“As pessoas não sabem que votam contra si ao votarem em Bolsonaro”.
Para Wellington Leonardo da Silva, presidente do Conselho Federal de Economia, os planos do candidato pioram a já baixa mobilidade social brasileira.
A ascensão social dos mais pobres é cada vez mais difícil no mundo. A distância deles para os ricos aumenta desde a crise financeira global de 2008, conforme uma pesquisa de junho da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico. Por razões históricas, no Brasil é pior. No quesito ascensão social, o País é o penúltimo em um ranking de 30 nações elaborado pela OCDE.
Em caso de vitória do candidato da extrema-direita à presidência, Jair Bolsonaro (PSL), o quadro vai se agravar, na avaliação do presidente do Conselho Federal de Economia (Cofecon), Wellington Leonardo da Silva. “As medidas propostas pelo Bolsonaro e o [ministro da Fazenda dele] Paulo Guedes pioram uma situação que já tinha ficado ruim com a reforma trabalhista do governo Temer”, diz. “Acabará a perspectiva de uma vida melhor, as pessoas vão trabalhar só para sobreviver. Será a semiescravidão”.
A reforma trabalhista do presidente Michel Temer barateou os trabalhadores, ao permitir aos empresários burlar a CLT dentro da lei.
Um empregado pode ser contratado, por exemplo, em regime de trabalho intermitente. Fica à disposição do patrão, mas só recebe pelo tempo efetivamente trabalhado. Assim, embolsa menos de 13º e tem de recolher, do próprio bolso, para o INSS, caso queira se aposentar.
A dupla Bolsonaro-Guedes tem planos de aprofundar a reforma. No programa de governo bolsonarista registrado na Justiça Eleitoral, há a proposta de criação de uma carteira de trabalho “verde-amarela”. Nela, a pessoa talvez seja contratada sem direitos convencionais, como o 13º.
Embora o 13º não seja citado explicitamente no programa, pode-se presumir que o direito estará ameaçado devido a declarações da equipe de Bolsonaro. O vice na chapa, general Antônio Hamilton Mourão, diz e repete que o 13º é uma “mochila nas costas de todo empresário”.
Guedes acha que direitos trabalhistas são na verdade “encargos”, “armas de destruição em massa” de empregos. Em um evento em maio na Associação Comercial do Rio de Janeiro, o próprio Bolsonaro disse coisa parecida. Para ele, as leis daqui deveriam “beirar a informalidade”.
“O mundo do trabalho está sendo profundamente atacado, e não é só no Brasil”, diz Leonardo da Silva. “Imagine uma pessoa trabalhando sem jornada limitada de horas, sem 13º, sem Previdência Social… Vai ter dinheiro para comer e olhe lá”.
Pagar menos aos trabalhadores pode, à primeira vista, interessar aos empresários. Mas, com pouca grana na praça, questiona o economista, como as empresas vão vender e lucrar no Brasil? Compensar com exportações não será fácil, pois o mundo caminha para uma guerra comercial protecionista, vide a briga entre Estados Unidos e China.
Com menos dinheiro no bolso, os mais pobres não terão condições de pagar plano de saúde para si e a família ou escola privada para os filhos. Dependerão sempre do SUS e da rede pública de ensino.
São duas áreas que já recebem menos verba federal do que precisam e que ficarão ainda mais desfalcadas financeiramente nos próximos anos, pois o governo Temer aprovou em 2016 o congelamento de gastos públicos por duas décadas.
O adversário de Bolsonaro na eleição, Fernando Haddad, do PT, promete revogar o congelamento. Paulo Guedes defende mantê-lo. “Tem candidato já dizendo que vai derrubar o teto; nós, ao contrário, queremos construir os fundamentos fiscais para o teto ficar de pé”, disse Guedes em uma entrevista em 18 de setembro à rádio Jovem Pan. “Esse teto de gastos é perverso”, diz Leonardo da Silva. “As pessoas não sabem que estão votando contra si ao votarem no Bolsonaro”.
O Brasil é um país de pobres. A renda per capita em 2017 foi de 1,2 mil reais, segundo o IBGE. No Nordeste, a região mais pobre, a renda per capita foi de 800 reais, menos de um salário mínimo.
Na eleição deste ano, há 147 milhões de eleitores aptos a votar, segundo o Tribunal Superior Eleitoral. Desse total, 45% são pessoas analfabetas, com, no máximo, o Ensino Fundamental, ou que declaram que apenas sabem ler e escrever, conforme o TSE.
Para Leonardo da Silva, do Cofecon, os eleitores não podem contar com a imprensa para entender o programa do presidenciável da extrema-direita. “A mídia não debate porque isso contrariaria o interesse dos seus anunciantes, que são grandes empresas, grandes bancos. Os bancos têm recorde de lucro no meio da crise, mas ninguém fala disso”.
Com o congelamento de gastos públicos, o governo pode direcionar mais facilmente verba para pagar juros da dívida pública a detentores de títulos públicos no chamado “mercado”. Bancos, fundos de investimentos, rentistas em geral.
No primeiro semestre do ano, o Itaú lucrou 12 bilhões de reais, 3% a mais do que no mesmo período de 2017. O Bradesco, 8 bilhões, 12% a mais. O Santander, 5 bilhões, 56% a mais. São variações superiores ao crescimento da economia no primeiro semestre, de 1,1%, segundo o IBGE.
Bolsonaro esconde seus planos econômicos, ao evitar participar de debates na TV e mandar Paulo Guedes e o general Mourão ficarem quietos. A mídia não aprofunda o assunto.
O modelo econômico proposto por Haddad e o PT é estimular o crescimento do PIB a partir de baixo, com dinheiro na mão dos mais pobres. Isso seria feito, por exemplo, com a geração de emprego através da retomada de obras públicas e da isenção de imposto de renda para quem ganha até cerca de 5 mil reais por mês.
Os planos bolsonaristas são opostos. Facilitar os lucros empresariais, na esperança de que esses lucros levem os empresários a investir mais, a contratar mais gente. A mesma lógica levada adiante no governo Michel Temer.
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