Em novembro do ano passado, a Comissão da União Africana (AUC), a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) e o Instituto Lula anunciaram uma união de esforços para erradicar a fome e a desnutrição na África. Durante um encontro na sede da União Africana, em Adis Abeba (Etiópia), as três entidades envolvidas concordaram em convocar uma reunião de alto nível com líderes africanos e internacionais sobre “Novos enfoques unificados para acabar com a fome na África”. Esse esforço junta a liderança da União Africana, a experiência técnica e o comprometimento constante de combate à fome da FAO e a experiência política do ex-presidente Lula. O conhecimento e o apoio de outros parceiros internacionais, regionais e nacionais fará com que essa parceria tenha sua força ainda mais amplificada. A reunião está programada para acontecer no início de março, em Adis Abeba.
O anúncio foi feito após reunião entre a presidenta da Comissão da União Africana, Nkosazana Dlamini Zuma, o diretor geral da FAO, José Graziano da Silva, e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que é presidente honorário do Instituto que leva seu nome.
Em recente artigo publicado no jornal O Povo, João Bosco Monte, que é pós-doutor em Relações Internacionais, consultor internacional e colaborador do Instituto Lula lembrou que a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) considera a fome e a desnutrição em nível mundial, o principal risco à saúde, maior até do que a aids, a malária e a tuberculose juntas. Os números são impressionantes. Mais de um bilhão de pessoas dormem com fome todos os dias e João Bosco chama a atenção para o fato de que o combate à fome precisa entrar definitivamente na agenda dos governos pelo mundo.
Para reflexão sobre este tema, reproduzimos abaixo o artigo na íntegra:
Segurança alimentar: um desafio mundial
“Mais de um um bilhão de pessoas passam fome; quase metade do mundo vive com menos de US$ 2,50 por dia e as mulheres são responsáveis pela produção de mais de 90% dos alimentos em muitos países “
A Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) afirmou que a fome e a desnutrição são consideradas, em nível mundial, o principal risco à saúde, mais que a aids, a malária e a tuberculose juntas. E justamente neste ponto gostaria de chamar a atenção para um dos maiores problemas na atualidade (talvez o maior) enfrentados pela população mundial: a insegurança alimentar.
A FAO define segurança alimentar como o estado em que as pessoas em todos os momentos têm acesso físico, social e econômico a alimentos suficientes e nutritivos que atenda as suas necessidades alimentares para uma vida saudável e ativa.
Na mesma direção, esta semana, a ONG Action Against Hunger’s (Ações Contra a Fome) apresentou em seu relatório anual algumas conclusões que aparentemente passam despercebidas, mas que, de fato, precisam ser encaradas como importantes pela comunidade internacional. Ao denunciar a contraditória situação de que o mundo produz mais alimentos que o suficiente para todos, e ainda assim muitas pessoas não podem acessá-los, a AAH chama a atenção para a alarmante situação de fome e desnutrição vivida em diversos países. O documento afirma o seguinte: mais de um bilhão da população mundial passa fome; quase metade do mundo vive com menos de US $ 2,50 por dia e as mulheres são responsáveis pela produção de mais de 90% dos alimentos em muitos países.
Há de se considerar ainda, que o crescimento previsto da população mundial até o ano 2050 será de 9,1 bilhões de pessoas (dados da Divisão de Populações da ONU), o que propõe ainda mais problemas à segurança alimentar. Para enfrentar este aumento da população e o desafio resultante, a agricultura terá que duplicar sua produção em 30 anos.
Assim, os governos precisam entender que o desenvolvimento e a mobilização de todas as formas de agricultura, tanto nos países do Norte como do Sul, são essenciais para responder a este desafio. Não obstante, este desenvolvimento só poderá ser sustentável se se tomam em consideração os numerosos desafios meio ambientais atuais: mudança climática, desertificação, degradação de solos, redução dos recursos hídricos etc.
Nos últimos anos, tem sido comum o debate em torno da capacidade que os países têm, principalmente os mais pobres, em suprir alimentos para suas populações. E, dentro das diversas questões que surgem a respeito deste tema, reside o principal problema que até agora não foi solucionado. Como prover alimentos para todos? Em 2000, os líderes mundiais reuniram-se na sede das Nações Unidas, em Nova York, para adotar os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio que consistia em oito metas a serem alcançados até 2015, que incluía entre outras demandas erradicar a pobreza e a fome e combater o HIV/aids.
Nesse sentido, é importante destacar que a segurança alimentar e nutricional foi objeto de especial atenção do governo brasileiro em 2003, quando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao apresentar o Programa Fome Zero, afirmou que sua meta seria assegurar que todos os brasileiros poderiam comer três refeições por dia. A iniciativa não elimina todos os problemas, mas, ao definir a erradicação da fome como politica de governo, sinaliza para o reconhecimento e principalmente o seu enfrentamento.
É imperativo, ainda que o tema da segurança alimentar mundial se apresente de forma recorrente nos grandes fóruns mundiais para que sejam identificadas as alternativas para a distribuição de alimentos para todos, principalmente quando a falta de vontade política dos Estados e a especulação com o preço dos alimentos se caracterizam como as principais causas do problema.
Há de se ponderar também que as relações econômicas no presente têm na produção e comercialização de alimentos, diferentemente de outras épocas, uma lucrativa fonte de rentabilidade. As concentradas e centralizadas empresas mundiais controlam o mercado das sementes e agroquímicos que incidem nas formas de produzir, bem como nos custos e preços dos alimentos no mundo.
Para impulsionar a produção de alimentos nos países em desenvolvimento, e em particular nos menos desenvolvidos e mais seriamente afetados entre eles, os países desenvolvidos e outros países que estejam em condições de fazê-lo deverão adotar medidas internacionais urgentes e efetivas para proporcionar-lhes em forma sustentada mais assistência técnica e financeira em condições favoráveis e em volume suficiente para suas necessidades, através de acordos bilaterais e multilaterais.
Por outro lado, o enfrentamento do problema deve ser visto de forma mais pragmática, onde a ajuda (doações de alimentos) aos países e suas populações deve ser substituída por trocas comerciais, respeitando-se obviamente as capacidades produtivas de cada país.
A segurança alimentar do mundo deve figurar de forma incisiva na agenda dos Estados, corporações e sociedade, a fim de resolver o grave problema da distribuição de alimentos a nível global é algo crítico para as próximas gerações, pois a fome tem um impacto positivo na paz e na segurança mundial.
João Bosco Monte
Pós-doutor em Relações Internacionais e consultor internacional
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