Leia a íntegra da entrevista de Lula para o portal Uol

Durante 1h35 de conversa, o ex-presidente abordou assuntos como economia, democracia, eleições e ministérios que pretende recriar

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Lula durante entrevista para o portal Uol

No último dia 27 de julho, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva concedeu uma entrevista para jornalistas do portal Uol. Confira abaixo a íntegra da conversa com os colunistas Kennedy Alencar, Alberto Bombig e Carla Araújo.

Luiz Inácio Lula da Silva:
Estou à inteira disposição tua, Kennedy, da Carla e do Bombig para responder todas as perguntas que eu souber responder. A que eu não souber eu devolvo para vocês.

Kennedy Alencar:
Obrigado presidente. Bom dia.

Carla Araújo:
Bom dia, Kennedy. Bom dia, Bombig. Bom dia, presidente, obrigada por receber e atender esse pedido.

Luiz Inácio Lula da Silva:
Bom dia, Carla.

Kennedy Alencar:
Bom dia, Bombig.

Alberto Bombig:
Bom dia, Kennedy. Bom dia, Carla. Bom dia, presidente, obrigado por o senhor ter aceitado esse convite.

Luiz Inácio Lula da Silva:
Bom dia, Bombig.

Kennedy Alencar:
Presidente, o senhor é líder nas pesquisas e caso o senhor vença a eleição presidencial de outubro, eu queria saber quais serão as medidas que o senhor vai tomar nos primeiros 100 dias para gerar rapidamente primeiro emprego e combater a fome e a miséria. Atualmente 33 milhões de brasileiros passam fome, dezenas de milhões passam mal e convivem com uma inflação alta que corrói o poder de compra. Atualmente há um Auxílio Brasil no valor de 600 reais que vai até dezembro, o Ministério da Economia disse que no ano que vem o valor voltará a ser de 400 reais, eu quero saber do senhor, o senhor vai recriar imediatamente o Bolsa Família, pagará 600 reais de maneira contínua, vai recriar o Minha Casa Minha Vida, vai retomar o PAC, que é o programa de aceleração de crescimento com obras em infraestrutura, o que que vai estar nos seus 100 primeiros dias presidente?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Kennedy, na verdade não existe nenhuma possibilidade de eu tentar apresentar a solução do Brasil em 100 dias. Eu nunca fiz isso em nenhum mandato e não vou fazer agora. Veja, eu vou ganhar as eleições, pretendo ganhar as eleições, pretendo disputar da forma mais democrática possível, e ganhando as eleições eu vou governar para quatro anos, eu tenho um programa de governo, nós temos uma diretriz que depois nós vamos conversar sobre ela. E eu pretendo retomar algumas políticas que foram um sucesso. 

O Minha Casa Minha Vida é um programa que precisa ser retomado, ele pode ser aperfeiçoado, mas foi o mais importante programa habitacional feito nesse país, que levava em conta as pessoas que não podiam pagar e a gente subsidiava. Foram contratadas mais de 4 milhões de casas, simplesmente acabou isso, inventou-se uma coisa de Casa Verde Amarela, quando o povo tem que ter liberdade de escolher a cor que ele quiser na sua casa. 

A segunda coisa é a questão do Bolsa Família. O Bolsa Família não era um programa eleitoral, era um programa que permaneceu vivo durante 18 anos, ele tinha condicionantes, a mulher recebia o seu cartão, a mulher tinha que colocar o filho na escola, a mulher tinha que tomar vacina, tinha que dar, fazer uns exames, dar vacina nas crianças, era uma coisa quase que perfeita. Simplesmente mudar de nome foi uma bobagem. Nós vamos retomar o Bolsa Família a 600 reais, obviamente que você tem que levar em conta o número de pessoas por família, não tem que ser igual para todo mundo. 

E nós vamos retomar obras, e eu vou fazer um novo PAC. Eu tenho dito o seguinte, uma das primeiras coisas que eu quero fazer se eu ganhar as eleições e tomar posse é fazer uma reunião com todos os 27 governadores desse país para que a gente faça um levantamento das três principais obras em cada estado, de infraestrutura, envolvendo a questão da Educação, da Saúde, para a gente começar a trabalhar ainda antes do carnaval. Porque não tem muito tempo não, quatro anos em que a gente pretende fazer aquilo que o Juscelino fez, 5 em 50, nós vamos fazer, ou melhor 50 em 5, nós vamos tentar fazer em 40 em 4, porque o Brasil precisa de muita urgência para recuperar o seu emprego e a qualidade de vida do povo.

Alberto Bombig:
Presidente, o senhor já disse que vai recriar o Ministério da Cultura, Igualdade Racial e também disse que criaria um ministério para a questão indígena. Que outros ministérios  o senhor pretende recriar, por exemplo, Esporte, Cidades, Comunicação Social? Vai separar Fazenda e Planejamento? Fala-se também de criar o Ministério da Amazônia, que seria uma coisa inovadora. O senhor já está pensando nisso, como é que está esse desenho da estrutura de governo?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Bombig, tem algumas coisas que você precisa saber da minha boca que eu vou fazer, os ministérios que eu tinha vou recriá-los, Ministério da Igualdade Social, Ministério dos Direitos Humanos, o Ministério da Pesca, eu vou criar os Ministérios das Causas Indígenas nesse país e terá que ter um índio no Ministério, não precisa ser um branco de terno e gravata, pode ser um índio, quem vai tomar conta da FUNAI não precisa ser um advogado, não precisa ser um militar, pode ser um indígena. Eles estão preparados, eles se formaram, eles se prepararam, conhecem o problema deles. Quem vai cuidar da saúde indígena por que não pode ser um indígena formado em Medicina? 

Então, nós vamos fazer aquilo que for necessário porque no nosso mandato a Amazônia ela vai ter um papel especial, não só Amazônia, mas os outros biomas do cerrado, a Mata Atlântica. Por quê? Porque é preciso que a gente leve muito a sério a importância climática no planeta Terra. E o Brasil tem muita responsabilidade, ao invés de ficar brigando a Amazônia é minha, não é minha, é minha, ou seja, a Amazônia tem que ser de todo mundo, embora o Brasil tenha soberania sobre ela a gente pode construir com os cientistas do mundo inteiro, com os governos do mundo inteiro o jeito de pesquisar a Amazônia, explorar todo o seu potencial de desenvolvimento na indústria de fármacos, na indústria de cosméticos e outro tipo de indústria, para que a gente gere emprego para as pessoas que trabalham na Amazônia porque são mais de 25 milhões de pessoas. Então, nós vamos criar os ministérios que forem necessários criar. Eu acho que é uma bobagem, uma bobagem a gente imaginar que ministério custa muito. Na verdade, se a gente for ver as agências reguladoras custam mais do que os ministros. Muito mais.

Kennedy Alencar:
As Cidades e os Esportes o senhor vai recriar, e Fazenda e Planejamento vão ficar separadas ou vai ficar Ministério da Economia?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Veja, eu não posso dizer tudo o que vai acontecer, mas obviamente que um país do tamanho do Brasil não pode deixar de ter um Ministério do Planejamento, esse país tem que ser planejado de curto, de médio e de longo prazo, esse país tem que ter uma prateleira de projetos feito pela Ministério do Planejamento. Esse país tem uma costa marítima extraordinária, nós temos que levar muito a sério as nossas empresas de navegação. Nós temos que ter uma indústria naval poderosa nesse país.  

Então nós vamos criar aqueles ministérios que forem necessários, porque quando você coloca uma coisa importante como a cultura, que já foi do Ministério do Esporte, que já foi do Ministério da Educação, que agora é do Ministério não sei das quantas, quando você coloca uma coisa importante num lugar secundário é porque você não está dando importância. Então a cultura vai ser uma coisa muito importante. Muito importante. Além de criar o Ministério, nós vamos criar Comitês Estaduais de Cultura para ver se a gente consegue nacionalizar a cultura nesse país, para ver se a gente começa a mostrar o que acontece do ponto de vista cultural em Roraima, no Amapá, no Amazonas, no Pará, no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, no interior de São Paulo, no interior do Rio Grande do Sul. 

É preciso que a gente dê à cultura uma compreensão inclusive de uma indústria geradora de milhões de empregos nesse país. É preciso tratar isso com muito carinho porque a riqueza cultural do Brasil é excepcional. É só andar o Brasil para a gente conhecer o que é a riqueza cultural. Acho que poucos países no mundo têm a riqueza cultural que tem o Brasil, e é preciso fazer com que isso aflore e que o povo possa ter conhecimento das coisas boas que o Brasil tem. Chega de coisa ruim na televisão, é preciso colocar coisas boas. 

Carla Araújo:
Presidente, em relação ao Ministério da Economia, o senhor e o PT evitam falar em nomes ainda, futuros nomes. Mas o senhor tem na sua cabeça já, em relação ao Ministério da Economia e do Planejamento, que o senhor disse que vai precisar, que tipo de perfil o senhor quer, um perfil mais técnico ou um perfil mais político, com interlocução com o Congresso?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Carla, eu nunca, em nenhuma eleição que eu disputei eu discuti a questão de Ministério antes. Em 89, por exemplo, você era muito nova, não devia ter acompanhado isso, as pessoas queriam que eu anunciasse o Ministério antes, é como imaginar que o Tite vai escalar a seleção antes de começar a Copa do Mundo. Não é possível você fazer isso porque você arruma mais inimigos do que amigos. Os meus ministros serão as pessoas mais competentes para cada atividade. Obviamente…

Kennedy Alencar:
Eu sei, presidente, mas o perfil, ninguém está pedindo o nome do ministro da fazenda. Mas eu lembro que em 2002 se falava muito que ia ser o empresário Eugênio Staub e na hora H o senhor indicou o Antônio Palocci, que tinha trânsito com o Congresso. A Carla está perguntando o perfil, o seu ministro da fazenda, por exemplo, é mais importante ele ser um economista, um técnico, ou ele ter trânsito político no Congresso? A gente vê que o Guedes não tem nenhum, por exemplo, a importância disso, é o perfil, presidente, do ministro da fazenda, sem o nome.

Luiz Inácio Lula da Silva:
Kennedy, você sabe que a ansiedade, a pressa não ajuda. Eu ia responder essa pergunta que a Carla fez.

Kennedy Alencar:
Então responda.

Luiz Inácio Lula da Silva:
Eu ia responder o perfil das pessoas, porque eu quero sempre a pessoa com o perfil, com uma cabeça política. Ele pode ser advogado, ele pode ser médico, ele pode ser empresário, ele pode ser catador de material reciclável, o que eu quero é que ele tenha a cabeça política. Se ele pensar politicamente correto, se ele tiver bastante versatilidade política, esse cara pode ser um ministro da Economia e ele pode ser economista. O que eu não quero é fazer um governo burocrata, o que eu não quero é fazer um governo só de técnico porque se técnico resolvesse os problemas, eu ia na USP pegaria todos os técnicos e colocaria no governo. Eu ia em Harvard buscar os maiores especialistas. 

Quem tem que dirigir é a política e por isso que eu, todos os meus ministros terão que ter cabeça política, se ele tiver cabeça política boa ele monta a equipe com os melhores técnicos do mundo, com os melhores assessores e tudo vai ser uma maravilha nesse país. Eu quero que vocês saibam que eu estou voltando a disputar uma eleição nesse país porque eu tenho confiança e tenho certeza que nós vamos recuperar esse país, fazer ele voltar a crescer, a gerar emprego, a distribuir renda, a investir na cultura, na educação, porque é disso que o Brasil precisa e é isso que nós vamos fazer, eu e o Geraldo Alckmin.

Kennedy Alencar:
Presidente, o senhor vai retomar a política de correção do salário-mínimo acima da inflação com o reajuste real?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Vai acontecer. Vai acontecer, é importante que o Brasil saiba que nós conseguimos uma proeza extraordinária. Antes de eu ser presidente na década de 80 se dizia que não podia aumentar o salário-mínimo porque causava inflação. Nós aumentamos o salário-mínimo em 74% no meu governo, e não houve aumento da inflação. A inflação que era 10,5% chegou a 4,5% dentro da meta durante muito tempo, e nós vamos continuar do mesmo jeito. A inflação será reposta para o salário-mínimo e todo trabalhador terá direito à reposição inflacionária e todo trabalhador vai ter o aumento com relação ao PIB. O PIB só tem interesse ele crescer para a gente distribuir, distribuir a riqueza é distribuir o PIB. Se o PIB cresce e a gente não distribui, ou seja, só alguns vão ficar mais ricos e o povo vai continuar ficando pobre. Então, nós temos que saber que muita gente recebe o salário-mínimo e que ele vai ter aumento com relação ao aumento do PIB. 

Alberto Bombig:
Presidente, o senhor vai instituir alguma regra para substituir o teto de gastos? Por exemplo, vai ter uma meta de superávit primário, e se houver, o que seria excluído dessa meta seria considerado investimento, sei lá, Saúde, Educação, infraestrutura? Como é que o senhor está planejando isso?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Bombig, eu tenho a sorte de ter ao meu favor o meu mandato. Só para você saber Bombig, de todos os países que participavam do G20, o Brasil foi o único país que fez superávit primário todo ano. Você está lembrado que em 2004 eu aumentei o superavit para 4,35%, até muita gente saiu do PT porque eu mantive o superávit primário. Mas veja, eu não preciso de lei de teto de gastos, quando você faz uma  Lei de Teto de Gastos é porque você é irresponsável, porque você não confia em você, porque você não confia no seu taco, porque você não tem segurança no que precisa fazer. Quem é que obrigou o governo a fazer o teto de gastos? Foi a Faria Lima, foi o sistema financeiro que queria garantir o seu, sem se importar que o povo tem direito a uma parte, sem se importar que você quando coloca um teto de gatos você tem que colocar investimento para a saúde, investimento para acabar com a fome, para gerar emprego, para aumentar salário, para melhorar as coisas nesse país? Então eu não preciso de teto de gastos. Eu digo sempre o seguinte, o Brasil precisa…

Kennedy Alencar:
Presidente, o argumento era controlar a expansão dos gastos públicos, acabou comprimindo os gastos sociais. Alguma regra terá? Vai ter meta de superávit primário?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Só um dado, Kennedy, só um dado, um dado. Esse país não precisa de teto de gastos, esse país precisa de um governo que tenha credibilidade, que garanta a estabilidade e que tenha previsibilidade. E isso eu e o Alckmin vamos fazer com muita competência, vamos fazer com muita competência. Eu sei, aprendi, eu digo sempre, eu digo desde 89, eu aprendi economia como uma mulher analfabeta que pegava o meu holerite de pagamento para distribuir as coisas dentro de casa, para saber o que pagar, o que cada filho ficava. Eu sei que eu não posso gastar mais do que eu tenho, eu sei que eu não posso gastar mais do que arrecado, se eu tiver que gastar eu tenho que fazer uma dívida em algum ativo que seja produtivo que me garanta uma certa rentabilidade. Eu não posso gastar para custeio aquilo que eu não tenho.

Kennedy Alencar:
Mas o Bombig perguntou, por exemplo, se gasto com Educação e Saúde e infraestrutura vai ser excluído de uma meta de superávit primário, por exemplo. O senhor considera isso investimento? O que vai fazer?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Então escuta o que eu vou falar, para quem sabe ninguém nunca mais me perguntar. Educação e Saúde, investimento em Ciência e Tecnologia não é gasto na minha concepção, é investimento. É investimento, formar um engenheiro é tão importante quanto emprestar dinheiro para uma empresa com juros baixos e com dez anos de carência. Formar um médico, formar um pesquisador é muito importante para esse país. O que nós precisamos, companheiros da imprensa, é parar de discutir quanto nós vamos gastar e nós temos que nos perguntar uma coisa que eu falava em 89, nós precisamos parar de perguntar se é gasto ou se não é gasto e começar a responder quanto custou a esse país não fazer as coisas na hora certa. 

Quanto custou a esse país não investir na Educação no começo do século passado, quanto custou a esse país não investir na Saúde no momento certo, quanto custou a esse país não melhorar a vida do povo trabalhador no momento que todo mundo melhorou. Então esse país ficou sempre para trás, ele foi o último a abolir a escravidão, o último a ter independência, foi o último a ter a universidade. Kennedy, eu já te falei isso, o Peru teve a sua primeira universidade em 1554, o Brasil só foi ter a sua primeira universidade em 1920, e não é porque estavam preocupados em criar a universidade, era porque o rei da Bélgica vinha visitar o Brasil e o rei para visitar o Brasil tinha que receber um título de doutor honoris causa, e precisava ter universidade. Aí juntou-se um monte de universidade e criou a Universidade do Brasil. 

Então, como é que se explica esse país sempre fazer as coisas depois que os outros fazem? Como é que se explica a Argentina ter quase 40% dos jovens dos 19 aos 24 anos na universidade? Como é que se explica o Chile ter quase 40%? E o Brasil somente no nosso governo é que chegou a 17%, porque era menos que 11%. Como é que se explica um país desse tamanho aqui, quando eu cheguei na presidência tinha só 3,5 milhões de alunos na universidade, nós chegamos a 8 em oito anos, ou melhor, em treze anos. Ora, como é que se explica as pessoas não garantirem investimento na Educação nesse país, e isso não é gasto, é investimento, porque a gente tem um retorno depois que a pessoa se volta, não só porque a pessoa pode pagar, mas porque a pessoa vai produzir coisas mais qualificadas para esse país, e esse país vai ser mais competitivo com outros países a nível internacional. Eu quero pensar no Brasil do século 22 e eu quero começar ele no século 21.

Carla Araújo:
Presidente, em relação à Petrobras, eu queria saber como é que o senhor está pensando, o senhor já falou de mudança na política de preços da Petrobras, queria saber exatamente o que o senhor está pensando em relação a isso e qual que é a sua avaliação em relação a Lei das Estatais, que foi criada aí para evitar nomeações políticas? O presidente Jair Bolsonaro fez trocas no comando da Petrobras. O senhor acha que é o presidente da Petrobras tem que estar alinhado ao governo ou ele tem que ter um perfil técnico e independente?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Olha, o presidente da Petrobras tem que ser uma pessoa competente. Eu tenho muito orgulho de ter tido o José Eduardo Dutra presidente da Petrobras, e tenho muito orgulho de ter tido o presidente Sérgio Gabrielli como presidente da Petrobras. É importante lembrar que o Sérgio Gabrielli, quando era diretor financeiro da Petrobras, foi dois anos seguidos eleito o melhor diretor financeiro de indústria de petroleiras do mundo. É importante lembrar que foi no governo dessa gente que nós descobrimos o pré-sal, e o pré-sal não foi sorte não, o pré-sal foi investimento em pesquisa, o pré-sal foi um desafio que nós nos colocamos para tentar fazer com que o Brasil fosse definitivamente autossuficiente. 

E quando nós encontramos a mais importante jazida de petróleo no século 21 nós resolvemos destruir a Petrobras, privatizar a BR, privatizar gasoduto, vender refinaria. E hoje, um país que poderia ser a sexta economia mundial, que hoje é a décima terceira, um país que é autossuficiente em petróleo e que poderia estar exportando derivado, não tem capacidade de refinar a quantidade de consumo que nós precisamos. O Brasil hoje só tem capacidade de refinar menos de 80% daquilo que a gente consome. É uma vergonha. É uma vergonha, esse país precisa ter orgulho de ser grande, esse país precisa saber que ele não é uma república de banana, esse é um país que pode ser um país importante no mundo, ele pode estar no mesmo patamar da China, ele pode estar no mesmo patamar dos Estados Unidos, da Alemanha, nós somos grandes. O que nós não podemos é pensar pequeno, tacanha, achar que a gente tem que vender as coisas porque o Estado não tem competência para nada. 

Carla Araújo:
Mas aí o senhor pretende mudar a política de preços, abandonar essa questão de preços internacionais?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Carla, presta atenção, eu pretendo mudar a política de preços da Petrobras. Eu pretendo fazer com que o preço da Petrobras seja em função dos custos nacionais, dos gastos nacionais, porque nós produzimos em real, pagamos salário em real. Ou seja, essa história de PPI, essa história de internacionalizar o preço, na verdade é para agradar aos acionistas em detrimento de 215 milhões de brasileiros. E a gente pode reduzir o preço sim, o presidente não teve coragem, não teve coragem porque depois que eles privatizaram a BR surgiram 392 empresas importadoras de derivados de petróleo. 392 que estão importando dos Estados Unidos, em dólar. Então, ele não pode mexer no preço, porque ele está comprometido com a privatização, ele está comprometido com 392 empresas. 

O seu Guedes vive dizendo que é preciso dar de graça a Petrobras, vender, porque o petróleo não vai fazer mais nada. Enquanto os países ricos estão fazendo estoque de petróleo. Aquele estado em que o petróleo ainda será estratégico por muito tempo. Então é uma pena, eu se ganhar as eleições nós vamos voltar, vamos fazer refinaria nesse país, esse país vai ser autossuficiente, vamos restabelecer o royalties e 75% ficar para a Educação, Saúde e Ciências e Tecnologia, e vamos fazer a Petrobras ser se não a primeira, a segunda empresa petroleira do mundo. Nós temos condições para isso. 

Então, o dirigente da Petrobrás é indicado por um Conselho, um Conselho que elege. Você falam e às vezes esquecem que no Conselho quando eu era presidente estava o Roger Agnelli, estava o Gerdau, estava o Fábio Barbosa representando os bancos, tinha gente de toda a sociedade brasileira, tinha a representação dos acionistas minoritários. Ora, então isso nós vamos repor outra vez, a Petrobras vai voltar a ser mais do que uma empresa de petróleo, a Petrobras é uma empresa de energia, a Petrobras quando nós aprovamos a indústria naval e as plataformas, que a Petrobras tinha que contratar 60% de componentes de indústria nacional, é porque a gente queria ter política industrial e desenvolver uma grande indústria nesse país. Lamentavelmente tudo foi destruído.

Kennedy Alencar:
Pois é, presidente, o senhor vai pegar um país, se eleito, bem, com bastante dificuldade na economia. As reservas cambiais hoje elas estão aí na faixa de uns 360, 370 bilhões de dólares, elas são importantes para o país resistir à crise internacional. Há gente no PT que defende usar uma parcela dessas reservas para um programa de infraestrutura para o PIB voltar a crescer e diminuir a dívida pública. Qual é a sua visão sobre as reservas cambiais, elas podem ser utilizadas em parte para um programa desse tipo ou o senhor não vai por esse caminho?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Kennedy, esse pernambucano que está falando com você foi um cara que tornou obsessão ter reserva internacional. Eu fui à Índia em 2005 e quando eu cheguei na Índia, a Índia tinha anunciado que ela tinha concluído 100 bilhões de dólares de reservas, e eu fiquei pensando porque o Brasil não faz reserva, porque o Brasil não constrói um colchão de segurança para que a gente não fique vulnerável. Então eu fiz 370 bilhões que tem aí, isso foi obra do nosso governo em 2005, 2006 e continuou com a Dilma a partir de 2010. Eu não pretendo mexer nesse dinheiro. 

Eu já peguei o Brasil pior do que está hoje, ou melhor, pior não, a inflação estava mais alta do que está hoje, o desemprego estava 12%, o juros estava 24,9% quando eu peguei o Brasil. E o que aconteceu com o Brasil? A dívida que era 60% caiu para 39%, vocês se lembram disso, o PIB que era 0 cresceu em média 4.7%, vocês se lembram disso, sem precisar mexer nas nossas reservas. Sem precisar mexer. Esse país tem dinheiro e é preciso cutucar, é preciso a gente furuncar esse dinheiro porque a gente pode arrumar o dinheiro e fazer com que a gente faça as coisas que o Brasil precisa. 

Eu, obviamente que eu não vou dizer o que é que eu vou fazer, como é que eu vou fazer. Mas eu quero querido, você como é um jornalista competente, novo, como o Bombig é muito novo, e a Carla, vocês se preparem porque vocês vão ter surpresa no que nós vamos fazer nesse país para esse país retomar o crescimento, gerar indústrias novas, gerar emprego, gerar aumento de salário, melhorar a Educação, melhorar a Saúde e vocês voltarem a ter orgulho de ser brasileiro. Quando vocês viajarem vão poder mostrar o passaporte de vocês com muito orgulho e quem vai pegar o passaporte de vocês vai falar: bem-vindo brasileiros. Nós vamos recuperar isso, pode ter certeza, que eu tenho na cabeça cada coisa que eu quero fazer, e se eu não tivesse certeza do que eu vou fazer eu não estaria concorrendo à presidência da República.

Alberto Bombig: 

Presidente, ainda nesse bloco econômico, como é que o senhor está pensando o papel dos bancos públicos? Pode ser mais na linha do que foi o governo Dilma, dos compões nacionais, ou o senhor pretende voltar ele para o micro, para o médio, qual a visão do senhor para os bancos públicos?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Bombig, você poderia ao invés de perguntar se os bancos iam ser como foi no governo da Dilma, você poderia perguntar se ele seria como foi no meu governo. Você sabe que quando houve a crise do Lehman Brothers em 2008, você sabe que eu liguei para o Obama perguntando para o Obama se ele tinha banco público, se ele tinha um BNDES, se ele tinha uma Caixa Econômica e ele não tinha. E ele disse: aqui não pode criar isso. E quem foi que salvou a economia brasileira? Foram os bancos públicos. Foram os bancos públicos, foram os bancos públicos que entraram para poder salvar a economia brasileira. 

Ou seja, quando a coisa está feia quem resolve é o Estado, quando a coisa está boa todo mundo fala em mercado, mercado, mercado. Quando quebrou o Lehman Brothers quem foi que salvou a economia? O Estado. Houve uma intervenção bruta do Estado que gastou trilhões de dólares para recuperar a economia americana e a economia mundial. Ora, aqui no Brasil, se não fosse o BNDES, o Banco do Brasil, a Caixa Econômica, o BNB e o Basa, a gente não teria recuperado. Então quando os bancos privados não querem emprestar dinheiro, o BNDES está aí para emprestar. Para emprestar e a gente inclusive baixar a taxa de juros, fazer empréstimo de longo prazo. 

Hoje eu quero mudar o perfil do BNDES, Bombig, hoje eu quero fazer com que o BNDES seja um emprestador de dinheiro para pequenos e médios empreendedores, não apenas emprestar dinheiro para grandes empresas, mas emprestar para pequenas e médias empresas, para pequenos e médios empreendedores para que a gente possa dinamizar muito, muito, muito a economia brasileira. Eu estou voltando a governar esse país com uma sede imensa de fomentar a criação de cooperativas, todo tipo de cooperativa que as pessoas quiserem criar, que as pessoas tiverem interesse de criar, vou facilitar criar porque a gente não pode ficar dependendo de ninguém na economia. 

Todo mundo vai ter que se mexer. É por isso Bombig, que nós estamos fazendo um programa, diretrizes básicas para programa de governo, e colocamos na internet. Já tem 15 mil contribuições, nós agora vamos pegar uma equipe da Fundação Perseu Abramo, vamos sistematizar isso, e quando eu tomar posse se preparem, porque eu vou discutir muito com a sociedade brasileira. Eu vou voltar a fazer conferências nacionais para discutir reforma tributária, por exemplo. Vocês entrevistam muita gente e todo mundo fala de reforma tributária, de reforma tributária, de reforma tributária, mas ela não sai.

Alberto Bombig:
Isso é uma lenda, presidente ninguém faz. Isso ninguém faz, o senhor tem razão, virou uma lenda.

Luiz Inácio Lula da Silva:
Então, mas deixa eu te contar Bombig. Se você está lembrado, em 2007 eu dei entrada numa proposta de política tributária que foi aprovada por 27 governadores, foi aprovada pelas centrais sindicais, foi aprovada pelas confederações e foi aprovada pela liderança do Congresso. O Serra era governador de São Paulo, quando eu dei entrada o Serra virou contra. Mas ele era favorável à proposta de reforma. Então eu vou repetir outra vez, eu vou convidar os empresários, vou convidar os trabalhadores, vou convidar os políticos e nós vamos tentar fazer uma proposta de política tributária definitiva nesse país onde o rico paga um pouco mais e o pobre paga um pouco menos. Uma política tributária que ela pode ser pode ser diminuída, pode ser alguma coisa que a gente consiga diminuir a quantidade de impostos, que a gente diminua a burocratização, mas que a gente faça com que as pessoas paguem sobre lucros e dividendos para que a gente não permita que um cara que compre um quilo de feijão pague o mesmo imposto que paga o Roberto Setúbal, ou que paga o Lula, ou que paga você. É preciso que a gente faça uma política tributária em que o rico paga mais e o pobre paga menos, é isso que eu quero.

Carla Araújo:
Presidente, o governo Bolsonaro agora, o Ministério da Economia reviu um pouco das projeções de déficit e está falando até em superávit, antecipando aí alguns dividendos das estatais de 2023 para 2022. Eu queria saber o que o senhor acha dessa manobra, e se o senhor acha que a equipe do Paulo Guedes está fazendo aí uma contabilidade criativa, uma maquiagem nas contas.

Luiz Inácio Lula da Silva:
Eu sinceramente, Carla, fico vendo o que o Paulo Guedes está fazendo nessa economia e eu fico assustado, porque as pessoas falam em teto de gastos e ele faz o que ele fez com os precatórios, ele faz o que ele fez agora, ele criou uma PEC de emergência, criou uma PEC para poder fazer um benefício eleitoreiro de quatro meses. Você não precisa utilizar o povo como massa de manobra porque o povo está com fome, pode ser um programa feito de forma permanente. Ele fez até dezembro, e agora percebeu a bobagem que fez e já está falando nos comícios: não, eu vou deixar, depois de dezembro vai ser, vai ter fixo. Mas a lei que ele fez é só até dezembro. O que nós precisamos na verdade, Carla, é fazer uma grande política de crescimento econômico, nós temos que fomentar, que incentivar, e aí é que tem o papel do Estado, porque se o Estado não entrar com dinheiro sendo indutor do desenvolvimento ele convence a empresa privada a fazer e ele convence o mercado externo investir aqui. 

Quem é que vai investir aqui hoje, Bombig, Carla e Kennedy? Qual é o investidor estrangeiro que com um presidente maluco desse vem fazer investimento aqui? Ora, e vocês sabem da credibilidade que nós conquistamos no nosso governo lá fora, o Alckmin sabe que nós íamos viajar o mundo ainda. Nós vamos para a China, para a Rússia que está em guerra nós não vamos agora não, nós vamos para a China, nós vamos para os Estados Unidos, para a Alemanha, para a França, para a Itália, vamos para tudo quanto é lugar, tentar convencer as pessoas de que vale a pena investir nesse país. Porque esse país tem mercado, esse país tem 215 milhões de habitantes, esse país tem estabilidade, esse país tem credibilidade, esse país tem previsibilidade, e quando a gente fizer isso, a gente vai conseguir fazer com que as pessoas venham para cá não para comprar os nossos ativos já existentes, mas para fazer coisas novas, indústrias novas. É isso que vai acontecer no Brasil. E eu quero que você todo ano Kennedy me convoque para uma entrevista pelo UOL, todo ano, para a gente discutir o Brasil.

Kennedy Alencar:
Já está convidado, já está convocado para a primeira entrevista quando for eleito presidente da República. 

Luiz Inácio Lula da Silva:
Está garantido.

Kennedy Alencar:
Então beleza, compromisso. Vamos mudar um pouco de assunto, falar um pouco de democracia. A Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, da USP, criou uma Carta em Defesa da Democracia, que é um manifesto para repudiar esses ataques que o Bolsonaro faz à urna eletrônica. O presidente da República mente dizendo que o sistema eleitoral não é confiável, e a gente sabe que ele é confiável. O manifesto tem a adesão da direção da FIESP, do Josué Alencar, filho do José Alencar, que foi vice do senhor, o Horácio Lafer Piva falou, está endossando, um grupo de advogados, o Prerrogativas, que apoiam o senhor, da Faculdade de Direito da USP estão pensando num ato no dia 11 para uma espécie de Carta ao Povo Brasileiro. Então relativo à democracia, eu quero saber se o senhor vai lançar algum tipo de carta ao povo brasileiro nesse sentido da questão democrática. O Marcos Nobre, cientista político, deu uma entrevista aqui para nós no UOL dizendo que o senhor deveria ser um líder em defesa de um impacto da democracia porque o senhor lidera as pesquisas, é o favorito, e que é preciso que a sociedade como um todo diga que não vai aceitar o golpismo. O senhor pretende, presidente, propor algum tipo de pacto, o senhor? Ou o senhor acha que é algo que tem que ficar aí a cargo da sociedade civil como o Manifesto da USP, do Prerrogativas, dos empresários?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Olha, primeiro, eu fico feliz pela existência de milhares e milhares de brasileiros se propondo a assinar o Manifesto a favor da democracia. Eu fiquei muito feliz com essa iniciativa da USP, eu lembro muito bem o que aconteceu com o Alfredo Civitelli em 1977, eu assisti à leitura daquela carta, e eu acho que esse movimento na USP é extraordinário. Eu acho que se o Prerrogativa fizesse também é extraordinário. Eu não sei se cabe a mim fazer uma carta, porque aí essa carta ao povo brasileiro já fica sob suspeita, só porque eu sou candidato. Mas deixa eu te dizer uma coisa, eu estou convencido de que todos os brasileiros, homens e mulheres, precisam brigar muito para que a gente mantenha a consolidação do processo democrático neste país. 

A democracia é a única forma política que a gente pode garantir liberdade de ir e vir para as pessoas, liberdade de expressão, liberdade de comunicação, liberdade de pensamento, ou seja, a gente não pode permitir que uma mentira causada por um bronco, causada por um bronco que todo dia conta seis ou sete mentiras através da sua live, tenha força nesse país. Então eu estou muito feliz, eu estou obviamente totalmente de acordo, feliz porque os intelectuais e os empresários resolveram se mexer, porque também nos anos 80 foi assim, nos anos 70, e eu acho que a gente vai consolidar a democracia e a gente não pode colocar em suspeição uma coisa que não merece suspeição. Um cidadão que foi eleito, não tem um vereador, um prefeito, um deputado estadual, federal, um governador que coloca em suspeição a urna, só esse bronco, que ganhou pela urna eletrônica, é que está tentando copiar o Trump, tentando desafiar a lógica da democracia. Eu estou favorável e qualquer coisa que foi feito para garantir a democracia pode saber que eu estarei dentro.

Carla Araújo:

Presidente, agora durante o lançamento da candidatura, o presidente Jair Bolsonaro convocou aí manifestações para o 07 de Setembro contra os surdos da toga, em referência ao Supremo Tribunal Federal. O senhor acredita que ele pode tentar um golpe caso ele não vença as eleições? E aí o que o senhor acha e como reagiriam as Forças Armadas caso o presidente tente um golpe, o senhor acredita que ele teria chances de sucesso nessa tentativa?

Luiz Inácio Lula da Silva:

Carla, a primeira coisa que eu queria te dizer era que eu sonhei muito com esse 2022. Eu quando era presidente da República, na Secretaria de Assuntos Estratégicos, eu estava pensando em preparar um documento para garantir o Brasil que a gente iria ter em 2022, quando a gente completasse 200 anos de independência. O presidente que aí está, se tivesse o mínimo de bom senso, se tivesse o mínimo, o mínimo de inteligência, ele estaria promovendo um 22 de setembro uma grande festa cívica de comemoração aos 200 anos de independência. Avaliar o que foi feito nesses 200 anos e saber o que nós queremos daqui para frente. 

Não, ele quer transformar os 200 anos num ato dele, ele quer fazer uma motociata, quem sabe com uma estátua de Tiradentes, ele quer brincar com a data mais nobre que nós temos nesse país. É lamentável que seja assim. Ele não vai ter sucesso porque o povo sabe que a independência não é dele, o povo sabe que a independência não é uma coisa dos militares, a independência é uma conquista da sociedade civil brasileira. A independência é uma coisa séria para todo mundo. É uma pena que os militares se apoderaram e a festa é quase toda militar, mas a independência é uma coisa da sociedade civil. Então, o que eu acho é que ele vai tentar fazer tudo o que ele quiser fazer. 

Eu acho que é importante ter em conta que os militares são mais responsáveis do que o Bolsonaro. Eu convivi com os militares e eu posso te dizer que eu não tenho queixa do comportamento das Forças Armadas, nem da Marinha, nem do Exército, nem da Aeronáutica. Ou seja, eu mantive oito anos de convivência da forma mais digna possível, eles nunca me criaram um único problema, eles ajudaram naquilo que era possível ajudar. Quando eu cheguei na presidência em 2003, Carla, o Exército liberava os soldados às 11:30 porque não tinha dinheiro para dar o almoço. 

Eu não só garanti que ficasse o dia inteiro para dar o almoço como eu garanti um curso para fazer o soldado cidadão, para ele fazer um curso no SENAI, como compramos inclusive fardas novas e coturnos para as Forças Armadas. A Aeronáutica não tinha mais nem avião, a Aeronáutica estava um frangalha, o avião presidencial chamava sucata, sucatão, e os outros eram sucatinha, não tinha mais avião. Eu peguei 20 e poucos aviões da Rio Sul e dei para a Aeronáutica, que não é possível um país que é o maior país da América Latina não ter sequer avião. Eu fui visitar o Barão de Tefé lá na Antártica, eu fiquei com vergonha do tamanho do nosso navio, quase que não cabe o pesquisador dentro do laboratório. Eu falei para o almirante: vamos comprar um navio decente e ele comprou. 

Então as Forças Armadas não criam caso. Eu tenho certeza que essas bobagens que o Bolsonaro fala não tem o apoio dos militares da ativa. Não tem apoio do alto comando. Embora o presidente da República seja o chefe supremo, ele só pode ser considerado o chefe supremo quando ele sério, quando ele fala coisa com coisa, quando ele respeita a sociedade, respeita as instituições, respeita a democracia, respeita as próprias Forças Armadas. De vez em quando ele fala “o meu Exército, as minhas Forças Armadas”. Não é dele coisa nenhuma, ele é um cidadão que foi expulso, ele foi expulso do Exército por má conduta. Então, como é que a gente pode pensar em golpe? Eu não acredito em golpe, não acredito que as Forças Armadas aceitem isso, não acredito que a sociedade brasileira permita. Não acredito, sinceramente esse cidadão, se ele começar a brincar com a democracia, ele vai pagar um preço muito caro. Até porque esse cidadão anda fazendo um decreto de sigilo de 100 anos. Eu não conheço na história desse país em nenhum momento alguém fazer um decreto de 100 anos para proteger os seus familiares, para proteger os ministros.

Kennedy Alencar:
O senhor vai revogar esse sigilo de 100 anos?

Luiz Inácio Lula da Silva:
É lógico que tem que revogar, Kennedy, não é possível. Não é possível a gente permitir. Ontem eu ouvi dizer que tem gente dele lá no Congresso que estão pensando uma PEC para garantir que nenhum presidente pode ser preso. Ora, o que esse cidadão…

Kennedy Alencar:
E do senador vitalício, o senador vitalício, o que o senhor acha disso?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Eu sou contra. Eu sou contra. O senador tem que ser eleito. Eu sou contra inclusive a figura do suplente. Eu sou contra, porque tem cara que coloca o tio, o sobrinho, o parente, o cunhado, não é possível, isso não é sério. Quem ficou em segundo colocado é o substituto dele, acabou. Ou convoca outra eleição. É tão simples.

Alberto Bombig:
Presidente, só para encerrar esse pedaço, o senhor é favorável a, por exemplo, ter um militar na frente do Ministério da Defesa como tem o Bolsonaro, ou o senhor acha que tem que ser comandado por um civil, como era no seu governo? Qual a visão que o senhor tem disso em tese e na prática, como o senhor está vendo a atuação do atual ministro da defesa?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Eu vou te contar uma coisa bem séria, primeiro, eu sou favorável a um civil como ministro da Defesa. Muito claro. Segundo, eu quando era presidente conversei várias vezes com os meus comandantes e eles diziam para mim; presidente, não é prudente colocar um militar no Ministério da Defesa, porque não é possível uma força mandar na outra. Se você coloca o Exército, a Marinha e a Aeronáutica fica chateada, se coloca a Aeronáutica o Exército e a Marinha fica, se coloca a Marinha, a Aeronáutica e o Exército… sabe? E por isso, lógico, conquistamos a indicação do ministro da Defesa, está dentro, para colocar gente da sociedade civil. E pode ficar certo que será um ministro da sociedade civil, não será um militar.

Carla Araújo:
Em relação ao Paulo Sérgio, presidente, o que o senhor tem achado da conduta do ministro da Defesa atualmente?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Olha, eu não tenho acompanhado, eu só acho que o Brasil é tão grande, e o Brasil pode ser tão importante, veja, um ministro da defesa e as nossas Forças Armadas tem oito milhões e meio de quilômetros quadrados para cuidar, tem quase 16 mil quilômetros de fronteira seca, tem mais oito mil quilômetros de fronteira marítima, tem, a Floresta Amazônica toda, tem cinco biomas para cuidar, tem as nossas riquezas de solo e subsolo para cuidar, tem 12% de água doce do mundo, essas são riquezas além da sociedade brasileira que as Forças Armadas tem que cuidar de forma soberana. E as Forças Armadas têm que estar bem preparadas, bem armadas, bem treinadas porque elas precisam defender o Brasil contra possíveis inimigos externos. 

Kennedy Alencar:
Mas o ministro da Defesa quer cuidar de urna eletrônica. Ele tem, as Forças Armadas têm que se meter no processo eleitoral?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Olha, eu vou dizer uma coisa que eu disse para o senador Jacques Wagner e para o senador Humberto Costa, era preciso que eles fizessem um discurso para dizer em alto e bom som que as Forças Armadas não tinham que ficar dando palpite sobre urna. Urna é uma questão da sociedade civil, é uma questão do Congresso Nacional, é uma questão dos partidos e uma questão da lei, da Justiça Eleitoral. Ora gente do céu, não é possível que com a quantidade de responsabilidade que nós temos que ter com o tráfico de armas das nossas fronteiras, com o tráfico de drogas na nossa fronteira,  a gente ter um ministro da Defesa preocupado com urna eletrônica porque o presidente está preocupado. Não. Está errado. Está errado. Discutir a urna eletrônica é uma questão da sociedade civil, uma questão dos partidos políticos, uma questão dos políticos e uma questão da Justiça Eleitoral, é assim que deve ser, e o Ministério da Defesa está preocupado em organizar as nossas tropas para elas bem defenderem o Brasil quando o Brasil precisar.

Carla Araújo:
Presidente, é que nesse caso os militares, o Ministério da Defesa argumenta que foram convidados pelo TSE para participar desse processo. O senhor acha que foi um erro do TSE convidar? E aí, emendando nessa questão do Judiciário, tanto da Justiça Eleitoral como do STF, que avaliação o senhor faz aí do STF atualmente, o presidente Bolsonaro antagoniza muito, mas parte da sociedade civil também critica o STF. O  senhor acha que o STF está politizado? Como é que o senhor faz essa avaliação da Justiça Eleitoral e do Supremo?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Veja, eu acho que a politização do STF é culpa do político, ou seja, a classe política ela judicializou muito a política. Qualquer coisinha as pessoas entram com recurso na Suprema Corte. Ou seja, tem coisa que tem que ser resolvida no plenário da Câmara e aprovado no plenário da Câmara, as pessoas não podem ficar recorrendo toda hora para a Justiça. Então, eu acho que o Poder Judiciário tem um papel, sobretudo a Suprema Corte, é aquilo que a gente chama de guardiã da Constituição Brasileira. O que é um papel nobre e excepcional. Eu acho que nós precisamos voltar à normalidade, o Poder Executivo governa, o Poder Legislativo legisla e o Poder Judiciário julga. É isso que nós queremos. Acontece que hoje o presidente da República não controla nem o orçamento da União, quem controla o orçamento é a Câmara dos Deputados, e um relator de um orçamento secreto que é a excrescência da política brasileira. Eu não deveria estar falando isso, Kennedy, porque o deputado está vendo: ah, o Lula está xingando o orçamento secreto.

Kennedy Alencar:
É, e o senhor vai ter que se relacionar com o centrão, se for eleito vai ter que se relacionar com o  centrão.

Luiz Inácio Lula da Silva:
O orçamento secreto é excrescência da política brasileira. Não é sério, não é sério. Até porque se você quer saber uma coisa séria não tem que ser secreta. Não precisa ser secreta. O relator tem mais poder que o ministro, o relator tem mais poder que o presidente da República, aonde é que isso aconteceu desde que o Brasil teve a Proclamação da República? Em nenhum momento histórico. Acontece agora porque o presidente não tem nenhuma força sobre o Congresso Nacional, ele é uma marionete, é isso que é. 

Então, meu caro, é o seguinte, eu vou governar, eu não considero o Centrão um partido político. Eu estava como deputado constituinte quando eu vi o Centrão ser criado. O Centrão foi criado para evitar o avanço da sociedade civil nas conquistas sociais na nossa Constituição. Era o companheiro Mário Covas que era o cara da sistematização e a gente estava conseguindo conquistar muitas coisas. E eu lembro do Roberto Cardoso Alves, eu lembro de um deputado de Pernambuco conversando para criar o Centrão para evitar que a gente tivesse muitas vitórias. Então o Centrão se junta em torno de determinados assuntos. 

Eu, sinceramente, quero conversar com os partidos políticos, eu ganhando as eleições pode ficar certo que eu vou conversar com os partidos políticos, e eu quero colocar nas costas deles, na responsabilidade deles também o Brasil que a gente tem que construir. Ou ele quer governar o Brasil para ajudar esse povo que está dormindo na rua, esse povo que está sem comer, são 33 milhões, são milhões que estão desempregados, ou eles querem governar o Brasil para essa gente, ou eles vão falar que querem governar para eles. E isso eu vou responsabilizá-los porque eu quero parceria, eu quero trabalhar junto. 

Você sabe que quando eu ganhei as eleições, você falou em impacto, Kennedy, você sabe que a primeira coisa que eu fiz foi criar o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social com empresários, com banqueiros, com trabalhadores, com índios, com bispos, com pastores, ou seja, todo mundo participou. Eram 90 pessoas que participaram. Isso vai ser recriado. Isso vai ser recriado. As conferências nacionais para definir políticas públicas vão ser recriadas, porque esse país não é meu, esse país é o país do povo brasileiro. Eu sou apenas um síndico se ganhar as eleições. Então, eu quero é que o povo diga o que a gente tem que fazer, não eu dizer para o povo o que eu vou fazer, eu não quero ser o dono da verdade, eu quero ser o maestro de uma orquestra que tem prefeito, que tem governadores, que têm sindicatos, que têm empresários, que tem gente contra, gente a favor, e eu preciso como maestro tratar essa orquestra de 215 milhões para que a gente possa fazer esse país ir para frente.

Alberto Bombig:
E presidente, nessa orquestra do senhor aí,  qual é o papel do Arthur Lira, teria, se ele for presidente da Câmara, o senhor colocaria ele em que lugar dessa orquestra? Como é que o senhor vê a atuação dele agora na presidência? E a gente já sabe que tem uma articulação, ele está se articulando para permanecer. Como o senhor enxerga a figura dele nesse processo?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Bombig,  tem um político que esses dias me colocou a seguinte tese, que eu precisava tomar cuidado porque se a coisa continuar do jeito que está, eu estou em disputa, o Bolsonaro está em disputa, todo mundo está em disputa, a única coisa que está certa é o Lira presidente da Câmara, se for permitido. E não vai ser isso, sabe por quê? Porque primeiro eu vou trabalhar durante a campanha, eu vou pedir voto para a bancada dos partidos que estão me apoiando. Eu vou criar a bancada do time do Lula, a bancada do time da democracia, para que a gente eleja. E depois o presidente da Câmara não é uma coisa do presidente da República, eu aprendi Bombig, eu aprendi que se o presidente tiver cuidado ele não se mete na escolha de presidente da Câmara e nem do Senado, o presidente cuida dos seus afazeres. 

Alberto Bombig:
Eu sei até que do que o senhor está falando, a gente viu esse filme no governo da Dilma.

Luiz Inácio Lula da Silva:
Mas deixa eu contar uma coisa, eu vou pegar o meu governo, para não citar o da Dilma, no meu governo o Genoíno lançou o líder Eduardo Greenhalgh presidente da Câmara. Eu chamei o Genoíno e falei? Genoíno, o Greenhalgh não passa porque o Greenhalgh é advogado dos Sem Terra. O advogado não passa. E aí o Virgílio Guimarães que era do PT também resolveu concorrer achando que ia ganhar. E quem ganhou? O Severino. No segundo turno, no segundo turno o Greenhalgh teve menos votos do que o primeiro. Porque era previsível que a bancada ruralista não iria votar no Greenhalgh. 

Então eu estava no Suriname quando o Greenhalgh teve 200 e poucos votos no primeiro turno, eu fui dormir achando que o Greenhalgh era presidente da Câmara. Acordei tinha um papel na minha porta com o seguinte: o presidente da Câmara é o Severino, é um deputado de Pernambuco. Eu nem conhecia bem ao Severino. O que eu fiz? Eu peguei o telefone, eram 9 horas da manhã liguei para o Severino, falei: bom dia presidente, aqui quem está falando é o presidente Lula, eu quero lhe comunicar que a primeira coisa que eu quero fazer quando chegar em Brasília é tomar um café com o senhor. 

Pronto, virei amigo do Severino, virei amigo até… Deixa eu te contar uma coisa, Bombig, não é o presidente da Câmara que precisa do presidente da República, é o presidente da República que precisa do presidente da Câmara. Então, a gente tem que entender essas coisas para a gente não achar que a gente pode se meter. Não. É prudente, é prudente, eu vou repetir outra vez Bombig, é prudente o presidente da República não se meter a escolher presidente, porque se ele perde ele está lascado.

O ex-presidente Lula durante entrevista para o portal Uol
Foto: Ricardo Stuckert

Kennedy Alencar:
Presidente, tem uma coisa que eu quero abordar com o senhor, que nessa guerra cultural que a extrema direita trava no mundo inteiro e o Bolsonaro fazia e seus filhos fazem o tempo inteiro nas redes sociais, é dizer que eles defendem a família, que eles são os verdadeiros patriotas, eles acreditam em Deus, os adversários não, a luta do bem contra o mal. E tem essa captura dos símbolos nacionais como as cores da bandeira, a camisa da seleção brasileira. Como é que o senhor pretende travar essa guerra cultural na campanha agora? Vai ter aí um horário eleitoral e o momento da reta final da eleição, e se eleito, no governo fazer essa guerra cultural. Porque haverá uma oposição, como a gente vê nos Estados Unidos, o Trump saiu do poder, mas o trumpismo continua. Como é que o senhor vai evitar esse sequestro dos símbolos nacionais?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Não, veja, eu acho que essas coisas acontecem no mundo inteiro e nós precisamos aprender a lidar com elas. Veja, eu acho que, eu tenho dito aos companheiros do PT de que a gente não pode permitir que os símbolos nacionais sejam tomados por eles. A cor verde e amarela é uma cor do Brasil, não é a cor do partido do Bolsonaro ou do Bolsonaro. A bandeira nacional é um símbolo do povo brasileiro, e que a gente não tem que não tem que ter vergonha de utilizar a bandeira nacional. A camisa da seleção brasileira deveria ser proibida, eles utilizarem como utiliza a fim de propaganda política. A camisa da seleção brasileira é uma coisa do povo brasileiro, não é uma coisa deles.

Ou seja, como eles não tem partido, eles não tem música, eles não tem bandeira, não tem nada, na verdade os partidos é um amontoado de deputados, parece uma cooperativa com interesses próprios, ou seja, então eles ficam utilizando. A pauta de costume saindo da boca deles é muito falsa. Olha a cara do Bolsonaro quando ele fala em Deus, é visível que ele não acredita em Deus, porque se ele acreditasse ele não falava o nome de Deus em vão, ninguém utiliza o nome de Deus eleitoralmente. Eu tenho muito cuidado com os evangélicos porque, eu acho que as pessoas são religiosas, as pessoas têm que cuidar da sua fé e da sua espiritualidade, mas as pessoas não podem ser manipuladas. 

Os bispos, às vezes, mais do que pastores, são empresários. Se utiliza a religião como se fosse uma empresa, uma indústria, e que tentam manipular a sociedade. Isso não vai prevalecer, isso é apenas uma questão de tempo, quando você vai perceber que se os evangélicos só saberem como é que foi o meu governo para os evangélicos, eles vão perceber que os evangélicos nunca foram tão bem tratados por um presidente da República do que no meu governo. Pergunte ao Edir Macedo, pergunte aos deputados deles, pergunte ao Malafaia, pergunte a esses que falam mal de mim como é que eles foram tratados no meu governo. Pergunta. Se eles forem honestos e acreditarem em Deus eles vão falar a verdade.

Kennedy Alencar:
Esse voto evangélico é importante, o senhor pretende disputar esse voto com o Bolsonaro? Porque 70% votaram no Bolsonaro e 30% apenas no Haddad, em 2018.

Luiz Inácio Lula da Silva:
É, eu não vou trabalhar a campanha disputando voto evangélico contra o católico, contra judaico, voto islâmico, voto da religião matrizes africanas. Eu não vou disputar assim. Eu vou disputar as eleições falando com o povo brasileiro. E quando eu falar de fé, quando eu falar de religião, eu quero falar para todo mundo, eu quero tratar todo mundo como cidadãos brasileiros, homens e mulheres eleitores. É assim que eu vou me dirigir. Não tem voto evangélico ou voto católico, ou voto islâmico, não, é voto do povo brasileiro. E eu tenho que ter uma mensagem para todos eles, como brasileiros e brasileiras que querem o bem desse país. Não dá para eles acreditarem em mentira, não dá para voltar a acreditar em mentira. Essa bobagem de falar: o Lula vai fazer isso, o Lula vai fazer aquilo… 

Eu já governei esse país por oito anos, eles sabem. Eu não foi ficar obrigando o Poder Judiciário, de evangélico ou de católico, o Poder Judiciário ele tem que ser composto pelas pessoas que tem competência de serem ministros, que tem alto teor de conhecimento jurídico nesse país. É assim que tem que ser o mundo e é assim que eu vou trabalhar. Se alguém pensa que eu vou tentar fazer isso para agradar, eu não vou fazer. Eu vou tratar a religião como uma coisa muito séria, muito séria, a fé do povo é muito séria. Quando o povo está cuidando da sua espiritualidade, da sua fé, é uma coisa sagrada, a gente não pode manipular essa gente. É assim Kennedy que eu vou lidar com as pessoas. Esse negócio dos temas que eles levantam, quando você vai ver na prática tem muita gente que fala muito em Deus, mas é muito mais pecador do que outros que falam menos.

Carla Araújo:
Presidente, um outro tema que tem sido colocado aí pelo presidente Bolsonaro é em relação aos debates. O PT tem falado de organizar alguns pools de imprensa porque os convites são muitos. Mas o Bolsonaro na convenção disse que ele quer debater com o senhor, mas não sabe se o senhor vai. O senhor está disposto a debater com o Bolsonaro, vai aos debates?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Olha, eu não sei, veja, o PT, o PT através do comando da campanha, fez um ofício para os meios de comunicação dizendo que nós gostaríamos de três debates, que fosse um pool entre todas as redes de televisão, para que a gente pudesse não ficar refém de cinquenta debates. Ou seja, eu preciso viajar o Brasil, se a gente for fazer todo dia um debate, todo dia um debate, todo dia, você não tem noção, Carla, como tem proposta de debate, você não tem noção. Então não dá para você ficar atendendo tudo, porque senão você não faz outra coisa. E eu preciso viajar o Brasil.

Carla Araújo:
Mas o senhor não tem receio de debater com o Bolsonaro?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Eu irei em debate com qualquer pessoa.  Eu já participei de debate com tanta gente, com Ulisses, com o Brizola, com o Aureliano Chaves, com o Maluf, sabe, com muita gente eu já participei de debates. Muita. Agora, o que o Bolsonaro está pensando? Ele já não foi no debate na outra campanha, ele agora está pensando o seguinte, eu só vou em debate no segundo turno. E se você puder lembra a ele que pode não ter segundo turno, a eleição pode ser resolvida no primeiro turno.

Alberto Bombig:
O senhor acha que vai ganhar no primeiro turno, presidente, o senhor tem essa expectativa?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Veja, eu não sei, eu vou trabalhar para ganhar o mais rápido possível, ter o maior número de votos possível. A gente só vai saber dia 02 de outubro.

Kennedy Alencar:
Por que é importante ganhar no primeiro turno e não no segundo turno? Por que seria mais importante?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Veja, eu acho importante porque você encurta o gasto da campanha, você ganha um mês para se preparar para governar o país, para montar o governo, é isso. 

Kennedy Alencar:
Mas é difícil o Bolsonaro contestar o resultado da eleição?

Luiz Inácio Lula da Silva:
E no caso desse sujeito que está aí você nunca sabe o comportamento dos milicianos que o apoiam. Você nunca sabe. Então veja, mas eu gosto de dois turnos, gente, o PT, o PT foi um dos partidos que mais brigou para que a gente tivesse eleições de dois turnos. Eu fiz dois turnos com o Fernando Henrique Cardoso, com o Serra, com o Alckmin, eu adoro o debate, eu gosto de debate, é uma coisa instigante. É a mesma forma que um jogador gosta de entrar na final para disputar uma Copa do Mundo, eu gosto do debate. Seja no primeiro ou no segundo turno, mas o que eu quero é dar uma certa moralizada na quantidade de debate porque eu não sou um político de gabinete que espera apenas um debate para aparecer, eu tenho que viajar muito, muito, eu quero viajar os 27 estados da federação, eu quero abraçar as pessoas, eu quero cumprimentar as pessoas, eu quero sentir as pessoas. Mas eu vou para o debate, a hora que a gente receber a resposta do pedido que nós fizemos eu estarei disposto a fazer os debates. 

Carla Araújo:
Presidente, o senhor falou aí da expectativa do primeiro turno, qual é a sua expectativa em relação ao chamado voto útil? Por exemplo, a Anitta que declarou que vota no senhor sem nunca ter sido petista, ou alguns eleitores do Ciro Gomes que poderiam eventualmente votar no senhor, como é que o senhor acha que o senhor vai trabalhar nesse chamado voto útil, o senhor está contando com ele?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Não, eu não trabalhar a ideia do voto útil porque eu já fui vítima disso muitas vezes, Carla. Eu já fui muitas vezes vítima do voto útil. Eu levanto todo dia, Carla, levanto todo dia imaginando que no dia 02 de outubro a maioria do povo brasileiro vai votar na democracia, e para votar na democracia vai votar na chapa Lula e Alckmin. É isso. Eu sonho que você vai votar em nós, eu sonho que o Bombig vai votar, eu sonho que o Kennedy vai votar, eu sonho que o diretor da UOL vai votar, eu sonho que o diretor da Folha vai votar, eu sonho… Sonho, o meu trabalho é esse, é acreditar que eu vou convencer todo mundo, e todo político faz isso. Ora, se isso der certo será ótimo, se não der certo vamos nos preparar para os dois turnos. Vamos nos preparar. A gente não ganha um campeonato antes dele terminar. O que eu tenho certeza é que  seja em um ou em dois nós vamos ganhar essas eleições, porque o povo quer democracia.

O povo quer comer, o povo quer trabalhar. Além da democracia, o povo quer comer, o povo quer trabalhar, o povo quer receber salário. E eu digo sempre, o povo quer o seu churrasquinho, uma picanhazinha feita na hora e uma cervejinha gelada. Até sai água da boca do Bombig só porque eu falei na picanha feita na hora, a Carla também parece que gosta de uma picanha, estou vendo o sorriso dela, ela pensou é comigo mesmo, vai ser no próximo sábado.

Kennedy Alencar:
Presidente, mudando um pouco de assunto aqui, uma coisa importante, a gente teve um caso de violência política clara na campanha que foi o assassinato lá do Marcelo Arruda pelo Jorge Guaranho, um petista foi morto por um apoiador do Bolsonaro. Qual é a sua preocupação com a repetição desses casos? A gente tem o  07 de Setembro, o Bolsonaro convocando as pessoas para a rua. O senhor acha que o Bolsonaro é responsável por essa morte devido ao discurso de ódio dele? E eu pergunto claramente para o senhor: o senhor teme um atentado?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Kennedy, eu já participei de muitas campanhas, desde 1980 que eu participo, 78 na verdade, a primeira vez que eu fui num palanque eu fui para apoiar Fernando Henrique Cardoso, candidato ao Senado em 78. De lá para cá eu participo de todas as campanhas. Eu nunca vi, eu nunca vi a ignorância e a violência do que eu estou vendo hoje nesse país. Nunca vi. A gente fazia um comício, depois eu terminava um comício você ia no restaurante encontrava gente de outro partido político, você se cumprimentava, ia para uma mesa, tomava a sua cerveja, jantava e não tinha problema. 

Hoje as pessoas não conseguem fazer isso porque existe uma frente bolsonarista que é a frente do ódio, a frente da violência, a frente que quer atirar, a frente que quer matar. Então eu acho que o Bolsonaro tem responsabilidade, tem responsabilidade na morte do Marcelo. Se ele não tivesse, ele não mandava chamar o irmão do Marcelo e não estava preocupado em atender a família e tentar falar, ele tem responsabilidade, porque é ele que está instigando nos discursos dele, nas lives dele. O chiqueirinho que ele fala lá todo dia, ele está instigando a sociedade a isso. O Trump terminava um discurso nos Estados Unidos e falava: olha, se alguém provocar vocês batam nele que depois eu garanto advogado. O Bolsonaro faz o mesmo, ele atende ofende, ele agride as pessoas. 

Então, eu não estava habituado a isso, eu estava habituado a polarizar com o PSDB, a polarizar com O PMDB, a polarizar de forma civilizada, ele não tem polarização, ele é o ódio contra o bom senso. Um cidadão que é presidente da República, que ficou receitando remédio que não servia para nada para combater o Covid, um cidadão que não derramou uma lágrima e que não foi visitar uma criança órfã que os pais morreram pelo Covid, esse cidadão pode fazer mais do que fez com o Marcelo. Você sabe que o PT já sofreu três provocações, nós temos a bala, o tiro que deram no ônibus, na caravana no Paraná que nunca foi investigado, nós temos agora várias tentativas deles, e nós estamos preparados. Nós estamos preparados. Obviamente que eu vou com mais cuidado.

Kennedy Alencar:
Presidente, o senhor teme atentado? O senhor teme um atentado? O senhor teme ser vítima de um atentado?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Eu vou falar uma coisa para você, eu acho que, eu não tenho, eu tenho tanta fé em Deus Kennedy, eu tenho tanta fé em Deus, eu tenho tanta fé em Deus que eu tenho certeza que dona Lindu está lá em cima tomando conta do caçulinha dela. Eu acho que isso não vai acontecer. Eu tenho certeza disso. Agora, você precisava perguntar para ele se ele vai fazer, porque a turma dele a gente não pode acreditar. Ele tem uma turma violenta, uma turma do mal, a turma que quebra placa da Marielle, a turma que matou a Marielle, e o Marcelo foi vítima disso, foi vítima do ódio. Um cidadão que sai de um outro lugar e vai no lugar para matar o outro, que história que é essa? 

Agora é o seguinte, é o seguinte Kennedy, o que ele está preocupado, o que ele está com medo realmente é porque ele sabe que o povo vai derrotá-lo. Ele sabe que o povo vai derrotá-lo. Ah, não, mas agora ele acha que ele vai ganhar porque ele deu até dezembro o vale refeição, vale refeição não, ele deu o auxílio para o motorista, para… Não, as pessoas vão pegar e não vão votar nele Kennedy. Eu tenho dito, se o dinheiro chegar na sua conta, pegue e coma, senão o Guedes toma. É isso. Pegue e coma senão o Guedes toma. E depois dá uma banana ao invés do voto. É isso que vai acontecer no Brasil.

Carla Araújo:
Presidente, na semana passada a gente entrevistou aqui o ex-presidente Michel Temer, e ele falou que era muito difícil apoiar o senhor, afirmou que o PT chama ele de golpista. Mas ele até fez aí uma sinalização para a ex-presidente Dilma dizendo que ela era honestíssima. Duas perguntas, o senhor quer o apoio do ex-presidente Michel Temer? E daí também a presidente Dilma respondeu ao presidente Michel Temer dizendo que ela não queria desculpas porque ele será para sempre um traidor. Como é que o senhor avaliou essa afirmação do Temer e essa resposta da Dilma?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Deixa eu lhe falar uma coisa, o Temer sempre teve dificuldade de votar no PT. Eu em 2005, 2006, 2002 a gente discutia essa possibilidade de aliança, ele nunca discutiu. Eu acho que o Temer não vai votar em nós mesmo, eu tenho certeza disso. E eu acho que a Dilma respondeu a carta porque a Dilma sentiu na carne o que foi feito com ela. Eu tenho conversado com o MDB e vocês têm visto, eu tenho 12 estados do MDB e das figuras importantes que estão com boas condições me apoiando. Eu gostaria que o MDB viesse me apoiar como um todo, mas eu respeito o MDB, tem candidata, eu jamais pedirei para uma pessoa não ser candidata. Jamais eu pediria para alguém retirar a candidatura. Porque se eu não fosse teimoso eu não teria chegado onde eu cheguei. Então o Temer vota em quem ele quiser, não tem problema. Ele já tem mais de 75 anos, ele tem direito de escolher o seu candidato a presidente. Quem errar sempre pode continuar errando, não tem problema. 

Kennedy Alencar:
Presidente, o senhor ficou 580 dias presos em Curitiba naqueles processos começando pela Lava Jato, o senhor foi tirado da disputa presidencial de 2018 quando era líder na pesquisa, o STF considerou o Moro suspeito e parcial, não lhe ofereceu um julgamento justo e também incompetente, ou seja, não podia ter julgado o caso do senhor. O senhor gostaria de ter algum tipo de revanche em relação a esses personagens, Moro, Dallagnol, setores da imprensa, da política, do empresariado que apoiaram o impeachment e torceram pela prisão do senhor?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Não. Kennedy, quando você chega ao grau de maturidade que um ser humano atinge aos 76 anos de idade, quando você tem a responsabilidade que eu tenho com o povo brasileiro, eu não posso ter nesse coração aqui espaço para ranço, para raiva, para ódio ou para vingança. Eu acho que quem faz aqui na terra, aqui na terra paga, eu acho que eles estão pagando. Eu só lamento Kennedy, só lamento, que o Moro e o Dallagnol tenham tido tanta habilidade para mentir para a imprensa a quantidade de vezes que eles mentiram. Eles conseguiram convencer a imprensa a transformar em verdades as mentiras que eles contavam. 

Então, eu fiquei lá os 580 dias pensando, lendo, e eu falei, eu preciso sair daqui maior do que eu entrei. E graças a Deus eu saí por causa do pessoal, do povo brasileiro. Eu estou muito tranquilo, eu não sei se é tranquilidade que eu tenho, eu estou muito tranquilo. Muito tranquilo e por isso eu quero ser presidente da República, e um presidente não pode ter raiva, não pode ter ódio, não pode querer se vingar. Eu vou tratar todo mundo como se fosse os meus melhores amigos. Até porque eu tenho que tratar todos em igualdade de condições. Com uma condição, as pessoas mais necessitadas serão tratadas com um carinho a mais.

Kennedy Alencar:
Presidente, o Moro e setores da imprensa inclusive dizem que o senhor não é inocente, apesar do princípio constitucional sendo presunção da inocência, e a anulação de um processo no caso do senhor não ser mera formalidade, porque é uma suspeição. A gente sabe disso. Mas a crítica que se faz é de que tem uma reação do senhor e do sistema político contra o combate à corrupção no Brasil, e que o senhor conseguiu vitórias na Justiça que outros acusados também conseguiram, e que na verdade o PT nega, que o senhor e o PT negam, não fazem autocrítica sobre casos de corrupção reais que aconteceram no governo, houve as delações, devolução de dinheiro. Eu queria saber como o senhor responde a esse tipo de críticas e que medidas o senhor pretende tomar no caso do combate à corrupção para que não se repita o caso de corrupção no seu governo?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Olha, deixa eu lhe falar uma coisa com muita sinceridade, eu vou falar olhando nos teus olhos, nos olhos da Carla e nos olhos do Bombig. Eu duvido que na história desse país, na história passada e na contemporânea, tenha um governo que tenha tratado de combater a corrupção mais do que o PT. E eu tenho dito que a corrupção só aparece quando tem liberdade, ela só aparece quando tem possibilidade de investigação. 

O PT criou o Portal da Transparência, as pessoas podem acompanhar as coisas da administração em tempo real. O PT criou a Lei de Acesso à Informação, em que cada um de vocês poderia saber qual a qualidade do papel higiênico que o presidente utilizava. O PT nunca fechou a porta para investigação, nós fizemos a lei, nós que criamos a delação, porque para nós é o seguinte, só tem um jeito do cidadão não ser investigado, é ele não cometer erro. Agora, o que foi grave nisso? 

O que foi grave é que o seu Dallagnol montou uma quadrilha manchando o nome do Ministério Público que é uma instituição muito séria. E por ser séria eles tem que ter mais responsabilidade, Kennedy. O seu Moro deve ter algum momento que ele se olhava no espelho e se achava um Deus e a imprensa fomentava, a imprensa divulgava. Gente, eu tive 13 horas de Jornal Nacional contra mim, eu tive 59 capas de revista contra mim, eu tive 680 editoriais contra mim, porque as pessoas pensaram que eu estava morto, e as pessoas não sabiam que quem nasce em Caetés e não morre de fome até 5 anos de idade, não vai ter medo de denúncia. 

E eu cansei de desafiar empresários, políticos, pode provar, me mostra provas. Querido, qual é a condenação que o Moro deu para mim? Eu cometi um fato indeterminado. O que é fato indeterminado, Kennedy? Você que é jornalista, ele não sabia qual o crime que eu cometi e mandou para a 2ª Instância que me julgou, o presidente nem tinha lido a sentença e falou: a sentença do Moro é excepcional. Ele nem tinha lido. Eles votaram para me condenar porque faziam parte de uma estratégia de não me deixar ser candidato a presidente, achando que o Lula iria morrer. 

Pois cá estou eu, feliz, casado de novo, casei dia 18 de maio, hoje eu sou um homem apaixonado pelo Brasil, apaixonado para resolver os problemas do Brasil, e apaixonado pela Janja. Você acha que um homem desse vai ter ranço contra quem, contra figuras que eu nem conheço? E que eu tive a sorte, porque foi Deus que me ajudou, de no primeiro depoimento dizer para o Moro: você está condenado a me condenar porque a mentira já foi longe demais. E aconteceu o que eu previ. 

Por isso eu estou tranquilo, sem raiva, sem desejo de vingança. Mas os desejos de reconstruir esse país para o povo brasileiro, eu quero que o povo pobre deixe de ser pobre, as pessoas precisam parar de pensar que pobre gosta de coisa de segunda, carne de segunda, feira de segunda, roupa de segunda. Não, a gente gosta de tudo de primeira. O povo quer comer bem, quer se vestir bem, quer ganhar bem, quer passear bem, quer ir para restaurante. E é isso que eu quero garantir, o povo quer estar na universidade, as pessoas pobres querem ser doutoras. E é isso que eu vou fazer, Kennedy. 

E é isso que gerou tanto ódio. Ah, porque o aeroporto está cheio de gente, é a desgraça do Lula, o aeroporto virou uma rodoviária, é a desgraça do Lula que pobre agora está viajando de avião. Eu quero mais pobre viajando de avião, mais pobre comprando carro para o trânsito ficar entupido até os prefeitos fazerem a rua boa. É esse país que eu quero, gente, e eu tenho certeza que é o país que vocês querem, porque o país deles aumenta a violência, aumenta a criminalidade, aumenta o assalto, aumenta a prostituição. Esse país eu não quero. Eu quero um país em que não tenha violência porque o Estado estará presente fazendo as coisas. Não é a polícia que resolve, é o Estado. O Estado tem que estar nas comunidades com educação, com cultura, com emprego, com lazer, com escola de tempo integral, Kennedy. Fique certo que é esse país que nós vamos fazer. Fique bem, se cuide bem, se cuide bem, faça ginástica, levante de manhã, ande para engrossar essas canelas suas que você vai ter que correr atrás de mim viajando o Brasil para ver as coisas que vai acontecer.

Alberto Bombig:
Presidente, o senhor está falando aí já de futuro, uma das causas que são apontadas até como motivadoras de eventuais desvios, de irregularidades, é o sistema da reeleição que foi criado no Brasil, com essa ideia de que qualquer um que assume o cargo, ele assume o cargo num dia e no dia seguinte ele começa a trabalhar não apenas para o mandato, não apenas para o cidadão, para o país, que é o dever dele, mas também para se reeleger. E aí vem a compra de apoio político, aí vem o aparelhamento, vem tudo mais. Eu gostaria de saber se o senhor concorda com isso e se o senhor de alguma maneira já pensa, está disposto a disputar um outro mandato se for eleito.

Luiz Inácio Lula da Silva:
Bom, primeiro Bombig, dizer para você que a única coisa boa que o Brasil copiou dos Estados Unidos é o direito de reeleição de um mandato. Porque você é eleito o presidente da República, em quatro você não tem tempo de fazer muita coisa, com as exigências ambientais que existem hoje, se você quiser fazer um projeto grande de infraestrutura, entre você pensar no projeto, encomendar o projeto, e aprovar esse projeto em todas as instâncias de fiscalização, terminou o teu mandato. 

Então, eu acho justo que um presidente tenha direito, que um prefeito tenha direito, que um governador, e acabou. Se ele quiser ser candidato, ele espera. Eu acho justo isso, é uma coisa boa. Obviamente, veja que eu vou dizer uma coisa para você, e que eu tenho medo que seja manchete, veja, eu sinceramente, não penso em reeleição. Eu quero cumprir um mandato com a maior competência possível. Eu saí do governo dia 01 de janeiro de 2011 com 87% de bom e ótimo, 10% de regular, e 3% de ruim e péssimo, esse ruim péssimo deve ter sido do Comitê dos meus adversários. E eu não posso sair com menos agora. 

Kennedy Alencar:
Mas o senhor descarta concorrer à reeleição? Já é uma decisão tomada hoje, que se o senhor for eleito o senhor não concorrerá em 2026, está tomada essa decisão?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Eu não quero, eu não tenho idade, Kennedy, eu vou estar com 81 ano,s cara. Eu não quis um terceiro mandato quando PT queria aprovar o terceiro mandato, que eu tinha 87% de bom, eu não quis o terceiro mandato. Eu não acho que isso…

Kennedy Alencar:
Está ficando claro que é uma decisão tomada. Está ficando claro que é uma decisão tomada.

Luiz Inácio Lula da Silva:
É uma decisão minha. Eu estou dizendo isso aqui agora da minha livre e espontânea vontade, eu quero cumprir o melhor mandato que eu já fiz na vida. E quero trabalhar em quatro anos por quarenta, esperem para ver. Quando eu digo para vocês que eu tenho 76 anos de idade, energia de 30, e tesão política de 20, ou seja, é porque eu estou assim, cara, eu nunca estive tão motivado na minha vida. Eu nunca estive com tanta vontade de fazer as coisas como eu estou agora. É o serviço que eu tenho para prestar para o meu país. 

Eu tinha muito medo em 2002, vocês não sabem quantas noites eu deitei naquele palácio com medo de errar, vocês não sabem quantas horas eu ficava acordado com medo de fracassar e virar um Walesa, como o Walesa na Polônia que se candidatou à reeleição e teve 0,5% só de voto. Quantas noites eu fiquei de barriga para cima pensando, meu Deus do céu, será que eu vou dar conta disso? E dei conta. Dei conta porque contei com o apoio de muita gente nesse país, contei com o apoio da sociedade, contei com as minhas conferências e contei com o apoio de todo mundo. Eu não sei se teve no Brasil algum presidente que teve tanta relação com os empresários como eu tive. E vou continuar tendo.

Kennedy Alencar:
Vai conversar com o empresariado na campanha agora? O setor financeiro se queixa muito que o senhor não se reúne com eles, não aceita os convites, tem toda uma queixa de empresários do setor financeiro.

Luiz Inácio Lula da Silva:
Kennedy, deixa eu te falar, o problema dos empresários é que quando eu era um candidato que eu era um zé ninguém, eu estava apenas disputando a eleição, eles quase não me convidavam. E quando me convidava eu ia, mas eu nunca fui na expectativa de ganhar voto, eu ficava falando porque eu não sei falar sem olhar na cara das pessoas. Eu respondo olhando na cara de vocês, daqui não, porque o Stuckert pede para olhar na câmera, mas eu gosto de olhar para a cara de vocês para saber a reação de vocês. Ou seja, eu nunca achei que iam voltar em mim. 

Então o que acontece:? Eu gosto de conversar com os empresários porque eu gosto de ouvir quais são as angústias deles, e às vezes eu fico angustiado com o que eles falam para mim porque é inacreditável Bombig, Carla e Kennedy, eu converso com os empresários e eles não falam da questão social, eles não falam da fome, eles não falam do desemprego, eles não falam do baixo salário, eles não falam das pessoas que estão dormindo na rua, eles só falam de coisa fiscal, ajuste fiscal, é fiscal, fiscal… Puxa vida, a falta de sensibilidade é total e absoluta. Este país será muito melhor para os empresários quando todo mundo tiver tomando café, almoçando e jantando, quando não tiver ninguém dormindo na rua, quando as pessoas puderem comprar carro, puderem viajar de avião, quando a gente transformar os pobres em classe média. 

Esse é um desejo meu, eu quero que as pessoas vivam como você Carla, bem vestida, bonita, bem pintada, eu quero que as pessoas sejam assim. Eu quero que as pessoas tenham paletó Bombig, que as pessoas possam comprar um paletó como o teu, é isso que eu quero. Essa é minha briga. Eu era assim quando eu era metalúrgico, quando eu estava dentro de uma fábrica, eu nunca gostei de ser tratado como um cara inferior. É essa briga que nós temos que fazer, e essa briga não é minha, essa briga é tua Kennedy, é tua Bombig e é tua Carla, essa briga é de todos nós que conquistamos o direito de comer, que conquistamos o direito de ser alguém na vida e estender a mão para a gente ajudar os outros. Não é passar e virar o pescoço como se a gente não tivesse nada com isso. Então…

Carla Araújo:
Presidente, o senhor está falando da sua disposição e paixão. Eu queria saber o papel da Janja num eventual governo do senhor, ela vai ter um papel importante, o que o senhor, ela está planejando, e o que o senhor está planejando para ela?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Carla, se você fosse candidata a presidente e ganhasse qual seria o papel do teu marido? 

Carla Araújo:
Ah, não sei, presidente. 

Luiz Inácio Lula da Silva:
Veja, porque é o seguinte, a Janja é a minha companheira, e eu obviamente acho que, eu estarei muito melhor se ela me ajudar. Eu não acho que a mulher do presidente tenha que ter um ministério, a mulher de presidente tem que ser a mulher do presidente, tem que ajudar ele, tem que discutir com ele, tem que aconselhar ele, tem que ser contra o que ele quer fazer, brigar com ele. É esse o papel. Agora, eu também não perguntei para ela, e ela é uma jovem senhora que tem pensamento próprio, que tem cabeça boa, e as vezes melhor do que a minha. Então ela terá a liberdade de pensar o que ela quer fazer para me ajudar. Eu sinceramente estou tranquilo com relação a isso.

Carla Araújo: 
Presidente, aproveitando, em relação a PGR, como é que o senhor, qual o critério que o senhor pretende usar para indicar o PGR no governo, o senhor fará como o presidente Jair Bolsonaro, indicará alguém de confiança, ou vai seguir a lista dos procuradores, enfim? Como é que o senhor está pensando em relação a essa questão da PGR?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Carla, você tem que deixar um pouquinho de suspense, porque se eu for contar tudo o que vai acontecer não tem suspense, fica um governo muito previsível.

Carla Araújo: 
Não, presidente, a gente tem que aproveitar essa primeira entrevista aqui, que está a audiência alta, qualificada, para o senhor falar.

Luiz Inácio Lula da Silva:
Eu aprendi isso, eu aprendi uma lição de vida, eu respeito, você não sabe o respeito que eu tenho pelo Ministério Público. Eu acho uma instituição excepcional. E toda vez que eu fui na posse de um procurador eu dizia: gente, vocês têm uma função muito importante, por isso vocês têm que ter mais responsabilidade, vocês não podem brincar com as pessoas, vocês não podem fazer acusações falsas. Para vocês acusarem e tornar público vocês têm que saber se é verdade. Porque vocês matam a vida de prefeito no interior, vocês não sabem o inferno que vocês fazem quando vocês fazem uma denúncia leviana. E no meu caso foi leviandade. Então eu vou pensar como é que eu vou escolher essa gente. Agora, eu posso te dizer que eu não vou votar, eu não vou indicar ministro da Suprema Corte por religiosidade. Eu vou indicar…

Kennedy Alencar:

Presidente, nós estamos chegando aqui ao final, só um minutinho Bombig, a assessoria está pedindo aqui pelo zap para a gente encerrar, a gente tem um pouquinho ainda, mas para encerrar com o senhor. O Bombig tem mais uma pergunta importante, a gente vai, eu sei o senhor tem compromisso, tem agenda aí, mas tem algumas questões internacionais que eu queria ver com o senhor ainda. O Bombig vai fazer uma pergunta e a gente vai estar encaminhando para o encerramento está bom?

Alberto Bombig:

Tem internacional também, mas obviamente nacional a pergunta, questão ambiental, eu queria que o senhor falasse, o senhor um pouquinho no começo, mas eu queria que o senhor falasse um pouco mais dessa visão, seja economicamente quanto politicamente. Nós tivemos crimes bárbaros recentemente, como é que o senhor olha essa questão ambiental, inclusive com esse olhar no exterior também.

Luiz Inácio Lula da Silva:
Isso vale para todos os biomas. É isso que eu vou fazer, essa é uma coisa que você pode saber que eu e o Alckmin vamos viajar o mundo tentando mostrar o que a gente quer fazer. A gente sabe que lá tem 25 milhões de habitantes, a gente sabe que as pessoas precisam trabalhar, que as pessoas têm que melhorar de vida. É por isso que a gente tem que defender a Zona Franca de Manaus. É por isso que a gente precisa garantir que tenha indústria mais limpa lá, indústria não poluente. Então eu vou tratar isso com um carinho muito especial. Nós vamos criar outros programas, eu faço questão de mandar para você para você distribuir para as pessoas aí que trabalham no UOL um programa nosso sobre a questão ambiental. E vamos trabalhar com muito carinho, muito, mas muito carinho.

Kennedy Alencar:
Mande que a gente, claro, vamos analisar. Presidente…

Luiz Inácio Lula da Silva:
Não é numa necessidade política cuidar do meio ambiente, hoje é uma necessidade de sobrevivência desse planeta que nós habitamos.

Kennedy Alencar:
Sem dúvida. Presidente, eu queria antes de ir para o pinga-fogo falar rapidamente de questões internacionais, eu queria que o senhor respondesse rapidamente que o senhor está com compromisso aí. O Acordo Mercosul União Europeia avançou no governo Temer, estava quase para ser fechado, parou no Bolsonaro por questões ambientais, como o Bombig mencionou a pouco. O senhor vai revisar o Acordo do Mercosul União Europeia ou vai assinar nos termos atuais? E segunda parte, como será a relação com Biden, Estados Unidos e relação China, terá um parceiro preferencial?

Luiz Inácio Lula da Silva:
Kennedy, duas coisas, nós vamos chamar a União Europeia e vamos melhorar o acordo. E eu tenho fé que a gente vai inaugurar esse acordo, vai anunciar esse acordo logo logo, mas com melhor qualidade para garantir que os países da América Latina possam ter política industrial. Eu já discuti muito isso com o Celso Amorim, eu tenho certeza que nós vamos avançar. A segunda coisa é que os Estados Unidos é um parceiro muito grande para o Brasil e muito importante, a única coisa que eu exijo dos Estados Unidos é aquele respeite o Brasil, o Brasil não é uma colônia o Brasil é um país grande e que a gente tem que ser tratado com respeito e ser respeitado por ele. Nós sabemos a importância americana e nós queremos melhorar a nossa relação política, a nossa relação de incentivo, tecnológica, a nossa relação empresarial e a nossa relação inclusive militar com os Estados Unidos. Nós não trataremos os Estados Unidos de forma secundária porque ele tem uma importância muito grande. E nós queremos ter relações com todo mundo, nós não temos contenciosos internacionais. Nós não temos e não vamos criar, por isso a nossa política internacional será ativa e altiva como muito bem disse o nosso querido companheiro Celso Amorim.

Kennedy Alencar:
Presidente, chegamos aqui no final, tem um pinga-fogo, eu pediria que o senhor respondesse rapidamente, uma ou duas palavras, por gentileza, está bom? Vamos lá. Lava Jato.

Luiz Inácio Lula da Silva:
Foi um erro histórico. 

Kennedy Alencar:
Sérgio Moro.

Luiz Inácio Lula da Silva:
O Sérgio Moro é um equívoco, é uma mentira criada pela imprensa brasileira. 

Kennedy Alencar:
Simone Tebet.

Luiz Inácio Lula da Silva:
Olha, eu não conheço a Simone, por isso eu não vou fazer julgamento. Eu sei que ela foi uma boa senadora.

Kennedy Alencar:
Ciro Gomes.

Luiz Inácio Lula da Silva:
Olha, poderia ser melhor. 

Kennedy Alencar:
Ditadura Militar de 64.

Luiz Inácio Lula da Silva:
Um erro histórico desse país.

Kennedy Alencar:
Tancredo Neves.

Luiz Inácio Lula da Silva:
Foi uma das pessoas mais inteligentes que eu conheci.

Kennedy Alencar:
José Sarney.

Luiz Inácio Lula da Silva:
O José Sarney… Sarney foi o companheiro que garantiu a transição democrática desse país. 

Kennedy Alencar:
Fernando Collor de Melo.

Luiz Inácio Lula da Silva:
Olha, foi um equívoco do povo brasileiro que resultou no que resultou.

Kennedy Alencar:
Itamar Franco.

Luiz Inácio Lula da Silva:
Eu acho que foi uma pessoa das mais sinceras que eu conheci. 

Kennedy Alencar:
Fernando Henrique Cardoso.

Luiz Inácio Lula da Silva:
Olha, o Fernando é um democrata, uma pessoa que foi muito útil ao nosso país. 

Kennedy Alencar:
Dilma Rousseff.

Luiz Inácio Lula da Silva:
Uma grande companheira minha, injustiçada.

Kennedy Alencar:
Michel Temer.

Luiz Inácio Lula da Silva:
Um equívoco.

Kennedy Alencar:
Jair Bolsonaro.

Luiz Inácio Lula da Silva:
Dois equívocos.

Kennedy Alencar:
Luiz Inácio Lula da Silva.

Luiz Inácio Lula da Silva:
Não sei.

Kennedy Alencar:
Janja.

Luiz Inácio Lula da Silva:
Olha, eu sou suspeito para falar bem. Janja é a mulher da minha vida agora.

Kennedy Alencar:
Brasil.

Luiz Inácio Lula da Silva:
Olha, é um país maravilhoso, que merece ser bem melhor e estar bem melhor do que está hoje.

Kennedy Alencar:
Presidente. Eu agradeço muito a entrevista do senhor, a paciência, muito obrigado, está renovado o convite para a primeira entrevista como presidente eleito se vencer a eleição. Agradeço muito a atenção do senhor e a entrevista que o senhor deu aqui ao UOL para a gente, a primeira aí como candidato oficial. 

Luiz Inácio Lula da Silva:
Muito obrigado Kennedy, um abraço. Kennedy um abraço. Bombig um abraço, Carla, até outra oportunidade, se Deus quiser.

Kennedy Alencar:
Até uma próxima. Abraço Bombig.

Alberto Bombig:
Abraços a todos.

Kennedy Alencar:
Abraço Carla.

Carla Araújo:
Abraço Kennedy, Bombig, abraço presidente, obrigada pela entrevista.

Kennedy Alencar:
Pois é. Obrigado a vocês todos, a entrevista com o ex-presidente Lula acaba aqui. Eu agradeço muito…