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Brasil tem 125 milhões em insegurança alimentar; crianças sofrem mais

As crianças são as principais vítimas do drama brasileiro de ter 125,2 milhões de pessoas com algum tipo de insegurança alimentar, das quais 33 milhões com fome, sem nada para comer. As informações constam no inquérito da Rede Penssan sobre insegurança alimentar, cujo detalhamento foi divulgado hoje (14/09). No país, 32,4 milhões estão sem acesso ao menos a uma das três refeições desejáveis por dia.

No Nordeste, são 39 milhões de pessoas com algum tipo de insegurança alimentar (68% da população), das quais 12 milhões com fome, a chamada insegurança alimentar grave. Com exceção do Sul, todas as regiões têm mais de 50% com algum tipo de insegurança alimentar. Na forma grave, a região Sudeste tem o segundo maior número absoluto: são 11,7 milhões de pessoas sem ter o que comer, das quais 6,8 milhões no estado mais rico, São Paulo.

Um dos dados revelados pelo estudo é que em 37,8% das famílias com crianças de até dez anos houve fome ou comida insuficiente. Os pesquisadores visitaram 12.745 domicílios de áreas urbanas e rurais de 577 municípios dos 26 estados brasileiros e do Distrito Federal, entre novembro de 2021 e abril de 2022.

Problema é maior no Norte e Nordeste

Regionalmente, o problema é maior nos estados do Norte e Nordeste com, respectivamente 51,9% e 49,4% dos lares com criança de até dez anos com fome ou com insegurança alimentar. O menor percentual, 25%, é no Sul. Sudeste e Centro-Oeste têm, respectivamente, 32,6% e 37,3%.

A falta de acesso a alimentos afeta o desenvolvimento físico e cognitivo das crianças. O quadro apresentado pela pesquisa é um retrato da crise atual, que deixou famílias sem ter garantia de que haverá comida na mesa. Francisco Menezes, consultor da Actionaid, uma das entidades que compõem a Rede Penssan, destacou, em entrevista ao O Globo a necessidade de políticas de enfrentamento da fome com foco na infância, que estão “sofrendo mais intensamente”.

Merenda escolar

Menezes também menciona o fato de a merenda escolar, que cumpre função importante em famílias mais pobres, estar com valores congelados, desde 2017, num contexto de inflação dos alimentos superior a 40% desde 2020. O Congresso incluiu ajuste de 34% no Orçamento, mas o presidente Jair Bolsonaro vetou.

“Quando o Brasil saiu do mapa da fome, a alimentação escolar teve papel importante. A alimentação na escola vai piorando, com a substituição de alimentos de melhor qualidade nutricional para ultraprocessados, mais baratos”, disse.

A pesquisa mostra outros dados preocupantes. Em lares nos quais o responsável é um trabalhador informal ou está desempregado, a fome chega a 44,7%. Nos que o responsável tem emprego formal, cai a 16,7%.

No geral, a fome atinge em média 15,5% dos lares brasileiros. Em 14 estados, o percentual é acima da média. Em Alagoas, por exemplo, chega a 36,7%.

Tripla vulnerabilidade

Tereza Campello, que foi ministra de Desenvolvimento Social e Direitos Humanos entre 2011 e 2016, considera gravíssimo o quadro em que quase 40% das famílias com crianças de até dez anos estarem em insegurança alimentar grave ou moderada.

Ela explica que o Bolsa Família foi criado pensando nessas famílias mais vulneráveis, com crianças. O valor era proporcional à composição familiar e os responsáveis pelas crianças se comprometiam a manter os maiores de seis anos na escola e levar os menores – de zero a seis – ao médico a cada seis meses.

A escola oferecia merenda de qualidade e ajudava a suprir eventual carência familiar. O acompanhamento médico sinalizava se a criança estava bem nutrida. Hoje, não há diferenciação de valor por família e não há contrapartida educacional e de saúde. A merenda escolar, por outro lado, perdeu a qualidade.

“Essas crianças estão nos três sentidos vulneráveis, por não ter uma renda per capita proporcional, não ter acesso à educação, por não ter acesso à saúde e isso levou a deterioração do quadro a esse ponto.”

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