Leia íntegra da entrevista do ex-presidente Lula à Rádio Jornal, de Recife (PE)

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Na sexta, 29 de abril, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva concedeu entrevista ao vivo à Rádio Jornal, de Recife (PE).

Lula conversou com os jornalistas Geraldo Freire, Wagner Gomes, Romoaldo de Souza e Igor Maciel, no Programa super Manhã. Confira a íntegra:

Geraldo Freire: É um prazer recebê-lo aqui, e vamos falar para o mundo, está certo?

Luiz Inácio Lula da Silva: Está certo, de Recife para Paris.

Geraldo Freire: Aí, está certo. Bom, como eu vou, certamente o tempo não vai permitir, eu só vou lhe fazer uma pergunta, eu queria lhe fazer uma pergunta talvez um pouco demorada. Porque o senhor tem como companheiro de chapa um candidato a vice que não é um candidato qualquer, o senhor tem Geraldo Alckmin. Convencionou-se se colocar como vice um candidato que não perturbasse, que não criasse dificuldade e que também não fizesse nada. Se a gente for para o finado José Alencar, ele passou oito anos com o senhor, desses oito anos a única coisa que ele faia era reclamar da taxa de juros e o senhor achava graça, deixava para lá. Bom, aí eu lhe pergunto, qual é, qual pode ser o papel de Geraldo Alckmin sendo vice-presidente no governo de Lula?

Luiz Inácio Lula da Silva: Bom, Geraldo primeiro bom dia, bom dia ao povo de Recife, bom dia aos ouvintes do programa Super Manhã, bom dia aos ouvintes da Rádio Jornal. Eu quero dizer que é um prazer falar com Pernambuco outra vez, falar com você. E estou percebendo que você tem vários companheiros que vão participar da entrevista. Nós temos aí o companheiro Wagner Gomes, temos o Romualdo de Souza, temos o Igor Maciel.

Deixa eu falar uma coisa para você, eu fui candidato em 89, 94, 98, 2002, 2006, eu só tive uma vez um candidato do PT, que foi em 94, o companheiro Aloísio Mercadante, porque o Bisol desistiu. Eu tive duas vezes vice do PSB, que foi o companheiro Bisol, que foi meu vice em 89 e 94. Depois eu tive o Brizola em 98, depois o José Alencar duas vezes, e agora eu estou com o Alckmin.

Ora, para mim, é muito importante fazer essa aliança com o governador Alckmin, primeiro, pela representatividade que ele tem. Ou seja, um político que tem 20 anos na governança de São Paulo é um político muito, muito preparado. É um companheiro que nós disputamos duas eleições, trocamos ofensas, que é próprio de política, como um jogo de futebol, o jogador dá botinada no outro, mas de repente eles vão para o bar tomar cerveja e conversar da forma mais civilizada possível.

Eu acho que o Alckmin vai completar a necessidade que eu tenho de falar com outros segmentos da sociedade, não apenas em São Paulo, mas no Brasil inteiro. E eu acho que ele vai me ajudar a fazer um governo melhor do que eu já fiz quando eu governei esse país, de 2003 a 2010.

Geraldo Freire: O senhor reconhece que quando pegou o governo da outra vez pegou numa situação bem melhor do que agora, se por acaso o senhor pegar. Concorda?

Luiz Inácio Lula da Silva: Não, é bem melhor, mas vamos ver como é que estava o governo. O governo, quando eu peguei em 2003, tinha uma inflação de 12%, tinha um desemprego de 12%, tinha uma dívida externa de 30 bilhões de dólares, o Brasil não podia pagar as suas exportações, tinha uma dívida pública interna de 65%, e o Brasil não tinha nenhuma reserva internacional.

O que aconteceu é que em cinco anos a gente consertou esse país. E, agora, nós vamos pegar o Brasil numa situação pior, não apenas do ponto de vista econômico, do ponto de vista de crescimento, do ponto de vista social, do ponto de vista sanitário. Nós vamos pegar um país em que as instituições foram destroçadas.

Ou seja, é preciso, então, ter certeza de que nós vamos reconstruir esse país para a gente voltar a civilidade, para a gente voltar à normalidade, para a gente aprender a conviver democraticamente na adversidade. Que as pessoas se encontrem na rua, se cumprimentem, se encontrem num restaurante, pode ter disputado uma campanha, mas as pessoas não são inimigas, as pessoas são adversárias apenas.

E é isso que nós temos que recuperar, além do que esse povo precisa voltar a comer, precisa voltar a trabalhar. E é isso que nós vamos fazer.

Geraldo Freire: Bom, então nós vamos fazer a nossa rodada da mesa aqui. Temos o nosso Igor Maciel, colunista de política do Jornal do Comércio.

Igor Maciel: Lula, muito bom dia. A gente acompanhou ontem que o senhor esteve num evento do PSB e sempre que tem algum evento junto com o PSB o senhor aparece lá com Danilo Cabral, Danilo Cabral faz uma foto e aí coloca nas redes sociais, e olha, o Lula apoia o Danilo Cabral, o Lula apoia o Danilo Cabral. E aqui a gente tem a Marília Arraes, que saiu recentemente do PT, foi para o Solidariedade, foi para o Solidariedade e lá no Solidariedade ela foi, disse que é candidato ao governo também e que conta com, pelo menos, a sua imagem e com o senhor no palanque dela também. Afinal, o ex-presidente Lula, candidato à presidência da República em 2022, apoia quem em Pernambuco?

Luiz Inácio Lula da Silva: Olha, deixa eu lhe falar uma coisa, Igor. Eu, primeiro, lamentei profundamente a saída da Marília do PT de Pernambuco. Você você sabe que o Humberto era, na minha opinião, a pessoa que deveria ter sido candidato a governador, o Humberto retirou a candidatura para que o PSB pudesse indicar um candidato. Eles indicaram o Danilo, e a Marília era então a preferida para ser a candidata ao Senado. Por problemas internos, a Marília resolveu sair do PT. Ao sair do PT, a Marília criou uma situação para mim que é o acordo que eu tenho com o PSB.

Então, o meu candidato a governador no estado de Pernambuco é o Danilo. É o Danilo porque nós temos um acordo com o PSB. Esse acordo não é apenas em Pernambuco, é um acordo nacional, é um acordo que nos interessa porque agora o Alckmin faz parte do PSB, o nosso companheiro governador do Maranhão faz parte do PSB, sabe. Então, o PSB ganhou uma dimensão nacional importante e para nós essa aliança com o PSB é muito importante, a nível nacional e a nível de Pernambuco.

Por isso, embora eu mantenha toda a relação de respeito que eu tenho, porque eu não misturo a minha relação pessoal com a minha relação política, embora eu mantenha uma boa relação com a Marília, eu, sinceramente, vou trabalhar para que o Danilo seja o governador do estado de Pernambuco. É esse o meu compromisso com o PSB, e o compromisso do PSB é me ajudar a me eleger presidente da República.

Igor Maciel: E pergunto isso e eu vou só insistir em um determinado, num certo ponto, que é o seguinte Lula, a Marília quando lançou a candidatura dela foi com a sua foto e ela disse que vai levar a sua foto, vai colocar a sua foto no palanque. O PSB, chegou-se a falar no PSB, em tentar entrar na Justiça para proibir isso. Ela disse que está acobertada juridicamente. O senhor vai fazer, vai criar algum problema com isso, ou o PT vai criar algo com isso, com o uso da sua foto na campanha dela?

Luiz Inácio Lula da Silva: Não, eu não vou criar nenhum problema porque em outros estados eu estou apoiando um outro candidato e tem candidatos do PSB que vão usar a minha foto e vão trabalhar também a minha candidatura. Ou seja, eu já fui candidato algumas vezes e algumas vezes tinha vários partidos políticos me apoiando para candidato, mesmo no mesmo estado.

Aí em Pernambuco, mesmo, vocês são testemunha que eu levava para o palanque o Eduardo Campos e o Humberto Costa. Os dois eram candidatos a governadores, eu pedia voto para os dois e dizia: quem for para o segundo turno a gente vai eleger governador. E deu certo, o Eduardo Campos foi eleito governador. É plenamente possível, vai ter mais gente, inclusive vai ter gente de outros partidos políticos mais conservadores que vão querer trabalhar a minha candidatura para presidente.

E eu, obviamente, que não vou brigar com ninguém. Eu gosto que as pessoas façam aquilo que bem entender porque eu vou precisar quanto mais voto melhor para ganhar as eleições. Mas o que eu quero dizer é que, oficialmente, o meu apoio é para o Danilo.

Geraldo Freire: Estamos com o ex presidente Lula, candidato novamente agora pelo Partido dos Trabalhadores, ele fala para Pernambuco, por toda a nossa rede Rádio Jornal Petrolina, Rádio Jornal Garanhuns, Rádio Jornal Pesqueira, Rádio Jornal Caruaru, Rádio Jornal Limoeiro, as nossas mídias todas pela toda internet, o UOL também está com a gente nessa hora. E vamos para Romualdo de Souza em Brasília.

Romoaldo de Souza: Presidente Lula, muito bom dia para o senhor. Na gestão do presidente Michel Temer, a Petrobras passou a adotar o PPI – preço de paridade internacional. Na prática, presidente, o dólar sobe em relação ao real, o combustível sobe. Quando o mercado internacional eleva o preço do barril, o preço sobe aqui na bomba na mesma hora. No Congresso Nacional, presidente Lula, temos um projeto aguardando a votação na Câmara que cria uma espécie de colchão para amortecer esse impacto. Se o senhor vencer as eleições, o que o senhor vai fazer no dia 01 de janeiro de 2023? A Petrobras vai manter o PPI ou a Petrobras vai ter uma outra política de preços para não impactar tanto o frete, o preço do combustível, e principalmente, o dia a dia da dona de casa porque só nisso aí o preço da cebola já sobe 22%, presidente?

Luiz Inácio Lula da Silva: Olha, Romoaldo, obrigado pela pergunta. Você sabe perfeitamente bem que, durante oito anos na presidência, eu cuidei para que o preço da Petrobras fosse um preço baseado no custo nacional. A Petrobras faz prospecção de petróleo em real, a Petrobras financia a construção de navio petroleiro em real, a Petrobras paga o salário dos seus trabalhadores em real. Então, não existe nenhuma explicação de o preço internacionalizado, porque isso só tem como objetivo pagar dividendos para os acionistas da Bolsa de Nova York. Isso não é explicável para a opinião pública brasileira. Não é explicável.

Veja, eu fui presidente da República e, na crise de 2008, o barril do petróleo chegou a 147 dólares, mais do que é hoje. E você sabe quanto você pagava no litro de gasolina para colocar no teu carro aí em Brasília? Apenas R$ 2,60, numa demonstração de que não é possível. E por que está assim o preço, Romualdo? Está assim porque quando destroçaram a BR, dizendo que era preciso criar concorrência, hoje nós temos 392 empresas importando gasolina dos Estados Unidos sem pagar imposto.

E, mesmo assim, nós estamos pagando o preço da gasolina a preço internacional, quando nós poderíamos ter gasolina a preço estabelecido pela Petrobras em função da realidade da nossa moeda. Por isso, eu quero te dizer que, se ganhar as eleições e voltar à Presidência da República, eu tenho utilizado a palavra abrasileirar os preços do combustível, o preço de gás.

Eu quero te dizer que é uma vergonha, não tem nada a ver com a crise da Ucrânia, não tem nada a ver com a pandemia, o gás de cozinha custar até R$ 150,00 em alguns estados. É uma vergonha a gasolina custar R$ 8,00, o diesel custar quase R$ 7,00, é uma vergonha. É uma vergonha. Então, o preço não precisa ser, sabe, um preço de paridade internacional.

O preço pode ser em função da nossa realidade, e é isso que nós vamos fazer. Pode se preparar que você vai encher o tanque do seu carro com o preço da gasolina em real. Em função da nossa realidade, nós já provamos que isso é possível, a Petrobras era grande, a Petrobras, você está lembrado que em 2010 eu fiz a maior capitalização da história do capitalismo mundial, capitalizamos em 70 bilhões de reais a Petrobras, para ela se transformar na segunda empresa de energia do mundo. E eles estão fatiando e tentando vender.

Nós, hoje, não temos a refinaria produzindo a quantidade de gasolina que nós quisemos, que nós precisamos porque eles demoraram para concluir a Refinaria Abreu e Lima. Eles destroçaram a ideia da refinaria em Fortaleza, da refinaria no Maranhão, ou seja, então o Brasil hoje não refina a quantidade de gasolina que precisa porque o Brasil precisa fazer novas refinarias, ou seja, isso chama-se incompetência gerencial e nós vamos mudar isso.

Geraldo Freire: Agora é Wagner Gomes que participa.

Wagner Gomes: Presidente, eu tenho aqui em posse uma pesquisa que foi divulgada ontem pelo Instituto Futura, feita por encomenda do Banco Modal, e eu tenho um recorte aqui que é bastante interessante, presidente. Que ele pergunta, a pesquisa pergunta ao entrevistado aqui o seguinte: se você fosse presidente da República qual seria a sua prioridade considerando as opções? Eu vou ler de baixo para cima, a quarta opção, a que aparece em quarto lugar aparece reduzir o desemprego, com 14,9%. Em terceiro lugar, melhorar a educação pública, com 17,9%. Em segundo lugar, melhorar a Saúde Pública, com 18,6%. E em primeiro lugar, presidente, o combate à fome, com 20,9%. Eu estou trazendo esse recorte aqui porque a gente está vendo muita discussão em torno dos pré-candidatos e quase nada de propostas. Até agora a gente não viu ninguém dizendo, olha, eu vou começar a consertar esse país a partir de tal ponto. Então, era isso que eu queria saber do senhor. Caso o senhor seja eleito, o que o senhor pretende fazer a partir de 01 de janeiro de 2023? Levando em consideração aquilo que o Geraldo já falou, que a situação que o senhor vai herdar, caso seja eleito, vai ser muito diferente daquela de 2003. E quero saber também. Presidente, do seu time. Para consertar esse país, quem o senhor vai botar em campo? Naquela época em 2003 a gente sabia quem era o seu time, estava todo mundo aparente. Nomes como José Genuíno, José Dirceu e Dilma Rousseff vão entrar em campo também agora, presidente?

Luiz Inácio Lula da Silva: Não, primeiro que ninguém sabia meu time em 2003, ninguém sabia. Porque eu escolhi o meu time depois que eu ganhei as eleições. Veja, é preciso ter cuidado porque, quando tem pessoas que falam que é preciso escolher o time antes, se você escolher o time antes de ganhar as eleições, você pode não ganhar as eleições. Porque você começa a gerar discórdia dentro do seu próprio time. É preciso ter muito cuidado. Até no futebol os técnicos só escalam um time na hora de entrar em campo, porque senão ele vai criar uma zorra total dentro do vestiário.

Então, eu queria te dizer o seguinte, você é pernambucano e você sabe que em 2011 o desemprego aqui nesse estado era de apenas 4.7%. Você sabe que, quando eu fui presidente, Pernambuco crescia a números equiparados à China. E, em 2021, nós tivemos um desemprego de 20% no estado de Pernambuco. Ora, então veja, a fome, a gente tinha acabado. Você se lembra, você se lembra das antigas Frentes de Trabalho, em que as pessoas ficavam que nem um franguinho ciscando de um lado para o outro com uma pazinha jogando terra sem produzir nada?

E você se lembra da glória que foi a transposição do Rio São Francisco, a quantidade de adutoras que nós fizemos aqui, a política de cisterna para você levar água para a casa das pessoas pobres. Então veja, nós sabemos como acabar com a fome, nós fizemos o projeto mais importante que foi adotado pela ONU como o melhor modelo de transferência de renda que já aconteceu.

E foi, a ONU tentou induzir que todos os países em desenvolvimento adotassem dois programas nossos, na verdade três: o programa da cisterna, que nós fizemos 1 milhão e 400 mil cisternas; o programa Luz para Todos, que levava luz elétrica onde as pessoas viviam na base do candeeiro; e o programa Bolsa Família, dando o cartão para a mulher porque a mulher saberia transferir aquilo em alimento para os seus filhos.

Ou seja, esses programas foram modelo de programas brasileiros adotados pela ONU para que o mundo acabasse com a miséria. Nós sabemos como acabar com a fome, nós sabemos como diminuir a pobreza, nós sabemos como inserir o povo no mercado de trabalho porque, quando nós fomos presidente da República, nós tínhamos 22 milhões de empregos com carteira profissional assinada.

Vocês sabem o que nós fizemos em Pernambuco, vocês sabem o que nós fizemos no nordeste brasileiro, vocês sabem a quantidade de indústria, a quantidade de benefício que foi feito nesta região, um programa como o Minha Casa Minha Vida, que fez mais casas do que em qualquer outro momento da história desse país e, inclusive, casa para as pessoas pobres que não podiam pagar. Isso acabou. Isso acabou.

Então, o país está com muito desemprego, o país tem 19 milhões de pessoas passando fome, tem 116 milhões de pessoas que estão com algum problema de segurança alimentar. Eu só posso te dizer que isso não é um fenômeno da natureza. Isso é um fenômeno chamado falta de vergonha na cara de quem governa esse país.

Quem governa o Brasil hoje não conversa com o governador, não conversa com prefeito, não conversa com o empresário, não conversa com radialista, não conversa com sindicalista, não conversa com ninguém. Só sabe contar mentira através de fake news, só sabe contar mentiras através das suas lives. O país não pode continuar assim.

Então, eu posso te dizer uma coisa, se a gente ganhar as eleições, a primeira coisa que eu quero fazer em janeiro é uma reunião com os 27 governadores de estado para reestabelecer a normalidade da relação interfederativa nesse país para que a gente possa voltar a uma normalidade, crescimento econômico, geração de riqueza, distribuição de riqueza, para que esse país volte a ser feliz, para que o povo volte a comer, para que a gente não veja ninguém no açougue buscando osso, ou gente querendo pegar carcaça de frango.

As pessoas têm o direito de comer coxa de frango, as pessoas têm direito de comer carne de primeira, as pessoas têm direito de almoçar, jantar e tomar café todo dia. Esse país vocês sabem o que nós já construímos, esse país vocês já viveram ele aqui em Pernambuco, vocês já viveram ele no nordeste, e nós vamos fazer o nordeste voltar a sorrir e o Brasil voltar a sorrir outra vez. Esse é o meu compromisso, essa é a reedição de uma coisa que nós já tínhamos feito e que eles destruíram.

Wagner Gomes: Presidente, a memória do seu governo é bastante recente e talvez seja por isso que o senhor esteja também na liderança das pesquisas. Mas o momento econômico, eu insisto, era outro. O mundo tinha um momento econômico totalmente distinto do que estamos vivendo hoje. Estamos num mundo com um cenário de inflação galopante por causa da pandemia, e a crise na Ucrânia, como o senhor se referiu, interfere sim em várias relações econômicas em torno do globo. Então, a preocupação que nós temos é o seguinte, é com o cenário atual do Brasil e com o cenário econômico que o senhor vai herdar não só do Brasil, mas do globo também. Então, a situação, o que passou nós sabemos. Então, a preocupação é: como começar diante desse cenário.

Luiz Inácio Lula da Silva: Wagner, deixa eu lhe dizer uma coisa, Wagner, olhando bem nos seus olhos aqui eu vou dizer uma coisa para vocês. Primeiro, não é verdade que a guerra da Ucrânia tem influência nos preços aqui no Brasil. 50% da inflação brasileira é da responsabilidade dos preços controlados pelo governo. É energia elétrica, é óleo diesel, é gás de cozinha e é gasolina. Então, o governo que crie vergonha e tenha a coragem de dizer para a Petrobras que os preços não serão internacionalizados, que um botijão de gás ele pode fazer parte da cesta básica, ele não pode ser vendido a R$ 150,00, ninguém pode gastar 15% do salário mínimo para poder cozinhar comida.

Então é o seguinte, meu caro, nós temos um problema de guerra? Nós temos. Ah, mas a pandemia fez gastar dinheiro. Você sabe qual foi o dinheiro utilizado na pandemia pela primeira vez, quando foi dado o auxílio emergencial aprovado no Congresso de R$ 600,00? Não foi dinheiro que o seu Bolsonaro arrumou não, foi dinheiro que nós deixamos no Brasil com as reservas internacionais porque nós compramos o dólar a R$ 1,60 e chegou a R$ 6,00 e ele deu um lucro de quase 800 bilhões de reais, esse dinheiro foi usado para o auxílio emergencial.

O que nós vamos fazer nesse começo de governo é anunciar um grande plano de investimento em obras de infraestrutura. Todas as obras importantes que estão paralisadas vão ser reativadas, vamos ter um acordo com o Governo do Estado para que cada governador defina no seu estado quais são as prioridades, e nós vamos buscar dinheiro para fazer essas obras. E a gente vai buscar dinheiro internamente e a gente vai buscar dinheiro, sabe, recuperando a credibilidade que o Brasil já teve.

Quando eu fui presidente, o Brasil ou era o primeiro ou era o segundo país a receber investimentos diretos. Então, é preciso ter um presidente que tenha pelo menos capacidade de conversar, que tenha capacidade de dialogar, que não arrume contenciosos, que não brigue com ninguém. Esse sujeito que governa o Brasil ele briga com todo mundo, ele briga com o amigo, com o inimigo, com o aliado, com conhecido, com desconhecido, porque ele nasceu para isso. Ele nasceu e entrou no Exército para fazer greve, por isso que ele foi expulso do Exército.

E agora está presidindo esse país, sabe, agindo como se fosse um irresponsável. Ele não fala em crescimento econômico, ele não fala em distribuição de renda, ele não fala em geração de emprego. A única coisa que ele fala é vender: eu vou vender a Petrobras, eu vou vender a Eletrobras, eu vou vender o gasoduto, eu vou vender o Banco do Brasil, eu vou vender o BNDES.

Sabe uma coisa que eu vou fazer, Wagner? Eu vou transformar o BNDES em um grande banco de investimentos para pequenas e médias empresas brasileiras. Nós vamos incentivar o empreendedorismo nesse país. Quem quiser fazer alguma coisa por conta própria vai ter oportunidade de ir a um banco público arrumar dinheiro para começar o seu negócio.

Esse país não pode ser um país capitalista sem capital, ele não pode continuar sendo um país capitalista sem crédito. Então qual é o papel do Estado? É garantir que as pessoas que querem progredir vão progredir, porque o Estado vai ajudar.

Geraldo Freire: O senhor falou muito das coisas boas que o senhor viveu, mas vamos falar um pouquinho das ruins também? O processo de delação que o senhor sofreu, o senhor diz ser um homem que perdoa com facilidade. O senhor perdoa todos os seus delatores? Paolocci está perdoado?

Luiz Inácio Lula da Silva: Ah, meu caro Geraldo, essa pergunta é velha, meu querido. A decisão da ONU ontem mostrou a falácia do que foi o processo contra mim. A decisão de não me deixar ser candidato, a decisão de me prender. Ontem a ONU deu um chute nisso e mostrou a pouca vergonha que foi feita para evitar que o Lula fosse presidente da República em 2018.

Agora, a União tem até 180 dias para saber como é que ela vai repor os prejuízos que eu tive. Bom, o correto seria revogar o mandato do Bolsonaro e me colocar na presidência. Como já está no fim eu também não quero no fim. Então, que deixe as eleições serem democráticas, porque nós vamos ganhar e vamos governar esse país para recuperar o país. Eu agora não tenho que provar mais nada, Geraldo, agora quem tem que provar é quem foi mentiroso e me acusou.

Esse pessoal que me acusou induziu a imprensa brasileira a acreditar nas mentiras do Moro, nas mentiras do Dallagnol, um bando, quase que uma quadrilha feita para mentir nesse país. E eu estou muito tranquilo porque agora quem tem que pedir desculpas para mim é quem me acusou falsamente, é quem mentiu a meu respeito, é quem foi leviano comigo.

Geraldo Freire: Pronto. Então agora volta Igor Maciel.

Igor Maciel: Lula, a gente sabe que aqui em Pernambuco, por exemplo, o seu aliado, o PSB, ele tem uma prática de esconder alguém quando a rejeição é muito alta. Aconteceu aqui no Recife, por exemplo, com o Geraldo Júlio, o Geraldo Júlio mal apareceu na campanha do PSB aqui no Recife em 2020, a rejeição era alta. Paulo Câmara agora rejeição alta também, tem essa expectativa, essa dificuldade. E muito se fala em Dilma Rousseff na sua campanha, e eu tenho um dado aqui, a gente fala muito de desemprego agora, a gente está com quase 14%, 13,8% de taxa de desemprego agora. Mas essa série de dois dígitos de taxa de desemprego começou lá com Dilma Rousseff, quando bateu 11.2% lá em 2016 ainda, no comecinho de 2016, primeiro trimestre. E eu queria lhe perguntar sobre Dilma Rousseff na sua campanha. O senhor pretende, pretende ter Dilma Rousseff no seu palanque, Dilma Rousseff vai participar da campanha, e qual vai ser o papel dela na campanha de Lula em 2022?

Luiz Inácio Lula da Silva: Olha, primeiro, eu tenho orgulho da Dilma. Se você conhece algum político que tem vergonha dos seus companheiros, eu não tenho, eu tenho orgulho da Dilma. E você Igor, quando você quiser fazer uma crítica a Dilma, e ela merece, e você pode fazer, mas você tem que dizer que até 2014, eu vou lhe dar um dado, até dezembro de 2014, quando terminou o primeiro mandato dela, o desemprego nesse país era só de 4.5%. Você sabe o que é isso? Isso significa padrão Suécia, padrão Noruega, padrão Dinamarca, padrão Alemanha. Era pleno emprego nesse país.

Você se lembra que até 2014 o salário mínimo subiu acima da inflação todo ano. Você se lembra o programa Minha Casa Minha Vida, que foi o programa que mais fez casa nesse país. Aonde é que as coisas começaram a dar errado? Quando o Eduardo Cunha assumiu a presidência da Câmara que resolveu criar bombas todo dia contra a Dilma. Ela mandava uma Medida Provisória tentando desonerar esse microfone vermelho que está na sua frente, ou seja, e ele desonerava não apenas o microfone, mas toda a rede de microfones do mundo, ou seja, criando embaraço para a arrecadação do governo.

Então, tentar jogar a culpa da quebradeira em cima do Brasil, em cima da Dilma, é tentar apaziguar o golpe de 2016 que foi o que quebrou esse país. É importante lembrar o que aconteceu depois do seu Temer, quais foram os benefícios que ele fez para esse país. Ele acabou com os direitos dos trabalhadores dizendo que ia gerar emprego, cadê o emprego? Ele acha que o trabalho intermitente é emprego? Ele acha que esse trabalho de entregar comida de aplicativo é emprego? Cadê as férias, cadê o descanso semanal remunerado, cadê a seguridade social que esse trabalhador não tem? O trabalhador voltou quase que a ser escravo.

Então, nós vamos refazer muita coisa nesse país para esse povo voltar a sorrir, para voltar a sonhar, para esse povo voltar a comer, para esse povo voltar a ser feliz, para as famílias não brigarem como estão brigando hoje, para as famílias não ficarem inimigas como estão ficando hoje. E eu terei o maior orgulho, a Dilma irá fazer na minha campanha o que ela quiser. Ela será cabo eleitoral da minha campanha, e se for necessário ela virá a Pernambuco e vocês poderão fazer uma entrevista com ela e perguntar todas as perguntas que vocês quiserem fazer, porque a Dilma, como eu, não tem medo de pergunta. E para nós não tem pergunta difícil, não tem pergunta embaraçada, não tem pergunta que a gente não possa responder.

O que nós queremos é restabelecer a verdade. E eu estou com muito orgulho aqui, Igor, porque esperei seis anos, seis anos, em que a minha vida foi destruída por uma grande parte dos meios de comunicação desse país. Vocês sabem o que eu sofri, entretanto, eu estou aqui de cabeça erguida, e os meus acusadores hoje talvez tenham vergonha de sair na rua. Hoje, talvez, não temha a coragem de entrar num bar para tomar uma cerveja porque eles sabem que induziram o Brasil a uma mentira. Então, meu caro, é o seguinte, a Dilma será a minha companheira antes, durante e depois das eleições.

Geraldo Freire: Deixa eu já ir lhe agradecendo, ao senhor e a todos os candidatos que dão entrevista aqui para a gente, com o maior prazer. Estamos sempre abertos, prontos para receber a todos. E pedir ao nosso Romualdo de Souza que faça a última pergunta de hoje.

Romoaldo de Souza: Presidente, por gentileza, a gente está falando em fome no Brasil, mas os partidos políticos, incluindo o seu partido, o Partido dos Trabalhadores, aprovaram um fundão eleitoral presidente de quase 5 bilhões de reais, e esse dinheiro foi espetado na conta do contribuinte, do cidadão. Esse dinheiro poderia ser usado inclusive no enfrentamento, nesses programas aí de enfrentamento à fome, ao desemprego. O que o Executivo nas suas mãos fará com o Congresso que aprovar um fundo de 5 bilhões de reais para a campanha eleitoral, além do fundão que todo ano os partidos recebem para administrarem suas despesas?

Luiz Inácio Lula da Silva: Olha, primeiro eu sou favorável ao financiamento público de campanha, que é uma das formas de você acabar com a corrupção empresarial nesse país junto aos partidos políticos. Segunda coisa, querido companheiro Romualdo, é que você deveria falar não do fundo eleitoral. Você deveria falar do orçamento secreto, que é a vergonha do século 21, um orçamento que envolve quase 20 bilhões de reais, em que o presidente da Câmara distribui para quem quer, para que deputados saiam por aí tentando fazer acordo com prefeitos. Essa é uma vergonha nacional.

O fundo eleitoral é um jeito da Justiça Eleitoral controlar os partidos políticos e saber que não vai ter corrupção, saber que não vai ter empresário comprando partido, comprando mandato, comprando deputado. E nós estamos num processo de aprimoramento da democracia brasileira, porque no Brasil, lamentavelmente, a gente tem poucos partidos. A gente tem muitas cooperativas de deputados, partidos que são feitos, sabe, com 10, 15, deputados só por causa do fundão.

É preciso que a gente tenha noção, nós vamos precisar de uma reforma política para que a gente tenha partidos políticos altamente representativos da sociedade brasileira. E eu continuo achando que o financiamento público é a forma mais decente de você fazer o processo eleitoral limpo nesse país. Não existe outra possibilidade de você fazer se você não tiver o controle da própria Justiça Eleitoral. Eu não sei se é muito ou se é pouco, eu não sei se é muito ou se é pouco, eu não tenho com quem comparar, mas o dado concreto é que, quando as empresas podiam financiar abertamente, era bem pior para o Brasil.

Agora isso não é responsável pela fome não, o que é responsável pela fome é uma doença crônica de incapacidade das personalidades governamentais brasileiras não terem responsabilidade com o povo pobre. E quem está falando com você, Romualdo, é um pernambucano que saiu do Caetés com 7 anos de idade, que comeu pão pela primeira vez com 7 anos de idade, e eu provei que a pobreza não é um problema nesse país, a pobreza é a solução.

Na hora que você faz com que chegue recurso no bolso desse povo e ele possa comprar, ele possa trabalhar, ele possa receber salário, ele possa consumir. Quando ele faz isso, a companhia cresce, o comércio cresce, a indústria cresce, o setor de serviços cresce e tudo vai bem. Eu quero que você me faça uma entrevista depois das eleições, se eu ganhar as eleições, que eu vou dar os parâmetros para você e depois no final do meu mandato eu quero dizer o que aconteceu.

Eu vou terminar dizendo o seguinte: nós pegamos esse país como uma dívida de 30 bilhões, nós pagamos os 30 bilhões e ainda emprestamos 15 bilhões para FMI. Nós pegamos esse país com uma dívida interna pública de 65%, e nós deixamos com 32%. Nós fizemos uma reserva internacional de 370 bilhões de dólares, o Brasil nunca tinha tido reservas internacionais. E nós fizemos. E essas reservas internacionais que não permitiram que o país quebrasse agora com essa crise toda.

Então, nós vamos reeditar com mais competência, com mais colaboração da sociedade, com mais participação dos partidos políticos, do movimento sindical, das igrejas, a gente vai reeditar uma política de recuperação e da decência do povo brasileiro. Ninguém precisa mendigar o prato de comida todo dia, as pessoas tem que trabalhar, receber um salário e com o salário do seu trabalho as pessoas vão sustentar as suas famílias. Esse país, eu garanto para vocês, que nós vamos entregar quando terminar o meu mandato.

Geraldo Freire: Pronto. Um abraço para o senhor, muito obrigado, como agradecemos aos outros que já falaram e aos próximos que vão falar. Porque é assim que a gente gosta de fazer aqui no Passando a Limpo. Os comerciais, a gente volta já.