Violência política contra mulheres: #NãoSeremosInterrompidas

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A execução da vereadora Marielle Franco (Psol), em 14 de março de 2018, em um crime ainda não solucionado (quem mandou matar Marielle, e por quê?), manifestação máxima da violência política, foi prova da barbárie que se instala no país com as milícias. A violência política, especialmente contra mulheres, se expressa de variadas formas e vem crescendo desde a ascensão de Jair Bolsonaro ao poder.

Na madrugada da última terça (31), a Igreja Universal, em seu programa na TV Record, propagou fake news sobre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e sobre a ex-deputada federal e ex-candidata à vice presidência Manuela D’Avila (PCdoB). Em mais uma cena de violência política explícita, pastores mentiram em rede nacional, afirmando que a esquerda apoiaria um suposto projeto de lei de Manuela sobre “regulamentação do incesto”. É uma mentira baixa e vil, que já foi desmentida por diversas agências de checagem.

Ao longo de sua vida pública, Manuela vem sendo vítima de violência política, que tem se intensificado consideravelmente com o crescimento das milícias digitais no Brasil. A ex-deputada, Manuela já denunciou, inclusive, inacreditáveis ameaças de estupro e morte contra sua filha Laura, de apenas 5 anos. Segundo a ex-deputada, as ameaças ocorreram depois que o pai de uma das crianças que frequentam a mesma escola de Laura, em Porto Alegre, tirou uma foto da menina e divulgou em grupos que distribuem mensagens de ódio nas redes sociais.

O Instituto Marielle Franco lançou, nesta semana, a campanha #NãoSeremosInterrompidas, pela aplicação da Lei de Violência Política na campanha eleitoral de 2022. Para o instituto, a violência política que ocorre nos meios digitais está diretamente ligada aos ataques ocorridos fora deles.

A pesquisa realizada pelo IMF ouviu 142 lideranças políticas negras e pardas. Dentre as candidatas negras, 78,1% relatou ter sofrido algum tipo de violência virtual, a mais relatada. Em maior número estão os comentários machistas, seguidos por comentários racistas, reuniões virtuais invadidas e etc. Foram também registrados relatos relativos ao envio de “nudes” por homens desconhecidos nas redes sociais, ataques com 12 conteúdos LGBTfóbicas durante uma live e comentários preconceituosos e machistas de origens diversas.

5,4% das entrevistadas também afirmou ter sido vítima de criação e disseminação de notícias falsas sobre si, membros da família ou de sua campanha. Não é novidade para ninguém que a base de apoio bolsonarista é campeã na divulgação de notícias falsas. Um dos casos mais emblemáticos, que foi parar na CPI das fake news, aconteceu contra a deputada federal Joice Hasselmann (PSDB-SP). Ela passou a ser vítima de uma campanha de ódio, com viés machista, após romper com o governo, em outubro do ano passado.

Erika Hilton (PSOL-SP), primeira trans eleita para a Câmara Municipal de São Paulo e vereadora mais votada do País em 2020, tem que andar com escolta. Ela, que é pré-candidata a deputada federal, conta que a violência aumentou de 2020 pra cá.

Uma das vítimas do gabinete do ódio bolsonarista é a também deputada Maria do Rosário (PT-RS) desde que protagonizou uma discussão com o então deputado federal Jair Bolsonaro na qual este afirmou que “não a estupraria porque ela não merece”. Há 13 anos, a parlamentar é alvo constante das mentiras bolsonaristas, com ataques frontais a ela mesma e a membros de sua família, inclusive à sua filha menor de idade; e também com notícias falsas sobre sua atuação parlamentar. Um dessas notícias diz que ela quer descriminalizar a pedofilia.

Neste ano, a vereadora Carol Dartora (PT-PR) sofreu ataques racistas por causa de uma publicação falsa que a acusava de invadir uma igreja, em Curitiba. Carol afirma que não participou da invasão e denunciou ter recebido uma série de mensagens nas redes sociais com contepudo racista.

Com relação à identificação dos agressores, a maioria das participantes (44,9%) relatou ter sofrido um ataque de indivíduos ou grupos não identificados, enquanto 29,3% afirmaram que os agressores são candidatos, indivíduos ou grupos militantes de partidos políticos adversários; 14,6% indivíduos ou grupos com identidade política ideológica identificada como neonazistas, racistas e grupos antifeministas; e 4,5% candidatos, indivíduos ou grupos militantes do seu próprio partido político. Cabe destacar que entre as participantes da pesquisa, 90% pertencem a partidos considerados progressistas (de esquerda ou centro-esquerda), o que evidencia a escalada de ódio promovida por partidos políticos de extrema-direita e conservadores.

A Lei da Violência Política contra a mulher (14.192/21) estabelece normas para prevenir, reprimir e combater a violência política contra mulheres durante as eleições e no exercício de direitos políticos e funções públicas. O Instituto Marielle Franco afirma que, a poucos meses das eleições, ela não tem sido amplamente aplicada na disputa, o que motivou a pesquisa.

Vale ressaltar que esses ataques são direcionados a uma população de baixa representatividade. De todos os deputados federais, apenas 15% são mulheres, fato que coloca o Brasil na 140ª posição de um ranking internacional da ONU que mede a igualdade nos Parlamentos.