Comissão Econômica da ONU para a África apoia seminário do Instituto Lula, FAO e União Africana

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O secretário-executivo da Comissão Econômica da ONU para a África (CEA), Carlos Lopes, esteve no Instituto Lula e declarou que apoiará o seminário “Novos enfoques unificados para acabar com a fome na África”, que será realizado em março, pelo Instituto Lula, a FAO e a União Africana. Lopes comentou ainda sobre a importante articulação da CEA com a União Africana e o Banco de Desenvolvimento Africano na proposição de novas pautas para o continente e sobre a resistência dos países africanos à crise mundial. Para ele, o BNDES é a instituição brasileira que mais pode alavancar os investimentos brasileiros no continente.

Leia a íntegra da conversa abaixo.

Qual é o papel da Comissão Econômica da ONU para a África (CEA) para o continente africano?

A CEA é a CEPAL para a África. Tem como função principal fazer estudos, ser uma espécie de centro de pensamento sobre o desenvolvimento da África. É a mais antiga das comissões e foi criada antes da organização da unidade africana. Até dois anos atrás todas as reuniões da União Africana eram feitas na sede da CEA. Então, até do ponto de vista histórico é um lugar que tem uma simbologia muito especial para os africanos.

E qual a sinergia com os trabalhos da União Africana e do Banco Africano?

Hoje em dia tem uma estrutura tripartite formada pela CEA, a União Africana e o Banco Africano. Os três trabalham juntos para o desenvolvimento do continente. Nessa aliança tripartite, a União Africana é o líder político, o Banco Africano é o investidor e a Comissão Econômica é o pensar. Isso tem uma importância fundamental para o crescimento africano neste momento e também desempenha um papel de provocador de novas ideias e de fomentar novas pautas.

Como a África está reagindo ao cenário atual de crise mundial?

Em termos regionais é de longe a região que mais cresce. A Ásia no seu conjunto não cresce tanto como a África, embora saibamos que tem economias como a China que crescem acima da média. Há uma grande quantidade de expectativas sobre a África. É o novo continente do futuro.

O que faz com que a África seja tão resistente às crises são três fatores. O primeiro fator é que durante bastante tempo eram as commodities que faziam crescer a economia africana, hoje as commodities continuam a ter uma importância grande nas exportações, mas só representam 1/3 da economia africana. Uma outra situação muito interessante é o crescimento da classe média africana, que são agora cerca de 330 milhões de pessoas e é maior que a classe média da Índia. O terceiro fator é de que existem nesse momento pontas de inovação na África que estão a fazer crescer muito a contribuição econômica do continente. Além disso, são razões de otimismo a juventude da população africana, a urbanização da África e as grandes descobertas na área de energia. Outra razão é o fato de a África ter 60% das terras cultiváveis não utilizadas no mundo.

Qual a importância desse evento como esse que será realizado pelo Instituto Lula, FAO e União Africana?

Uma das grandes debilidades da África é o fato de ela não conseguir alimentar a si própria. Tem todas as condições para fazê-lo do ponto de vista tecnológico e do ponto de vista da natureza. É mais um problema político do que de potencialidades. Então esse evento vai trazer esse debate em uma altura crucial da África onde a África está otimista, precisa crescer, mas também precisa cuidar dessas várias debilidades e vulnerabilidades. E se conseguir importar as experiências bem-sucedidas em outros continentes, nomeadamente no Brasil, terá feito o seu trabalho que é o de provocar um debate político de fundo sobre o porquê dessas características continuarem a dominar a agricultura africana.

E o combate à fome idem. O que é preciso trazer como discussão é qual é o papel da ajuda alimentar. Porque os agricultores são penalizados duas vezes: têm dificuldade de acesso a crédito, dificuldades de infraestrutura e logística e quando há a seca você tem essas dificuldades todas e ainda tem a comida que vem de graça, que é oferecida. Tudo isso vai ser objeto de análise nesse encontro. A Comissão Econômica para a África apoia esse encontro e vai ter um papel de ajudar os três organizadores a mobilizar uma boa participação africana e vamos também trazer para esse encontro algumas análises, documentos que nós produzimos sobre esse tema, nomeadamente sobre a questão da terra.

O que mudou nas relações entre Brasil e África desde a eleição de Lula como presidente?

Houve uma mudança brutal durante o período da presidência Lula nas relações com a África. Isso pode ser medido de várias formas. Desde a intensidade das relações diplomáticas e políticas até o aumento do comércio e investimento entre os países. Além disso, há uma descoberta de uma relação para além do econômico, uma relação cultural, de cumplicidade histórica e que começa agora a ganhar uma certa importância e eu acho que vai ter muito mais importância no futuro. A África vai completar cinquenta anos de unidade africana no próximo ano e quem os africanos convidam como principal convidado para a cúpula, a presidente Dilma. Isto é uma simbologia muito forte. É um privilégio que se dá ao Brasil. O Brasil é o afago, é a solidariedade, é emoção, é muito mais do que só uma relação puramente comercial e econômica.

O Brasil também precisa de políticas públicas para promover esse relacionamento. Ter protagonistas públicos que servem um pouco para abrir caminho. No caso do Brasil eu acho que essa instituição deve ser o BNDES. Tem tudo para abrir esse caminho e deve incentivar através de uma política bem desenhada o empresário brasileiro a ir pra frente. É preciso ver a complexidade africana. Todos os países que estão em guerra representam cerca de 100 milhões de pessoas, mas há os outros 900 milhões que não tem nada a ver com isso. São instituições públicas que têm que fazer esse trabalho de poder ajudar o investidor, os atores econômicos a poder distinguir no meio da fumaça onde é que está o caminho. Esse papel é fundamental.


Clique aqui para saber mais sobre o seminário “Novos enfoques unificados para acabar com a fome na África”.