso Nacional tomou conta do orçamento da União que era de administração do presidente da República, o Poder Judiciário está fazendo mais política do que o Congresso Nacional. O Congresso Nacional está judicializando a política, ou seja, houve muitas inversões e nós precisamos parar, sentar. Tem gente que fala assim para mim que quando o Brasil estava perdendo da Alemanha de 7 a 1, quando a Alemanha marcou o terceiro gol o Felipão deveria ter pedido para o jogador cair dentro do campo para parar e arrumar o time, para não levar mais com gol. Ou seja, nós vamos ter que parar, pensar e fazer as coisas acontecerem com mais cordialidade, com mais civilidade, com mais democracia e com mais participação da sociedade. 

Eu e o Alckmin, nós temos um compromisso de recuperar esse país. Esse país já foi protagonista internacional, esse país já foi modelo de muitas coisas, considerada pela ONU o orçamento participativo que o José Machado fez tão bem em Piracicaba quando foi prefeito, e que nós fizemos no Brasil inteiro. Esse país foi muito bem na questão ambiental, nós fomos responsáveis pela diminuição de 80% do desmatamento da Amazônia e esse país teve um exemplo extraordinário que enquanto o mundo desenvolvido gerava 100 milhões de desempregados na crise de 2008, o nosso país gerava 22 milhões de empregos com carteira profissional assinada. Então tudo isso nós vamos levar em conta para que a gente possa consertar esse país, o povo voltar a ter esperança, o povo voltar a ser feliz e o povo acreditar que esse país não nasceu para ser pequeno, e esse país não nasceu para que o povo passe fome. Não tem explicação alguém em Piracicaba ou alguém na minha Caetés, lá em Pernambuco, ou alguém na capital de São Paulo ir dormir com fome porque não tem o que comer. 

Paulo Eduardo Carlim:
Depois de tudo que se passou Lula, principalmente a partir de 2016, as denúncias do Mensalão, do Petrolão, a Lava Jato, o impeachment da sua sucessora Dilma, 580 dias você tendo permanecido na prisão, você considera que as próprias pesquisas atualmente divulgadas de intenção de votos são um indicador de que a sua credibilidade política individualmente já tenha sido devidamente resgatada perante o eleitorado?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Olha, eu nunca perdi essa credibilidade, Paulo. Você sabe que quando eu estava na Polícia Federal eu cheguei a crescer 16 pontos na pesquisa de opinião pública porque o povo brasileiro me conhece, o povo brasileiro sabe da mentira que foi o comportamento do Moro com relação a mim. As pessoas sabem as mentiras que o Ministério Público, chefiado pelo Dallagnol, contou. Então, isso nunca me prejudicou do ponto de vista da minha relação pessoal com a sociedade brasileira. Então quando fui para a Polícia Federal eu fui com o objetivo de desmascarar. Não é que a Lava Jato teve corrupção, se teve corrupção você tendo o corrupto, se o empresário roubou prenda, se um gerente roubou prenda. O que você não pode é quebrar as empresas, o que você não pode é fazer com que o empregado daquela empresa sofra porque o seu patrão roubou, porque o seu gerente roubou. Não, você prende quem roubou e deixa as empresas funcionando. 

Porque no frigir dos ovos a Lava Jato causou um prejuízo de 4 milhões e 400 mil pessoas que ficaram desempregadas. Causou um prejuízo de 170 bilhões de reais que deixaram de ser investidos neste país, causou um prejuízo de 58 bilhões que deixou de arrecadar de imposto. Olha, não precisava disso, provas, eu estou cansado de pedir provas. Você está lembrado que quando eu fui prestar depoimento eu disse para o Moro, olhe, você está condenado a me condenar porque a mentira já foi longe demais. E ele sabia que ele estava mentindo, porque ele tinha a informação, ele sabia dos processos, e ele sabia que eu não tinha cometido crime. E não tinha, por que eu sabia que não tinha cometido. Eu tentei mostrar para ele o erro que ele estava cometendo. 

Não, mas ele estava com o objetivo político e levou isso até o fim e acabou no que acabou. Hoje ele é uma figura defenestrada na política brasileira e para muita gente da sociedade e eu estou aqui mostrando, mostrando e com muito orgulho, que foi no governo do PT que a gente apurou corrupção. Porque no governo do PT não tinha denúncia que não fosse investigada. Não tinha. Foi nós que criamos a delação, foi nós que criamos o Portal da Transparência, foi nós que criamos a Lei do Acesso às Informações, porque qualquer pessoa poderia saber o que acontecia no nosso governo. Agora, o Bolsonaro não, o Bolsonaro ele diz que não tem corrupção, mas decreta sigilo de cem anos para qualquer denúncia contra ele. Ou seja, decreta sigilo de cem anos para o filho, decreta sigilo de cem anos para os amigos, decreta para o Pazzuelo, ou seja, nada dele é investigado, só daqui a cem anos, quando ele não existir mais. Essa é uma coisa que eu poderia dizer para vocês, nós vamos ter que fazer um decreto fazendo um revogaço desse sigilo que o Bolsonaro está criando para defender os seus amigos.

Jairinho Mattos:
Lula, a Saúde brasileira infelizmente é sempre e será o calcanhar de Aquiles de qualquer governante. Aqui em Piracicaba mesmo, a nossa região, região agora metropolitana, com 24 cidades, PIB de 70 bilhões de reais, nós temos uma dificuldade enorme porque o teto do salário dos médicos oferecidos no Sistema Único de Saúde é o salário do prefeito Luciano Almeida. E muitos médicos não querem trabalhar no SUS porque acham que ganham mais em outros municípios ou ganham na iniciativa privada ou coisa que o valha. Presidente, a Saúde do Brasil está de joelhos, e esse é um problema antigo. O senhor teria alguma saída prática para a gente resolver isso, o Programa Mais Médicos, o programa dos médicos cubanos? Fale-nos um pouquinho, uma vez eleito o candidato Lula, o que seria feito na Saúde para dar um choque imediato, Lula?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Olha Jairinho, a primeira coisa que é importante, eu quero te agradecer por essa pergunta, é porque o SUS desde que ele foi criado em 1988, na Constituição, o SUS foi muito atacado pela iniciativa privada, muito atacado pela imprensa. Ou seja, só falavam do SUS aquelas coisas que não prestavam. Veio a pandemia e o SUS deu um show de competência. Se não fosse o SUS a gente teria tido mais de um milhão de pessoas mortas, porque uma parte morreu pela irresponsabilidade do presidente, e aquelas que foram salvas é graças à dedicação dos médicos e dos funcionários do SUS. Nós vamos ter que fortalecer o SUS, a sociedade brasileira precisa saber que nós temos que colocar mais dinheiro no SUS. Quando eu era presidente, quando eu era presidente, o Senado tirou 40 bilhões de reais que eu disse que ia colocar no SUS, que era da CPMF e não criaram nada no lugar. 

E você sabe que para cuidar das pessoas mais humildes, para dar o remédio que ela precisa, é necessário ter dinheiro. Você lembra Jairinho a guerra que foi feita contra os Mais Médicos? A gente não estava só trazendo médicos de Cuba, a gente fez um edital para levar médico brasileiro, e você disse uma coisa que é verdade, muitas vezes a gente não consegue contratar o médico brasileiro numa cidade longínqua. As pessoas não vão. Eu tenho informação que tem prefeito oferecendo 30 mil reais e não tem médico, as pessoas não querem ir para o interior, para bem longe, as pessoas querem ficar mais próximos aos centros mais desenvolvidos. Quando nós criamos o Mais Médicos nós levamos médicos para todas as cidades brasileiras, para pessoas que nunca tinham possibilidade. 

Eu não sei se a gente vai criar o Mais Médicos, mas a gente vai ter que fazer muita coisa para a gente levar médico em toda cidade e essas pessoas têm que ganhar aquilo que é razoável. A gente nunca ganha aquilo que a gente quer, a gente ganha aquilo que é razoável, aquilo que as pessoas podem pagar, aquilo que a prefeitura pode pagar, aquilo que o estado pode pagar. Porque uma coisa é você atender a parte privilegiada da sociedade que pode pagar um plano, outra coisa é você tratar universalmente toda a sociedade brasileira. Muita gente que está doente porque tem fome, muita gente que está doente porque não tem saneamento básico na sua rua, na sua casa. 

Então é uma tarefa imensa, e essa tarefa é prioridade para nós, Jairinho. Essa para nós é uma prioridade de cuidar, sabe, cuidar da criança quando nasce, cuidar do velhinho porque também no Brasil tem pouca especialidade para cuidar dos velhinhos. E eu sei do trabalho que teu pai fez aí em Piracicaba. Então é importante a gente saber que Saúde custa dinheiro, a gente pode melhorar a gestão, mas precisa de dinheiro para a gente atender de forma universal todos os milhões de brasileiros que precisam de Saúde e que não podem pagar um plano, que é a grande maioria do povo brasileiro.

Jairinho Mattos:
Presidente, eu emendaria a sua citação ao seu vice, o governador Alckmin, que aliás ficou mais do que quatro anos do governo, o Alckmin foi vice de Mário Covas, o Alckmin tem 12 anos de…

Luiz Inácio Lula da Silva:
Ele ficou 14 anos no governo.

Jairinho Mattos:
Exatamente. Agora a minha dúvida é o seguinte, o Brasil ainda presidente Lula, permita-me chamá-lo de presidente, pré-candidato, a rejeição do seu principal oponente chega à casa de 57%. A do senhor na última pesquisa 44, do Ciro 51, o seu oponente agora praticamente já selou com o general para vice. E o seu vice é de Pindamonhangaba, médico. A minha curiosidade é, o nome do Alckmin foi aprovado por 68 a 14 entre os petistas para seu vice. Na oportunidade parece que o senhor estava em trânsito entre Brasília e São Paulo. A escolha do Geraldo Alckmin, candidato Lula, foi pessoal do senhor, foi uma indicação do Márcio França, nome que está ainda aqui pendente em São Paulo se vai a governador, se vai a senador, ou é um candidato simpático dos banqueiros, que em várias rodadas de conversas com o senhor teria indicado o nome do Geraldo Alckmin? E uma vez eleito qual seria o papel do Geraldo Alckmin no seu governo, negociar com o centrão, presidente Lula?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Jairinho, primeiro, o Márcio França não foi o responsável pela indicação do Alckmin. E a indicação do Alckmin foi um desejo meu, uma vontade minha, porque o presidente da República que tem que escolher o vice, o vice tem que ser uma pessoa que tenha uma certa combinação, uma certa relação com o governador. Você não pode ter um vice que você não confia, você não pode ter um vice que você não vai dar para ele as condições de igualdade na governança desse país. Então, o Alckmin foi uma escolha minha, que foi levada para o partido, como faz um partido democrático, e o partido levou para a reunião de diretório e aprovou. Aprovou e o Alckmin tem se saído de forma extraordinária. É uma pessoa palatável, é uma pessoa conversável, é uma pessoa de bem. 

E o que eu quero, o Alckmin não vai conversar com banqueiro, não vai conversar com usineiro, o Alckmin vai conversar com o povo brasileiro como eu vou conversar com o povo brasileiro em função das suas necessidades. Ou seja, não tem ninguém indicado para conversar com banqueiro, nós queremos é resolver o problema da sociedade brasileira. Eu, por exemplo, se fosse pegar Piracicaba, pegar a questão da cana-de-açúcar como exemplo, eu poderia dizer para você que pouca gente nesse país cuidou da questão do etanol como eu e o Alckmin cuidamos, ele como governador do estado e eu como presidente da República, valorizando o etanol, levando o etanol para discutir em todos os países do mundo, tentando fazer com que a União Europeia incluísse o etanol na gasolina. 

Então, o que nós vamos fazer é o seguinte, o nosso compromisso é conversar com todos os segmentos da sociedade. E eu posso te dizer uma coisa, Jairinho, o Alckmin é um companheiro que vai participar do governo efetivamente, ele não será um vice que vai ficar no banco esperando substituir. Não, ele vai ser um vice ativo, ele vai participar, ele vai discutir, ele vai me representar, vai fazer reunião em meu nome em quase todos os lugares que for necessário. É assim que eu quero tratá-lo e é assim com que um respeito entre duas pessoas exige, de comportamento.

Paulo Eduardo Carlim:
Lula, eu queria voltar à temática das acusações de corrupção que pesaram sobre você e sobre o PT, no caso corrupção passiva, lavagem de dinheiro, falsidade ideológica, ocultação de patrimônio, enfim, aquilo que ficou conhecido como o Quadrilhão do PT. Você considera que tenha sido traído por tanto dos seus pares, muitos condenados, e que inclusive chegaram a devolver dinheiro aos cofres públicos? Ou em que medida o presidente Lula tenha sido talvez negligente com o que se passava no segundo e no terceiro escalão do governo?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Deixa eu te dizer uma coisa, Paulo, você é uma pessoa séria, você é um jornalista competente, você não sabe o que está acontecendo na tua casa agora. Você sabe? Se eu perguntasse o que o teu filho está fazendo você não sabe. Querer que um presidente da República saiba o que acontece no meio de um milhão de pessoas, querer que um presidente da República saiba o que está acontecendo em 8 milhões e meio de quilômetros quadrados que representa o Governo Federal, é no mínimo… As pessoas que acusaram assim, querer má-fé. Ora, eu acabei de dizer para você, todas as coisas mais importantes para combater a corrupção foram feitas no nosso governo. 

E eu disse duas que você precisa levar bem a sério, primeiro o Portal da Transparência, segundo a Lei de Acesso à Informação. No nosso governo as pessoas saberiam o papel higiênico que era usado no palácio porque a gente não estava lá para esconder nada. No nosso governo a Polícia Federal foi na casa do meu irmão, eu fiquei sabendo 12 horas antes porque eu estava na Índia, tinha um fuso horário, e eu falei não, se a Polícia Federal quer ir lá que vá, que investigue. E depois peça desculpa. 

O problema não é acusação, o problema é que quando você é canalha e faz a acusação depois você tem que ter o caráter de pedir desculpa. A palavra desculpa não custa nada. Eu só queria que as pessoas que me acusaram, que as pessoas que foram na minha casa, que as pessoas que invadiram a minha casa, que abriram o meu televisor, que desmontaram o fogão, que abriram o colchão, que levantaram a cama, eu só queria que essas pessoas tivessem, a hora que revistaram e que não encontraram nada poderiam falar: olha, nós queríamos pedir desculpas ao presidente Lula e a sua família. Porque nós já pesquisamos no banco, pesquisamos em todo os lugares e não encontramos nada. O que Paulo?

Paulo Eduardo Carlim:
Por exemplo, a figura do Antônio Palocci Filho, chegou a fazer algum movimento no sentido de se desculpar com você, como você menciona?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Deixa eu vou lhe falar uma coisa para você, o Palocci mentiu e está pagando pelo erro que mentiu. A delação foi uma farsa nesse país em muitos casos. Em outros as pessoas confessaram porque quiseram confessar. O que eu estou dizendo para você, cara, é que as pessoas que me acusaram, as pessoas que me acusaram sabem que me acusaram falsamente. Porque eu tenho uma vida pública mais do que vasculhada, mais do que investigada, e o que fizeram comigo nunca fizeram com nenhum político no Brasil. Eu fiquei 580 dias na cadeia com a certeza que ia acontecer exatamente o que está acontecendo. Exatamente o que está acontecendo. Aqueles que mentiram vão ser desmoralizados ao longo do tempo, e eu estou muito tranquilo. 

Estou muito tranquilo, muito maduro, muito consciente do que aconteceu nesse país, muito consciente do que foi a Lava Jato, muito consciente do papel dos procuradores, e eu não posso ficar colocando isso no meu dia a dia da política porque eu não quero ser tomado pelo ódio, pelo rancor. Essa gente vai ser julgada pela história, e já estão sendo julgados, e eu também vou ser julgado pela história, e também já estou sendo julgado. E vamos ver quem a história vai colocar no lugar certo. E eu dizia quando era presidente, Paulo, não tem outra forma, a única forma de você não ser importunado, a única forma de você não ser investigado, é você andar corretamente. 

Agora, eu também não concordo, também não concordo que as pessoas a primeira coisa que faz é criar uma manchete de jornal acusando uma pessoa sem prova nenhuma, depois na semana seguinte a pessoa é colocada como inocente e a mesma manchete não tem uma manchete igual dizendo que foi um erro. E você sabe como é acusação, se você for acusado em Piracicaba, seu nome sair na manchete dos jornais, seu nome sair nos programas de rádio, você nunca mais vai conseguir apagar isso. Nunca mais. Então eu dizia para o Ministério Público, eu dei posse para três procuradores, eu dizia para a Polícia Federal: investiguem todo mundo, agora, por favor, só acusem quando tiver prova, se não tiver prova não faça acusação porque você destrói a vida das pessoas, como destruíram a vida de muita gente. Não destruíram a minha vida porque eu resolvi brigar. 

Você lembra, Paulo, quando eu estava na Polícia Federal? Me ofereceram acordo, me ofereceram para ir para casa, e eu disse: olha, eu não troco a minha dignidade pela minha liberdade. Eu não troco. Então você pode usar tornozeleira e ficar em casa. Eu não sou pombo correio, e a minha casa não é cadeia, vou ficar aqui até vocês se derem conta que vocês fizeram bobagem. Eles se deram conta. E ainda tem muita coisa para passar aí, tem muita coisa, porque nós precisamos moralizar as instituições brasileiras também, o procurador tem muita responsabilidade, ele tem muita força, ele não pode fazer acusação venal contra ninguém se ele não tiver prova concreta. 

Ele não pode fazer uma acusação e depois levar a pessoa para a tortura psicológica, ameaçando prender filha de gente, ameaçando levar mulher. Não pode, isso é tortura psicológica. Para muita gente é mais grave do que uma tortura de choque. Então, meu caro é o seguinte, esse país para ser recuperado de verdade ele tem que voltar à normalidade, as instituições precisam respeitar as forças que tem, e fazer a coisa séria para que o Brasil e o povo não seja prejudicado. Eu sei o prejuízo que a Lava Jato causou a esse país. Eu sei. 

Jairinho Mattos:
Lula, eu tenho reiterado às vezes aqui no programa, comentaristas da Rádio Educadora, dito com muita coragem, que o governo Bolsonaro foi a maior oportunidade perdida da direita brasileira. Eu digo isso com a maior transparência porque eu depositei minha confiança nele e alguns fatores fizeram uma divisão do governo Bolsonaro. A sua atuação na questão da Amazônia, a questão do extrativismo do garimpo, questão agora da morte de um jornalista inglês, de um indigenista brasileiro. Nós temos visto, presidente Lula, uma crítica muito grande da forma como o presidente atual conduziu a questão da vacinação no Brasil, como bem frisado, o SUS é um orgulho para o brasileiro. E eu queria não fazer uma pergunta, eu queria fazer uma observação, eu tenho acompanhado muito as suas lives, e o senhor disse que é uma pessoa muito perseguida pela mídia, uma das pessoas mais perseguidas e censuradas do Brasil. Eu queria entender um pouquinho mais porque é que o senhor tem esse pensamento, e qual é essa questão da censura e do controle social da mídia, é mais a internet ou passa também pela concessão de rádios e televisão, Lula?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Não, primeiro deixa eu dizer uma coisa para você, eu não sei se você tem todas as informações, Jairinho, mas em nove meses eu tive 13 horas de Jornal Nacional me acusando. 13 horas. E nem um minuto de defesa. Eu tive 59 capas de revistas me acusando e nenhuma me defendendo. Eu tive mais de 680 páginas de jornais e editoriais me acusando e nenhum me defendendo. Então sobreviver a tudo isso significa resiliência, muita, muita resiliência para aguentar a quantidade de porrada para poder provar a inocência. E quando a gente fala em censura, vamos ser francos, nós passamos um período em que nenhuma acusação tinha resposta na televisão porque não se permitia. 

O meu advogado que é o Zanin, que aliás, é filho de Piracicaba, os pais dele moram em Piracicaba, entrava com pedido de resposta simplesmente era negado. Então, quando a gente fala de que é preciso democratizar os meios de comunicação, a gente está falando da mídia eletrônica, a gente está falando do rádio e da televisão, a gente está falando que é preciso regular a internet. Mas quem vai regular? Ora, vai ser a sociedade brasileira, não vai ser o presidente da República. Nós vamos ter que convocar plenárias, congressos, palestras e a sociedade vai ter que dizer como é que precisa ser feito para a gente poder democratizar, regular melhor o direito de resposta. 

Porque a verdade é essa cara, nós temos nove famílias que são donas quase de todos os meios de comunicação nesse país. Então é preciso que a gente possa abrir um pouco mais a participação, o jornal e revista isso é problema do dono, faça o que quiser, escreva o que quiser. Mas aquela mídia que é concessão do Estado é preciso que a gente coloque a sociedade para discutir como é que a gente pode democratizar melhor, como é que a gente pode fazer melhor. Eu lembro que quando nós fizemos a concessão, quando nós criamos a possibilidade da rádio comunitária, a campanha que era feita em alguns setores de comunicação em São Paulo e no Rio de Janeiro e em outros estados contra as rádios comunitárias. Que a rádio comunitária atrapalhava os aviões, atrapalhava não sei o que, atrapalhava… 

Então é preciso que a gente tenha o direito de várias opiniões nos meios de comunicação. O que você está fazendo agora comigo é um momento de democratização, você está me levando hoje, vai levar outro amanhã, outro depois e todo mundo fala, todo mundo se explica, todo mundo responde pergunta, e assim a sociedade vai aprendendo a ser democrática. Se ela ficar só ouvindo uma música, só uma versão, só um discurso, ela não irá se politizar, ela não irá ter condição de fazer juízo de valores porque ela não sabe. 

Eu vou pegar uma coisa do Bolsonaro. O Bolsonaro, quando eu digo que o Bolsonaro foi uma grande mentira, porque o Bolsonaro fez uma campanha dizendo que era preciso acabar com a classe política e com a velha política, com a velha política. Ele tinha 28 anos de mandato de deputado, e você não conhece um Projeto de Lei que ele apresentou, ele tinha mais quatro anos de vereador no Rio de Janeiro. Ou seja, ele agora tem todos os filhos eleitos pela urna eletrônica, ele foi eleito em 98, em 2002, em 2006, 2010, 2014, 2018 pela urna eletrônica, e ele agora vem com a maior desfaçatez, com a maior cara de pau dizer que a urna eletrônica é suspeita. 

Na verdade o que ele está querendo, Jairinho, é que ele sabe que ele vai perder as eleições, e o que ele está querendo é fazer o que o Trump fez, criar uma confusão antes, durante e depois. E ele não vai conseguir criar essa confusão porque a maioria do povo já está cansada, e a maioria do povo vai tirar ele da presidência no dia 02 de outubro, é isso que vai acontecer. Então pode aumentar, quer gastar mais 60 bilhões, 70 bilhões, quer aumentar o auxílio emergencial, quer fazer, faça tudo o que não fez durante os quatro anos, que não vai adiantar, o povo já está convencido que o povo gosta mais de democracia, gosta mais de amor do que de ódio, gosta mais de mais de livro do que de armas, e o povo então quer se livrar disso. 

É por isso que eu acho que ele é uma mentira muito grande para a sociedade brasileira. Eu não esperava que o Brasil tivesse tanta gente, tanta gente de posições conservadoras. Eu lidei muito tempo com o Maluf, lidei muito tempo com os militares, e as pessoas eram civilizadas, a gente terminava um comício em Piracicaba, a turma do Maluf estava no outro palanque, você se encontrava no restaurante você se cumprimentava. Agora a política está tomada de ódio, ou você usa a camisa verde amarela ou você não é brasileiro, ou você processa as mentiras do fake news do Bolsonaro ou você é comunista. Então é um discurso falso, é uma mentira que lamentavelmente uma parcela da sociedade acreditou em 2018 e agora eu penso que a sociedade vai se desfazer dessa mentira e restabelecer a verdade, a paz, o amor, ao invés do ódio. 

Paulo Eduardo Carlim:
Pegando exatamente esse gancho aí Lula, será interessante o seu posicionamento, principalmente perante aquele eleitorado, digamos, menos engajado na política. O senhor pretende implantar no Brasil algo parecido com o comunismo, o socialismo, ou algo do tipo?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Olha, eu vou fazer melhor o que eu já fiz. Eu vou fazer melhor. Eu vou dizer para você o que eu quero fazer nesse país, eu quero que todas as pessoas tenham possibilidade de estudar, eu quero que todas as pessoas tenham oportunidade de trabalhar. Porque é com o trabalho e com o salário ganho pelo seu trabalho que as pessoas criam a sua família com dignidade. Eu quero que as pessoas tenham o direito a ter saneamento básico, direito à saúde, direito a viajar, direito a ir comer num restaurante num final de semana, direito a comprar as coisas que ele produz. 

Eu quero que as pessoas vivam bem, eu quero que o filho da empregada doméstica vá para a universidade, eu quero que o filho do pedreiro vá ser engenheiro. Nós não queremos tirar nada de ninguém, nós queremos apenas dar oportunidade àqueles que nunca tiveram oportunidade. Nós queremos que as crianças humildes, que as crianças que não tiveram oportunidade tenham a oportunidade. Vamos colocar as crianças no mesmo banco da escola, dar a mesma qualidade de comida, a mesma qualidade de ensino, e vamos ver quem vai crescer na vida. É esse mundo que eu quero criar para o Brasil, o mundo de fartura, o mundo de paz, o mundo da esperança, o mundo de trabalho, o mundo na verdade de riqueza, porque ninguém faz opção pela pobreza, ninguém quer ser pobre, todo mundo quer melhorar de vida. 

E o que o governo tem que fazer é criar a oportunidade das pessoas melhorarem de vida. É ser uma espécie de alavancador de oportunidades para que as pessoas possam melhorar de vida. É por isso, é por isso, Paulo, que quando eu entrei na presidência tinha 3 milhões e meio de jovens na universidade e quando eu deixei tinha 8 milhões e meio de jovens na universidade. É por isso que eu e o José Alencar fomos os presidentes que mais fizemos universidades na história do país, mais fizemos universidades e mais fizemos escolas técnicas. Então esse país é que eu quero construir com mais força. 

Eu na verdade quero criar um estado de bem-estar social em que as pessoas trabalhem, as pessoas morem, as pessoas comam, as pessoas vivam em paz, que nos bairros tenha área de lazer para as crianças, que no bairro tenha área de prática de esporte para o povo, que as pessoas não precisam só da política, as pessoas precisam de investimento do Estado para melhorar a condição de vida do povo mais humilde. É isso que eu vou fazer. 

Eu, por exemplo, eu vi que em 2021 foi criada a região metropolitana de Piracicaba, que vai para um monte de cidades, ou seja, vai até Pirassununga, é um monte de cidade, eu não vou ler todas aqui porque são bastante cidades, são muitas, muita gente. Ou seja, eu fico imaginando o discurso que foi feito para criar a região metropolitana. Porque todo mundo faz um discurso de que vai melhorar. Agora, se o governador do estado não colocar dinheiro, não incentivar o transporte, a Saúde, a geração de oportunidades de Educação e a oportunidade de trabalho, daqui a pouco a região metropolitana de Piracicaba estará tão nervosa como outras regiões metropolitanas abandonadas pelo país. 

Então agora que está criada, companheiro Paulo e companheiro Jairinho, vocês precisam ficar atentos, vocês têm que ser o fiscal para fazer com que o governador se reúna com os prefeitos da cidade da região metropolitana, que o governador faça investimento, que o governador invista na Educação, que o governador invista em creche, que invista no transporte, invista no desenvolvimento. Porque senão as cidades vão ficar esperando e isso não vai aparecer nunca. Então, vocês dois aproveitem o microfone da Rádio Educadora AM 1060 de Piracicaba e cobrem todo dia. 

Eu vou dizer para vocês, se o Haddad ganhar as eleições para o governo, eu vou te contar, aí sim essa região metropolitana vai funcionar, porque nós sabemos como conversar. E eu não acredito que o país possa ser rico, ou o estado, se as cidades forem pobres. A gente tem que saber que é na cidade que está o problema, é na cidade que está a questão da Educação, a questão da Saúde, é o prefeito que é o para-choque de tudo isso. Então nós temos que respeitar os prefeitos e fazer a governança ligada umbilicalmente com as prefeituras para que a gente possa fazer as cidades brasileiras progredirem. É isso que nós vamos fazer, você vai ver outro país. Quando eu for presidente outra vez, Jairinho, você e o Paulo me convidem para ir ao vivo, assim me pagam um almoço no Mirante do Rio de Piracicaba, que eu não sei se tem dourado ainda lá, mas vocês me pagam um almoço, me levam naquele engenho que eu participei da inauguração, alguma coisa cultural, que o José Machado me levou quando prefeito. Se vocês me derem um dourado assado lá no Mirante eu já estarei agradecido e vou contar para vocês o que vai estar acontecendo neste país.

Jairinho Mattos:
Lula, você está convidado, nós vamos ao Porto comer um peixinho na telha, tomar uma cachacinha boa de Piracicaba, que aqui é de praxe e comemos uma pamonha de Piracicaba. Da minha parte eu queria só fazer uma última pergunta, e o Paulo também, que na verdade eu divido em duas. Como é que você vê esse crescimento aqui na América Latina, os presidentes, do viés ideológico mais à esquerda, isso é uma tendência, a direita às vezes perdendo um pouco de espaço com a sua possível eleição novamente? E uma vez eleito, Lula, como é que vai ser o seu enfoque na questão das privatizações. Porque o Brasil é um país com muitas estatais, algumas delas ineficientes, um dromedário, um elefante andando numa areia movediça. Como você vai fazer para esse trabalho de privatização, o que é eficiente no Estado, o que não é Lula?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Jairinho, primeiro obrigado pela pergunta. Primeiro eu sou contra privatização, eu sou favorável ao Estado criar empresas de economia mista como o Banco do Brasil, como a Petrobras. Empresas em que você tenha a participação da sociedade brasileira, que o governo possa até indicar a direção, mas a gestão disso ser feita por um Conselho indicado pela população. Veja, aqui no Brasil se criou o dogma de que tudo que é do Estado não presta, tudo que é privado é bom. Então quando se fala em privatização as pessoas acham que é bom. 

Eu vou dar um exemplo, um exemplo novo. A BR foi privatizada com o argumento de que a BR tinha um monopólio da venda de gasolina, de óleo diesel, e que se fosse privatizada ia ter muitas empresas concorrendo e o preço ia ser mais barato. Pois bem, privatizaram a BR, hoje tem 392 empresas importando gasolina dos Estados Unidos e vendendo para o povo brasileiro, como se a gente ganhasse em dólar. É por isso que a gasolina está tão alta, o diesel está tão alto e o gás está tão alto. Ora, é muito mais fácil você controlar o preço do gás na Petrobras do que você ficar criando vale para a campanha política. Jairinho, eu era presidente quando teve a crise econômica de 2008, quando teve a quebra do Banco Lemann Brothers, você está lembrado. Naquele episódio o barril do petróleo chegou a 147 dólares. Mais do que hoje. E quanto é que estava a gasolina que você enchia o tanque do teu carro em Piracicaba? R$ 2,60. 

O preço do combustível chegou aonde chegou por irresponsabilidade do Bolsonaro, o presidente do Conselho da Petrobrás, o presidente da Petrobrás não pode mais do que o presidente do país não. O presidente do país ele tem responsabilidade, se ele quiser ele chama o Conselho, chama o Conselho Nacional de Política Energética. Essa história de privatizar é coisa de incompetência. Eu não sei governar, eu não sei como fazer a economia crescer, eu vou vender o que tenho e vou ter dinheiro para gastar. Daqui a pouco eu não tenho nem dinheiro e nem as empresas, aí que o país vai para a bancarrota. Então meu caro, eu sou contra, sou contra as privatizações daquilo que é essencial ao Estado Brasileiro. 

O Banco do Brasil é essencial ao Estado Brasileiro, a Caixa Econômica é essencial ao Estado Brasileiro. Você nem perguntaram do presidente da Caixa Econômica que está sendo acusado por assédio, mas também eu não sou procurador e não sou policial. Vocês, vocês, o BNDES tem que ser um banco estatal, a Petrobrás tem que ser uma empresa pública de economia mista. Quando eu falo estatal não, é uma empresa pública de economia mista. Para esse país poder crescer. É assim no mundo desenvolvido. Vai ver na Europa se a Alemanha abre mão, se a França abre mão das empresas públicas fortes deles. E no Brasil está privatizando as nossas empresas estatais para empresas de estatais chinesas, empresas estatais da Arábia Saudita. É muito engraçado, que a gente se desfaz e vende para outra estatal estrangeira, quando na verdade o presidente precisaria ter competência. 

Você sabe por que nós descobrimos o pré-sal? Você acha que foi milagre? Não. Aquilo foi investimento em pesquisa, foi muito investimento em pesquisa e aquilo fez a gente descobrir a maior jazida de petróleo do século 21 que deu para o Brasil independência, autossuficiência. E o que o Bolsonaro faz? Destrói, por incompetência. Ele fala todo dia: eu não sei governar, eu não entendo de economia, eu não entendo de política, eu só sei ser militar. Então pede a conta e volta, volta para a caserna se é isso que ele quer. Para a caserna não porque ele já estava aposentado, vai participar de algum clube aí, e deixa o povo governar esse país. Esse país precisa voltar a crescer, precisa ainda voltar a gerar emprego, precisa investir na Educação, investir em Ciência e Tecnologia, senão a gente nunca será um país grande e potente economicamente.

Jairinho Mattos:

Lula, eu vou pedir ao Paulo Eduardo lhe lançar mais uma pergunta. Agora, eu queria que pelo menos aos ouvintes de Piracicaba o senhor nos desse algum furo de reportagem, alguma informação privilegiada. Porque nós procuramos aqui levar ao telespectador e ouvinte da Rádio Educadora algum ato que o senhor já vai fazer, uma vez eleito. Eu já estou imaginando uma eleição muito acirrada, o senhor liderando todas as pesquisas de primeiro e segundo turno. Mas uma vez eleito, o que pode acontecer, o que você pode já adiantar naqueles famosos cem primeiros dias de governo, se eleito?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Jairinho, eu não trabalho com essa ideia de cem primeiros dias. Eu trabalho com um mandato de quatro anos. Ou seja, quando eu planto um pé de jabuticaba eu não fico em volta do pé de jabuticaba pedindo que dê logo, eu tenho que saber que precisa ter bastante sol, que tem que ter bastante água, tem que jogar um fertilizante ali e depois eu vou colher essa jabuticaba. No governo é a mesma coisa, a fome tem pressa. Então, nós vamos tomar medidas sérias para acabar com a fome, o emprego tem pressa, nós vamos tomar medida séria para acabar com o desemprego e gerar emprego. Isso não acontece num dia. 

O que eu não quero é fazer fantasia e pirotecnia, ficar anunciando um monte de coisa que depois não acontecem em cem dias. Tem presidente que em cem dias não aprender sentar na cadeira ainda. Qual é a minha vantagem e a do Alckmin? É que nós já sabemos sentar na cadeira. Eu acho que a cadeira que está lá é a mesma que eu comprei, então nós não teremos nenhuma dificuldade para começar a governar esse país. Eu sou contra ficar dizendo eu vou fazer isso, vou fazer isso em cem dias. Não, eu quero que você saiba o seguinte Jairinho, o desemprego para mim é obsessão, a gente vencer o desemprego. Reduzir a inflação é uma obsessão, a gente fazer com que as pessoas tenham comida é uma obsessão, quem tem fome não pode esperar. E isso nós vamos trabalhar durante o processo de companha e quando eu tomar posse você vai saber. Você vai saber por que vai estar o time montado, nós vamos anunciar as coisas que nós vamos fazer. Mas tem um tempo, se eu, se o Tite ficar escalando a seleção dele agora, ele quando chegar na Copa do Mundo está todo mundo preparado para marcar ele e não deixar ele fazer. Eu vou com muito cuidado porque eu sei como é que funcionam essas coisas.

Paulo Eduardo Carlim:
Poxa vida Lula, de certa maneira você derrubou a minha derradeira pergunta. É 1:10 da tarde de quarta-feira, nós já excedemos em alguns minutos, o horário que foi combinado com a sua assessoria, mas na mesma linha do comentário do Jairinho, eu também gostaria de ouvir alguma informação inédita. Você disse que a escalação do time ainda é cedo para ela. Mas sobre criar algum novo Ministério ou recriar algum Ministério que tenha sido extinto, e particularmente o agora oitentão Gilberto Gil, será que ele topa voltar na Cultura, Lula?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Paulo, nós vamos recriar o Ministério da Cultura, vamos recriar o Ministério do Meio Ambiente, vamos fazer o IBAMA voltar a funcionar, vamos criar o Ministério da Igualdade Racial, vamos criar o Ministério da Pesca. Nós vamos criar várias coisas, vamos criar, nós vamos criar Comitês de Cultura nesse país, eu vou criar um Ministério para cuidar das questões indígenas nesse país. Porque os indígenas têm que ser respeitados nesse país. Então, essas coisas. 

Eu vou dar duas novidades para você. Primeiro que o meu filho não é dono da Esalq, porque durante as acusações que faziam contra a minha família, pegava o prédio da Esalq, vendiam na internet como se fosse a casa do meu filho. E então não é. E a segunda coisa que eu posso dizer para vocês é que eu quero ver se durante as eleições eu vou a Piracicaba. Eu vou a Piracicaba porque eu tive muita relação com Piracicaba nos anos 80, eu fui duas vezes como presidente a Piracicaba, eu já fui na Esalq, eu tenho uma bela relação com o nosso companheiro e querido amigo Ometto, e nós vamos fazer várias reuniões. A minha companheira Bebel, que é presidente da APEOESP ela mora em, me parece que em São Pedro, aí vizinho de Piracicaba. 

Então, eu quero ver se a gente vai… Inclusive ver, eu estou falando a verdade para você, Paulo, eu quero voltar a almoçar no Mirante, faz tempo que eu não vou. Hoje de manhã quando eu levantei, eu amei uma coisa que eu fiz, eu pedi para a minha companheira colocar a música Rio de Piracicaba para eu me sentir saudade do tempo que eu ia lá, e os companheiros tocavam viola e cantavam Piracicaba. Olha, um abraço para você dois, obrigado pela entrevista, estou à inteira disposição. Quero que vocês saibam que eu tenho uma missão de vida, a minha missão de vida junto com o Alckmin é recuperar esse país, é fazer o povo brasileiro voltar a sorrir, voltar a ter esperança e voltar a acreditar que o Brasil pode ser uma grande nação. Quando nós éramos governo o Brasil chegou a sexta economia do mundo, o Brasil hoje é a décima terceira economia do mundo. Então isso demonstra que o Brasil vai voltar a crescer muito nesse país. E Piracicaba junto, porque Piracicaba é uma cidade que tem um polo industrial poderoso. Então, um abraço a vocês e até a próxima se Deus quiser.

Jairinho Mattos:
Lula, se você me permite um encerramento, eu estou aí colocando de fundo a música que inspirou então o seu pedido à sua esposa. Paulo Marques, nosso técnico, eu disse agora há pouco que hoje foi uma festa da democracia, Lula. A Educadora coloca no ar, sem se importar com o espectro ideológico direita, esquerda. Nós vamos entrevistar médicos, metalúrgicos, militares, mulheres, e hoje eu estou muito feliz porque a Rádio Educadora, que completa 55 anos, junto com Piracicaba. A Rádio Educadora foi fundada no bicentenário de Piracicaba. Piracicaba 255 anos, 1º de agosto, e a Educadora 55. Eu só queria dizer que eu senti no seu semblante aquele Lulinha paz e amor, e pelo que você nos disse aqui, se um dia o PT for afastado do Lula e o Lula afastado do PT, agora parece que o casamento voltou. Muito obrigado Lula. Está aí meus amigos da Educadora, encerrando quase às 13:15 da tarde mais um grande projeto da Rádio Educadora.

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