Estamos a três meses das eleições e, a cada dia, mais notícias revelam as reais intenções de quem não está interessado nem na verdade, nem na democracia. Dois casos merecem atenção. O primeiro é a informação de que o Google derrubou 100 anúncios políticos por infringirem suas regras (como não haver conteúdo falso ou desinformação). O campeão de anúncios tirados do ar é o PP, partido de Arthur Lira, aliado de Bolsonaro. A vice-campeã é a Brasil Paralelo, produtora revisionista da qual falamos recentemente. O segundo caso é a divulgação, pelo próprio governo federal, da criação de contas “alternativas” de seus canais oficiais nas redes sociais, uma ação descarada para tentar driblar a lei.
Não é novidade o Google remover anúncios que violem suas diretrizes, mas sim a divulgação de quem eram os anunciantes e do montante investido. Este é um avanço positivo, porém ainda tímido, já que a gigante da tecnologia não oferece ao Brasil o mesmo grau de transparência e acesso à informação que disponibiliza a países mais ricos. Há, inclusive, campanhas para que o Google passe a considerar o Brasil merecedor da mesma transparência que os Estados Unidos. Se eles têm o Trump, nós bem sabemos o que temos aqui.
Por ora, ficamos com as informações já disponíveis. Os dados divulgados se referem a peças publicitárias que aparecem nos resultados da busca do Google e como sugestão de vídeos para assistir no YouTube.
Sem ter acesso aos conteúdos retirados do ar, nem aos motivos específicos que levaram à remoção, o que nos resta é ligar os pontos visíveis. Sabemos a segmentação (propaganda política), temos uma estimativa de custo (varia, mas a média é de R$ 500 a R$ 1.000 por anúncio) e o nome dos anunciantes.
Os 100 anúncios retirados de circulação representam 6% do total veiculado de novembro de 2021 até junho deste ano. Nesse período, o partido Progressistas veiculou 163 anúncios e 67 deles eram vídeos que infringiram as regras da plataforma e foram retirados do ar (não sem antes serem apresentados entre 1,4 e 1,7 milhão de vezes para as pessoas).
Por sua vez, a Brasil Paralelo teve 13 anúncios removidos no mesmo período e que foram vistos entre 133 mil e 163 mil vezes. Isso representa uma parte ínfima do total que a produtora de conteúdo revisionista e fake news investe em publicidade.
A lista de restrições do Google para os anúncios fica disponível online. Entre as proibições está o anúncio de produtos falsificados ou perigosos e a promoção de declarações falsas. A empresa foi questionada pela agência de checagem Aos Fatos, que divulgou a notícia da remoção, sobre quais regras o PP e a Brasil Paralelo tinham infringido, mas informou que tem por política não divulgar esses detalhes.
Fica, portanto, a critério de cada um supor os motivos. O que será que tanto o PP quanto a Brasil Paralelo têm em comum no histórico de atuação e no espectro político?
Seja como for, a mera exposição da remoção de anúncios impróprios já movimentou a Brasil Paralelo. Após a publicação de uma reportagem sobre seu estranho ímpeto em fazer anúncios políticos, a produtora revisionista informou ao site Núcleo Jor que, ora ora, não investe em anúncios de política e disse, em nota, que “já solicitou ao Google a correção das informações divulgadas no Relatório de Transparência, uma vez que suas ações de mídia foram classificadas erroneamente como anúncios de cunho político”. O Google, por sua vez, já havia informado que é o próprio anunciante que escolhe a categoria do anúncio.
A verdade é que temos acesso a apenas uma fração do grande “balé” que envolve as gigantes da tecnologia (com suas redes sociais e plataformas de troca mensagem espalhadas por todos os cantos do país), suas regras de comunidade e diretrizes para anúncios (tão bonitas quanto genéricas) e seus ganhos cada vez mais vultosos com publicidade (que, sabemos, é movida a burburinho seja ele qual for).
De um lado, as regras das plataformas, de outro, a lei. No meio, na calada da noite, o governo Bolsonaro operando manobras para se esquivar de umas e da outra. Como noticiou também o Núclo Jor, e como se viu nos próprios canais do governo federal nas redes sociais, no último dia 28 foram criadas contas “provisórias” dos canais oficiais do governo para o período eleitoral devido a “restrições impostas pela legislação eleitoral e pela jurisprudência da Justiça Eleitoral”.
Parece esquisito, e é. Explicamos: além das contas oficiais já existentes no Twitter, no Facebook, no YouTube e no Instagram, agora passam a existir contas “duplicadas” do governo nesses mesmos canais. Ao criar essas contas “alternativas” e pedir que quem segue as oficiais também migre para lá, Bolsonaro faz uma manobra para tentar driblar a legislação e, por exemplo, usar essas contas alternativas para ferir o princípio da impessoalidade da administração pública, fazendo propaganda indevida ou espalhando desinformação. Quem não tem o intuito de infringir a lei não cria mecanismos para infringir a lei. Simples assim.
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