A volta da fome é uma realidade devastadora no Brasil. São pelo menos 19 milhões de pessoas que não comem todos os dias no país, e 116 milhões de pessoas estão em situação de insegurança alimentar (ou seja, comem menos do que o necessário). Com a volta das aulas presenciais nas escolas públicas, se multiplicam relatos de estudantes desmaiando de fome em sala de aula. Enquanto isso, Bolsonaro acabou com o Bolsa Família, maior programa de transferência de renda e combate à fome do mundo, substituindo-o pelo Auxílio Brasil, programa sem previsão orçamentária definida e com uma série de incertezas.
A fome é decorrência direta da política de morte de Bolsonaro:a inflação dos alimentos está completamente descontrolada, e acumula alta de mais de 13% em 12 meses, segundo o IBGE. Alimentos como o arroz, o feijão, o leite, a carne bovina, o frango, verduras e legumes acumulam altas inéditas no país, e 85% da população precisou substituir alimentos em sua dieta. O desemprego atinge 13,7 milhões de pessoas, e o salário mínimo não teve nenhum aumento real durante o governo de Bolsonaro. O resultado é a tragédia da fome. Segundo dados da Universidade Livre de Berlim, a insegurança alimentar grave atinge especialmente lares com crianças e adolescentes. Em dezembro de 2020, a insegurança alimentar grave atingia impressionantes 20,6% dos domicílios com crianças de 5 a 17 anos.
Reportagem publicada pela BBC Brasil nesta quarta (17) traz uma série de relatos de professores de todo o Brasil sobre alunos que desmaiam de fome em plena sala de aula. São crianças que não comem porque seus responsáveis estão desempregados, porque ficaram órfãs ou perderam os avós durante a pandemia da Covid-19, que, sob a batuta genocida de Bolsonaro, matou 610 mil brasileiros.
Também vem sendo observado aumento da evasão escolar de crianças e adolescentes, que precisam parar de estudar para procurar trabalho ou para assumir trabalhos domésticos de parentes vítimas da pandemia. Enquanto isso, Bolsonaro se preocupa em espalhar fake news, em viagem no Oriente Médio, sobre o Enem (mais um programa que Bolsonaro vêm destruindo).
Leia alguns dos relatos da fome em sala de aula
Relato de professora da rede municipal carioca, sobre aluno de 8 anos de idade.
“Essa aluna chegou bem atrasada. Ela bateu na porta da sala de aula, eu abri e notei que ela não estava bem, mas não consegui entender o porquê. Passei álcool na mão dela e senti a mão muito gelada, num dia em que não estava frio para justificar. Ela sentou e abaixou a cabeça na mesa. Eu estranhei e chamei ela à minha mesa. Ela veio e eu perguntei se ela estava bem. Ela fez com a cabeça que estava, mas com aquele olhinho de que não estava. Perguntei se ela tinha comido naquele dia, ela disse que não.Fui pegar algo para ela na minha mochila — porque eu sempre levo um biscoitinho ou uma fruta para mim mesma. Mas não deu tempo. Ela desmaiou em sala de aula.”
Relato de professora de Sumaré, São Paulo. O aluno tem vários irmãos e a mãe, desempregada, deixava de se alimentar para dar comida aos filhos.
“Com a volta às aulas presenciais, depois da pandemia, temos observado vários casos de alunos passando por necessidade. Casos de fome mesmo, de que o único alimento que o aluno tem é na escola. “Nesse caso, nós percebemos na educação física, porque o aluno desmaiou na quadra. Aí, conversando, ficamos sabendo que ele ainda não tinha se alimentado naquele dia e já era o período da tarde”.
Relato de professora de Rio Claro, São Paulo.
“Dentro do processo de tutoria, em que cada aluno é acompanhado de perto por um professor, uma aluna de 13 anos, com dois irmãos menores e uma irmã bebê, relatou que precisava de ajuda, que precisava de alimento, porque não tinha comida dentro da casa dela”.
Relato de conselheiro tutelar da Zona Oeste do Rio de Janeiro, sobre criança de 7 anos.
“Havia um conflito dentro da escola, um nervosismo muito grande de uma criança sem histórico de agressividade. Ela havia agredido uma colega, depois desafiou a professora e, por fim, acabou tentando agredir a direção. A escola nos chamou para conversar com essa criança e sua família, para saber se se tratava de uma reprodução de violência. Mas, conversando com essa criança, ela nos relata vontade de comer.”
O combate à fome nos governos de Lula
O combate à fome sempre foi uma obsessão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Em seu discurso de posse, em 2003, Lula afirmou que, se conseguisse assegurar que todos os brasileiros pudessem tomar café da manhã, almoçar e jantar, teria cumprido a missão de sua vida. O Brasil saiu do Mapa da Fome da ONU em 2014, graças às políticas sociais implementadas pelos governos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e de Dilma Rousseff.
O Programa Bolsa Família foi uma das principais peças dessa engrenagem de políticas públicas que não apenas deu o peixe a quem tinha fome, mas também ensinou a pescar. O Bolsa Família foi um programa de distribuição de renda parte de uma engenharia ampla de combate à pobreza que levou o Brasil a ser reconhecido internacionalmente, replicado em cerca de 20 países, e tirou 36 milhões de pessoas da miséria.
Além disso, durante os governos de Lula e do PT, a política de valorização do salário mínimo foi um dos pilares das políticas sociais. De 2002 a 2015, o aumento real do salário mínimo (ou seja, acima da inflação do período) foi de 76,54%. Esse foi um dos principais fatores responsáveis por manter a economia aquecida durante a crise internacional iniciada em 2008 e pela inclusão social.
Lula transformou a valorização do salário mínimo em lei, fruto de construção conjunta com os movimentos sindicais. A lei garantia garantia o reajuste real do salário mínimo por meio de sua correção a partir da variação do PIB do ano anterior somada ao repasse da inflação do período.
Infelizmente, toda essa engenharia social foi completamente desmontada pelo golpe e pela gestão de Bolsonaro. Se o desemprego está nas alturas, os salários não sobem e os alimentos seguem cada dia mais caros, a fome é uma certeza.
Em 2021, um salário mínimo só consegue comprar 1,57 cestas básicas. A proporção é muito inferior àquela dos governos do PT. Em 2010, era possível comprar 2,31 cestas com um salário mínimo. Em 2014, um salário mínimo comprava 2,58 cestas.