A regra do bolsonarismo não muda: quem não sabe fazer, mente. E assim a família do presidente Jair Bolsonaro tenta justificar um governo ruim de serviço que só trouxe miséria para o povo. Mente sobre o que não fez e mente sobre o que Lula já fez e deu certo. Um dos alvos é o Mais Médicos, um marco de como o Estado pode, sim, democratizar o acesso à Saúde se souber governar e construir políticas públicas. O que nenhum dos Bolsonaro sabe fazer.
Tão despreparado quanto o pai, o senador Flávio Bolsonaro passou a atacar o programa para distrair a atenção. O medo deles é que o povo cobre as promessas não cumpridas da campanha de 2018, como o de acabar com o Mais Médicos (o que ele fez) e em seu lugar instituir o Programa Médicos pelo Brasil (que ficou engavetado por anos). Nem mesmo uma pandemia que levou à morte mais de 680 mil pessoas fez com que o presidente se compadecesse em tirar do papel um programa para a Saúde. Só às vésperas das eleições, em abril, foram anunciadas as contratações de 529 médicos para os mais de 5 mil municípios brasileiros.
A conta não fecha, e programa não chega aos pés do seu antecessor. No Rio Grande do Sul, calcula-se que o novo programa tenha gerado perda de 17% das vagas nos postos de saúde. No Ceará, a primeira etapa do programa cobre menos de um terço dos municípios.
Em três anos de existência, o programa Mais Médicos, criado em julho de 2013, durante o governo da ex-presidenta Dilma Rousseff, já tinha levado 18 mil médicos aos rincões do Brasil. O Mais Médicos significou uma verdadeira revolução no atendimento de saúde à população, principalmente aos mais vulneráveis e que vivem em lugares de difícil acesso: indígenas, quilombolas e populações ribeirinhas. O programa possuía, inclusive, unidades fluviais para garantir que o atendimento médico chegasse a todos, independentemente das circunstâncias e das condições de acesso às comunidades.
Bolsonaro sempre foi um crítico do Programa Mais Médicos por pura ignorância e preconceito, uma questão ideológica contra os médicos cubanos que vieram trabalhar no Brasil por meio do programa. Assim como fez com todas as políticas bem-sucedidas de governos petistas, o presidente fez questão de sufocar o Mais Médicos até sua extinção e substituí-lo por uma versão que não atende aos objetivos do programa.
Até a chegada dos governos do PT à Presidência, a escassez de médicos em comunidades do interior e áreas vulneráveis parecia uma realidade incontornável. Em 2013, Dilma Rousseff criou o mais médicos com dois objetivos: levar médicos para todas as áreas do país, incluindo os distritos indígenas, e ampliar a formação de médicos no Brasil, criando vagas de graduação e residência.
É importante esclarecer que o convênio mantido entre o governo brasileiro e a OPAS (Organização Panamericana de Saúde), que garantia a participação dos médicos cubanos no programa, era necessária para que se alcançasse a meta de 2,7 médicos por mil habitantes.
Não fossem os profissionais cubanos, tal meta só seria atingida em 2035. Em 2013, antes da implementação do Mais Médicos, o Brasil tinha apenas 1,8 médicos por mil habitantes, menos do que o México, o Uruguai e a Argentina. Em apenas dois anos, 18.420 médicos passaram a trabalhar em 4.058 municípios e 34 distritos de saúde indígena.
Até o golpe de 2016, o Mais Médicos ofereceu atendimento a 63 milhões de brasileiros. Muitos deles nunca tinham tido acesso a um profissional de saúde. Quando o programa completou um ano de existência, uma pesquisa realizada pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) mostrou que 95% da população atendida e entrevistada estava satisfeita com a atuação dos médicos, que obtiveram notas maiores que 8. Para 86% dessas pessoas, o atendimento melhorou muito.
O programa foi bem-sucedido também do ponto de vista fiscal, já que a ampliação do número de médicos no atendimento básico de saúde evitou 521 mil internações em 2015, gerando uma economia em internações hospitalares equivalente a um terço do orçamento do programa naquele ano.
Um estudo da FGV realizado em 2015 revelou que houve uma redução de 4,6% nas internações em geral e 5,9% nas relacionadas a doenças infecto-parasitárias em 2015. Naquele ano, as 11,3 milhões de internações custaram R$ 18,2 bilhões (R$ 1.612, em média, cada uma), e a economia de quase R$ 840 milhões corresponde a cerca de 33% dos R$ 2,6 bilhões destinados ao Mais Médicos no período – em 2017, foram gastos R$ 3 bilhões.
O Tribunal de Contas da União (TCU) divulgou, no início de 2017, uma avaliação positiva dos resultados do Mais Médicos. Para o órgão de controle, o programa tinha eficácia comprovada na ampliação e melhoria da cobertura médica de 63 milhões de beneficiários em suas duas primeiras fases.
É por conta desse sucesso e para dar um basta à política desastrosa de Bolsonaro que Lula e Alckmin vão retomar o Mais Médicos. Entre as prioridades estão a contratação de profissionais brasileiros, o fortalecimento da formação acadêmica, a adequação da infraestrutura na área do atendimento e a ampliação do Exame Nacional de Revalidação de Diplomas Médicos (Revalida).
Hoje a situação é bem diferente. Ainda antes da pandemia, em 2019, a população já sofria com a falta de profissionais de saúde. A última Pesquisa Nacional de Saúde, realizada pelo IBGE em parceria com o Ministério da Saúde ainda em 2019, revelou que o número de visitas domiciliares de equipes de saúde da família reduziram, mesmo antes da pandemia: em 2013, 47,2% dos domicílios cadastrados receberam ao menos uma visita mensal. Em 2019, esse índice caiu para 38,4%.
Após o rompimento do contrato de Cuba com o Brasil, em 2018, depois dos ataques de Bolsonaro, que tinha sido eleito presidente, cidades inteiras ficaram sem atendimento, como Guaribas, no Piauí, onde há baixo interesse de atuar por parte dos médicos brasileiros. Ainda em 2019, quando as contratações de médicos para o programa caíam substancialmente, 6 milhões de brasileiros já sofriam com a falta de atendimento básico de saúde.
Não há números atualizados do impacto pós pandêmico, mas a situação piorou drasticamente. A falta de testagem em massa e a subnotificação de casos acompanharam a pandemia desde a confirmação dos primeiros casos. Isso só se agravou com um verdadeiro apagão de dados oficiais, que servia apenas para os fins negacionistas de quem queria dizer que tudo estava bem. Não causa espanto que o Brasil tenha sido considerado o país que pior respondeu à pandemia do novo coronavírus em todo o mundo.
O governo jamais instituiu uma política nacional de isolamento social — e criou rixas públicas com governadores e prefeitos que o adotaram durante meses. Quem pôde, adaptou a rotina para trabalhar de casa, à distância. Quem não tinha dinheiro sequer para se proteger de uma doença ainda sem cura, teve de ir à rua e se expor a contaminações a mando do próprio presidente da República. Viramos o epicentro da pandemia, topo de ranking.
A verdade é que, por trás de tudo, há a escolha política e pessoal de um homem que, movido pelo ódio, jamais se condoeu ou enviou solidariedade às centenas de milhares de pessoas, os incontáveis órfãos da pandemia. Por trás dos números, há as pelo menos 400 mil vidas que poderiam ter sido salvas caso algo de sério tivesse sido feito. Em vez de trabalhar, Bolsonaro escolhe mentir. Ninguém aguenta mais.
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