É só percorrer as ruas de qualquer cidade brasileira, mas principalmente das grandes capitais, para deparar-se com um cenário desolador: a quantidade de famílias sem ter onde morar, que acabam ocupando viadutos, praças e calçadas. O resultado do descaso do poder público é nítido: o crescimento da população em situação de rua piorou muito. Esse cenário fica ainda mais desesperador por causa do frio incomum que estamos enfrentando neste ano.
Cidades como Brasília, Curitiba, São Paulo e Belo Horizonte registraram temperaturas mínimas de 1.4ºC, 4ºC, 6ºC e 5ºC, respectivamente, na última semana, a mais fria do ano. A sensação térmica chegou a – 11,6°C em Belo Horizonte, por exemplo.
Em São Paulo, já é conhecido um caso de morador em situação de rua que faleceu por hipotermia na manhã de quarta. Isaías de Faria, de 66 anos, chegou ao centro de convivência São Martinho de Lima, na Zona Leste de São Paulo, pegou a senha para tomar café da manhã e caiu morto aos olhos de todos, antes da refeição.
No perfil do padre Júlio Lancelotti, que atua em São Paulo fazendo o papel que deveria ser do governo, é possível vê-lo tentando esquentar outro morador de rua na mesma situação. Ele abriu as portas da igreja para receber essa população e pede para que outros párocos façam o mesmo. Em um vídeo, o padre chora de desespero diante da situação. E o inverno só começa de fato em 21 de junho.
A estimativa de pessoas morando nas ruas era de 221.869, aproximadamente, em 2020, segundo dados do Ipea. Provavelmente a situação deve estar muito pior após a pandemia e, principalmente, em consequência do desastre humanitário que é o governo Bolsonaro.
Após o golpe de 2016, contra a presidenta Dilma Rousseff, a população de desabrigados aumentou pelo menos 60,95%. Eram 137.849 contra os quase 222 mil de brasileiros na rua durante o governo Bolsonaro. A estimativa utiliza dados disponibilizados por 1.924 municípios via Censo do Sistema Único de Assistência Social (Censo Suas). Esse aumento estrondoso pode ser visto também utilizando a ferramenta do Google Street View, como fizemos no vídeo abaixo.
A falta de censo da população de rua nas capitais, outra apuração de dados escanteada pelo governo federal, dificulta a criação de políticas públicas na área. Em Belo Horizonte, por exemplo, os últimos dados são de 2013, e o número (1.827 pessoas) é quase a metade do estimado hoje por entidades sociais.
O Censo realizado em 2021 na cidade de São Paulo permite ter uma ideia da situação do país com a pandemia. A população em situação de rua na capital paulista foi de 24.344, em 2019, para 31.884 no final de 2021, o que representa um aumento de 31%, contingente maior do que o número de habitantes da maioria das cidades do estado. A pesquisa revela que 18 em cada 100 pessoas estão na rua há menos de um ano.
Em São Paulo, o censo mostra que o perfil da população em situação de rua também mudou. Embora a maior parte dos desabitados seja ainda de homens jovens, hoje vê-se o aumento de idosos, mulheres e crianças. Essa mudança evidencia a ida de um “perfil familiar” para a rua, possivelmente por motivação econômica. Famílias inteiras sem lugar digno para viver. Esse dado é ainda mais preocupante, pois se trata de uma população ainda mais vulnerável ao clima frio, como é o caso do senhor Isaías, que morreu de frio.
O alto número de desempregados também é um fator muito importante para determinar essa realidade. No primeiro trimestre deste ano, 11,1% da população não tinha emprego. Isso sem contar com aqueles que desistiram de procurar, os chamados “desalentados”. Dentre os empregados também existem notícias ruins: 47% das categorias tiveram seu salário comido pela inflação nas alturas.
Esse Brasil de agora em nada lembra o país sob Lula e Dilma. Entre 2003 e 2015 foram gerados mais de 20 milhões de postos de formais de emprego, com carteira assinada. A Era lula chegou ao fim com taxa de desemprego de 5,7% (quando ele assumiu, era 11,2%). O índice de desemprego caiu 45% nos oito anos de seu governo. Em 2014, o governo da presidente Dilma marcou taxa de 4,3% de desemprego (ou pleno emprego), a menor já existente na história desse país.
A inflação nas alturas atinge toda a população. Em um ano marcado por recordes mensais sucessivos da taxa de inflação, abril fechou o mês com o maior índice inflacionário em 26 anos, com 1.06%. foram atingidos 78,3% de todos os produtos e serviços monitorados pelo IPCA.
Além da fome, do desemprego e da renda insuficiente, o brasileiro ainda lida com o alto valor dos alugueis. O Índice Geral de Preços-Mercado (IGP-M), principal indexador de contratos de aluguel e de preço de matérias-primas, não para de subir com Bolsonaro no comando. A inflação do aluguel fechou o ano passado com alta de 17,78%, a segunda maior alta anual desde 2002, atrás somente do índice de 2020.
Com preços absurdos e a renda que só encolhe, além dos reajustes anuais do salário mínimo sem ganho real no governo Bolsonaro, os brasileiros se veem impossibilitados de pagar aluguel, e a única solução é levar a família para viver nas ruas. Ou melhor, sobreviver.
Em 2009, vale lembrar, o governo Lula lançou um dos maiores programas de moradia popular do mundo: o Minha Casa Minha Vida, que priorizava as mulheres e as famílias mais pobres. A iniciativa contratou 4,2 milhões de moradias em 96% dos municípios e entregou 2,7 milhões, beneficiando 10 milhões de pessoas.
Jair destruiu o MCMV e colocou uma cópia mal feita no lugar. O programa Cada Verde e Amarela deixa e fora os mais pobres. Além disso, Bolsonaro sabota o próprio projeto: em 2021, o programa chegou a ficar praticamente sem orçamento, já que o presidente bloqueou os recursos para a área.
Bolsonaro tem sufocado o Brasil e os brasileiros, empurrando as famílias para uma situação de desespero, miséria e falta de dignidade, muito diferente do que vivíamos durante os anos de bonança dos governos democráticos e populares do PT. É inconcebível que as pessoas morram de frio nas ruas enquanto ele mesmo ostenta passeios de jet-ski e motociatas infindáveis sem cumprir sequer um dia de expediente completo para pensar soluções para o problema que ele mesmo ajuda a aprofundar diariamente.
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