O juiz Sérgio Moro ouviu duas testemunhas nesta segunda-feira (8), em Curitiba, em ação movida pelo MPF (Ministério Público Federal) em que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é um dos réus. Esta ação penal investiga se a compra de um terreno por parte da Odebrecht teria como objetivo entrega-lo ao Instituto Lula, em troca de facilitação em contratos com a Petrobras. As duas testemunhas foram os executivos Ricardo Pessoa, da UTC Engenharia, e Marcos Pereira Berti, da Toyo Setal. Os dois não tinham conhecimento de qualquer ligação entre supostos esquemas anticoncorrenciais na estatal e o ex-presidente da República.
No processo, os procuradores que acusam Lula afirmam que a Odebrecht se aliou a um grupo de mais 10 a 15 empresas, que dividiam entre si as obras da Petrobras, frustrando a livre concorrência, e, em troca deste benefício, pagavam propinas a executivos da Petrobras que, por sua vez, dividiam esses recursos com políticos e partidos específicos.
A acusação diz ainda que, parte do valor das propinas que teriam sido pagas pela Odebrecht S/A ‘foi lavada mediante a aquisição, em benefício do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do imóvel localizado na Rua Dr. Haberbeck Brandão, nº 178, em São Paulo (SP), em setembro de 2010, que seria usado para a instalação do Instituto Lula’”. A tal sede, aliás, conforme é sabido e admitido por todas as partes envolvidas no caso, jamais chegou a ser entregue ou utilizada pelo Instituto Lula. O MPF processa Lula baseado na hipótese de ter existido, um dia, uma intenção da Odebrecht em doar a sede ao instituto, e que esta doação seria uma forma de pagamento de propina da empresa por ter recebido facilitações – graças a ordens de Lula – em contratos com a estatal.
Bem, as testemunhas do MPF ouvidas nesta segunda não ajudaram a corroborar a tese dos procuradores. Ricardo Pessoa, o primeiro a prestar esclarecimentos, disse que tem negociado acordo de delação premiada com as autoridades de investigação, e que admitia ter participado por cinco anos de reuniões trimestrais entre sua empresa e mais 10 a 15 construtoras (o número variou no decorrer dos anos), realizadas para se definir o fatiamento das obras da Petrobras, inclusive apontando vencedoras de processos de licitação por acontecer e também empresas que fariam propostas no processo concorrencial com preços sabidamente superiores ao da concorrente marcada para vencer, em uma espécie de cobertura da fraude em que se revezavam as empresas-membro do grupo.
Disse também que, para manter o esquema, tanto a UTC quanto as outras empresas do grupo eram compelidas a pagar propinas da ordem de 1% a 3% a três executivos da Petrobras (Paulo Roberto Costa, Pedro Barusco e Renato Duque), e que estes repassariam parte destes valores a representantes de partidos políticos.
A representante do MPF na oitiva perguntou, então, se Ricardo Pessoa saberia dizer se a Odebrecht também pagava as propinas. Ele disse acreditar que sim. Perguntou se havia algum representante do Partido dos Trabalhadores entre os que recolhiam parte da propina. Pessoa disse que efetuava pagamentos apenas a executivos da Petrobras, mas que sabia que João Vaccari Neto acabaria por recolher parte destes recursos.
Depois do Ministério Público, nenhum advogado de defesa dos réus no processo se interessaram em fazer mais perguntas, encerrando o depoimento. De acordo com a lei, findadas as perguntas das partes, pode o juiz que conduz a audiência também fazer questionamentos, exclusivamente para esclarecer pontos que possam gerar dúvidas dentro do que já tenha sido dito pela testemunha.
O juiz Sérgio Moro, porém, achou por bem ir além do que permite a lei, e perguntou, por sua própria vontade: “O senhor tratou desses assuntos (propina) com Antônio Palocci?”. A resposta: “Não, excelência”. Depois, perguntou: “O senhor tratou desses assuntos com o senhor Luiz Inácio (Lula da Silva)?”. “Nunca, excelência”.
Na sequência, foi ouvido o diretor comercial do Grupo Setal, Marcos Pereira Berti. Com leves diferenças de datas, periodicidade e valores, o executivo confirmou as informações do depoente anterior: havia um grupo de empresas que se reuniram durante anos para fechar entre si obras e concorrências da Petrobras, definindo vencedoras e empresas de cobertura. Para manter tal ilegalidade, pagavam propinas para executivos da estatal, os mesmos citados por Ricardo Pessoa. A Odebrecht era uma das empresas do grupo e também deveria pagar propinas.
Novamente, o depoente não fez qualquer menção a Lula ou ao instituto que leva seu nome. Novamente, após o MPF encerrar suas perguntas, os advogados de defesa abriram mão de formular quaisquer novos questionamentos. Desta vez, porém, Sérgio Moro preferiu não perguntar mais nada.