Em encontro com representantes de diferentes movimentos negros da Bahia, na noite de quinta-feira (26/08), o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva reforçou o compromisso de corrigir dívidas históricas com o povo negro e disse não ser possível construir políticas públicas no Brasil sem colocar essa questão em pauta.
“Quero assumir um compromisso com vocês: daqui pra frente não dá para discutir política nesse país, se a gente não colocar na pauta a questão do povo negro, do jovem negro, da mulher negra”, afirmou, lembrando que toda a estrutura institucional e de governança foi feita há muitos anos por uma elite, quando a maioria do povo não tinha direitos”.
O encontro, na Senzala do Barro Preto, sede do bloco afro Ilê Aiyê, que tem papel importante na luta pela igualdade racial, foi uma espécie de celebração das conquistas que o povo negro teve nos governos do PT e também uma oportunidade para que representantes de diferentes movimentos negros baianos expusessem suas demandas e prioridades para construção de uma sociedade com igualdade racial.
Após ouvir os representantes, Lula falou da dívida “impagável” que o Brasil tem com a África e o de sua tentativa fazer esse reparar essa injustiça quando estava na Presidência. Lula lembrou que visitou 34 países africanos e abriu 19 embaixadas novas na África. “Era importante para o Brasil, que teve a história muito ligada ao povo africano, não passar e por cima da África fingindo que não conhecia o seu território”, afirmou, citando algumas cooperações governamentais, como a universidade aberta em Moçambique, a Embrapa em Gana e a fábrica de retrovirais, também em Moçambique, além de pedir desculpas oficiais ao povo africano “por 350 anos de segregação e trabalho escravo do povo negro no Brasil”.
“Tenho dívida com vocês, o Brasil tem dívida com vocês”, afirmou. Lula disse que a motivação em dar continuidade à essa reparação histórica foi uma das razões para ele se candidatar em 2018. O país, no entanto, lembrou Lula, foi assaltado pelo esquema “demolidor” da Operação Lava Jato, que levaram 4,4 milhões de pessoas a perderem o emprego. “A Lava Jato tinha o único objetivo de desfazer tudo que fizemos na Petrobras, na indústria naval e com as empresas de engenharia brasileira, que estavam tomando conta do mundo, com obras importantes na Europa, nos EUA e no mundo árabe”, denunciou.
O ex-presidente destacou que os petistas devem ter a consciência do porquê criaram um partido e querem eleger mais uma vez um presidente da República: é para mudar a história do país. “É porque nós temos a obrigação de fazer aquilo que a elite brasileira jamais vai fazer ou reparar, porque ela acha que pobre e negro tem que ser tratado como cidadão de segunda classe, e temos obrigação de mudar essa história”.
Educação para todos
Lula ressaltou ações de política de governo na área de educação que também serviram para reduzir injustiças sociais e raciais, como o Prouni e os investimentos em campus avançados e escolas técnicas. “Nunca antes na história do Brasil tantos negros estão agora nas universidades. Eu provei, com a ajuda de vocês, que era possível fazer reparo na educação e tenho muito orgulho de vocês terem me ajudado a ser o presidente que em apenas oito anos fez mais universidades do que a elite brasileira fez durante a vida inteira”.
Lula lembrou também a importância da Unilab. “Quando assumi a Presidência da República, sonhei que era possível criar no Ensino Fundamental o ensino da História Africana neste país, para que a gente pudesse, definitivamente, fazer nascer gerações que compreendessem melhor o papel do negro na história brasileira”, lembrou Lula que, em 2010, fez na Bahia e no Ceará, a Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab).
Mais representatividade
Um dos desejos expressos pelos movimentos para o futuro é o reforço da política de cotas, implementada no governo Lula. “Essa Lei será revisada e pode ser, inclusive, revogada. Tem que ser grifado a questão que essa Lei de Cotas seja revisada, sim, mas que continue, pois ela ainda não atingiu seus objetivos totais”, recomendou Gilberto Leal, da Coordenação Nacional de Entidades Negras (CONEN).
“O que tem de mais sofisticado na gestão pública brasileira são invenções monumentais do PT”, elogiou Vilma Reis, representante da Coalizão Negra por Direitos. Ela sugeriu maior representatividade de pessoas negras nos cargos de liderança do governo. Também pediu por um olhar mais atencioso para política de guerra às drogas, que hoje é responsável pelo encarceramento em massa.
O presidente do Olodum, João Jorge Rodrigues, falou do débito impagável do Brasil com a população Negra “Nós construímos a estrutura da sociedade brasileira e não nos foi dado nada. Então, é hora de reparar com vontade. Então é preciso agora um novo presidente que diga: ‘Vamos nos empoderar juntos!’”
Jaciara Ribeiro, representante das religiões de matriz africana na Bahia, e Ademir Santos, representante do Segmento Evangélico Negro, lembraram da instituição do Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa, em 2007, como marco da luta contra a discriminação religiosa. “Compreendemos que a sua gestão sempre teve um bom diálogo com os evangélicos. Não é esse evangelho que está no poder que nos representa, não é nesse evangelho que nós acreditamos. Nós acreditamos no evangelho da justiça social”, falou Ademir, lembrando também da ex-presidenta Dilma que, em 2016, sancionou a lei que instituiu o Dia Nacional da Proclamação do Evangelho.
Revolta dos Búzios
Agosto é o mês da Revolta dos Búzios, que ocorreu em 1798 na capital baiana. A revolução por liberdade e igualdade de direitos foi organizada por negros escravizados, libertos e também trabalhadores pobres. Os revoltosos foram reconhecidos como heróis em 2011, durante o mandato da presidenta Dilma, através da Lei 12.391.
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