Uma frase bastante provocativa vez por outra vai parar entre os assuntos mais falados nas redes sociais: Jair odeia pobre. O motivo é uma tentativa de mudança de discurso do presidente, que após décadas destilando ódio e preconceito contra a população, ofendendo-a publicamente ao atacar programas sociais e de combate à desigualdade, adotou uma postura demagógica sobre o combate à miséria para tentar reverter a popularidade em queda e as críticas que tem recebido por sua pífia atuação como presidente.
Um dos principais momentos lembrados é quando Bolsonaro foi o único deputado federal a votar contra a criação do Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza em dezembro de 2000. Desde sempre, ele defendia que os auxílios incentivariam as pessoas a não trabalharem, uma retumbante mentira. Cerca de 70% das famílias beneficiadas pelo programa estavam no mercado de trabalho e tinham o Bolsa Família como complemento da renda familiar.
“O pobre não sabe fazer nada.” É isso o que Jair Bolsonaro pensa e declara publicamente, sem pudor ou ressalva. Frases assim foram ditas na tribuna da Câmara Municipal do Rio de Janeiro pelo então vereador entre 1989 e 1991.
De novo no plenário da Câmara dos Deputados, defendeu diversas vezes o fim do benefício. “É um projeto para tirar dinheiro de quem produz e dá-lo a quem se acomoda”, disse em 2011. Ele nunca negou a missão de destruir programas sociais.
“Bolsa Família é uma mentira. No Nordeste, você não consegue uma pessoa para trabalhar na sua casa. Porque se ela for trabalhar, perde”, disse pouco depois à TV. Como sempre, sem qualquer lastro de verdade.
É de se entender o cavalo de pau que ele tenha tido que dar diante dos índices cada vez piores de popularidade. No cenário para a disputa à reeleição, ele não receberia o voto de 58% dos entrevistados “de jeito nenhum”, revelou pesquisa do Instituto FSB, contratada pelo banco BTG Pactual. Para 47%, seu governo é ruim ou péssimo. Diante da avalanche de críticas e da falta de apoio popular, Jair resolveu posar como “pai” do Auxílio Brasil. Ironicamente, quer ser “pai” de um povo que ele chamava de forma preconceituosa de “reprodutor”: “Quanto mais filhos tiver, mais salário mínimo vou ganhar”.
Analisar o histórico do deputado mediano é revelador do quanto ele não acredita e nunca acreditou na luta de combate à desigualdade. Não é, como ele tenta fazer colar, uma medida de urgência para avaliar os impactos sofridos pela população. Oportunidades para isso não faltaram ao longo da pandemia de covid-19 sem que ele demonstrasse qualquer vontade política de ajudar o país a atravessar aquele momento. “Sou Messias, mas não faço milagre”, dizia sem derrubar uma lágrima sequer para as centenas de milhares de pessoas vítimas da infecção, os incontáveis órfãos deixados pela doença.
Não só no governo federal, mas do pouco que fez ao longo de toda sua vida pública, boa parte foi para tentar impedir a população de conquistar alguma dignidade. Em dezembro de 2000, ele foi o único deputado federal a votar contra a criação de um fundo para programas que incluíam transferência de renda, algo que abriria as portas para o Bolsa Família.
“Orgulho-me de ter votado contra o Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza. Orgulho-me e muito!”, bradou o então parlamentar. Em 2015, em entrevista ao documentarista Carlos Juliano Barros, voltou a despejar preconceito e ódio: “O cara tem três, quatro, cinco, dez filhos e é problema do Estado, cara. Ele já vai viver de Bolsa Família, não vai fazer nada. Não produz bem, nem serviço. Não produz nada. Não colabora com o PIB, não faz nada. Fez oito filhos, aqueles oito filhos vão ter creche, escola, depois cota lá na frente. Para ser o quê na sociedade? Para não ser nada”.
Depois, falava publicamente em terminar com o Bolsa Família, o revolucionário programa de inclusão social, reconhecido internacionalmente por ter sido determinante para que as famílias pudessem se alimentar, se vestir, comprar medicamentos e material escolar, aliviando a pobreza e aquecendo também a economia local. O Ipea em 2013 identificou que a cada R$ 1,00 investido no Bolsa Família retornava R$ 1,78 para a economia.
Bolsonaro tanto fez que, no final do ano passado, destruiu o programa. Só com a substituição, mais de 29 milhões de famílias ficaram desamparadas. O ódio de Bolsonaro pelo programa ficava explícito no seu preconceito, que nunca levou em consideração a verdade: cerca de 70% das famílias beneficiadas pelo programa estavam no mercado de trabalho e tinham o Bolsa Família como complemento da renda familiar.
Mesmo o Auxílio Brasil, que agora é usado como boia de salvação pelo governo federal enfrentou diversos empecilhos para ser aprovado. Foi só quando a omissão do presidente era fato inegável que foi proposto o pagamento de apenas R$ 200, limitado a trabalhadores informais, e apenas por três meses. O governo chegou a indicar que elevaria o valor a R$ 300, mas foi longo o debate até que o Congresso aprovasse o pagamento, mas de R$ 600. Se o que cai hoje dificilmente chega ao final do mês, imagine o que seria com a fração proposta pelo governo federal.
E, curiosamente, já naquela época Bolsonarro barrou parte da ampliação do benefício previsto pelos parlamentares e que seria destinado, entre outros, a taxistas e caminhoneiros, justamente para quem ele acena agora com a PEC do Desespero. Com a mesma canetada, ele tenta agora lidar com a fila enorme de pessoas aguardando o benefício, que demorou e muito para chegar às pessoas.
Fica óbvio que o aumento exponencial do empobrecimento foi uma decisão política. Tão grave, ou mais, quanto a decisão de agora de tripudiar do sofrimento do povo humilde por motivação eleitoreira.