É assustador acompanhar o labirinto que as fake news percorrem para chegar no seu celular, despertar um sentimento em você e, assim, tentar deturpar o debate sério. E quanto mais se criam regras e acordos para reduzir a ação dos robôs, das contas falsas e a propagação de mentiras, mais atalhos elas acham para manter de pé essa indústria lucrativa do ódio. A mais recente estratégia está nos grupos de compra e venda do Facebook, o chamado Market Place.
São contas que passam por vendedores de persiana, botijões de gás e aparelhos celulares, mas que, entre um anúncio e outro, lotam a rede social de fake news, mentiras e difamação, mostrou uma reportagem de O Globo. Isso fere diversos padrões da comunidade, o que pode até levar à suspensão das contas. Mas, até que sejam pegos, todo um novo batalhão já está a postos para assumir dali em diante.
É como o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva comentou na reta final do Big Brother Brasil, o maior e mais lucrativo realitys show da TV brasileira: “Estão entrando agora para ver quem vai ganhar [o BBB], e tem um cara que está com esquema de computador, é uma indústria. […] Tem um cara que é mais abastado lá, me parece, tem mais dinheiro, e ele montou uma fábrica de computador para mandar mensagem para votar nele. Enquanto o cara que não tem, precisa pegar o telefone e votar, o cara tem uma fábrica. Que estupidez que é essa, que brincadeira que é essa?”
É lógico que um programa de entretenimento, por maior que seja, não reflete o comportamento do eleitor diante das urnas. Nem mesmo as motivações para o voto são as mesmas, e cada uma tem uma dinâmica diferente. As urnas eletrônicas, por exemplo, são auditadas e seguras. Ninguém em sã consciência proporia a falsa simetria da comparação entre um programa de TV e um processo democrático e seguro de eleições.
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O que Lula deixa óbvio com essa comparação é, sim, a tecnologia disponível e as manobras que estão claramente em voga para manipular o debate público, seja qual for o assunto. No caso do programa da TV Globo, há suspeitas de que páginas de celebridades no Instagram recebiam dinheiro em troca de publicações positivas para determinado participante. Por outro lado, fazendas de robôs teriam atuado para manipular os resultados da escolha digital dos eliminados da semana.
Da mesma forma, são artimanhas sabidamente usadas por figuras públicas e políticos que tentam criar um “hype” positivo em torno de seus nomes, ou, no caso da milícia digital de Bolsonaro, esconder as mazelas e denúncias de corrupção de seu governo. As fazendas de likes, robôs e fake news são um problema real que afetam o mundo todo, influenciando até mesmo em pesquisas de intenção de votos às vésperas de eleições de diversos países.
Por definição, as fazendas de robôs, ou bots, são uma forma de fraude digital que usa de computadores para invadir sistemas e roubar dados de pessoas nele cadastradas, gerar tráfico falso e impulsionar conteúdos ou anúncios. Recentemente, o Serviço de Segurança Ucraniano desmantelou duas fazendas de bots em Lviv, em plena guerra, que tinham uma capacidade total de 18 mil contas falsas. Elas se localizavam em dois apartamentos e contavam com 3 mil SIM cards, os chipes dos celulares, para promover, a mando de agentes russos, desinformação e criar pânico na população. Nisso, entram anúncios falsos de atentados, atos terroristas e outras fake news virais.
Os equipamentos mantidos por eles permitiam gerenciar diversos números de telefone, uma tática de pulverização fácil de ser implementada e que dificulta a detecção do sistema. A manobra data antes mesmo da guerra, e já em janeiro o governo ucraniano acusava a Rússia de promover ataques virtuais contra 70 sites oficiais, além de enviar mais de 5 mil mensagens a membros do exército e das forças policiais da Ucrânia. Além disso, a imprensa internacional reporta que os ataques infectaram centenas de computadores na Lituânia e em Latvia.
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Já as fazendas de cliques são criadas para gerar um tráfico de internet altíssimo, seja para beneficiar algum negócio ou pessoa, seja para fazer com que determinada narrativa ou versão fique em alta nos assuntos mais comentados no momento no mundo digital. Se valendo de uma estrutura conhecida como “fazenda de cliques”, criminosos simulam visitas de usuários para gerar tráfico falso a determinados conteúdos. Acontece que os acessos não são feitos por pessoas reais, mas por funcionários ou bots. Há diferenças entre as interações feitas por cada um deles, mas, de modo geral, eles não refletem o comportamento orgânico ou mesmo a opinião da população.
O problema é que, segundo as plataformas, não é muito fácil diferenciar a atuação dos robôs e contas falsas das de usuários reais. A tecnologia é tão sofisticada que eles são capazes de imitar com semelhança o perfil de navegação de seres humanos. Não só roubam dados dos usuários, como também espalham desinformação, criam fraudes e abertamente forçam os debates públicos para o lado que os favorecem.
Segundo especialistas, o Facebook só consegue detectar uma a cada 10 contas criadas nessas fazendas. A título de exemplo da escala do estrago que podem fazer, em maio de 2021, uma fazenda de likes gerenciava 13,7 mil perfis falsos na plataforma. Cada um deles postava 15 vezes por mês, o que soma 206,6 mil posts criados apenas por esta fazenda.
Não é de hoje que se sabe que, no Brasil, a milícia do Instagram usa propina paga para dar destaque a certos influenciadores e artistas, enquanto destrói a imagem de outros. A questão é que poucas vezes o assunto esteve tão em voga. Fora do mundo do entretenimento, essas práticas são capazes de fazer um estrago gigantesco.
Segundo estudo de Rafael Grohmann, as fazendas de cliques são “plataformas parasitas”, uma vez que dependem da infraestrutura das redes sociais para existir. Funcionários das fazendas criam contas falsas e robôs, já que ganham dinheiro pelo número de cliques que são capazes de dar a determinado conteúdo.
+ Como denunciar mentiras e fake news do bolsonarismo
Também porque as mentiras não são criadas apenas como informações falsas: elas miram especialmente gerar sentimentos negativos em quem as recebe. E quando alguém, bem ou mal intencionado, divide um desses conteúdos, está criado o campo para uma disseminação quase incontrolável.
Na política, sabemos bem no que isso resulta. Normalmente, as fazendas de robôs atuam nessa seara, com publicações provocativas ou diversionistas para incitar reações de pessoas reais que acessam as redes sociais. Cada conta falsa se faz passar por uma pessoa real a princípio, e há um gosto preferencial por participações em grupos, onde a chance de chegar a usuários de carne e osso é mais fácil. Aí valem memes, piadas, fotos roubadas ou forjadas, vídeos manipulados e mensagens de ódio, tudo para parecer humano. Mentira plantada, as pessoas passam a comprar as mesmas ideias e a compartilhá-las de forma alienada.
O ‘boom’ do bolsonarismo no Twitter
Esse assunto é ainda mais importante diante dos acontecimentos dos últimos dias. Segundo o pesquisador Christopher Bouzy, fundador do site BotSentinel.com, da noite para o dia, uma série de nomes da política norte-americana ligados ao Partido Republicano e associados à extrema-direita atingiram picos de seguidores nunca antes vistos no Twitter. Por outro lado, políticos democratas perderam um número significativo de seguidores. O comportamento, que causa preocupação, chegou também ao Brasil. Entre a segunda (25) e a terça (26), Jair Bolsonaro ganhou mais de 65 mil seguidores na plataforma. Acontece que, desse total, 19.999 foram criados na própria terça, e outros 17.923 vieram à luz na segunda. Ou seja: 58% dos seguidores recentes de Jair são contas que até poucos dias nem sequer existiam.
Outros nomes ligados a ele, como seus filhos e apoiadores fiéis, tais quais Carla Zambelli, Helio Lopes, Mário Frias, Damares Alves, Marcelo Queiroga e até o empresário Luciano Hang tiveram um crescimento vertiginoso em seus perfis no Twitter no mesmo período.
A relação entre a criação de contas falsas, a disseminação do ódio e as campanhas de ataques direcionados é clara. Para dificultar a localização dos autores das falas criminosas, são criados diversos perfis, a princípio pequenos, que se dedicam exclusivamente a propagar as fake news criadas pelo gabinete do ódio. Como conseguem atuar em massa, têm a intenção de manipular o debate público, dando a impressão de que dado assunto se tornou central no país. “Só se fala nisso”, dão a entender. E, de quebra, enchem os bolsos de dinheiro, já que a indústria das mentiras e da desinformação é altamente lucrativa.
Não é de hoje que está nítido que a estratégia deles é tentar repetir 2018 e nos afogar em mentiras. Sempre que se vê acuado, Bolsonaro cria cortinas de fumaça a cada notícia negativa veiculada sobre o seu governo (e são muitas). Essa estratégia não é nova, mas é extremamente eficaz. Com suas declarações absurdas, o presidente pauta a mídia e as redes sociais dia após dia, deixando as más notícias sobre sua administração em segundo plano.
Siga denunciando!
Nunca é demais reforçar: não compartilhe posts visivelmente falsos. Qualquer publicação, mesmo que em tom de denúncia ou indignação, ajuda a aumentar a propagação dessa mentira, que visa confundir o debate sério e mudar o foco para a discussão que realmente importa. Ou seja, a sua denúncia acaba virando divulgação daquele conteúdo com que você não concorda.
Por isso, reforçamos: ao notar um conteúdo falso, não compartilhe nem com seus amigos. Respire fundo, e lembre-se de que é essa justamente a estratégia do bolsonarismo. Então, responda à mentira com uma verdade. Basta buscar uma vacina em https://lula.com.br/verdadenarede para desmontar os argumentos falsos e as narrativas fantasiosas dos apoiadores do genocida.
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