Lula em Brasília: primeiro discurso do presidente eleito na Transição

Leia a íntegra do pronunciamento de Lula em encontro com parlamentares, no dia 9 de novembro, no CCBB, sede do Gabinete da Transição

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Não adianta pedir para o Alckmin falar um discurso mais longo que ele não fala. Eu, lá atrás, falei: ‘Alckmin, você não tem que fazer discurso telegráfico que você fazia nos comícios. Aqui é uma reunião de pessoas, sabe, mais qualificadas do ponto de vista político. Você pode falar um pouco mais’. Mesmo assim, ele foi telegráfico como sempre. Só faltou dizer uma coisa, Alckmin, as pessoas que não estão na comissão que está sendo escolhida, ainda não terminou, vão participar da transição. Eu fiz questão, primeiro, de colocar o Alckmin como coordenador para que ninguém pensasse que o coordenador vai ser ministro. Ele não disputa vaga de ministro, que é o vice-presidente da República. Qualquer outro que eu colocasse, ‘Ah, esse cara vai ser o coordenador, vai ser ministro’. E eu tenho pedido para todo mundo quando convidar alguém para comissão de transição dizer o seguinte: ‘Olha, não será ministro as pessoas que estão, pode ser ou pode não ser, mas ninguém fique trabalhando como se ‘ah, eu vou ser ministro’ porque foi escolhido para a comissão de transição.

A segunda coisa é que a comissão de transição não decide nada. O que a comissão de transição vai fazer é como se fosse uma máquina de ressonância magnética. Ou seja, ela vai fazer um levantamento da situação do país. E, a partir dessa situação do país, nós vamos discutir e vamos tomar algumas decisões para começarmos o processo de mudança do nosso país. Portanto, se alguém quiser contribuir, quiser mandar proposta, tiver alguma coisa, por favor, não se sintam excluídos porque não estão na lista das pessoas que estão participando. O Alckmin é o coordenador, o Aloizio Mercadante e a Gleisi têm um papel importante e cada partido político que participou da coligação tem um papel importante. Nós estamos começando o processo.

A segunda coisa que eu queria dizer para vocês é que eu estou vendo aqui a cara de companheiros que ganharam as eleições, a cara de companheiros e companheiras que perderam as eleições. Eu queria dizer para vocês que o fato de alguém ter perdido uma eleição não significa que esse alguém é menor do que alguém que ganhou. Significa apenas que possivelmente quem ganhou tenha sido melhor compreendido pelo discurso que fez. Eu, cada vez que perdia uma eleição, e não foram poucas as eleições, quantas vezes eu, em casa, chorava porque eu achava que o meu discurso era o mais correto. Eu achava que a minha proposta era a mais correta, eu achava que eu era o melhor para o país. E eu ficava triste porque eu não tinha conseguido convencer o povo daquilo que eu acreditava que eu era. Então, muitas vezes, nós temos de compreender que a gente perde, mas se não fosse, às vezes, a derrota da gente, a gente não fosse candidato, o que está eleito não estaria eleito. Porque muita gente está eleito pela somatória de voto daqueles que perderam, e, às vezes, por diferença pequena. Então, é preciso que a gente leve em conta isso na nossa relação, porque muitas vezes só é reconhecido quem ganha, quem perde não ganha. Aliás, a gente costuma dizer que quem conta a história de uma nação são os vencedores. Os perdedores não têm o direito de escrever. Nesse caso, eu queria dizer para vocês, os perdedores vão ter o direito de escrever e vão ter o direito de participar desse processo de transição e desta governança.

Terceira coisa que eu quero dizer para vocês é que se tem um ser humano feliz no planeta Terra sou eu. Eu estou muito feliz porque eu sempre acreditei em Deus e eu acho que, depois de tudo que aconteceu comigo, depois de tudo, eu me sinto como se eu estivesse sendo ressuscitado. Eu, muita gente não imaginava que a gente pudesse estar vivendo esse momento agora. E nós não estamos vivendo esse momento não por mérito pessoal de qualquer pessoa que esteja aqui, mas pelo mérito e pelo compromisso coletivo que nós temos com o povo brasileiro e pela grandeza política do povo mais humilde e mais pobre desse país. Isso significa que a gente não tem que ter vergonha de dizer que o nosso voto é o voto daquelas pessoas que mais necessitam. É daquelas pessoas que um dia viveram num país que tinha um governo que olhou para elas, que governou prioritariamente para elas, sem esquecer da responsabilidade, da participação de outros segmentos da sociedade.

E, às vezes, eu não fico chateado quando algumas pessoas não compreendem, ou seja, quem nasce no centro de Salvador, quem nasce no centro de Recife, quem nasce no centro de São Paulo, quem já nasce no asfalto, com luz elétrica, com água encanada não tem noção do que é fazer política para o povo pobre nesse país. As pessoas não têm noção do significado de uma cisterna. Parece uma coisa trivial para quem tem água encanada, quem lava calçada com torneira com água potável, quem lava carro com água potável, parece bobagem. Por que fazer um milhão e 400 mil cisternas? O que que isso interessa à economia brasileira? O que que isso representa para o PIB? A gente não pensa no PIB quando a gente faz isso. A gente não pensa na economia ou na macroeconomia. A gente pensa na sobrevivência da espécie humana, que o Estado tem obrigação de cuidar e dar a possibilidade da igualdade de condições para as pessoas.

E eu acho que vocês e os milhões de brasileiros que votaram outra vez votaram por conta disso. Votaram porque vocês acreditam que, embora a gente tenha que governar para todos, a gente tem que tratar prioritariamente as pessoas mais necessitadas. A gente tem que discutir o mundo do trabalho. Você não pode viver no mundo em que os trabalhadores parecem que são microempreendedores, mas que trabalham como se fossem escravos, sem nenhum sistema de seguridade social para protegê-los no infortúnio. Os empresários que ficaram chateados porque nós ficamos falando que vamos rediscutir a legislação trabalhista, a verdade é que nós vamos ter que discutir a relação capital e trabalho no século 21. Quem é empresário sério, quem é sindicalista sério sabe que a gente não poderia ficar no século 21 tratando apenas da lei feita em 1943, mas a gente também não pode abdicar daquilo que era conquista e que dava segurança ao ser humano mais humilde, alguns direitos que foram tirados dos trabalhadores.
Parece pouco, parece pouco, mas a reforma na aposentadoria fez com que um trabalhador que normalmente receberia 2 mil reais vai receber 1.300 reais agora. Parece pouco que uma mulher que poderia receber 2 mil reais de pensão do marido vai receber metade disso. Ora, por que que as pessoas são levadas a sofrerem por conta de garantir a tal da estabilidade fiscal nesse país? Por que que toda hora as pessoas falam ‘é preciso, é preciso cortar gasto’, ‘é preciso fazer superávit’, ‘é preciso fazer teto de gastos’? Por que que as mesmas pessoas que discutem com seriedade o teto de gastos não discutem a questão social desse país? Por que que o povo pobre não está na planilha da discussão da macroeconomia? Por que que a gente tem meta de inflação e não tem meta de crescimento? Por que que a gente não estabelece um novo paradigma de funcionamento nesse país?

Eu quero dizer para vocês que a única razão que eu tenho de voltar a exercer o cargo de presidente é tentar restabelecer a dignidade do nosso povo. E a prioridade zero, outra vez, o mesmo discurso que eu disse em dezembro de 2003, de 2002, o mesmo discurso, não tem que mudar, não tenho que mudar uma única palavra. Eu quero dizer para vocês: se quando eu terminar esse mandato, cada brasileiro estiver tomando café, estiver almoçando e estiver jantando, outra vez, eu terei cumprido a missão da minha vida. Gente, desculpem, desculpem, mas o fato é que eu jamais esperava que a fome voltasse nesse país. Jamais.

Quando eu deixei a Presidência da República, eu imaginava que nos dez anos seguintes esse Brasil estaria igual a França, esse país estaria igual a Inglaterra. Esse país teria evoluído do ponto de vista das conquistas sociais. Esse país teve um impeachment de uma mulher por uma mentira, uma pedalada, a pretexto de melhorar esse país. Esse país viveu o maior processo de negação política que eu conheço na história. Nesse país, eu fui acusado das maiores infâmias, sem que o acusador jamais pudesse provar. Eu não tive que provar a minha inocência. Eu tive que provar a culpa de quem me acusou. Eu tive que provar a culpa do Moro, eu tive que provar a culpa do Dallagnol, e graças a Deus conseguimos provar. E nós voltamos por isso, porque esse país é o terceiro produtor de alimento do mundo, esse país é o maior produtor de proteína animal do mundo. Esse país pode efetivamente garantir que cada cidadão possa comer. Não há explicação. A única explicação é que falta compromisso dos governantes com isso, que é o essencial. A gente se preocupa tanto. Nós temos que garantir uma política fiscal muito séria porque é preciso pagar os juros com o sistema financeiro. E aqui eu tenho dito durante a campanha: ‘ninguém pode falar de responsabilidade fiscal comigo’. Ninguém. Poder falar, pode. Mas ninguém pode dizer que nesse país tem alguém mais responsável do que eu.

Vocês se lembram que, quando eu cheguei na Presidência, em 2003, esse país tinha 12% de inflação, nós levamos a inflação para o centro da meta, para 4,5%, que oscilava dois pra cima, dois pra baixo durante todo o nosso mandato. Esse país estava com 12% de desemprego e vocês se lembram que, quando chegou em 2014, esse país tinha 4,3% de desemprego, o menor desemprego da história desse país. Vocês se lembram que esse país tinha uma dívida pública interna de 60.7%. Deixamos a dívida com 37.7%. Vocês se lembram que esse país tinha uma dívida externa com o FMI em que o ministro Malan, todo final de ano, tinha que ir a Washington tentar pegar dinheiro para fechar o caixa, e o Brasil era humilhado todo ano com gente descendo no aeroporto do Rio de Janeiro ou de São Paulo para vir fiscalizar as contas brasileiras e dizer o que que a gente podia gastar e não podia gastar. A palavra desenvolvimento não existia, a palavra geração de emprego não existia. Era só a palavra fiscal para garantir que a gente pudesse pagar o FMI. E o que aconteceu nesse país? Nós não só pagamos o FMI como hoje nós somos credores do FMI. E além do que o Brasil, que não tinha reserva internacional, nós deixamos 370 bilhões de reais, que é o que segura esse país até hoje. E mais, o Brasil foi o único país de todo o G20 que, durante todo meu mandato, fizemos superávit primário. Eu tive até gente do PT que saiu do PT porque eu elevei o superávit primário para 4,25%. De 3,75% para 4,25%.

Eu tinha consciência que eu precisava conquistar uma coisa chamada credibilidade. Que tem três palavras que quem é governo, quem se elegeu governo, coloque na cabeça. Tem três palavras sem as quais você não consegue governar. Primeiro é a questão da estabilidade. Primeiro a questão da credibilidade. Um presidente da República, quando ele fala, é necessário que ele fale para ser entendido, compreendido e aceito como sério o que ele está propondo. Segundo, é preciso garantir estabilidade. Estabilidade e somente o Estado é que pode tomar decisões de garantir estabilidade política, a estabilidade econômica e a estabilidade jurídica e a estabilidade social. Terceira, a questão da previsibilidade. A sociedade não pode ser pega de surpresa. Eu vou dar dois exemplos do que é falta de previsibilidade. Vocês estão vendo que ainda tem na frente de quartéis algumas pessoas inconformadas com o resultado eleitoral por conta de toda denúncia, de toda fake news, de todas as mentiras contadas sobre o processo eleitoral, de que as urnas eletrônicas não eram sérias. Eu me recordo o Saddam Hussein dizendo que tinha que enfrentar os Estados Unidos, porque os Estados Unidos diziam que ele tinha armas químicas e ele não tinha coragem de dizer que ele não tinha armas químicas. E ontem aconteceu uma coisa humilhante, deplorável para nossas Forças Armadas. Um presidente da República, que é o chefe supremo das Forças Armadas não tinha o direito de envolver as Forças Armadas, a fazer uma comissão para investigar urnas, coisa que é da sociedade civil, dos partidos políticos e do Congresso Nacional. E o resultado foi humilhante. Foi humilhante. Eu não sei se o presidente está doente, não sei o que que está. Mas ele tem obrigação de vir à televisão e pedir desculpas à sociedade brasileira e pedir desculpas às Forças Armadas por ter usado as Forças Armadas que é uma instituição séria, que é uma garantia para o povo brasileiro contra possíveis inimigos externos, fosse humilhada apresentando relatório que não diz nada. Nada, absolutamente nada daquilo que ele durante tanto tempo acusou. Um presidente da República, ele pode errar, mas ele não pode mentir. Não é aceitável que um presidente da República minta para o seu povo. E nós ontem acabamos de provar que um presidente que tinha sido eleito cinco vezes deputado pela urna eletrônica, que teve seus filhos eleitos pela urna eletrônica, colocasse em dúvida a urna eletrônica. Exatamente porque ele sabia que ele ia perder as eleições. Ele tinha certeza que ele ia perder.

E vocês sabem que não foi a disputa entre dois homens, não foi a disputa entre dois partidos políticos, não foi a disputa entre dois candidatos. Foi a disputa entre um candidato e a máquina do Estado, porque ela foi utilizada na sua totalidade. A inteligência, a Polícia Federal, a Polícia Rodoviária, as polícias públicas de cada estado estiveram envolvidos, os empresários ameaçando, os empresários ameaçando, e mais ainda, gente, por isso que foi criado o ‘proibido entrar no celular’, porque tinha empresário querendo que o seu trabalhador fotografasse seu voto para provar que tinha votado contra nós.

Talvez, de todos vocês aqui, eu seja o único que já disputei muitas eleições presidenciais. Eu nunca tinha visto nada igual na minha vida. E eu perdi três eleições para presidente. Eu nunca tinha visto nada na minha vida. Nada. A indústria de mentiras que foi inventada desde as eleições do Trump, nos Estados Unidos, a eleição de 2018 e de agora é uma coisa que é inimaginável, que a gente possa fazer uma eleição num processo desse. Em que milhões e milhões e milhões e milhões de notícias falsas, 24 horas por dia, difamando as pessoas, falando mal. Sabe, utilizando a religião que é uma coisa sagrada. A fé, a fé e a religiosidade das pessoas é uma coisa sagrada. A nossa espiritualidade é uma coisa nossa, muito íntima. Pois até com isso eles mentiram, contando mentiras e contando mais mentiras.

Agora que chegou ao fim, ele ainda não reconheceu a derrota. Seria tão fácil fazer como fez o Alckmin, quando disputou comigo. Seria tão fácil fazer como fez o Serra, quando disputou comigo. Seria tão fácil fazer como eu fiz duas vezes com o Fernando Henrique Cardoso, quando eu perdi as eleições. Pega o telefone e liga e, ‘olha, parabéns pela sua vitória’, e anuncia ao país. Esse país tem um perdedor e tem um ganhador. Ele ainda não teve coragem de fazer isso, como Saddam Hussein morreu, sem ter coragem de reconhecer que o Iraque não tinha armas químicas. Ele afundou um país por conta de uma mentira que só ele acreditava. Portanto, o presidente Bolsonaro tem uma dívida com o povo brasileiro. Peça desculpas pela quantidade de mentiras que foram contadas nessa eleição e pelas ofensas que fez à urna eletrônica, que é um modelo que o mundo inteiro teria que mudar. A maior economia do mundo está contando papelzinho até agora.

Se ele conhecesse a Amazônia ele ia saber que uma urna de uma cidade vai de canoa para a capital, demora três dias dentro de uma canoa. Se ele conhecesse o Brasil ele não recusaria e não ousaria discutir a legitimidade das urnas eletrônicas. Portanto, ontem eu vim aqui para visitar as instituições brasileiras para dizer o seguinte: ‘a partir de agora, vocês vão ter paz porque vocês não vão ter um presidente desaforado querendo intervir na Suprema Corte, querendo intervir na Justiça Eleitoral, querendo intervir. Ou seja, não é possível. Não é possível. Os ministros da Suprema Corte não podem ir num restaurante, não podem ir num cinema, não podem sair de casa.

O presidente do Tribunal Eleitoral, que teve uma coragem estupenda, que é um homem que teve um comportamento exemplar, que é orgulho de todo Brasil. E não me importa se o Alexandre de Moraes é conservador. Não importa se ele seja progressista. Não importa se ele seja de direita de centro. O que importa é que ele foi de muita coragem e muita dignidade na lisura e no compromisso de dirigir essas eleições. Então, eu vim visitar as instituições para provar a partir de agora que vocês vão ter paz, porque vocês vão ser respeitados, porque esse país vai voltar à civilidade. Por isso, eu fui visitar o presidente da Câmara, o Lira, ontem. Muita gente achava que jamais o Lira iria conversar comigo. Eu fui conversar com o Lira por uma única razão. Eu sei o que ele pensa ideologicamente, eu sei que ele é o meu adversário, mas ele é o presidente da Câmara, eleito pelos deputados, e o presidente da República necessita de conversar, necessita de dialogar, porque não é o presidente da República que tem que se intrometer quem vai escolher o presidente da Câmara ou o presidente do Senado, é da responsabilidade de vocês. Então, vocês votaram contra ou elegeram, o dado concreto é que ele é presidente da Câmara e eu fui conversar com ele, da mesma forma que eu fui conversar com o Pacheco, que é presidente do Congresso Nacional e do Senado.

Estamos aqui para provar que nós queremos estabelecer um diálogo entre os partidos políticos. Não venham me dizer “ah… mas e você vai conversar com o Centrão?”. Eu não vou conversar com o Centrão, eu vou conversar com deputados e deputadas eleitas por partidos políticos que se uniram em determinadas circunstâncias, desde a Constituinte. E as pessoas não são obrigadas a concordar comigo. As pessoas não são obrigadas a votar num projeto que eu quero porque eu penso que é bom. Eu não acho que é errado um deputado querer fazer uma emenda num projeto do Governo. O que eu acho errado é um governo achar que ele é tão sabido que ele é capaz de fazer uma medida provisória que não tenha defeitos, e que ninguém queira fazer algum reparo.

Então, nós vamos provar que o nosso governo vai ser o governo do diálogo, vai ser um governo que vai conversar com as instituições, que vai conversar com o Congresso Nacional e com a Câmara, independentemente de que partido que o cidadão tenha sido eleito ou a cidadã. Vamos conversar com cada governador, independentemente do partido que ele foi eleito. Não quero saber se ele gosta de mim ou não. Eu quero saber que ele é governador e foi eleito pelo voto do povo do seu estado, portanto ele tem que ser tratado com a mesma deferência daqueles que votaram em mim e daqueles que trabalharam para mim.

É assim que a gente precisa governar. Mas eu tenho que conversar com o movimento social, é preciso conversar com o movimento sindical, é preciso conversar com as mulheres, é preciso conversar com o povo negro, é preciso conversar com os indígenas, é preciso conversar com as pessoas que lutam todo santo dia para levar um pão para casa. E o presidente da República tem que conversar. Eu vou andar todos os estados e vocês vão ver que não vai ter uma motociata, mas vai ter muitos abraços, vai ter muita conversa, vai ter muito compromisso com o povo porque eu sei da minha responsabilidade.
Eu disse durante a campanha, só tem sentido eu voltar a ser presidente se for para fazer mais do que eu fiz no primeiro mandato. E eu sei o que que o povo pensa, eu sei. Vocês sabem quando um time está ganhando de 4 a 0 no primeiro tempo e os torcedores estão todos satisfeitos, rindo, aplaudindo, imaginando que vai ser mais 4 no segundo tempo. E quando chega no segundo tempo os adversários marcam 4 e empatam. Ou seja, você sai com o amargor de derrota. Se eu fizer apenas a mesma coisa que eu fiz no primeiro mandato, vai ter um gosto de empate, vai ter o gosto de derrota, vai ter gosto de perda, e isso não vai acontecer, isso não vai acontecer.

Quero dizer para os meus companheiros deputados, para minhas companheiras deputadas, para os meus companheiros senadores e senadoras, eu tô com 77 anos de idade, mas quero dizer para vocês que pouca gente de 30 está com a energia e com a tesão que eu estou para governar esse país e para tirar esse país da situação em que ele se encontra. Eu digo isso todo dia porque quero ser cobrado. Eu não quero um tapinha nas costas. Amigo é aquele que vem e fala a verdade para você. Errou, cobra. Fez coisa errada, cobra, porque senão a gente não acerta, e é assim que eu quero governar esse país. Eu quero pagar uma dívida social que todos nós temos com o povo brasileiro. Não é só o Estado, somos nós, nós que tomamos café de manhã, nossos filhos que tomam café de manhã, nós que podemos ir num shopping, nós que podemos comprar o que a gente quiser para comer. Nós temos uma dívida, nós temos que estender a mão para trazer essas pessoas que não tiveram. E não são porque elas são burras, porque muita gente pensa ‘eles são burros’, ‘eles não estudaram’, ‘eles não sei das quantas’. Eles não são burros. Eles não tiveram a oportunidade que nós tivemos. Eles não tiveram a possibilidade de ter acesso a uma profissão. Esse país não acreditava na educação. Esse país não acreditava na educação. Eu digo em todo debate, eu digo em todo o debate, o Peru teve a sua primeira universidade em 1554. E o Peru foi descoberto oito anos antes do Brasil. Em 1554 ele já tinha. O nosso país foi ter a primeira em 1920. Não porque o governo estivesse preocupado com a educação do povo. É porque o rei da Bélgica ia visitar o Brasil e precisava receber um título de doutor Honoris Causa.

Então, eu tenho orgulho. Eu e o Zé Alencar, dois quase que analfabetos, passamos para a história como os dois homens que mais investiram em educação nesse país. Mas a dívida nossa é muito grande com a educação. Agora mesmo a gente está vendo milhões de crianças pobres que não têm celular, que não têm computador, que não têm acesso à internet. Por conta da pandemia, voltaram para a escola menos sabidos do que estavam. E nós precisamos fazer uma verdadeira revolução para recuperar a capacidade do aprendizado dessas crianças.

Então, o nosso compromisso é muito simples. É reconstruir esse país. A democracia está de volta, a civilidade está de volta. Esse povo vai ser ouvido, esse povo vai ter o direito de dar palpite naquilo que nós temos que fazer. Eu quero dizer para vocês que as empresas públicas brasileiras serão respeitadas. A Petrobras não vai ser fatiada. Quero dizer que o Banco do Brasil não vai ser privatizado. A Caixa Econômica e o BNDES, o BNB e o Basa voltarão a ser bancos de investimento, banco de investimento, inclusive para pequenos e médios empreendedores porque muita gente ou de má fé, ou por esquecimento, esqueceu de dizer que foi no nosso governo que nós criamos a Lei Geral da Pequena Empresa e que foi no nosso governo que nós criamos o Simples. E que foi no nosso governo que a gente fez o maior financiamento da securitização da dívida dos agricultores brasileiros, R$ 89 bilhões na Medida Provisória 452 de 2008. Então, quando as pessoas falam que os ruralistas estão com bronca, eu quero conversar para saber porque a bronca. Por que a bronca? Porque no nosso tempo um empreendedor do agronegócio comprava um trator por 2% ou 3% de juros ao ano e hoje está pagando 18%. Então, quero saber qual é a bronca?

Quero dizer para vocês que nós não vamos facilitar a compra de armas, mas sim a compra de livros nesse país. E vamos mudar alguns conceitos nesse país. Muitas coisas que são consideradas como gasto nesse país, nós temos que passar a considerar como investimento. Não é possível que se tenha cortado o dinheiro da Farmácia Popular em nome de que é preciso cumprir a meta fiscal. Cumprir a regra de ouro. Sabe qual é a regra de ouro desse país? É garantir que nenhuma criança vá dormir sem tomar um copo de leite e acorde sem ter um pão com manteiga para comer todo dia. Essa é a nossa regra de ouro. É o compromisso em fazer com que esse país maravilhoso tenha o povo voltando a sorrir.

Uma vez, companheiros, eu vou contar isso para terminar. Quando eu criei o Brasil Sorridente. A coisa que mais me incomodava é que quando eu ia para a periferia de São Paulo, quando eu ia pro sertão nordestino, às vezes tinha meninas de 16 anos, de 18 anos, rapazes, gente bonita, quando dava um sorriso não tinha nem um dente na boca. E por quê? Porque não podia ir no dentista ou não tinha dentista. Nós criamos o Brasil Sorridente para que o povo pobre pudesse fazer um tratamento e não perder os seus dentes na infância. A gente vai ter que voltar com dentista nas escolas, com dentistas nas escolas para que as crianças não tenham cárie de qualquer jeito. Para que a gente possa começar a recuperar antes que não tenha mais jeito.

E eu posso garantir para vocês que a coisa mais barata num país é cuidar dos pobres. A coisa mais barata. A coisa mais cara é garantir que o sistema financeiro receba aquilo que o Estado lhe deve. A coisa mais cara é aquele dinheiro que é inútil, que você não tira proveito dele. Você veja uma coisa, gente. Só nesse período de governo já vai mais de 150 bilhões de dólares pagos em dividendos para acionistas da Petrobras, e nada para o investimento. E essa semana vocês viram que inventaram a distribuição de mais 50 bilhões de dólares de um possível lucro futuro. Qual é a ideia? Esvaziar o caixa da Petrobras para que a gente não possa fazer nada. E vocês sabem que esse país hoje não consegue refinar a quantidade de gasolina que ele precisa. Nós já fomos exportadores de gasolina e, agora, nós exportamos por volta de, refinamos por volta de 79%. É por isso que tem 390 empresas importando gasolina dos Estados Unidos pagando em dólar o preço. Agora eu tô sabendo que eles vão pegar não sei quantos bilhões com o BNDES para que também deixem o BNDES vazio para que não tenha capacidade de investir.
Eu quero terminar dizendo para vocês, eu, depois de tudo que aconteceu comigo, eu sou um homem sem mágoa, sem ressentimento, mas um homem com muito compromisso. Vocês, eu quero que vocês saibam, que eu só tomei a decisão de voltar porque eu acreditava que nós vamos ter condições de fazer esse país voltar a sorrir outra vez, fazer as pessoas terem esperança.

Em 2008, a ONU fez uma pesquisa. O povo brasileiro era o povo mais alegre do mundo e era o povo que tinha mais esperança no mundo. Faz uma pesquisa hoje, que vocês vão ver, agora começou a melhorar, as pessoas já estão dormindo mais tranquilas, as pessoas já estão acreditando que a democracia voltou, com os braços abertos para dar a cada um de nós a sensação e o prazer de felicidade, a sensação e o prazer de que nós seremos capazes de recuperar a civilidade nesse país.

Cada companheiro deputado, cada companheira deputada, pode ficar certo, que nós vamos conversar com o Congresso Nacional, vamos conversar porque o Congresso Nacional tem todos os defeitos que cada um de nós queira que tenha, mas esse país já foi muito pior quando a gente não tinha Congresso Nacional, que ele tinha sido fechado. É melhor um debate caliente, um debate nervoso das divergências nossas, do que o silêncio profundo do medo da baioneta que esse país já experimentou.

Lamentavelmente, lamentavelmente Alckmin, tem gente, uma minoria que está na rua pedindo. Eles não sabem nem o que pedem, mas estão pedindo. Eu, se pudesse dizer para essas pessoas, ‘voltem para casa, democracia é isso, um ganha, outro perde, um ri, outro chora’. É assim em qualquer esporte, é assim em qualquer política. Quantas vezes eu chorei porque perdi. Quantas vezes eu cheguei em casa achando que tudo tinha acabado pra mim. E hoje eu descubro que uma derrota é apenas um incentivo para eu me preparar melhor para outra disputa eleitoral. Então, se vocês tiverem ouvindo pela internet, voltem pra casa. Não sejam violentos com crianças, não sejam violentos com quem pensa diferente de vocês. Vamos respeitar quem não é igual a gente. Vamos respeitar quem não pensa como nós pensamos. Vamos respeitar quem não gosta da música que nós gostamos, vamos respeitar quem não gosta do candidato que nós gostamos. A democracia é isso. É a gente viver democraticamente na diversidade. Eu não peço para ninguém gostar de mim. Eu só peço para as pessoas: ‘respeitem o resultado eleitoral porque nós vencemos as eleições e vamos recuperar esse país’. E vou precisar muito de vocês. Vou precisar muito de cada um de vocês. Portanto, um abraço. Estou viajando segunda-feira para o Egito. Já vou ter no Egito mais conversas com lideranças mundiais num único dia do que Bolsonaro teve em quatro anos. OU seja, uma das coisas que nós vamos fazer é recolocar o Brasil no centro da geopolítica internacional. Vocês não têm noção. Vocês não têm noção. A expectativa que o Brasil está gerando no mundo. A expectativa, a expectativa é tão grande que o Putin ligou, que o Zelensky ligou. A expectativa é tão grande que, num único dia, eu recebi 26 telefonemas, coisa que o Bolsonaro talvez não tenha recebido nenhum.

Eu não quero arrumar inimigo. O Brasil é um país historicamente, o último contencioso nosso foi com a Guerra do Paraguai. Eu não guerra, eu quero paz. Eu não quero ódio, eu quero amor. Eu não quero arma, eu quero cultura e quero livro. Eu não quero cadeia, eu quero escola. É esse país que eu peço a vocês: ajudem-nos a construir. Um abraço, companheiros.

Gente, um aviso. Um aviso importante para vocês. A Copa do Mundo começa daqui a pouco. E a gente não tem que ter vergonha de vestir a nossa camisa verde e amarela. O verde e amarelo não é de candidato, não é de partido. O verde e amarelo são as cores para 213 milhões de habitantes que amam esse país. Portanto, vocês vão me ver com a camisa verde e amarela, só que a minha vai ter o número 13.