O SIM OU O NÃO DA COLÔMBIA, ENTRE O PASSADO E O FUTURO
EMIR SADER, especial para lula.com.br
Nunca o mais longo conflito bélico na América Latina esteve tão perto de chegar ao seu fim, mas também nunca esse processo esteve tão perto de eventualmente fracassar. Depois de longas e tortuosas negociações de paz entre o governo e as Farc – que já apontavam para um processo similar, mas provavelmente bastante mais simples, com o outro movimento armado do país, o ELN -, o processo de paz conseguiu desembocar em acordos, longos e complexos, que ainda teriam que encontrar formas difíceis de regulamentação e implementação prática.
Num plebiscito marcado para outubro, a população da Colômbia dirá “sim” ou “não” ao acordo de paz com as FARC. Mas eis que o que parecia ser apenas um trâmite, até mesmo de consagração popular do longo esforço das negociações realizadas em Havana, a consulta, sempre desejada pelo presidente Juan Manuel Santos, como referendo popular, acreditando que o desejo da grande maioria dos colombianos seria a paz, promete surpresas ou pelo menos incertezas. Desde que se constituiu um amplo e muito variado, politica e ideologicamente, campo de campanha a favor do sim, se aguardava a decisão do partido do ex-presidente Alvaro Uribe, o Centro Democrático, sobre os acordos de paz. Diante do que se supunha ser uma grande maioria pelo sim, havia cogitações inclusive de que o partido de Uribe se definisse pela abstenção.
Mas, mesmo enfrentando defecções internas, o CD optou pelo “não” e se pôs imediatamente a propagar suas razões. Seu discurso se centra na rejeição a que os dirigentes das FARC não sejam julgados e condenados pelas acusações que pesam sobre eles e possam retornar à vida politica. Nisso, contam com grande apoio da população.
A primeira pesquisa depois da definição da posição de Uribe da mais de 50% a favor do não e apenas 38% a favor do sim. Um resultado surpreendente, mas que coloca em risco todo o longo processo de negociação da paz e, principalmente, reabre um futuro inimaginável até agora para os colombianos, que consideravam que os conflitos armados estavam superados na historia do pais. Conta também a favor do “não” a baixa popularidade atual do governo de Santos. E o clima de virada conservadora no continente.
O fim do conflito colombiano significaria transformar de fato a América Latina numa zona de paz no mundo, concluindo o último conflito que resta ainda. A eventual derrota na consulta representaria um revés de proporções para o governo de Santos, mas também para a esquerda colombiana e para todas as forcas democráticas latino-americanas. A vitória de Uribe significaria, por sua vez, mais uma conquista da direita do continente, depois dos seus avanço na Argentina e no Brasil.
A campanha apenas começou. A esquerda dispõe de um grande potencial para desenvolver seus argumentos a favor da paz, da luta politica que não exclua a nenhuma força, da restituição das terras aos camponeses, da reconversão da militância guerrilheira à luta politica institucional e a paz finalmente reencontrada pela Colômbia. Seu transcurso representa um momento de grandes debates políticos e mobilizações populares, que contarão com a solidariedade de todas as forcas progressistas da América Latina.
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