Leia Íntegra da entrevista de Lula à Rádio Progresso

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Na quinta, 17 de fevereiro, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva concedeu entrevista à Rádio Progresso, do Cariri cearense. Confira abaixo a íntegra da conversa com o apresentador João Hilário.

João Hilário: Rádio Cultura FM de Assaré pela Difusora Gonzagão de Barbalho e outras Difusoras que estão retransmitindo nesse momento o Jornal o Progresso. Bom gente, ele é um dos políticos mais experientes do Brasil, saiu da raiz do nordeste do Brasil para ganhar o país através de sucessivas campanhas. Sindicalista, torneiro mecânico, com uma inteligência privilegiada, Luiz Inácio Lula da Silva. Conquistou dois mandatos de presidente da República depois de tanta luta política, depois de tanta perseverança. Conheceu todos os lados da política, inclusive a privação de liberdade. Foi chamado de o cara pelo presidente dos Estados Unidos Barack Obama, criou programas sociais que ainda hoje estão em atividade no Brasil, trouxe a maioria dos cursos da atual Universidade Federal do Cariri para a região do Cariri. Criou o Bolsa Família, o Brasil Sorridente, tantos e tantos programas sociais que tiraram mais de 30 milhões de brasileiros da condição de miséria e o elevaram a classes mais altas, no patamar financeiro do país. Conheceu também muitas tribulações na vida, foi impedido inclusive de ser candidato a presidente das últimas eleições no momento em que liderava as pesquisas. Para 2022 conseguiu liderar as pesquisas com números antes nunca alcançados em pré-candidatura, e com rejeições bem mais baixas do que historicamente. Governou com muita popularidade chegando a ter nos últimos meses do seu último governo 83% de aprovação da população brasileira. É esse histórico, cidadão nordestino, cidadão brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, que temos a honra de entrevistar no Jornal Progresso. Boa tarde e muito bem-vindo presidente.

Luiz Inácio Lula da Silva: Boa tarde, João Hilário, boa tarde povo de Juazeiro, boa tarde ouvintes da Rádio Progresso, do Jornal Progresso, e eu queria dizer João Hilário que é um prazer imenso poder estar falando com o povo do nordeste através dessa Rádio Progresso, dessa região do Cariri, tão importante e tão significativa para o Brasil e para o Ceará. João Hilário, antes de começar a falar, primeiro eu queria começar a fazer uma correção, eu não gosto que me tirem 3% nas pesquisas. É o seguinte, eu deixei o governo com 87% de bom e ótimo, 10% de regular e 3% de ruim e péssimo, que deve ter sido no Comitê dos Tucanos, que eu só tive 3% de péssimo e ruim.

Mas eu queria começar esse programa pedindo licença para você para fazer um apelo para o povo da cidade de Juazeiro, a nossa querida terra do nosso querido Padim Cícero de Juazeiro, que o povo de Juazeiro fizesse uma reza muito forte em solidariedade às vítimas de Petrópolis. Já são 105 pessoas mortas, 134 desaparecidas, da maior tromba d’água que se tem notícia nos últimos 90 anos. Então, é muito importante que a gente que tem fé, que a gente que acredita em Deus, a gente possa fazer uma reza forte para que a gente possa estimular, estimular e diminuir o sofrimento das pessoas que estão vivendo esse drama insuportável causado pelas enchentes. Então, eu quero aproveitar esse momento, João Hilário, para dizer ao povo do Ceará, ao povo de Juazeiro, ao povo que segue Padim Cícero, que era muito importante a gente fazer uma profissão de fé muito grande para fortalecer não só as vítimas, mas também os parentes que estão sofrendo muito com o que aconteceu em Petrópolis.

No mais, dizer para você que conversar com o nordeste e conversar com o Ceará é sempre uma alegria. Eu sei que Guimarães está ouvindo, eu sei que a Luizianne está ouvindo, eu sei que o Camilo está ouvindo, eu sei que o José Airton está ouvindo, sei que os nosso deputados estaduais, o Acrísio Sena, o Eumano, o Fernando de Santana e o Moisés também estão ouvindo, eu sei que o governador Camilo essa hora deve estar inaugurando alguma coisa, mas deve estar com o ouvido no rádio grudado para ouvir se eu vou falar mal ou vou falar bem dele. Eu só vou falar bem dele. E falar bem do povo do nordeste que é um povo que está na minha alma, está na minha origem, está no meu sangue, essa região que eu prezo tanto, respeito tanto, e admiro tanto. E por isso eu digo sempre o seguinte: nós precisamos devolver ao povo do nordeste brasileiro a cidadania, o direito de viver bem, o direito de trabalhar, o direito de comer, o direito de ser feliz, ou seja, o povo nordestino é um povo que merece respeito do país inteiro, porque é um povo que carrega muito sofrimento ao longo da história pelo abandono das elites governantes desse país.

Portanto, o meu bom dia, João Hilário, estou à sua inteira disposição, faça a pergunta que quiser e como quiser. Se eu não souber responder eu peço para o Stuckinha, que está aqui na frente da câmera, para ele responder por mim.

João Hilário: Uma simpatia em pessoa o Stucker, simpatia, eficiência em pessoa. Presidente, venha a Juazeiro, venha pedir as bênçãos ao meu padrinho viu presidente, não deixe de vir aqui a Juazeiro pedir as bênçãos ao Padim que dá muita sorte, inclusive para os nordestinos.

Luiz Inácio Lula da Silva: João Hilário, se Deus quiser, eu quero ir em Juazeiro até porque tem uma pessoa que está querendo ser candidato a presidente que pensava que Padim Cícero era pernambucano. Rapaz!

João Hilário: Isso seria cômico se não fosse trágico, não é?

Luiz Inácio Lula da Silva: Se o cara já é adulto e não sabe da onde é Padim Cícero é porque ele está mal, está mal das pernas e está mal da cabeça.

João Hilário: É verdade, é verdade. Presidente, depois de tantos governos, depois de dois governos seus, dois governos, um e meio praticamente, um governo a partir do seu apoio, que foi no caso da Dilma, depois do governo Temer, agora o atual governo. Qual é a diferença, por exemplo, numa eventual eleição sua a presidente da República, que diferença com tanto conhecimento político de Brasil que o senhor tem, que diferença o senhor vê entre a época em que o senhor assumiu a primeira vez a Presidência da República e agora, o quadro de agora? O que o senhor entende que o espera numa possível eleição a presidente da República?

Luiz Inácio Lula da Silva: João Hilário, eu às vezes fico triste e ao mesmo tempo eu sou tomado por uma alegria muito grande porque eu tenho certeza que nós seremos capazes de corrigir os rumos do Brasil. Quando deixei a Presidência, o Brasil era considerado entre a 6ª e a 7ª economia do mundo, hoje o Brasil é a 13ª economia do mundo. Quando nós deixamos a presidência, a gente estava gerando milhões de empregos com carteira profissional assinada, a gente estava fazendo o maior investimento em educação nas universidades, nas escolas técnicas, no ensino fundamental. Da creche à universidade, a gente estava cuidando.

A gente estava cuidando de levar a água para o nordeste porque, mesmo Dom Pedro sendo imperador, ele não conseguiu fazer a transposição da água, nós teimamos e fizemos a transposição. Essa transposição ficou 88% pronta no nosso governo, e eu fico muito feliz de saber que o semiárido nordestino e mais Fortaleza vão ter definitivamente a solução da água, porque é o mínimo que o Estado tem que fazer. Eu sei a quantidade de cisternas que foram feitas no nordeste, que foram feitas em Fortaleza, eu sei o significado do Luz para Todos, o significado do PAA, o significado da maior política de inclusão social que esse país já viveu. E o que que acontece?

Eu fico triste porque o que nós estamos percebendo é que as coisas foram destruídas. E aí vem aquela velha máxima, você leva 10 anos para construir uma coisa boa e vem alguém e destrói aquela coisa boa num minuto. Num minuto. E é o que esse governo está fazendo, esse governo não cuida da economia, não cuida da pandemia, esse governo não cuida da Educação, esse governo não cuida da Saúde, e muito menos esse governo cuida do Nordeste. Ele, ao invés de cuidar do Brasil, ao invés de cuidar do Sul, do Sudeste, ele resolveu brigar com os governadores do Nordeste que criaram a coisa mais extraordinária que foi o Consórcio do Nordeste para que os governadores pudessem fazer compras mais baratas, pudessem produzir coisas mais baratas, pudessem, agindo conjuntamente, melhorar a vida do povo do nordeste. E ele ao invés de ajudar, ao invés de ir ao Nordeste, ao invés de fazer reunião com os governadores, ao invés de perguntar aos governadores no que o Governo Federal pode ajudar, o que ele faz? Ele transforma os governadores em inimigos, começa a xingar, começa a provocar, começa, na verdade, a criar uma discórdia onde só deveria haver concórdia, porque esse é o papel do presidente da República, é harmonizar a relação entre os entes federados, é conversar com governadores, é conversar com prefeitos, é saber o que está sendo necessário na cidade porque ninguém será feliz se a cidade não estiver bem.

A vida da gente começa na rua da gente, na vila da gente, no bairro da gente e na cidade da gente. Então, o Brasil nunca estará bem, se as cidades não estiverem bem. O Brasil nunca estará bem, se os estados não estiverem bem. O Brasil vai estar bem quando as cidades estiverem bem, quando os governos dos estados estiverem bem e quando o povo estiver bem. Então, eu na verdade, João Hilário, eu sei que nós temos uma tarefa gigantesca que é recolher os cacos da destruição do atual governo e reconstruir o Brasil. Reconstruir o Brasil gerando emprego, melhorando o salário, cuidando da Saúde, cuidando da Educação, e agora com um problema mais sério que é tentar fazer com que a gente recupere no menor tempo possível o atraso a que as crianças mais pobres foram submetidas com a pandemia. As crianças que não tiveram aula pela internet estão dois anos mais atrasadas que as crianças que tiveram aula pela internet, ou seja, então é um trabalho imenso, imenso, que nós vamos ter que fazer para recuperar o Brasil. E eu tenho muita fé, eu tenho muita crença que a gente vai fazer o que nós fizemos em 2003, fazer o povo brasileiro voltar a ser feliz, a trabalhar, a sorrir, a progredir. Porque o interesse de todas as pessoas é progredir e não regredir, é comer e não passar fome, é estudar e não comprar armas. É isso que nós precisamos fazer nesse país. E é isso que eu vou fazer, e é por isso que eu estou com muita vontade, muita disposição de voltar a governar esse país.

João Hilário: No penúltimo ano do seu segundo governo, um pouco antes do senhor deixar o governo, o Brasil registrava emprego pleno. Foi a primeira vez que aconteceu na história o emprego pleno na nação. Hoje nós vemos a nação com um desemprego muito alto, com uma desigualdade social também aumentada nos últimos anos, e um desafio muito maior para o senhor hoje. Então, como o senhor pretende chegar ao emprego pleno? Nas suas projeções, claro, o senhor tem ao seu lado grandes economistas, o senhor mesmo é uma pessoa de uma inteligência privilegiada. Nas suas projeções, quando seria? Seria possível o nosso país chegar novamente ao emprego pleno? E, num eventual governo seu, novamente presidente, quando isso seria possível?

Luiz Inácio Lula da Silva: Olha, não é possível prever uma data João Hilário, porque eu não tenho esse dom de prever uma data. O que eu tenho é o dom de dizer para você que é possível fazer o Brasil voltar a ter pleno emprego. E, para mim, tem uma solução que eu sempre achei simples, e foi motivo de muito debate meu viajando pelo exterior, ou seja, na medida em que você coloque o pobre no orçamento e você transforme o pobre num pequeno consumidor, esse pobre começa a comprar, o comércio começa a vender, a fábrica começa a produzir, o campo começa a produzir e a economia começa a girar fazendo com que o dinheiro circule entre todo o povo brasileiro. E aí começa acontecer os empregos. Foi assim que nós fizemos. Normalmente, quando você entrevista um candidato, ele vai dizer para você: porque nós vamos criar uma política de desenvolvimento que vai gerar emprego. O que faz gerar emprego é um pouquinho de dinheiro na mão do povo, ninguém vai fazer uma fábrica se o povo não tiver poder de consumo, ninguém vai fabricar sapato, se o povo não puder comprar sapato.

Então, o que nós queremos é dizer para você uma coisa simples, é colocar o povo pobre no orçamento da cidade, no orçamento do estado, no orçamento da União, e colocar o rico para pagar imposto de renda, sobretudo as pessoas que vivem de dividendos. As pessoas que não pagam sobre os seus lucros, para que a gente tenha uma política tributária mais justa, mais correta, e que a gente possa fazer o país se transformar num país efetivamente desenvolvido, onde possamos alcançar um estado de bem-estar social. O que é um estado de bem-estar social? É onde todos, todos tenham o direito ao resultado daquilo que eles produzem, todos possam comprar aquilo que eles produzem, todos possam viver bem, estudar, comer, trabalhar, passear, ter acesso a cultura, a lazer. É isso que o povo sonha.

Lamentavelmente, João Hilário, a elite brasileira acha que o povo nasceu e o povo se conforma em ser pobre, que o povo não gosta de luxo. Não, o povo gosta, o povo gosta de comer bem, de trabalhar bem, de ganhar bem, de se vestir bem, de ter carro bom, de ter motocicleta, de ter a família bem criada, bem estruturada. É isso que o povo gosta. Eu quando eu brinco muito, que eu falo que eu vou garantir que a gente vai comer um churrasquinho, tomar uma cervejinha com uma picanha, eu agora melhorei o discurso, eu não falo só de churrasquinho, eu falo das pessoas que são vegetarianos e que não gostam de comer carne. Então, nós vamos ter que plantar mais, mais coisas orgânicas para melhorar a saúde das pessoas que são vegetarianas, que são veganas as pessoas que gostam de outro tipo de comida.

Mas eu acho, João Hilário, que é possível consertar o país. É importante, João, para que o povo do Cariri ouça bem, quando eu cheguei na Presidência em 2003, diziam que o Brasil estava quebrado e que não tinha conserto, diziam que o Brasil devia 30 bilhões para o FMI, que o Brasil não tinha dinheiro para pagar as suas importações. Pois bem, esse país que estava quebrado foi consertado, esse país que nunca tinha tido experiência na vida de ter reservas internacionais nós deixamos esse governo com 370 bilhões de reais de, de dólares, de reservas internacionais, que garantem que esse país não tenha quebrado. Quando nós assumimos em 2003, a dívida pública era 60%, caiu para 35% no meu governo e para 32% no governo da Dilma. Quando nós chegamos à Presidência da República, nós fizemos superávit primário durante todo o período do nosso governo, foi o único país dentre todos os países que participavam daquele grupo dos países mais ricos, do G20, que cumpriu o superávit primário. E ao mesmo tempo nós aumentamos o salário mínimo todo ano em 74%, fizemos a maior política de inclusão social. Ou seja, provando que o pobre não era problema, o pobre era solução.

Então, certamente, que nós vamos criar os empregos necessários, nós vamos fazer com que a nossa roda gigante da economia comece a rodar para que todo o povo possa participar.
Eu sei a importância do que era fazer cisternas no nordeste no Ceará, eu sei o que foi importante a gente fazer a transposição do São Francisco, porque quem nasce em Copacabana, quem nasce na avenida Paulista, quem nasce em Fortaleza e que não sabe o que é a falta d’ água no sertão, quem não sabe o que é o sofrimento, do cara ver o seu cabritinho, seu bodinho morrendo de sede, sua vaquinha morrendo de sede, não tendo comida para dar, é que sabe a importância de fazer a transposição das águas do Rio São Francisco, de fazer 1 milhão e 400 mil cisternas como nós fizemos pelo país afora. Então, eu acho que é isso que nós temos que fazer. O que nós temos é que reconstruir o Brasil, o povo brasileiro precisa voltar a ficar otimista, voltar a ficar feliz, voltar a trabalhar e viver dignamente porque esse é o sonho de toda mulher, de todo homem, de toda a família, a gente precisa viver bem. A gente precisa comer bem, estudar bem, a gente precisa ter o direito de viajar.

Eu lembro que quando eu governava o Brasil tinha muita gente que ficava com raiva porque os aeroportos estavam cheios de gente. Estavam cheio de gente porque o povo mais pobre estava viajando de avião, mas tem gente que não quer que o pobre viaje de avião, tem gente que acha que o pobre tem que andar de pau de arara como a minha mãe colocou a gente em 1952 no pau de arara para andar 13 dias para chegar em São Paulo. Então, eu sou um cara muito otimista, João Hilário, muito otimista, tenho muita fé, acredito muito de que a gente vai recuperar esse país e a gente vai fazer o povo brasileiro voltar a sorrir, inclusive com dente na boca. Porque quando eu criei o Brasil Sorridente é porque eu não podia admitir que uma pessoa não pudesse comer porque não tinha dente.

Eu lembro, João Hilário, de um companheiro de Pernambuco, lá de um assentamento na cidade de Suape, lá em Recife, um companheiro foi em Brasília fazer uma reivindicação para mim, e uma das coisas que ele falou para mim foi o seguinte: presidente, me dê uma dentadura porque eu não estou podendo mais comer carne, eu não posso comer castanha de caju. Eu não dei dentadura porque esse não é papel do governo, eu criei uma política de saúde bucal chamado Brasil Sorridente, e na época eu falei com o governador Eduardo Campos, ele levou o cidadão no dentista, o dentista tratou da boca do companheiro, três meses depois ele volta à Brasília para dizer: presidente, eu já estou comendo castanha, já estou comendo carne de bode, já estou comendo tudo, presidente. Agora, presidente, já que o senhor me deu os dentes, me dê um carrinho agora para mim poder trabalhar tranquilo. Eu falei olha: o carrinho não dá para dar porque não é possível ter uma fábrica de entregar carrinho.

Eu estou contando essas coisas, sabe por que João Hilário? Porque as coisas às vezes pequenas que a gente sofre no cotidiano não são levadas em conta por aquelas pessoas que governaram esse país historicamente. Às vezes as pessoas mais humildes elas são esquecidas, quando os políticos estão fazendo discurso no palanque eles lembram dos pobres, aliás, eles esquecem dos banqueiros, eles esquecem dos grandes empresários e lembram dos pobres, mas quando ele desce do palanque ele esquece do povo pobre. Então, o que nós precisamos é saber o seguinte: esse país só vai dar certo quando tiver um governo que governe para todos. Eu quero que o empresário ganhe, mas eu quero que o trabalhador ganhe, eu quero que o empresário viva bem, mas eu quero que o trabalhador viva bem, eu quero que o fazendeiro viva bem, mas eu quero que o trabalhador rural viva bem, o grande tem que comer, o pobre tem que comer, o grande quer viajar, o pobre tem direito de viajar, o grande tem carro, o pobre também tem direito de ter um carro. Você não sabe a minha alegria quando eu vi que o povo estava trocando o seu jumentozinho, o seu jegue, por uma motocicleta. Aí eu falei: agora é o progresso que chegou e não volta mais.

Mas, lamentavelmente, isso acabou porque quando eu deixei a Presidência, Hilário, a gente estava vendendo quase 4 milhões de carros por ano, hoje acho que nós não estamos chegando a 2 milhões de carros por ano, caiu pela metade. Porque o povo está pobre, o povo está empobrecido. Quando eu era presidente, 90% dos acordos salariais feitos pelas categorias organizadas eram 90%, todos eles, 90% tinham aumento real, acima da inflação, hoje quase ninguém tem aumento real acima da inflação. Então caiu o poder aquisitivo, aumenta o preço da comida, aumenta a inflação que está quase 11%, e o que acontece? O povo pobre tem inflação maior e o povo pobre sofre mais.

Então, eu, sinceramente, quero dizer ao povo do Cariri, quero dizer aos teus ouvintes, João Hilário, que com muita fé em Deus, com muita vontade de brigar e com muito apoio do povo brasileiro, nós vamos consertar esse país. Esse país tem que ter um presidente que ame o povo, que goste do povo, que goste da educação, que goste de doar livros e não armas, que goste de falar em amor e não em guerra, sabe, esse país nasceu para isso, é um povo muito cordato, é um povo muito sensível, e é isso que eu quero consertar junto com o povo, essa alma bondosa do povo nordestino, do povo brasileiro. Colocar essa bondade a serviço do crescimento econômico, porque o povo brasileiro, embora a gente pense que ele pensa com a cabeça, a verdade é que muitas vezes o que sai da cabeça é o sentimento que as pessoas têm no coração.

E eu tenho certeza que esse povo maravilhoso gosta do Brasil e esse povo maravilhoso vai nos ajudar a consertar esse país. Esta é a minha fé, essa é a minha disposição, e é para isso que eu quero trabalhar muito. Eu não quero saber se o prefeito é de outro partido político, eu quero saber que ele é prefeito. Se ele for prefeito, ele tem obrigação de cuidar do povo, se ele for cuidar do povo, ele sabe que eu vou ajudá-lo. Eu não quero saber de que partido é o governador, o governador foi eleito, ele tem que cuidar do povo, e se ele vai cuidar do povo eu tenho que conversar com ele, não tem essa de não gosto de governador, ele é da oposição. Para mim não tem governador de oposição, para mim governador é governador.

E aí todos sabem que eu converso com todo mundo, todos os prefeitos sabem que eu converso com todos os prefeitos, eu não faço discriminação porque senão o Brasil não dá certo. Eu digo sempre, João Hilário, o seguinte: olha, a gente tem que compreender que uma cidade parece pequena, se a gente comparar ela com o país, mas é na tua Juazeiro, é na minha Garanhuns, é na nossa cidade que a gente começa a ser feliz. Então, a cidade tem que estar bem o, povo tem que morar bem, o povo tem que gostar da sua rua, do seu bairro, da sua cidade, porque quando o povo tiver gostando da sua cidade ele está gostando do seu estado, e ele estará gostando do Brasil e todo mundo vai viver bem. É isso que nós vamos fazer nesse país João Hilário.

João Hilário: Muito bem. Presidente, o presidente do Banco Central foi indicado pelo presidente atual, Roberto Campos Neto, ele falou recentemente que uma troca, numa eventual troca de governo o mercado não é mais receoso, não tem receio mais se isso acontecer. O senhor entende que essa declaração do presidente já seria uma certa aceitação de uma, claro, eleição é eleição, só sabe no dia depois do resultado, já seria uma aceitação das evidências atuais? E por outro lado, falando ainda em economia, o senhor vai mudar algum critério de precificação da Petrobras para evitar que os combustíveis tenham aumentos tão grandes, cheguem a patamares tão grandes como já chegaram no Brasil? Qual será o critério de precificação da Petrobras que o senhor vai utilizar? O mercado evidentemente quando o senhor foi presidente, o mercado ficou muito satisfeito. Mas havia sempre esse temor, o temor de mercado, o temor de reformas que às vezes não aconteciam, ou que não eram anunciadas, não eram prioridades. Como o senhor encara nesse momento, como o mercado o vê e quais as articulações que o senhor, que o seu partido, que o seu staff tem tido com o mercado financeiro, e que preços o senhor deseja, digamos, estabelecer para os combustíveis num possível governo seu, presidente Lula?

Luiz Inácio Lula da Silva: João, somente um cabra arretado como você é capaz de fazer uma pergunta sabida desta para um candidato a presidente. Primeiro, eu não vou pedir voto para o mercado, eu vou pedir voto para o povo brasileiro. Porque o povo brasileiro, na verdade, é o grande mercado que eu quero ajudar nesse país. Na hora que o povo tiver comendo, bebendo, se vestindo e trabalhando, na hora que o povo tiver podendo comprar as coisas, ele vai ser a coisa mais importante no mercado. Aliás, o mercado não existirá se não existir o povo com capacidade de trabalhar e de consumir. Essa é a primeira coisa.

A segunda coisa é você lembrar que em 1989 teve um presidente da Federação das Indústrias de São Paulo, o Mário Amato, que disse uma bobagem imensa, que, se eu ganhasse as eleições, 800 mil empresários iriam embora do país. Você deve estar lembrado disso, João Hilário. Pois bem, demorou um pouco, eu ganhei as eleições e nunca os empresários ganharam tanto dinheiro como ganharam no meu governo.

Nunca nós geramos tantos empregos, nunca se aumentou tanto o salário, nunca houve tanta política de inclusão social como o nosso governo, numa demonstração do que o que faz bem para a economia é a inclusão e não a exclusão. A exclusão faz mal para o país, ela faz mal para o povo, ela faz mal para a cidade, ela faz mal para o estado. Agora, a inclusão de todo mundo participando do bolo que é feito. Quando a gente faz um bolo de fubá, quando a gente faz um bolo de pão velho, a gente faz um bolo, a gente tem que distribuir para todo mundo que participou de fazer aquele bolo. Todo mundo tem que comer um pedaço.

Então, é isso que nós vamos fazer no Brasil e o mercado vai me agradecer, porque ao invés do mercado ver alguém dormindo na sarjeta e nas ruas de Fortaleza, ao invés do mercado ver alguém dormindo aqui na sarjeta da Avenida Paulista, ao invés da gente ver a morte daquele congolês lá no Rio de Janeiro, aquele jovem que foi assassinado e brutalmente, num quiosque da praia, a gente vai ver o povo feliz, a gente vai ver o povo conversando, bebericando, falando de futebol, falando de namorado, de namorada, falando do Brasil, e não essa violência que a gente vê hoje.
Essa é uma coisa que o mercado vai ter que se acostumar.

Porque eu não quero que o mercado venha fazer pergunta para mim o que eu vou fazer, eu quero perguntar para o mercado o que vocês vão fazer para acabar com a fome desse país, o que vocês vão fazer para gerar emprego nesse país, o que vocês vão fazer para tornar o crédito mais barato para o povo, o que vocês vão fazer para ajudar a gente a diminuir o endividamento da sociedade brasileira, o que vocês vão fazer para parar de cobrar 300% de juros do cartão de crédito? Então, essas coisas é que nós temos que discutir. É chegar para o banqueiro e perguntar: cara, que Brasil você quer? Me conta, qual é o Brasil que você quer? Você quer um Brasil onde no final do ano você faça um balanço que teve um lucro de 30 bilhões de reais e o povo aumentou a pobreza, ou você quer um país onde você ganha um pouco menos e o povo ganha um pouco mais?

É essa discussão que nós temos que fazer nesse país. Você pode mandar o seu filho estudar em Paris, estudar em Londres, estudar em Nova York, e o filho do pobre estuda aonde? Então, é esse país que eu quero discutir com o mercado, que eu quero discutir com os empresários, que eu quero discutir com a sociedade brasileira. Não é um Brasil para mim, é um Brasil para o Brasil, é um Brasil para o povo brasileiro. Essa é uma coisa.

Outra coisa é a Petrobras. João Hilário, se você quer saber uma coisa que me deixa irritado é a canalhice que estão fazendo com a Petrobras. A Petrobras não é apenas uma empresa de petróleo, a Petrobras é uma empresa de grande investimento, a Petrobras investe em tecnologia, a Petrobras investia para poder fazer fomentar o surgimento de pequenas e médias empresas. Você está lembrado que, em dezembro de 2010, eu capitalizei a Petrobras no maior processo de capitalização da história do capitalismo Mundial. Eu vou repetir João Hilário: em dezembro de 2010, quando nós descobrimos o pré-sal, eu fiz o maior processo de capitalização da história do capitalismo mundial na Bolsa de Valores de São Paulo.

A gente adquiriu o equivalente a 5 bilhões de barris de petróleo para transformar a Petrobras numa empresa que fosse das maiores do mundo. O que aconteceu? Nós fizemos uma reformulação, criamos a Lei da Partilha para que o petróleo fosse do povo brasileiro, criamos um fundo para investir em educação, ciência e tecnologia e na saúde, criamos uma empresa para administrar um fundo da sociedade brasileira, a serviço do capital estrangeiro,

João Hilário, eles inventaram uma quantidade de mentira na Petrobras. Porque se tem um diretor da Petrobras roubando você prende esse diretor, mas deixa a empresa funcionando. Se tem uma empresa que prestava serviço para a Petrobrás e ela roubou, manda prender o dono da empresa, mas deixa a empresa trabalhando. O que eles fizeram? Eles quebraram toda a indústria de óleo e gás desse país, quebraram a indústria naval, deram um prejuízo de 270 bilhões de reais que deixou de ser investido nesse país, geraram 4 milhões e 400 mil desempregados nesse país, e ainda o Estado deixou de arrecadar 58 bilhões.

É isso que eles fizeram, para poder denunciar o PT, para poder levantar calúnia contra o PT. Ah, mas é verdade que tinha alguém que roubou? Olha, se tinha alguém que roubou que prenda, mas que não destrua a empresa. Você prende o dono, mas deixa os trabalhadores trabalhando, por que você vai causar prejuízo à sociedade?

Bem, a segunda coisa é o seguinte, a Petrobras hoje, a descoberta do pré-sal, petróleo que está há quase 6 mil metros de profundidade, 7 mil metros de profundidade, é a maior descoberta de petróleo do século 21. Não sei se tem outra, não sei se tem outra descoberta como essa. Quando nós descobrimos o petróleo diziam que a gente não tinha capacidade de explorar, que era muito caro.

Hoje, o barril do petróleo tirado do pré-sal é equivalente ao preço do barril de petróleo tirado na Arábia Saudita. Porque a Petrobras tem tecnologia porque a Petrobras investiu em tecnologia. Bom, então não tem nenhum sentido o preço do petróleo ser internacional. Se o Brasil tivesse que importar petróleo tudo bem, que a gente está importando o petróleo a preço internacional. O que esses malandros fizeram? Eu vou repetir, o que esses malandros fizeram? Esses malandros estão destruindo a Petrobras, fatia por fatia. Na hora que eles privatizaram a BR o que aconteceu? Apareceram nesse país 432 empresas que estão importando gasolina dos Estados Unidos da América do Norte, importando a preço de dólar, e aí o preço é internacional. Aí quem paga?

Quem paga é o nosso companheiro com carro, é o nosso companheiro que tem um caminhão, são os caminhoneiros brasileiros, são os pobres que tem um carro, e no final das contas sobra para o povo que não tem carro e que não tem caminhão, que é o povo que vai no supermercado comprar as coisas que está mais caro porque o preço da gasolina, o preço do diesel, o preço do gás, entra no preço dos alimentos. Então, o povo que está pagando o gás, está pagando o diesel, está pagando gasolina a preços que jamais poderiam pagar. Jamais.

A gente não deveria estar exportando petróleo cru e comprando gasolina, a gente deveria estar exportando derivado de petróleo, a gente deveria estar exportando gasolina chique para os Estados Unidos, gasolina chique para a Europa com 10 PPM. Sabe o que que é PPM? É partícula por milhão, ou seja, é para você diminuir os poluentes da gasolina e do óleo diesel. Então, a gente poderia estar exportando gasolina para a Europa, gasolina para os Estados Unidos, gasolina para o mundo. Não. Nós estamos exportando óleo cru e estamos comprando gasolina. E por isso a gasolina em alguns estados brasileiros chegam a 8, no outro chega a 7, no outro chega a 6,76.

Então, eu quero dizer aqui em alto e bom som, eu sei que o mercado fica nervoso quando eu falo, mas eu quero que eles pensem o seguinte, nós vamos abrasileirar o preço da gasolina, o preço vai ser brasileiro, porque os investimentos são feitos em reais, a gente vai tirar a gasolina, a gente vai aumentar a capacidade de refino. Porque você sabe que eu estava fazendo uma refinaria no Ceará, eles pararam, eu estava fazendo uma refinaria no Maranhão, eles pararam, eles demoraram 10 anos para acabar a refinaria de Pernambuco, eles demoraram 10 anos e ainda não terminaram o polo petroquímico do Rio de Janeiro.

Então meu caro é o seguinte: nós temos que fazer mais refinaria, porque hoje as nossas refinarias foram vendidas, estão algumas para serem privatizadas, o Brasil está refinando 25% de gasolina menos, e nós precisamos, então, refinar mais gasolina com preço brasileiro para que o povo não precise pagar o preço em dólar. É isso que vai acontecer João. Agora, eu quero que você saiba o seguinte, você não fique pensando que eu estou bravo, porque eu estou falando bravo, não estou bravo não.

João Hilário: Acho que o senhor está muito empolgado, presidente, está muito empolgado.

Luiz Inácio Lula da Silva: Não confunda no meu gesto braveza não. Eu estou indignado com o que eles estão fazendo com esse país. Agora mesmo, agora mesmo vão querer privatizar a Eletrobras, para aumentar mais a energia elétrica para deixar o povo mais no escuro. Porque os empresários privados não tem preocupação se o povo está vivendo no escuro, se o povo está cozinhando na luz de candeeiro, se a mulher está costurando na luz de candeeiro, não, o que eles querem é lucro.

E quem tem que cuidar do povo é o Estado, quem tem que fazer política social é o Estado. É por isso que nós fizemos o Luz para Todos, foram mais de 15 milhões de pessoas beneficiadas, e nós investimos mais de 20 bilhões para levar energia na casa das pessoas, porque o pobre também tem direito de ver televisão, de ter geladeira, de ter uma bomba d’água, de ter uma casa de farinha, sabe, não é só o rico para ver televisão não, é o pobre também.

Então quando nós decidimos fazer esses programas sociais: o Estado está gastando muito, o Estado está gastando. O Estado não está gastando, o Estado está investindo, porque tudo que é para o rico é investimento, tudo que é para o pobre é gasto. Vamos inverter, vamos inverter, tudo o que é para pobre é investimento, porque melhorar a saúde do pobre, melhorar a educação do pobre, melhorar a moradia do pobre, ou seja, é investimento numa sociedade mais sadia, numa sociedade mais alegre, numa sociedade mais humana, numa sociedade mais amorosa, e não uma parcela da sociedade de miliciano tudo com ódio como a gente está vendo hoje no Brasil.

Então é o seguinte, meu caro João Hilário, fique tranquilo que essa minha indignação é o que vai fazer com que a gente conserte esse país. E eu quero que a sociedade brasileira fique indignada, ninguém pode se conformar em passar fome, ninguém pode se conformar em passar fome. Esse país é o terceiro maior produtor de alimentos do mundo, esse país é o maior produtor de proteína animal do mundo, de carne de gado, de carne de porco, de carne de carneiro, de carne de tudo, não tem sentido uma pessoa ir no açougue e pegar um osso para levar para casa. Isso sim é falta de vergonha.

Então, meu caro, pode ter certeza, com a mesma fé que eu tenho em Deus, com a crença que eu recebi e as orientações da minha mãe, a dona Lindu, que nasceu e morreu analfabeta, é com esse amor, é com essa força que eu quero ajuda do povo brasileiro para consertar esse país. Esse país vai ser consertado se o povo assumir a responsabilidade de dizer: o país é nosso, o país não é do governo, não é de militar não, é de nada, o país é do povo.

Então, é o povo que tem que assumir a responsabilidade de reconstruir o nosso país. E é isso que eu quero que você acredite, você vai ter oportunidade de me entrevistar muito tempo porque embora eu tenha 76 anos de idade, eu já falei para você, eu tenho energia de 30 anos. Não pense que é brincadeira, não, e eu tenho muita energia para poder colocá-la à disposição do meu país. Por isso eu fico indignado.

João Hilário: O presidente Lula, gente, sentou a esta mesa que ele está sentado para nos conceder essa entrevista, 22 minutos antes. Quero agradecer ao presidente pela seriedade com que ele levou essa entrevista, ele estava às 11:38 ele já estava sentado nessa mesa, conversamos um pouquinho ali antes da entrevista, e ele dizia que podia perguntar tudo o que a gente quisesse, não tinha limitação de assunto e tudo. Até brincou um pouco comigo um pouco antes. Bom, o senhor falou em privatização da Petrobras, em privatização da Eletrobras, não é, que de uma certa forma fala-se muito em privatização, a direita, a extrema direita, a direita fala muito em privatizações. Quando foi anunciada a sua entrevista aqui presidente, um carteiro de Juazeiro do Norte, muito gentilmente me passou uma mensagem, e disse: João, acho que eu estou falando em nome dos carteiros de todo o Brasil. Há uma grande preocupação com a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. Pergunte ao presidente Lula se no governo dele ele decidiria privatizar os Correios ou permaneceria com esse serviço básico estatal durante o seu governo? Qual é a sua opinião sobre esse assunto presidente Lula?

Luiz Inácio Lula da Silva: A minha opinião é a mesma da Eletrobras, é a mesma da Petrobras. Eu quero que esse companheiro carteiro saiba o seguinte, apesar das pessoas que estão governando esse país dizer que depois da internet não tem mais sentido ter o Correio fazendo o trabalho que faz, eu queria dizer para você que o Correio vai continuar funcionando porque o Correio presta um serviço extraordinário ao povo brasileiro, os carteiros são das figuras mais respeitadas. Quando o carteiro chega numa casa e bate palma, a pessoa da casa tem confiança que ali está uma mulher ou um homem trabalhador. Portanto, além de gerar empregos, além de distribuir riqueza nesse país, nós vamos manter os carteiros e o Correio funcionando. Não se preocupe porque no nosso governo ele será fortalecido e não prejudicado. Isso vale para outras empresas públicas que têm que prestar serviço para o povo brasileiro.

Eu não sou favorável, João Hilário, à estatização de tudo não, eu acho que apenas as empresas estratégicas que atendam aos interesses soberanos desse país é que tem que ter a participação do Estado, que pode ser empresa de economia mista. Não tem problema. O que é importante é que o Estado assuma a responsabilidade. Se não fosse o Estado, se não fosse o Estado com o BNDES, a gente não teria escapado da crise de 2008. A crise pegou os Estados Unidos, pegou toda a Europa, nós conseguimos sair dela porque nós colocamos 100 bilhões de reais pelo BNDES para investir em obras públicas, em obras de infraestrutura.

Então, meu caro, o Estado tem que ter… agora na pandemia, agora na pandemia, no Covid-19, quem é que está salvando vidas? É o Estado, é o SUS. O SUS que foi tão massacrado desde que foi criado em 88. João Hilário, você cansou de ver notícias contra o SUS, agora que precisou mostrar o que o SUS é, a gente deve a vida de milhões de brasileiros aos trabalhadores do SUS, às mulheres, às enfermeiras, aos atendentes, aos médicos que, com a sua dedicação, conseguiram provar a capacidade da saúde pública nesse país.

Então, o Estado, João Hilário, ele tem que ter responsabilidade. Agora, nesse governo não, o cara quer vender tudo, o cara quer vender. Quando não tiver mais o que vender, vão vender a alma ao diabo. Não, o Estado tem que ser forte para garantir que as pessoas mais humildes sejam tratadas com decência. Portanto, João Hilário, diga para o nosso companheiro do Correio que ele vai continuar entregando a sua cartinha.

João Hilário: Presidente, em relação a aliança com o Alckmin, o ex-governador de São Paulo, o Alckmin, ex-candidato, inclusive adversário seu em campanhas políticas, considerado um político moderado de centro, centro-direita, de quem é a decisão, de quem parte a decisão de Alckmin na vice? É claro que o Alckmin é um político respeitado, embora não tenha tido um resultado satisfatório na última eleição de presidente, e até em outras eleições, já tivera sido bem mais votado em outras eleições, já concorreu a segundo turno em eleições. Mas é considerado uma pessoa moderada e uma pessoa do centro para um pouco, centro-direita. De quem é essa eleição? Porque nós vemos que há declarações de próceres do PT que fazem reticências, que fazem restrições em relação à escolha do Alckmin. O martelo está batido? E foi o senhor que efetivamente escolheu o Alckmin, como o senhor escolheu lá atrás o empresário José Alencar que foi seu vice, e que foi tão coerente com o seu trabalho durante os seus oito anos do primeiro mandato?

Luiz Inácio Lula da Silva: João, apenas algumas explicações para o povo e para os teus ouvintes da Rádio Progresso de toda a região do Cariri, das 43 cidades que essa potente rádio alcança. Veja, primeiro, o Alckmin não tem partido político, ele saiu do PSDB e não escolheu um partido político ainda. E eu não decidi se sou candidato ainda, porque eu vou esperar mais ou menos quem sabe no meio de março, ver se vai sair as federações para decidir. Quando o Alckmin se filiar a um partido e eu decidir ser candidato, nós vamos conversar com as forças políticas que estarão junto conosco. Agora, vamos ser francos, sabe, ninguém, ninguém tem mais prioridade para escolher o vice do que o presidente. E, obviamente, que eu levo em conta o meu partido, eu levo em conta os aliados, mas obviamente que eu tenho um poder de dizer quero ou não quero, ninguém vai me impor um vice que eu não queira.

Então veja, eu estou fazendo uma tentativa de mostrar ao povo brasileiro que eu não sou candidato, se for candidato, do PT. O PT é o meu partido, é o partido que eu criei, mas eu quero ser candidato de um movimento pela recuperação da democracia nesse país. O povo do bem do Ceará, os empresários de bem do estado do Ceará, os empresários honestos do Ceará, os empresários que querem servir a esse país sabem que, se quiserem votar em alguém para consertar o país, eles sabem que têm que votar no Lula. Então, eu estou discutindo uma aliança política que possa mostrar para a sociedade que tão importante quanto ganhar, o mais importante é governar. E para governar eu vou precisar de muita gente, não se assuste, eu já fui aí no Ceará conversar com o Tasso Jereissati. Se for preciso voltar a conversar com outras pessoas eu vou voltar a conversar, porque não sou eu sozinho que vou consertar o país.

Eu vou precisar do povo, vou precisar de gente que votou em mim e que não votou em mim, vou precisar de gente que gosta de mim e gente que não gosta de mim, eu vou precisar de gente que gosta do Brasil e que quer reconstruir esse país. E, aí sim, eu vou escolher o meu vice, e se for o Alckmin a gente vai fazer uma governança exemplar nesse país, como eu fiz com o José de Alencar. Ainda não está definido, João Hilário, mas pode ficar certo que nós vamos definir, logo logo nós vamos definir. Eu estou conversando com muita gente, estou conversando com vários partidos políticos, mas sobretudo conversando com movimento sindical, conversando com movimento social, conversando com empresários, porque eu quero provar que a gente tem que governar o país diferente dessa coisa que está aí.

A primeira coisa que eu quero fazer, se for candidato e ganhar as eleições, no mês de janeiro, é fazer uma reunião com todos os governadores sem querer saber de que partido ele pertence. É que eu quero repactuar o funcionamento da federação, os estados precisam do Governo Federal e o Governo Federal precisa dos estados. Então, tem que ter um casamento de procedimento. Nós temos que conversar com os prefeitos deste país para saber qual é a obra necessária na sua cidade, o que está faltando na cidade. Nós não podemos mais ter um presidente que não conversa com ninguém, a não ser que os seus milicianos, que não fale em educação, que não fale em saúde, que não fale em emprego, que não acredita na ciência. O país não merece isso, João Hilário, o país não merece, esse país pode e deve ser diferente.

É por isso que eu estou convencido que tão importante ou mais importante do que ganhar as eleições é governar esse país, e eu quero governar com todo mundo. Com todo mundo sabendo que o povo vai participar, não é todo mundo da elite não, é com o povo, é com esse povo que trabalha, que sofre, que tem esperança, que recebe promessa e que às vezes ninguém atende. É com ele que eu quero governar esse país.

João Hilário: Presidente, o Ceará é um caso à parte, tem um governador do PT, o governador mais bem avaliado do país, e tem um apoio de Ciro Gomes, de Cid Gomes, Cid Gomes que foi também um grande governador, que também foi aliado seu, o Ciro também foi aliado seu. Mas o Ciro se propõe a ser candidato, é pré-candidato a presidente da República, tem feito algumas críticas ao ex-presidente Lula e aos seus governos também. Outro dia Camilo almoçando na nossa casa eu disse: Camilo, tu és o governador mais bem avaliado do país, mas tu tens um gargalo muito grande para resolver na eleição. Como será possível conciliar o PT querendo também protagonismo no estado do Ceará, porque tem membros, tem quadros também muito populares, até que já foram, no caso o José Airton foi candidato a governador duas vezes, e foi ao segundo turno com grandes chances e perdeu por muito pouco no segundo turno. O PT tem o atual governador do estado, mas tem uma aliança muito forte e uma aliança firme que levou o Ceará a indicadores muito positivos, essa aliança. Como é possível contornar essa situação aqui no estado do Ceará para que não haja dois palanques, ou se houver os palanques que tudo seja sem, digamos assim, sem muitas agruras dentro da atual política no estado do Ceará, presidente Lula?

Luiz Inácio Lula da Silva: Olha, deixa eu te contar uma coisa, João Hilário. Em 2002, eu tive no primeiro turno 40% dos votos no Ceará, e no segundo turno eu tive 71.78% dos votos. Em 2006, eu tive no primeiro turno 71% e no segundo turno 83% dos votos. Então, eu começo dizendo que eu sou muito grato ao povo do Ceará, sou grato à ajuda que me deu o Cid, que me deu o Ciro, que me deu quem me ajudou. Eu levo muito a sério as pessoas que contribuíram comigo. Como eu também levo a sério quando o Ciro quis ser candidato. O Ciro já foi candidato duas vezes contra mim, e eu nunca achei ruim que ele fosse candidato. O PSB já lançou candidato contra mim. Se o partido quiser lançar candidato, que lance candidatos.

Veja, eu tenho um profundo respeito pelo Camilo, o Camilo é uma obra-prima que Deus deu ao Ceará, e por coincidência ele entrou no PT, e é um governador do PT muito extraordinariamente avaliado. E eu sei que o Camilo agora é pai, porque acabou de nascer um filho dele. E, obviamente, que o Camilo tem que fazer a política que é conveniente para o estado do Ceará. Eu acho que o Camilo pode compor, não sei se ele vai compor, com quem ele vai compor, eu sei que ele vai ser candidato ao Senado, eu sei que ele vai escolher o candidato a prefeito, um candidato a governador para sucedê-lo, uma pessoa que ele confie. Se ele confia, ele precisa convencer o PT a confiar na pessoa que ele vai indicar. E aí nós vamos estar juntos. O Ceará tem voto para todo mundo aí, tem voto para muita gente.

Eu vou, vou pedir para o povo cearense mais uma vez, com o carinho do povo cearense, eu vou pedir que, se eu for candidato, que ele vote no PT, que vote em mim, que vote nos deputados do PT, que vote no Camilo para o Senado, para a gente poder melhorar esse país. Eu estou muito tranquilo com relação a isso. Ninguém será o meu inimigo porque concorreu contra mim. O resultado final é do povo, e quando o povo vota e toma uma decisão, a gente acata e fecha a boca. Eu perdi as eleições em 89, eu perdi as eleições em 94, eu perdi as eleições em 98 e nunca ninguém me viu ficar nervoso, falando mal. Eu perdia as eleições, ia para casa me preparar para ganhar as próximas eleições.

Eu perdi três eleições, só fui ganhar na quarta. E eu acho que nessas eleições eu tenho vontade de ganhar, se eu for candidato e ganhar, eu tenho certeza que nós vamos resolver mais uma vez os problemas do sofrimento do povo brasileiro.

João Hilário: Presidente, bom, estamos com uma hora de entrevista, o presidente até brincava dizendo que uma hora é muito pouco, duas horas, vamos fazer duas horas. Mas a sua assessoria já nos disse que o senhor tem um compromisso agora a uma hora. Eu sei que é uma semana de muitas articulações políticas, sei que o senhor está bastante atarefado com essas articulações políticas, e assim nós estamos imensamente honrados com a sua entrevista aqui a Rádio Progresso, a Rádio Santana FM, de Santana do Cariri, a Cultura FM, de Assaré, Barbalho também, a Difusora do nosso Gonzagão, enfim, todas as outras difusoras que nos retransmitiram. Obrigado às redes sociais também que nos transmitiram. Quero agradecer ao presidente Lula pela sua entrevista, muito cortês, repito, às 11:38 ele já estava sentado a essa mesa e a gente já estava conversando, demonstra a seriedade, o compromisso dele para com a imprensa, para com a população também da região do Cariri, falando aqui através da Rádio Progresso. Quero fazer um convite presidente, quando o senhor vier à Juazeiro do Norte, venha aqui a nossa emissora para o senhor participar, trazer aqui ainda que seja rapidamente para falar com o povo da região do Cariri. Boa sorte na sua empreitada, mais uma, com a sua experiência, com a sua simpatia, com o seu carisma, com sua popularidade em todo o país, obrigado. O nosso Murilo Siqueira, que é um dos nossos grandes ícones do rádio jornalismo aqui também está aqui presente, o nosso Murilo Siqueira cumprimentando o presidente Lula. Muito obrigado, o Raul aqui que fez toda a técnica para essa entrevista, o Vitor também, muito obrigado por essa terceira entrevista presidente. Já o entrevistamos aqui na Progresso dia 01 de outubro de 2020, já o entrevistei em Petrolina, naquela empresa lá na Infraero em Petrolina, já apresentei seu título de doutor honoris causas na Urca, aqui, já tive tantos contatos e posso atestar a sua simpatia, a sua linearidade de simpatia para comigo e para com todas as pessoas. Muitíssimo grato pela sua entrevista, presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Luiz Inácio Lula da Silva: João Hilário, obrigado, obrigado pelo carinho, obrigado pela atenção. Eu quero agradecer a você, agradecer a todas as rádios coligadas que participaram dessa entrevista, e quero assumir um compromisso com você e com o seu público: eu indo ao Ceará e indo ao Juazeiro, eu quero sentar nessa cadeira perto do seu lado para fazer pergunta bem forte para mim para a gente poder conversar com muita seriedade junto com o nosso povo. Um abraço querido, que Deus te abençoe e que Deus abençoe o povo do Cariri e o povo do Ceará.

João Hilário: Muito obrigado ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, nessa entrevista exclusiva para o Jornal Progresso pela Progresso Santana, Cultura FM de Assaré, Difusora Gonzagão e enfim, todos os outros veículos que nos retransmitiram. Muito obrigado, muito bem-vindo presidente.