Os planos de saúde serão obrigados a cobrir apenas os tratamentos e procedimentos listados pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). A mudança na cobertura dos planos foi facilitada pelo governo Bolsonaro, que no início de março sancionou, por meio de uma medida provisória, a lei que regulamenta a ANS, dando base legal para a adoção do rol taxativo. A medida também concedeu ao Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias) do SUS, controlado pelo Ministério da Saúde, a prerrogativa de determinar quais tratamentos farão parte da lista obrigatória.
Após disputa judicial, essa semana o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu a favor da adoção do rol taxativo em uma audiência nesta semana. A decisão coloca a sobrevivência e a qualidade de vida de milhares de brasileiros em risco, enquanto ajuda as operadoras, que já tinham se beneficiado com o reajuste recorde das apólices em 15% nas últimas semanas. O STJ havia iniciado o julgamento em fevereiro deste ano, mas a decisão foi adiada por um pedido de vistas.
Até então, o Judiciário brasileiro considerava o chamado rol descritivo, no qual a lista da ANS era um ponto de partida e os pacientes poderiam solicitar na Justiça o direito de receber tratamentos que não estivessem listados, desde que tivessem justificativas médicas. O rol era considerado o mínimo a ser oferecido pelas operadoras.
Na prática, agora elas estão isentas de fazer isso. A decisão do STJ não é necessariamente obrigatória para outras instâncias da Justiça, mas a tendência é que ela seja seguida. Ou seja, brasileiros com doenças raras ou tratamentos crônicos que não estejam no rol da ANS, terão de pagar integralmente os procedimentos, terapias e medicamentos que necessitem ou recorrer ainda mais ao SUS, que está limitado pelo governo e pelo teto de gastos.
Vidas inocentes em risco
Entidades de pais e responsáveis de crianças com deficiências e atípicas protestaram contra a decisão. Em fevereiro, durante o primeiro julgamento em Brasília, dezenas dessas pessoas chegaram a se acorrentar diante do STJ. Na audiência de quarta-feira passada, muitas voltaram à porta do tribunal, em Brasília. Após a decisão, muitas já receberam notificações de operadoras sobre interrupções de tratamento.
“É de partir o coração que tantas famílias hoje estão chorando, sem saber como será amanhã. Sem saber se o plano vai bater na porta e tirar o home care, o respirador da criança. É triste dizer, mas é morte. Tem muita criança que, se ficar um dia sem tratamento, e um tratamento que não está no rol da ANS, morre”, reclamou a servidora pública Diony Souza, mãe de um menino autista de 3 anos, em entrevista ao portal Uol.
A decisão foi tomada a partir do julgamento do caso de um paciente que processou a Unimed de Campinas, que se recusava a cobrir um tratamento para esquizofrenia. A operadora perdeu nas duas primeiras instâncias e recorreu ao STJ. Ainda cabe recurso ao STF, mas é necessário que seja interposta uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin).
O rol da ANS, que agora será a base legal, não contempla tratamentos aprovados recentemente, alguns tipos de quimioterapia e radioterapia e alguns tipos de cirurgias. Os procedimentos que não tiverem similar aprovado pela agência ainda poderão ser pedidos na Justiça, desde que a ANS não tenha indeferido sua inclusão na lista, que haja comprovação da eficácia e recomendação de órgãos técnicos nacionais ou estrangeiros.
Durante uma audiência pública da Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados, nessa quinta-feira, o deputado federal e ex-ministro da Saúde do governo Dilma Rousseff, Alexandre Padilha (PT-SP), lamentou a decisão do STJ e afirmou que a bancada continuará brigando pelo direito dos brasileiros aos tratamentos adequados.
“Não vamos descansar, não vamos aceitar calados nem parados essa decisão. A casa das leis tem de ampliar o acesso a tratamentos de saúde, pois o direito já existe está na Constituição. Essas pessoas, que tanto sofrem de doenças e pagam o plano de saúde ao longo de toda uma vida, quando precisam utilizar esse benefício podem ter esse acesso negado por uma interpretação não correta”, afirmou Padilha.
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