Enquanto o Brasil afirma, a cada pesquisa, que quer Lula presidente mais uma vez, o retrocesso caminha a passos largos. Na última semana de agosto, foi a vez do Judiciário brasileiro lograr conquistas junto ao Executivo golpista: a promessa de que o orçamento de 2019 trará um aumento de mais de 16% para os ministros do STF – que será repassado em seguida, de modo integral ou parcial, aos demais integrantes do Judiciário, Ministério Público e afins.
Logo depois de obter essa conquista para os integrantes do Supremo (e depois para a “categoria”), o Tribunal decidiu uma questão que atinge de forma direta e prejudicial os interesses dos trabalhadores. Em votação que registrou um placar de 7 a 4, o STF aprovou que a terceirização pode ser adotada de forma irrestrita no mercado de trabalho. A norma que permite a terceirização de todas as atividades foi sancionada pelo presidente ilegítimo Michel Temer no ano passado, e aguardava análise do Supremo quanto à sua constitucionalidade.
A jurisprudência do TST (Tribunal Superior do Trabalho) determinava, antes da lei sancionada ano passado, que a terceirização da atividade-fim da empresa deveria ser vetada e autorizava a contratação para as atividades-meio.
No entender do STF, a partir da decisão desta quinta-feira: “É lícita a terceirização ou qualquer outra forma de divisão do trabalho em pessoas jurídicas distintas, independentemente do objeto social das empresas envolvidas, revelando-se inconstitucionais os incisos I, III, IV e VI da Súmula 331 do TST”.
Agora, pode-se terceirizar tudo. Cabe, aqui, o registro do que diferencia a atividade-meio da atividade-fim. A atividade-meio é considerada aquela não inerente ao objetivo principal da empresa. Em outras palavras, trata-se de serviço necessário, mas que não possui relação direta com a atividade principal da empresa. É, portanto, um serviço não essencial. Já a atividade-fim diz respeito àquela que caracteriza o objetivo principal da empresa, a sua destinação, o seu empreendimento. Normalmente, encontra-se expressa no contrato da companhia.
No julgamento desta quinta-feira (30/08), votaram a favor da terceirização irrestrita a presidenta do STF, Cármen Lúcia, os ministros Celso de Mello, Gilmar Mendes, Alexandre de Moraes e Dias Toffoli e os relatores Luís Roberto Barroso e Luiz Fux.
Já os ministros Marco Aurélio, Luiz Edson Fachin, Rosa Weber e Ricardo Lewandowski se posicionaram contra a terceirização da atividade-fim.
Para o ministro Celso de Mello, “a terceirização, notadamente em face de sua nova e recente regulação normativa, não acarreta a temida precarização social do direito do trabalho, nem expõe trabalhador terceirizado a condições laborais adversas”, defendeu. De acordo com Mello, as ofensas a direitos dos trabalhadores podem ocorrer em qualquer situação e as regras trabalhistas na terceirização restam mantidas.
O ministro buscou oferecer otimismo ao povo brasileiro: “Pode a terceirização constituir uma estratégia sofisticada e eventualmente imprescindível para aumentar a eficiência econômica, promover a competitividade das empresas brasileiras e, portanto, para manter e ampliar postos de trabalho”.
A presidenta do STF, Cármen Lúcia, seguiu nessa toada, defendendo a terceirização como mecanismo importante para a necessária criação de empregos no país.
De acordo com o registro do Portal Jota sobre a votação de hoje no STF, “o ministro Marco Aurélio destacou que a jurisprudência que impede a terceirização de atividade-fim já tem 32 anos”, e que “hoje o mercado de trabalho é mais desequilibrado do que era em 1943, quando da promulgação da CLT e do afastamento da incidência das normas civilistas. Hoje, temos escassez de empregos e mão de obra incrível, com um número indeterminado de pessoas desempregadas”.
A ministra Rosa Weber, por seu turno, foi enfática em suas críticas à terceirização da atividade-fim: “Segundo a magistrada, o Estado Democrático de Direito se assenta na sólida proteção ao trabalho e liberar a terceirização total seria prejudicial”. Para a ministra, “a permissividade não gera emprego, só determina se o posto de trabalho é direto e protegido ou se é precário e terceirizado”, disse.
Kennedy Alencar
O jornalista Kennedy Alencar fez uma dura análise a respeito do aumento negociado nesta semana pelo STF. Em seu texto, o comentarista político avalia que “o Judiciário faz um discurso moralista, mas não tem vergonha de abocanhar recursos públicos num momento de grave crise fiscal e de empobrecimento do país”.
Ele explica que “o STF pressionou e obteve do presidente Michel Temer a promessa de que o aumento de 16,38% para os salários dos 11 ministros da corte constará da proposta orçamentária de 2019”.
Em sua coluna, Alencar explica que, “obviamente, haverá efeito bilionário para as contas da União, Estados e municípios devido ao efeito cascata” e que, de imediato, “os salários da magistratura e do Ministério Público vão incorporar o privilégio aos seus ganhos”.
Não custa lembrar, mas recordar é viver. Em 2016, logo após a conclusão do impeachment contra Dilma Rousseff, o Judiciário pressionou, o Congresso Nacional aprovou e Temer sancionou um reajuste para o Judiciário, de até 41,4%.
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