Em uma semana marcada por viagens internacionais do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do atual presidente Jair Bolsonaro, a agenda ambiental está em pauta. Enquanto Bolsonaro emitiu informação comprovadamente falsa em Dubai, na última segunda (15), mentindo deslavadamente que a Amazônia, por ser uma floresta muito úmida, não pega fogo, Lula foi aplaudido de pé em evento no Parlamento Europeu, com discurso que versou também sobre a luta pela preservação do meio ambiente. Um dos elementos cruciais para a preservação do meio ambiente é o acesso a saneamento básico e à reciclagem.
O saneamento básico, tido como item certo pela população mais abastada, é ainda hoje um item de difícil acesso para boa parte de quem vive na pobreza ao redor do mundo. Não é de hoje que o Brasil discute a privatização do saneamento básico. Falar disso em um país com mais de 27 milhões de pessoas vivendo abaixo da linha da pobreza (FGV) é, no mínimo, cruel.
A primeira tentativa de privatizar o saneamento básico veio no governo de Fernando Henrique Cardoso e foi enterrada de vez pelo presidente Lula, assim que assumiu a presidência. O investimento recorde no setor rompeu o apagão do saneamento básico que se vivenciava no Brasil.
Antes dos governos de Lula e do PT, era comum escutar gestores públicos dizerem que “não valia a pena gastar dinheiro em obras que ficam embaixo da terra e ninguém vê”. Um ditado perverso, transformado em verdade por quem não estava nem aí para a saúde do povo. Com Lula e Dilma, os investimentos foram retomados e chegaram a pequenos municípios cujos habitantes sequer sonhavam em ver as ruas abertas para receber as tubulações de esgoto.
Segundo a Organização Mundial da Saúde, cada R$ 1 investido em saneamento representa R$ 4 de economia na área da saúde. Investir em saneamento básico é combater doenças infectocontagiosas, principalmente em crianças, valorizar regiões e cadeias produtivas.
Entre 2002 e 2015, a coleta de esgoto domiciliar cresceu 27% no Brasil. O aumento foi exponencialmente maior na região Norte – 325% de crescimento na rede de coleta de esgoto entre 2002 e 2015.
O acesso à água também cresceu para toda a população, mas cresceu muito mais para aqueles mais pobres: entre 2002 e 2015, o acesso à água cresceu 7 vezes mais rapidamente para a camada dos 5% mais pobres da população.
Lula colocou o saneamento no PAC e disponibilizou, só em 2007, 12 bilhões de reais para o setor. Enquanto isso, a Secretaria Nacional de Saneamento trabalhava em um projeto de lei que norteasse as ações de saneamento no Brasil. Essa proposta se efetivou com a promulgação da Lei Federal nº11.445/2007, que define os elementos que constituem o saneamento básico: abastecimento e tratamento de água, esgotamento sanitário e manejo dos resíduos sólidos e das águas pluviais.
No governo Dilma, o Plano Nacional de Saneamento Básico, que entrou em vigor em 2013, previa investimentos de R$ 508 bilhões para os próximos 20 anos.
Depois do golpe contra a presidenta Dilma, as lutas pela conquista do Plano Nacional de Saneamento Básico foram interrompidas e a agenda de privatização do setor voltou com tudo. Hoje, 35 milhões de pessoas não têm acesso à água tratada e 104 milhões não contam com serviços de coleta de esgoto no Brasil.
Bolsonaro assinou, em 2020, um decreto para regulamentar o novo marco legal do saneamento básico no país. Como tudo o que vem de seu governo, esse novo marco legal aumenta a participação do setor privado no setor, colocando em risco todas as conquistas alcançadas até aqui.
Ao falar em agenda verde, também é importante lembrar da reciclagem. Os catadores de materiais recicláveis foram uma das populações prioritárias nos governos de Lula. Em 2003, Lula já tinha assinado o decreto presidencial que criou o Comitê Interministerial de Inclusão dos Catadores, com a participação de 11 Ministérios, empresas públicas federais e o Movimento Nacional dos Catadores, atendendo a uma demanda da categoria.
De 2004 a 2007, Lula assinou uma série de leis beneficiando os catadores. Em 2007, o governo incluiu uma mudança na lei das licitações na Política Nacional de Saneamento permitindo que as prefeituras pudessem contratar as cooperativas e associações sem necessidade de licitação e pagar pelos serviços realizados por catadores.
Mesmo antes, com esses impedimentos, o governo investia nas cooperativas por meio do BNDES. Somente em 2007, o Banco contratou 24 operações de apoio financeiro a cooperativas de catadores num valor total de R$ 16,4 milhões para investimento em infraestrutura física, aquisição de máquinas e equipamentos, capacitação e etc. No total, foram 34 operações de apoio distribuídas em 34 municípios num valor de R$ 22,9 milhões.
Em 2010, após 21 anos de luta, Lula sancionou a Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei nº lei 12.305), incluindo definitivamente a categoria na cadeia produtiva e gestão compartilhada resíduos sólidos no Brasil. A lei é a mais inovadora da América Latina.
Com ela, foram criados os princípios, objetivos, instrumentos e diretrizes para a gestão de resíduos sólidos. A lei também determina que as empresas são responsáveis pelo recolhimento de descartáveis, a chamada logística reversa.
Lula continua falando da importância de se reconhecer os catadores e a reciclagem como fundamentais para a preservação do meio ambiente, uma pauta urgente e que não é apenas “coisa de gringo”, como o governo atual tenta fazer crer”.
A pauta é ainda mais cara a nós já que diversos estudos mostram que os países subdesenvolvidos são mais severamente afetados pelos efeitos das mudanças climáticas do que os países ricos. O abismo entre as nações mais pobres e mais ricas do mundo é 25% maior do que seria sem o aquecimento global entre 1961 e 2010, por exemplo, segundo estudo da Universidade de Stanford, na Califórnia. O Brasil teria tido um crescimento 25% maior se não houvesse aquecimento global.
Sendo assim, passamos pela mesma tempestade, mas não estamos no mesmo barco e, embora tenhamos contribuído menos para os efeitos das mudanças climáticas, seremos mais afetados por elas. Por isso, precisamos nos preocupar com esses efeitos e precisamos de governantes que estejam igualmente preocupados. É possível construir acordos com outros países para diminuir esses efeitos nocivos e colocar o Brasil novamente em uma posição de destaque internacional no que diz respeito ao clima. No momento, somos exemplo apenas do que não fazer. Os dados do Inpe, por exemplo, desmentem a fala de Bolsonaro em Dubai: o mês de outubro bateu mais um recorde de queimadas, com 877 quilômetros de focos de desmatamento na Amazônia.
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